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PORTO

MEMÓRIA
Guilherme Pinto de Almeida

Pelotas, RS | 2021
MINISTÉRIO DO TURISMO E SAGRES APRESENTAM

Porto Memória
Guilherme Pinto de Almeida

Edição: 222
Produção Executiva: OTROPORTO Indústria Criativa
Coordenação editorial: Duda Keiber
Impressão: Gráfica e Editora Pallotti
Direção de arte: Valder Valeirão
Design editorial: Nativu Design
Revisão textual: Duda Keiber, Mariana Heineck e
Taís Diniz Martins

Fotografia da capa: Pelotas – Porto de Embarque.


Cartão Postal. Edição da Livraria Universal de
Echenique Irmãos & C.ia. Pelotas. Década de 1900.
Acervo Eduardo Arriada.

Impresso no Brasil
ISBN: 978-65-992387-2-7

www.otroporto.com.br

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Ao irmão Duda Keiber, com carinho.
Almeida, Guilherme Pinto de
Porto memória / Guilherme Pinto de Almeida.
1. ed. - Pelotas, RS : 222, 2021.

ISBN 978-65-992387-2-7

1. Fotografias 2. Hidrovias 3. Iconografia 4. Memórias


5. Portos - Brasil 6. Pelotas, Rio Grande do Sul - Porto
7. Pelotas (RS) - História 8. Portos - Pelotas (RS) I. Título.

21-65539 CDD-981.65

Índices para catálogo sistemático:


1. Porto de Pelotas : Rio Grande do Sul : História 981.65
Maria Alice Ferreira - Bibliotecária - CRB-8/7964

Este livro foi realizado através do financiamento da Lei Federal


de Incentivo à Cultura - Lei 8.313/91.
16 Apresentação
22 Uma rica hidrovia
26 A presença indígena
30 Transição do território
34 Panorama I
38 Panorama II
42 Panorama III
46 Passo dos Negros, o Passo Rico
50 A Barca Liberal
54 Flutívagos Argonautas
58 Progressão em suspenso
62 A Batalha Naval do São Gonçalo
66 Que terreno foi esse?
70 Os Rodriguez (Ribas)
74 Passando dos limites
78 Uma praça pública por um armazém
82 Delimitação e denominação pétrea
86 Cais, praça e rua
90 Princesa visita Princesa
94 Admiráveis saladeiros
98 Isabel em uma charqueada, no porto
102 Notas
114 Notas iconográficas
122 Referências
126 O autor
128 Agradecimentos
A memória não é apenas um conjunto de informações armazenadas ou um
processo físico, químico e biológico do campo neural. A memória é o mapa
que nos conduz a um futuro aprimorado... ela é a chave para que não come-
tamos os mesmos erros e para que nos aperfeiçoemos, como indivíduo e
coletividade, no inexorável transcorrer do tempo. Olhar para trás, portan-
to, é primordial para olharmos para a frente com sabedoria e segurança...
Sob este prisma, então, cabe regressarmos um pouco na história do projeto
Porto Memória, que nasceu bem antes de 2021, e evoluiu trilhando um
caminho pautado em trabalho dedicado e amizade fraternal.

Apresentação Há quase 10 anos atrás conheci o pesquisador Guilherme de Almeida,


que acabara de trabalhar na digitalização da Revista do 1º Centenário
Duda Keiber de Pelotas, de João Simões Lopes Neto. Mal imaginava ele – e eu – que o
presente do Bicentenário da cidade fosse o nosso Almanaque, que Gui-
lherme coordenou a pesquisa iconográfica com grande competência e
acervo, embelezando a obra e deixando um legado eterno de amor à
Princesa do Sul.

Depois, foi com a descoberta de Guilherme que trabalhamos no resgate


da cápsula do tempo de Yolanda Pereira, fato inusitado que ganhou o
noticiário nacional – uma caixa esquecida na praça central, enterrada sob
um monumento, coisa de filme! Também com o trabalho e parceria do
Guilherme, realizamos o incrível álbum Figurinhas de Pelotas nº 1, um
livro ilustrado que resgata o passado, detalha fragmentos da urbe e da
comunidade e que, com certeza, ficará registrado na memória gráfica da
cidade. Estamos, aliás, neste momento, em montagem do Figurinhas de
Pelotas nº 2 e preparando o início da pesquisa para o Figurinhas de Rio
Grande, nosso município vizinho.

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Esta peregrinação pelo tempo em busca de fatos, imagens e registros es- Pelotas, escondido sob uma cortina do passado que, por esquecimento,
condidos nos possibilita jogar luz a uma cidade invisível, mas presente, desconecta motivos óbvios e futuros inevitáveis de sua raiz formadora.
como um perfume, e que se transforma incessantemente num infinito
e cotidiano cruzamento de temporalidades. Entender de onde estamos Portanto, atenção marujo: coragem e esperança, vai partir a nau Porto
vindo, o que nos forma e porque estamos aqui também faz parte da busca Memória em direção à nossa própria história.
inevitável pelo autoconhecimento.
Uma boa viagem!
O Porto Memória é uma síntese de todos estes desafios. Em 2016, em um
novo projeto – OTROPORTO -, a temática Porto de Pelotas veio à tona.
Entendemos ser importante resgatar a linha narrativa deste espaço fun-
damental e de apogeu cíclico na história de Pelotas, pois o surgimento de
um Porto Público conduziu a expansão do mapa urbano da cidade, facili-
tou o comércio e logística de inúmeros produtos e trouxe riqueza e pros-
peridade a charqueadores, industriais e comerciantes. Guilherme, com
o apoio constante da Gabi Mazza, então assumiu a pesquisa que gerou
mais de 60 artigos publicados nos dominicais do jornal Diário Popular
com o título de Colunas Porto Memória. Deste rico material compilado
surgiram também as palestras sobre a História do Porto de Pelotas para
as escolas públicas lindeiras, restando quase mil alunos participantes em
mais de 50 atividades, que perduraram até o final de 2018.

A partir de então, a ideia de reduzir tanta informação revelada em um li-


vro ficou cada dia mais pertinente. Editar um material que fosse utilizado
como instrumento de educação e pertencimento, de resgate histórico e de
reconexão com este espaço tão único na cidade nos pareceu a ação cor-
reta para que seguíssemos a nossa caminhada no sentido da valorização
da comunidade, do bem-estar do indivíduo, da educação e dos valores
alinhados à Declaração Universal dos Direitos Humanos e das práxis de
cidadania compartilhada. Por isso, toda a tiragem desta edição será dis-
tribuída dirigida e gratuitamente às escolas públicas municipais, estadu-
ais, à rede privada e às universidades, pois para amar é preciso respeitar
e, para respeitar, é necessário conhecer.

Parafraseando Caetano, o livro que ora lês é a flor da história mais velha
do Porto de Pelotas desabrochando em suas mãos. É um convite para
viajares no tempo conosco, mirar os arredores, compreender os proces-
sos formadores dos espaços e das comunidades, ver o lado invisível de

18 19
É banhada pelas águas do canal São Gonçalo – o Sangradouro da Mirim –,
em cuja margem esquerda está a planície onde encontrou lugar a povoação
da Freguesia de São Francisco de Paula. Canal junto ao qual os portugueses
ergueram o Forte de São Gonçalo, na foz2 do Rio Piratini. São Gonçalo que
tem como afluente o arroio Pelotas, tendo as margens de ambos sediado
charqueadas, empreendimentos movidos a trabalho escravizado. Sinuosa
comunicação entre a Lagoa dos Patos3 e a Lagoa Mirim, percurso delimita-
do por juncos e apreciado pelas garças-brancas e quero-queros. São Gon-
çalo do Passo dos Negros, o Passo Rico.

Quantas foram as embarcações – pelotas, canoas, botes, chalupas, catraias,


iates, barcas, lanchões, escunas, sumacas, brigues, patachos, paquetes, lú-
gares, galeotas, barcaças, palhabotes, vapores – que singraram suas águas?
Em um estaleiro às margens do arroio Santa Bárbara, outro afluente do São
Gonçalo, foi montada a primeira embarcação a vapor que cruzou as águas
do Rio Grande do Sul!

Uma rica hidrovia Por estas águas chegaram o sal para o charque e o açúcar para os doces.
Através destas águas chegaram os artigos importados que abasteceram o
Inconfundível paisagem, da mais absoluta pujante comércio local e satisfizeram o gosto cosmopolita dos pelotenses.
lhaneza1, a orla portuária de Pelotas representa Um porto conectando Pelotas ao mundo.
muito em relação à história e à memória da cidade.
Quantos foram os viajantes, cativos, livres ou imigrados aqui aportados?
Quantos trabalhadores obtiveram seu sustento do intenso movimento vi-
venciado nos períodos áureos de operação das diversas fábricas aqui ins-
taladas?

Também a região portuária muito quer dizer em relação ao futuro de Pelo-


tas. Experimenta uma revivescência, incrementada pela afirmação de um
núcleo de formação universitária, aliada à chegada de novas e promissoras
perspectivas econômicas.

O Porto de Pelotas tem e terá muitas histórias para contar.

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Ao longo das terras nas quais viria a se implantar a cidade, muitas gerações
de indígenas certamente apreciaram a idílica plenitude da natureza local,
em paradisíaco bucolismo, somente interrompido por eventuais enfrenta-
mentos intertribais.

Aqui viveram Tapes, Minuanos/Guenoas; vagaram Charruas e mesmo


Guaranis, entre outros, em nomadismo4 ou estabelecendo-se em territó-
rios-nações diversos geograficamente dos rígidos limites fronteiriços co-
nhecidos hoje.

Essa anterioridade não significou aos nativos qualquer garantia de posse


destas terras, quando da chegada do europeu; ao contrário. Já no século
XVI fez-se sentir a gana predatória do branco, na forma das violentas ban-
deiras paulistas, a recolher indígenas para suprir a escassez de mão-de-obra
escravizada africana. No século seguinte foi a vez do contato com outros
europeus ibéricos, os padres da ordem dos jesuítas, que, ‘portando procu-

A presença indígena ração de Deus’ (comarca diferente de Tupã), reivindicaram para si a ‘salva-
ção’ de suas almas, dando sequência assim à ‘perdição’ de suas liberdades.

A arqueologia aponta para cerca de dois milênios Visando a efetiva tomada do território, no século XVIII, os nativos foram
e meio de presença indígena na região de Pelotas. capturados e escravizados em massa, forçados a executar serviços braçais
para a Coroa Portuguesa, notadamente em tarefas de construção. Enquan-
to os Tapes, de índole bravia, ofereceram resistência, os Minuanos manti-
veram histórica cooperação com o colonizador português.

A toponímia5 local, como acontece em geral no país, está repleta de no-


mes de etimologia indígena. ‘Pelota’ em si faz referência ao veículo feito
de couro vacum, imortalizado em pintura atribuída ao artista francês Jean
Baptiste Debret; solução indígena para o deslocamento fluvial entre mar-
gens. Igualmente, tem-se “Serra dos Tapes”, “Lagoa dos Patos”, entre outros
inúmeros topônimos de similar étimo6. A rua Benjamin Constant, inclu-
sive, quando traçada na década de 1830, originalmente chamou-se rua da
Indígena, em provável referência a alguma moradora da região7.

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A História – ciência que estuda as ações do homem no tempo, presente e
passado – tem na Arqueologia – ciência que estuda a cultura e o modo de
vida do homem através de seus vestígios materiais no tempo, passado e
presente – uma poderosa aliada.

Neste sentido, em relação ao território onde hoje está a zona portuária de


Pelotas e arredores, a precedência indígena tem sido desvelada pelo traba-
lho profícuo dos arqueólogos universitários locais8. Em investigações sé-
rias e metódicas, executando escavações coordenadas, têm sido descober-
tos importantes vestígios dos habitantes originais. A correta interpretação
destes achamentos coloca luz sobre o modo de vida e os comportamentos
desses antigos habitantes.

As margens do canal São Gonçalo, especialmente o Pontal da Barra - local


onde este canal encontra a Lagoa dos Patos – constituem um precioso sítio
arqueológico, e têm sido alvo de especial atenção por seus muitos cerritos.

Transição do território Cerritos são pequenos cerros criados por aterro pelos índios, com obje-
tivos diversos, como servir como sepultura, fundação arquitetônica para
moradias em áreas alagadiças, marco central de aldeamentos, ou simples
A construção do conhecimento é um área de descarte de resíduos.
trabalho coletivo das ciências.
Pelos vestígios encontrados, sabe-se que os índios ali estabelecidos obti-
nham alimento da pesca de peixes como corvina, bagre e miraguaia, além
do plantio de milho e abóbora. Pesquisas de datação estimam que o perío-
do de sua permanência naquela região foi de 1.300 anos, a contar de 2.500
anos atrás, aproximadamente. Os especialistas, em sua maioria, afirmam
tratar-se dos índios Minuanos.

A presença indígena na região, que foi massiva, hoje restringe-se a poucos


indivíduos. Não houve espaço para os indígenas e seu modo de vida na
sociedade formada pelo colonizador branco. Talvez os topônimos de refe-
rência indígena sejam uma tentativa do inconsciente coletivo dos brancos
de buscar, tornando perene a memória de nossos aborígenes, uma estranha
expiação, face à vergonhosa e triste exclusão social à qual os submeteram.

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A partir de 1780, o rápido desenvolvimento da povoação de São Francisco
de Paula em freguesia, catalisado pelas charqueadas10, foi consolidando as
razões para sua autonomia administrativa, alcançada com a instalação da
vila em 1832. Logo elevada à categoria de cidade, em junho de 1835, Pelotas
exalava progresso.

Ainda que, em geral, os saladeiros11 possuíssem seus próprios atracadouros


junto ao arroio Pelotas e ao canal São Gonçalo, breve a necessidade de es-
tabelecer um porto público se impôs, como um dos equipamentos urbanos
necessários à manutenção e promoção do progresso local.

Uma das primeiras medidas dos edis da vila, em 10 de outubro de 1832, foi
proibir construções em uma faixa de 22 metros perpendicular às margens
daqueles cursos d’água, a fim de não embaraçarem o trânsito público nes-
tes veículos do nosso comércio. Na mesma sessão foi dado parecer favorável
a um trapiche no porto mais apropriado para a facilidade do comércio e à

Panorama I construção de um outro porto no arroio Pelotas12. Em outubro de 1834, um


trecho de margem do canal São Gonçalo foi reservado como logradouro
público13.
Com o Tratado de Santo Ildefonso (1777)9 e a diminuição
Nesta primeira metade da década de 1830, 15 novas ruas foram projetadas
das tensões entre as coroas portuguesa e espanhola pela posse na porção sul da cidade. Dentre elas, a atual rua Benjamin Constant. A
do território do atual Rio Grande do Sul, houve paz suficiente planta urbana aprovada em junho de 1834 já assinalava a localização do
para as incipientes povoações se organizarem. porto de Pelotas junto ao canal São Gonçalo, a sudeste do núcleo urbano
consolidado e expandido. Nesses primeiros tempos da cidade havia, por-
tanto, dois espaços públicos colocados em servidão como portos: um junto
às charqueadas e outro próximo à zona urbana.

Em outubro de 1832 iniciou viagens regulares pelo canal São Gonçalo a


Barca Liberal, segunda embarcação a vapor do país. Meses depois, em mar-
ço de 1833, já estava sendo articulada a desobstrução da barra do canal São
Gonçalo, a fim de permitir o acesso de navios de maior calado14. Ambas as
iniciativas foram interrompidas pela revolta Farroupilha, iniciada em se-
tembro de 1835.

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Traçadas, mas ainda com trechos obstruídos por chácaras e plantações, as
ruas da região do porto do canal São Gonçalo foram franqueadas em pre-
paração à segunda visita de Dom Pedro II a Pelotas16, em outubro de 1865.
Entre 1860 a 1890 Pelotas experimentou grande desenvolvimento em ter-
mos econômicos, gozando a riqueza do ciclo do charque, em seu auge. A
cidade recebeu importantes melhoramentos e passou a contar com novos
equipamentos urbanos. Foram criadas sociedades por ações na forma de
companhias, tendo os charqueadores e demais capitalistas entre seus prin-
cipais acionistas.
Em 1870 entrou em vigor um contrato de 35 anos com a Companhia Fer-
ro-Carril e Cais de Pelotas, que passou a administrar o cais do porto do
canal São Gonçalo. Em 9 de novembro 1873 a empresa inaugurou um ser-
viço de transporte de passageiros e de cargas em bondes movidos a tração
animal. A primeira linha implantada ligava o porto ao centro, pelas atuais
ruas Benjamin Constant e Félix da Cunha17. A companhia pretendia ainda
construir uma de suas estações junto à praça Domingos Rodrigues, mas
Panorama II isso não se efetivou.
No ano de 1871 foi criada a Companhia Hidráulica Pelotense, que implan-
Somente em 1845, após um decênio de conflito – período tou um sistema de abastecimento de água encanada. A água era captada em
de profunda estagnação econômica para Pelotas –, aos poucos barragens feitas em arroios ao redor da cidade, armazenada em uma caixa
a cidade foi dando continuidade a sua vida. Em 1846, a d’água metálica e distribuída por meio de quatro chafarizes18. O porto do
canal São Gonçalo recebeu um destes chafarizes em 1874, originalmente
solução de um litígio levou à doação do terreno para a instalado ao final da atual rua Benjamin Constant.
praça Domingos Rodrigues15. Nestes primeiros tempos, o
Em 1867 foi, enfim, estabelecida a Companhia de Desobstrução da Foz do
canal São Gonçalo era aproveitado como praia, balneário,
Rio São Gonçalo. O trabalho de dragagem foi concluído no final do ano de
apesar de seu acesso ainda não ser facilitado. 1875, sendo o vapor Guayba o primeiro navio nacional de grande calado
a atracar no porto do canal São Gonçalo, em 11 de outubro daquele ano.
O primeiro grande navio estrangeiro aqui aportado foi o palhabote norte
-americano Tampico, em 11 de fevereiro de 1876 – acontecimento muito
festejado, por seu enorme significado para a economia local19.
A navegação desempenhava seu papel de protagonista no desenvolvimento
local quando, em 1884, foi inaugurada a Ferrovia Rio Grande-Bagé. Pelotas
passou a ligar-se a Rio Grande através de uma ponte ferroviária, estendida
sobre o canal São Gonçalo, a oeste de seu porto, próximo da foz do leito
original do arroio Santa Bárbara.

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O cais, até então estruturado em estacada de madeira – pranchões, prensa-
dos à margem por sucessão de estacas –, estrutura rústica que necessitava
ser reconstruída de tempos em tempos, foi reestruturado em alvenaria de
pedra. O abundante granito das pedreiras regionais também foi empregado
no pavimento das ruas adjacentes ao cais20.
Em 1905 foi concluída a Estação Fluvial do ramal ferroviário do Porto de
Pelotas. Com a demolição de alguns prédios, em 1907 foi aberto o prolon-
gamento da rua Benjamin Constant. Neste mesmo ano Pelotas conseguiu
consolidar a existência de uma alfândega própria, após muita disputa polí-
tica com Rio Grande. A remodelação do porto contemplou ainda a arbori-
zação paisagística da praça Domingos Rodrigues, em 1910.
Em 1925 é inaugurado o prédio Almoxarifado Municipal, com frente para
a rua Benjamin esquina rua Santa Cruz, conectado pela rua Conde de Por-
to Alegre com os trilhos do ramal ferroviário. Foram iniciadas articulações
políticas para a remodelação completa do porto de Pelotas, que foi garan-

Panorama III
tida por decreto em dezembro de 1928, e confirmada por novo decreto
em junho de 1934. As obras deste novo porto tiveram muitos percalços, e
demoraram de novembro de 1933, quando foram iniciadas, até janeiro de
No final do século XIX, as charqueadas se aproximavam 1940, quando passou a operar. O novo porto, construído sobre o antigo,
ganhou em área de operação avançando, com uma estrutura de caixões de
do ocaso, ao passo que fábricas eram instaladas nas
concreto armado, alguns metros São Gonçalo a dentro. Três grandes arma-
proximidades do porto do canal São Gonçalo. Na primeira zéns foram construídos21.
década do século XX, com o final do longo contrato da
Nas décadas seguintes, administrado pelo Estado, experimentou alguma
Companhia Ferro-Carril e Cais (1870-1905), a municipalidade prosperidade, antes de sentir o paulatino declínio econômico vivenciado
promoveu uma grande reforma do espaço portuário. por Pelotas e região. A queda sensível no movimento de cargas ao longo
dos anos teve nos anos 1990 seu período mais acentuado. A zona do porto
pareceu mesmo deserta, fantasmagórica, em contraste total com o período
áureo do bairro – quando, conta-se, era comum os operários serem abor-
dados nas calçadas, a caminho do trabalho, por alguém propondo uma
oferta de emprego mais vantajosa em outra fábrica próxima.
No início do século XXI, com a instalação de unidades e de um campus da
Universidade Federal de Pelotas, em prédios há muito ociosos de antigas
fábricas, a região voltou a respirar vida, com o movimento de estudantes.
Atualmente, o porto experimenta um revivescer operacional. Voltou a mo-
vimentar grandes volumes de carga, com um dos seus armazéns adaptado
para servir a um terminal de transporte de toras de madeira anexo.

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O trânsito de homens embarcado em canoas, bem como a transposição do
gado proveniente dos Campos Neutrais23, era feito mediante o pagamento
do devido imposto de pedágio à Coroa Portuguesa. Também ali eram co-
mercializados os escravizados24 trazidos via Rio Grande.
Originalmente chamou-se Passo do Neves, em referência a um pioneiro
morador das cercanias. Devido à facilidade que oferecia, o pedágio arre-
cadou tal monta que passou a ser conhecido como Passo Rico25. Foi com
o nome de Passo dos Negros, entretanto, que passou à história, devido ao
alto contingente de trabalhadores escravizados a exercer ali, sob o jugo do
açoite, atroz rotina de pesadas atividades.

A intensa movimentação suscitou o planejamento de um arraial no local.


No ano de 1820 foram projetados seis quarteirões, nas terras de Manoel
Soares, dono de charqueada junto ao passo. O projeto não prosperou, o que
se atribui ao mau cheiro da atividade charqueadora circundante, ao temor

Passo dos Negros, de revoltas da numerosa população escravizada, mas sobretudo ao sucesso
do loteamento organizado por Antônio dos Anjos e pelo padre Felício26 a

o Passo Rico
noroeste dali – que veio a consolidar-se como o núcleo urbano definitivo
de Pelotas27, junto à atual catedral.
Ironia do destino, em 1922, cerca de um século após ser retratado por De-
Há muita história impregnada nas margens do canal São bret, o Passo dos Negros recebeu a instalação de em engenho de arroz, pro-
Gonçalo. Um dos seus trechos de maior relevância é o Passo priedade do cel. Pedro Osório28. A ironia está no fato de que um lugar tão
dos Negros. Situado pouco a oeste da foz do arroio Pelotas, ligado às charqueadas, passou a sediar uma empresa de beneficiar arroz,
consagrou-se como o ponto mais cômodo para travessia. justamente o produto apostado pelo coronel para alavancar um novo ciclo
econômico, frente à derrocada do ciclo do charque, na transição do século
XIX para o XX.

O arroz segue sendo importante para a economia regional, ainda que aque-
le engenho esteja em ruínas. A luta no Passo dos Negros hoje é por seu
reconhecimento enquanto Patrimônio Cultural brasileiro, junto aos órgãos
competentes (IPHAN), uma vez que a preservação de sua paisagem está
ameaçada pela especulação imobiliária29. É inegável sua importância para
a história do Rio Grande do Sul e do Brasil.

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A iniciativa de fabricar, montar e navegar um barco a vapor em águas rio-
grandenses partiu de Domingos José de Almeida31. Para realizá-la, cons-
tituiu uma empresa, que contou com Antônio José Gonçalves Chaves32,
José Vieira Vianna e Bernardino José Marques Canarim33 como os outros
acionistas. Almeida, entretanto, foi o responsável pelo adiantamento sem
juros do capital necessário para efetivar o negócio, frente à desistência dos
colegas.

Através dessa empresa, foi promovida a vinda do maquinismo e do ma-


quinista para a montagem da barca, cujo casco já se encontrava em cons-
trução. O maquinário – motor e caldeira – foi importado de Nova Iorque,
Estados Unidos da América. A fabricação foi da companhia Allaire Iron
Works, do notável mestre ferreiro e mecânico James Peter Allaire, um dos
maiores nomes da história da construção, invento e desenvolvimento de
máquinas a vapor destinadas à navegação marítima34.

A Barca Liberal O estaleiro onde foi produzido o casco e feita a montagem da Liberal ficava
no extremo sul da atual rua mal. Deodoro35, junto a uma curva daquele ar-
roio36. Sua existência, anterior a 1830, foi marcante a ponto de servir como
Sem exortações a pioneirismos, é fato que o segundo referência e nomear aquela região sudoeste da vila, que ficou conhecida
barco movido a vapor do Brasil30 – e o primeiro do tipo como Bairro do Estaleiro37.
a navegar as águas da Província de São Pedro do Rio O nome da embarcação era uma homenagem ao ideal liberal, visão polí-
Grande do Sul -, foi construído em um pequeno tica da qual os quatro sócios eram adeptos. Ideal já celebrado no nome do
estaleiro à margem esquerda do arroio Santa Bárbara, Theatro Sete de Abril38, batizado em lembrança da abdicação do Imperador
Vila de São Francisco de Paula, no ano de 1832. Dom Pedro I39, marcante vitória daquela corrente de pensamento político.
Os Farroupilhas, que tiveram em Domingos de Almeida o seu principal
pensador40, comungavam das ideias liberais, então pensamento de van-
guarda no mundo.

Em meados de setembro de 1832 a barca Liberal desceu às águas do Santa


Bárbara41 para testes.

51
Atingia a velocidade de nove milhas42 por hora. Podia carregar mercado-
rias e passageiros, e tinha capacidade para mais de 150 pessoas. Seu custo
total foi de aproximadamente 40 contos de réis.

Suas viagens começaram uma semana depois, no domingo, dia 7 de outu-


bro. Desta viagem inaugural, o pesquisador Alfredo Ferreira Rodrigues43
nos transcreveu do jornal O Noticiador, de Rio Grande44, as impressões45. A
embarcação partira de Pelotas às 8h conduzindo muitos generosos cidadãos
que quiseram ter o gosto de serem os primeiros flutívagos argonautas46. Seu
destino, a história.

Menos de três horas depois, por volta das 11h, chegaram à Vila de São José
do Norte, onde foram festivamente recebidos. Novos passageiros entraram
a bordo, partindo rumo à Vila de Rio Grande. O ígneo batel surgiu ao meio-
dia na Ponta da Macega empavonado, cheio de bandeiras. Alguns viajantes
observavam das janelas da barca a festa que a população fazia nos prédios,

Flutívagos Argonautas praias e embarcações, espoucando foguetes e içando bandeiras, flâmulas e


galhardetes. Às 14h, a Liberal partiu de volta a Pelotas.

Com o sucesso dessa primeira viagem, no mês de novembro a barca foi


Em sua primeira demonstração, no dia 30 de setembro
navegar águas mais distantes. Permaneceu vários dias em Porto Alegre, de
de 1832, a barca Liberal impressionou a todos pela onde excursionou para a Vila de Rio Pardo, a colônia alemã de São Leopol-
rapidez com que navegava as águas do canal do e a Vila de Triunfo – lucrando, nesta última, mais de dois contos de réis.
São Gonçalo, contra o vento e a correnteza.
Ao retornar à Vila de São Francisco de Paula, iniciou viagens regulares a
Rio Grande, fixadas, a partir de julho de 1833 nas segundas e quartas-fei-
ras, com retorno nas terças e quintas-feiras. As viagens a Porto Alegre se
mantiveram, esporadicamente.

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Medidas importantes estavam sendo tomadas para garantir essa prosperi-
dade. Era preciso estabelecer um porto público. Em uma das primeiras ses-
sões da câmara municipal, em outubro daquele ano, estabelecia a proibição
de levantar edificações nas margens do São Gonçalo, em uma faixa de 22
metros48. Posteriormente, em outubro de 1834, um trecho da margem do
mesmo canal foi declarado oficialmente logradouro público49.
Para melhorar a navegação comercial no canal São Gonçalo, era necessário
desobstruir sua foz50. A formação natural de bancos de areia verificada em
sua barra impedia o acesso de navios de maior calado51. A adequação ao
trânsito de navios maiores significaria a possibilidade de comércio direto
com praças mais distantes e em maiores volumes de cargas. Não haveria
mais necessidade de expedir as mercadorias em embarcações menores
via porto de Rio Grande, o que agilizaria sobremaneira os negócios dos
comerciantes locais52. Os charqueadores eram os mais interessados nessa
autonomia.

Progressão em suspenso Em março de 1833, Domingos de Almeida e Antônio José Gonçalves Cha-
ves formaram nova sociedade, com intuito de proceder a obra de desobs-
A elevação da Freguesia de São Francisco de Paula à trução53 da foz do São Gonçalo. Foi contratado o arquiteto-civil da câmara
categoria de Vila, instalada em 1832, era consequência de Edward Kretschmer54, que dirigiu estudos de sondagem e levantou plan-
tas55. Essa importante obra seria adiada por décadas, com o estouro da re-
seu notável desenvolvimento econômico47.
volta Farroupilha56, em 20 de setembro de 1835.
Vinte dias após a deflagração do conflito, em 10 de outubro de 1835, Do-
mingos de Almeida foi preso em sua casa, o solar à costa do Arroio Pelotas.
A bordo de sua própria barca a vapor, foi conduzido a Rio Grande, onde
permaneceu encarcerado por dezessete dias. Esse episódio interrompeu o
sonho de navegação comercial da barca Liberal, conforme seus proprietá-
rios haviam pensado. Tomada pela Marinha Imperial e armada com peças
de artilharia, foi transformada em navio de guerra para combater os pró-
prios farroupilhas. Posteriormente, foi usada como navio-escola, incorpo-
rada à esquadra imperial. Voltou a fazer viagens comerciais somente após
aquela guerra, conforme notícia de outubro de 1846.

59
Controlá-lo significava exercer poder sobre o trânsito fluvial-lacustre de
toda a região sul, da Laguna dos Patos ao rio Jaguarão. Por isso o Sangra-
douro da Mirim veio a se tornar palco de uma épica batalha naval.

As forças imperiais brasileiras, tendo em vista a retomada da capital Por-


to Alegre, ora sob domínio farrapo, haviam guarnecido em princípios de
1836 o São Gonçalo, na altura do Passo dos Negros. Ali foram postadas a
Barca Liberal e mais duas canhoneiras57. O bloqueio do canal não interferiu
na tomada da cidade de Pelotas, levada a efeito pelos farroupilhas em 7 de
abril de 183658.
O grande embate nas águas do canal São Gonçalo deu-se em 2 de junho
daquele ano. Um dia antes, os farroupilhas haviam avançado às suas mar-
gens, estabelecendo pequenas fortificações no Passo dos Negros, com um
corpo de artilharia a cavalo munido de seis bocas-de-fogo59. A esquadra
legalista sofreu então consideráveis avarias60, e o sucesso dos farrapos só

A Batalha Naval não avançou para a tomada da cidade de Rio Grande por conta do grave fe-
rimento sofrido pelo seu comandante-em-chefe – acidente que se fez sentir

do São Gonçalo
no ânimo de seus comandados61.
Os dez anos de duração da guerra (1835-1845) tiveram enorme impacto
sobre Pelotas. Houve profunda estagnação econômica, e boa parte da po-
A cidade de Pelotas teve papel relevante no teatro pulação deixou a cidade. Toda aquela prosperidade que só aumentava ficou
da guerra farrapa. Sua importância estratégica, em suspenso. Somente mais tarde, entre as décadas de 1860 e 1890 é que o
entre outros fatores, estava relacionada ao controle ciclo do charque atingiria seu apogeu.
do canal São Gonçalo, crucial para o domínio da região. Cem anos após a guerra, em 1935, na porção mais meridional da Praça
Domingos Rodrigues foi erguido o monumento ao Sentinela Farroupilha,
também conhecido como o Bombeador Farrapo62. A bela estátua em bron-
ze de autoria do talentoso escultor pelotense Antônio Caringi63 foi implan-
tada voltada para a direção sul, mirando o canal64. Procurava, quiçá, avistar
o terreno inimigo, do qual poderiam os farrapos ter se apossado naquela
ocasião, dando, talvez, outro desfecho àquela fatídica epopeia.

63
Ambos foram proprietários das terras em questão, antes de sua urbani-
zação. 

Mariana Eufrásia da Silveira era natural da Freguesia de São Salvador da


Vila da Horta, Ilha do Faial, Arquipélago de Açores65, Portugal. Seus pais,
Isabel da Silveira e o alferes66 Antônio Furtado de Mendonça, estavam en-
tre os casais integrantes da primeira leva de imigrantes açorianos, trazidos
para povoar a Comandância Militar de Rio Grande de São Pedro67. A famí-
lia chegou ao Brasil em meados do século XVIII68.
Mariana veio a ser proprietária da terminação ribeirinha da Sesmaria do
Monte Bonito69, situada entre os arroios Santa Bárbara e Pelotas, na última
ondulação da várzea que, vinda de Monte Bonito, se aproxima do Canal de
São Gonçalo. Em julho de 1813, o capitão-geral Dom Diogo de Souza aten-
deu à reinvindicação de Mariana, concedendo-lhe a posse de tais terras.
Dois meses depois, pediu permissão para vender uma parte delas – dois

Que terreno foi esse? terrenos nos quais seu finado marido, o capitão-mor Francisco Pires da
Silveira Cazado, havia concedido licença para que fossem erguidas duas
charqueadas. Os charqueadores eram o capitão Domingos Rodrigues e o
Dois nomes estão fortemente ligados à história do es- sargento-mor José Tomás da Silva.
paço ocupado pelo cais do porto e sua praça contígua: Mariana Eufrásia faleceu em 9 de abril de 1822, contando 90 anos de idade.
Mariana Eufrásia da Silveira e Domingos Rodrigues. Em seu inventário, aberto em novembro de 1829, foram listados alguns
terrenos, destinados conforme cláusula70 para obras de servidão pública da
crescente povoação da Freguesia de São Francisco de Paula. Na década de
1830 foram projetadas ruas nesta porção sul da freguesia, logo elevada às
categorias de vila e cidade71. Esta nova etapa de urbanização é conhecida
como Segundo Loteamento72. Desde 1909, a açoriana faialense é homena-
geada pela municipalidade com o nome de uma rua, no loteamento origi-
nado de suas terras73.

67
Casou-se com Doña Luzia Fermiana do Pilar77, com quem teve três filhos:
Domingos Rodrigues Ribas, João Rodrigues Ribas e Cecília Fermiana Ro-
drigues Ribas78. O casal integrava o círculo restrito de espanhóis designa-
dos como fidalgos da Casa de Borbón, que em 1780 passaram a residir em
Lisboa, tornados portugueses por ocasião do casamento da infanta de Es-
panha D. Carlota Joaquina de Borbón com o príncipe português Dom João
(futuro rei Dom João VI do Brasil), efetivado em 1785.

Domingos, Luzia e seus três filhos estavam entre os súditos leais trans-
migrados para o Brasil em 1808, acompanhando a Família Real Portuguesa.
Aqui chegaram a bordo do navio Affonso d’Albuquerque, da frota lusitana.

Residiram inicialmente no Rio de Janeiro, em uma chácara onde hoje está


o bairro do Botafogo. Mudaram-se para Colônia do Sacramento, atual
Uruguai, onde Domingos estabeleceu charqueada, enriquecendo como
negociante e pecuarista. Posteriormente, vieram para a nascente povoação

Os Rodriguez (Ribas)
de São Francisco de Paula.

Na futura Pelotas, os Rodrigues Ribas mantiveram charqueada em um


terreno79 próximo da margem do canal São Gonçalo, adquirido de Mariana
O capitão Don Domingos Rodriguez74 Ribas, Eufrásia da Silveira. Adquiriram muitas terras, inclusive a antiga Estância
comumente referido na historiografia como Domingos do Fragata, aumentando sua fortuna80.
Rodrigues, nasceu no Reino da Galizia75, noroeste da
Consta que o sobrado81 onde residiam fora erguido em 178482. Teria sido
Península Ibérica. Recebeu batismo na Freguezia de um dos mais antigos prédios da região do porto. Conforme depoimentos
Sancta Christina, Bispado de Tuy76. colhidos pelo escritor Fernando Osorio no livro A cidade de Pelotas, a
edificação teria servido de atalaia83 aos navegantes, testemunhando a
transformação do pequeno povoado em freguesia, vila e cidade. Em 1904
abrigou a Mesa de Rendas84 local, e em 1907 foi demolido para desobstruir
o prolongamento da rua Benjamin Constant.

71
O primeiro estourou na sessão ordinária de 14 de janeiro de 1834 da Câ-
mara Municipal da então Vila de São Francisco de Paula. Na ocasião foram
lidos dois ofícios recebidos do juiz de paz do primeiro distrito, datados do
dia 12 anterior.

Um dos documentos esclarecia a respeito da obra que Luzia Fermiana do


Pilar, viúva do charqueador Domingos Rodrigues, estava construindo na
margem do canal São Gonçalo. A comissão permanente da câmara ma-
nifestou que no porto do rio de São Gonçalo chamado de Domingos Rodri-
gues a proprietária dona Luzia Fermiana do Pilar edificou a casa de moradia
avançando de oito a dez palmos85 (1,76m a 2,20m) para além do permitido,
sem licença alguma. O parecer emitido ao procurador foi favorável à com-
petente demolição da arbitrária edificação.

Na sessão seguinte, dia 16, compareceu João Rodrigues Ribas pedindo vê-
nia para representar sua mãe Luzia. Propôs e comprometeu-se a realizar

Passando dos limites aterro com estacada86 na margem do dito rio em frente da referida obra para
o trânsito público, como compensação à transgressão daquele limite. O
presidente da câmara e demais edis87, por unanimidade, deliberaram sus-
Os Rodrigues tiveram dois imbróglios com a pender a ordem de demolição anteriormente expedida, e decidiram todos
municipalidade. Ambos relacionados a obras irregulares. fazer um exame no local, marcado para a tarde daquele mesmo dia, a fim
de julgar a conveniência da proposta.

Logo na abertura da sessão do dia 17 de janeiro, convencidos os vereadores


da utilidade da proposta de João Rodrigues Ribas, foi colocada a decisão,
igualmente unânime, de aceitá-la. Determinou-se o entendimento entre o
procurador municipal e a viúva D. Luzia na forma legal, através da lavratura
de um termo de obrigação junto ao juiz de paz88. Os vereadores atentaram
para a necessidade de a estacada ter a medida – em braças89 – adequada ao
trânsito público. Assim foi feito.

75
Um dos pedidos dos irmãos que constava naquele documento era relativo
à obra de um armazém que estavam construindo junto à margem do São
Gonçalo, em terrenos seus.

Os Rodrigues Ribas haviam sido intimados na forma da lei a não continua-


rem aquela obra, em virtude de que, com ela, não haveria espaço suficien-
te para trânsito e servidão pública. Vinham argumentar que já haviam se
comprometido a levantar estacada para compensar e garantir as dimensões
mínimas necessárias ao trânsito público. Também prometiam por escrito,
conforme certidão que traziam em anexo, a deixar no melhor lugar dos ditos
terrenos que ali possuem uma praça pública com quarenta braças90 do dito
rio91 e mais de setenta [braças]92 de fundos, uma vez que lhes fosse permitido
continuar a obra” do armazém. A súplica foi encaminhada à comissão per-
manente.

Dias depois, em nova sessão a 21 de julho, a deliberação sobre o assunto foi

Uma praça pública adiada, mas com uma ressalva do vereador João Jacinto de Mendonça. Pon-
derava o edil que, não havendo definição sobre terras de marinha em rios

por um armazém
navegáveis, e em face da ocupação existente na zona portuária da cidade,
dada de forma irregular em relação ao espaço exigido de margem vigente –
então de quinze braças93–, ficasse de ora em diante estabelecido como regra
Passados onze anos, os Rodrigues reincidiram. Em geral que, em relação às edificações dentro da planta da cidade, não se per-
16 de julho de 1845, estourou o segundo rolo. Durante a mitisse continuar a construir sem que entre o prédio e o limite da margem
ficasse preservada uma rua da largura das demais do plano desta cidade.
sessão da Câmara de Vereadores daquele dia foi lido um
Mendonça sugeria a aplicação dessa regra já ao caso dos irmãos Ribas.
requerimento com pedidos da firma João Rodrigues Ribas
& Irmão – sociedade daquele com seu irmão Domingos O imbróglio adentrou o ano seguinte. Era já a sessão de 15 de abril de 1846
quando foi lido novo requerimento de João Rodrigues Ribas & Irmão, pe-
Rodrigues Ribas, ambos filhos de Domingos Rodrigues e
dindo o fim do embargo de sua obra, e reiterando a proposta de fazer ali
Luzia Fermiana do Pilar. uma estacada que conserve em qualquer estação aqueles 80 palmos94, na con-
formidade das posturas95. O vereador Dr. Vicente José da Maia, em virtude
da ausência da totalidade dos vereadores encarregados da matéria e ale-
gando ainda necessidade de tempo para melhor ser discutida a questão,
encaminhou-a à respectiva comissão.

79
A resposta do governante, enviada à Câmara de Vereadores de Pelotas, foi
favorável aos irmãos. Resolvia que a Câmara assim praticasse e mandasse
verificar, fiscalizando.

Em sessão realizada em 21 de abril de 1846, o vereador João Ferreira Paes


posicionou-se quanto a esta atuação direta do presidente, oficiando parecer
que nada diria sobre a justiça dele por lhe faltarem bases suficientes. Atenta-
va, entretanto, que caso a Câmara a considerasse a decisão justa, que se lhe
desse execução mandando que os suplicantes lavrem o termo por eles ofereci-
do, marcando-se seis meses de prazo impreterível, contados da data do termo,
à multa de 60$97 e fazer-se a obra à custa sua se dentro do dito prazo a não
fizerem.

Mais incisiva foi a manifestação do vereador Vicente José da Maia, mem-


bro da comissão encarregada do assunto, naquela mesma sessão. Através de
parecer oferecido em separado, Maia argumentou que acatar a decisão do

Delimitação e presidente da província implicaria na quebra da independência do poder


judiciário, garantida na Constituição do Império, posto que a questão já

denominação pétrea
tramitasse junto àquele poder. Com forte e longo discurso, demonstrava
grande e razoável preocupação com as consequências daquela condescen-
dência.
Buscando apoio para a proposta de compensação à
Não foi dada naquela sessão a dissolução do impasse. O fato é que ainda na-
retirada do embargo da obra de seu armazém, os irmãos quele ano seria feita a demarcação da praça pública nos terrenos oferecidos
Rodrigues Ribas recorreram diretamente ao presidente pelos Rodrigues Ribas. A medição foi feita pelo arruador98 Manoel Eguia,
da província, Luís Alves de Lima e Silva96 através de ofício auxiliado por serventes, ao custo total de oito mil réis. A doação das terras
datado de 18 de outubro de 1845. foi condicionada à exigência de que a nova praça fosse batizada em home-
nagem ao patriarca da família, Domingos Rodrigues, com a curiosa cláu-
sula de que jamais – sob hipótese alguma – tal denominação seja alterada.

Assim nasceu a praça do porto; como contrapartida, compensação a uma


irregularidade.

83
A estruturação do porto público junto ao canal São Gonçalo e o traçado da
atual rua Benjamin Constant, no início da década de 1830, fizeram parte de
um mesmo processo de desenvolvimento econômico e expansão urbana,
forçosamente pausado por dez anos pela guerra farrapa. Passado o conflito,
em 1846, a municipalidade recebeu a doação e fez a medição do terreno da
praça Domingos Rodrigues. O cais era simples, em estacada de madeira.
Também a praça e a rua demoraram alguns anos a receber benfeitorias99.
Originalmente nomeada rua da Indígena, em uma provável referência a
alguma permanência aborígene marcante, em 1854 passou a chamar-se
São Domingos100. Em 1865 recebeu as primeiras benfeitorias, porque era
preciso arrumá-la para melhor receber o imperador Dom Pedro II. Nestes
primeiros tempos, seu limite leste era justamente o porto, a praça. Em 1874
o chafariz da Cia. Hidráulica Pelotense lhe pontuou essa extremidade. Bem
projetada, com um generoso leito carroçado, sobre ela foi instalada a pri-
meira linha de bondes, o que ajudou a consolidá-la como principal artéria

Cais, praça e rua de acesso ao porto, recebendo intenso tráfego de caminhões ao longo das
décadas101. Recebeu o nome atual em 1895.

Há uma profunda relação entre a rua Benjamin Constant, A praça Domingos Rodrigues, por sua vez, estabelecida em terreno com as
dimensões de 88m x 154m, parece ter sempre sido segmentada pela atual
a praça Domingos Rodrigues e o cais do porto.
rua Benjamin Constant em duas partes distintas. A porção norte recebeu
arborização somente em 1910, em meio a uma grande reforma do porto.
Na mesma ocasião, como parte do paisagismo, recebeu em seu centro o
mencionado chafariz, para ali transferido. Na segunda metade do século
XX, esta porção da praça passou a abrigar uma escola municipal102.
A porção sul, de 1846 à segunda metade do século XX, permaneceu como
um grande largo, servindo como uma extensão natural do cais, para depó-
sito temporário de cargas. Depois é que passou a ser delimitada por calça-
das, recebeu canteiros, arborização e o chafariz de volta103. Em 1981, o cha-
fariz foi levado para o recém-construído Calçadão, colocado no encontro
das ruas Andrade Neves e Sete de Setembro, onde permanece.

É justo afirmar que a praça Domingos Rodrigues constitui o coração do


porto de Pelotas.

87
Sua alteza, a herdeira do Império Brasileiro, veio ao encontro de seu es-
poso, Louis Philippe Marie Ferdinand Gaston, o Conde d’Eu. Gastão de
Orléans se achava no interior da província de São Pedro, em uma visita que
também contemplou as demais províncias ao sul do país, com o pretexto de
realizar inspeções nas tropas militares e exercícios de guerra. Como pano
de fundo, a necessária melhoria da imagem de estrangeiro do conde junto
aos brasileiros, especialmente como comandante militar.

Foi no dia 6 de fevereiro que chegaram os dourados visitantes no porto de


Pelotas. A bordo do paquete Itapuan estavam Isabel e os filhos, príncipes D.
Pedro e D. Luís, acompanhados de membros de sua Corte. O desembarque
ocorreu às 9h15min no trapiche da antiga companhia de navegação São
Pedro, devida e luxuosamente ornamentado104, ao som do estrugir de deze-
nas de dúzias de fogos. A recepção contou com a presença de grande massa
popular, da Câmara Municipal, representantes de diversas entidades, asso-
ciações, clubes e autoridades oficiais e eclesiásticas.

Princesa visita Princesa O trapiche São Pedro, no qual desembarcaram, era um trecho pequeno e
simples do cais do porto de Pelotas, licenciado para uso daquela compa-
O ano de 1885 foi augusto para os monarquistas pelotenses. nhia. Basicamente, uma escadaria adentrando a água, para facilitar o em-
barque e desembarque de passageiros. Ficava no prolongamento do eixo da
A Princesa do Sul recebeu a visita da Princesa Isabel.
rua Dona Mariana105, lado oeste da praça Domingos Rodrigues, onde hoje
há o Terminal de Toras.

A propósito, paquete é um tipo de navio mercante, movido a vapor, que


presta serviço de correio, transporte de passageiros e mercadorias. O em-
prego do termo paquete para designar tal embarcação deriva do inglês
packet106 boat, em referência à regularidade107.
Além do porto da cidade ser o caminho pelo qual a família imperial chegou
a Pelotas, seu entorno foi palco de momentos importantes da visita de Sua
Alteza Imperial.

91
Após o devido cerimonial, sucedeu-se uma chuva de pétalas de variadas
flores, precipitada sobre seu coche imperial especialmente preparado, que
partiu em direção à Igreja Matriz108, para celebração do habitual Te Deum109.
No caminho, através da antiga rua do Comércio (hoje Félix da Cunha),
centena e meia de outros veículos, além “uma compacta multidão”, presti-
giaram o cortejo. A hospedagem da família imperial se daria no sobrado da
família Ribas110, portentoso palacete em três pavimentos à esquina daquela
via com a Rua 24 de Outubro, atual Tiradentes - edifício posteriormente
utilizado como sede do Ginásio Pelotense e do Colégio Salis Goulart.

A estadia de Isabel na cidade demonstrou sua polivalência de visiteira. Sua


Alteza foi incansável em percorrer inúmeros lugares, recepções e estabele-
cimentos sociais, religiosos, assistenciais e fabris da cidade e adjacências111.
Foi na região do porto que Isabel presenciou um retrato muito caracterís-
tico da Princesa do Sul, com ele encantando-se. Fazia uma manhã cinzenta

Admiráveis saladeiros no dia 14 de fevereiro de 1885, em que a comitiva imperial conheceu o


estabelecimento saladeiril de Heleodoro de Azevedo e Souza Filho112.
O estabelecimento de Heleodoro era um, entre a dezena de charqueadas
A execução do Hino Nacional pela banda implantadas à margem norte ou esquerda do canal São Gonçalo, no trecho
Santa Cecília, em demonstração solene do ufanismo entre o Passo dos Negros e o arroio Santa Bárbara. Ao todo, Pelotas con-
local, foi a recepção aos primeiros passos de Isabel Cristina, tava 23 charqueadas em funcionamento na ocasião113, com destaque para
sua prole e corte sobre a margem esquerda do São Gonçalo. a charqueada de Junius Brutus Cássio de Almeida – filho de Domingos de
Almeida –, na costa do arroio Pelotas114. As charqueadas de Brutus e de
Heleodoro F.º eram ambas consideradas modelares pela imprensa.

O escritor João Simões Lopes Neto, em sua Revista do 1º Centenário de


Pelotas (1911-1912), contou que as terras de Heleodoro correspondiam ao
espaço sobre o qual veio a ser instalada a Companhia Fiação e Tecidos Pe-
lotense (1908), a Estação Ferroviária Fluvial de Pelotas (1905), entre outras
construções, após a incorporação daquela propriedade como área urbana
pública, no início do século XX115.

95
Ao subir a escada do curral, para acomodar-se em um camarote especial-
mente preparado, Isabel foi saudada por uma salva de 21 tiros, sucedida
por mais música. Os carneadores observavam dispostos em linha, trajando
novos uniformes especialmente confeccionados para a ocasião.
Sua Alteza presenciou o abate e a carneação de algumas rezes, antes de ser
conduzida ao galpão próximo. Ali, junto a um grande grupo de senhoras,
sentou-se para assistir à essência do processo do charque: o preparo das
mantas, sua salga, empilhamento e distribuição em varais. Nos subsequen-
tes galpões vizinhos, presenciou a salga dos couros e o embarricamento117
das gorduras. Aguçada pela fala do anfitrião, que lhe descrevia em porme-
nores o estabelecimento, a curiosidade de Isabel satisfazia-se, a cada res-
posta de suas minuciosas perguntas e observações. À parte a brutalidade
do espetáculo que se apresentava, a impressão deve ter sido muito boa, a
julgar pela imprensa local, segundo a qual esta charqueada era notável pela
limpeza com que se faz o serviço, podendo cinco minutos depois da matança
uma senhora percorrer a charqueada com sapatinhos de baile porque não há

Isabel em uma receio de que os possa estragar.


A visita prosseguiu na casa de residência do charqueador, junto à mesma
charqueada, no porto propriedade. Isabel apreciou a capelinha particular da senhora Azevedo e
Souza Fº. Às 10h, um lauto banquete foi servido no almoço, acompanha-
do de vinhos franceses e portugueses. A sobremesa, com doces locais, foi
Precisamente às 8h, a banda Santa Cecília116 executou o momento de brindes e saudações em homenagem à nobre conviva, in-
novamente o Hino Nacional, desta vez para recepcionar a cluindo manifestação do Presidente da Província, também presente. Após
Princesa Isabel em sua visita à charqueada de Heleodoro a refeição e um breve momento de descanso, Sua Alteza e comitiva despe-
diram-se, agradecidos pela hospitalidade. O anfitrião Heleodoro ofereceu-
de Azevedo e Souza Filho, no Porto de Pelotas. Findo o lhe, então, soberba parelha de cavalos vermelhos, trotadores, para coche e
cerimonial de recepção, Sua Alteza, com notável interes- outro marchador, para passeio, que foram aceitos.
se – destacou a imprensa –, pediu para conhecer aquele
A Princesa Isabel retornaria ainda à charqueada de Heleodoro no dia 18 de
estabelecimento. O primeiro ambiente visitado foi o curro, fevereiro, para outra visita breve, encontrando o porto e suas embarcações
pequeno curral onde o gado permanece em confinamento festivamente embandeirados118. O ponto mais alto das homenagens dos
antes de seguir por um pequeno brete – cercado em forma pelotenses a Sua Alteza foi a nomeação da antiga praça da Matriz, a mais
antiga da cidade, como praça Princesa Isabel, naquele mesmo ano de 1885.
de corredor –, para o local de matança.
Embora significativo, durou pouco tempo o gesto. O ufanismo gerado pela
Proclamação da República em 1889 levou à mudança do nome para praça
XV de Novembro. Em 1922, ano do centenário da independência da nação,
a popular praça da catedral passou a homenagear o patriarca José Bonifá-
cio de Andrada e Silva.

99
1. Referência ao primeiro romance de Heloísa Assumpção Nascimento, Harmonia
Excelsa (1932).
2. Ponto em que um rio ou arroio deságua em outro, ou em uma lagoa, uma laguna
ou no mar.
3. Embora tenha seu nome consagrado como tal, tecnicamente trata-se de uma la-
guna, pelo fato de sua água, em contato direto com o mar via Oceano Atlântico,
salinizar.
4. Modo de vida dos nômades, sem residência ou paradeiro fixo.
5. Estudo dos nomes próprios dos lugares.
6. Tanto no caso de Patos em Lagoa dos Patos, quanto no de pelota em Pelotas, há
mais de uma versão para explicação etimológica.
7. Conforme Mario Osorio Magalhães no verbete Constant, Benjamin em Os Pas-
seios da cidade antiga (Armazém Literário, 2000, 2 ed.).

Notas 8. Para ler um pouco mais sobre este assunto, recomenda-se o texto Pelotas: 2.500
anos de história indígena, às págs. 37-47 do Almanaque do Bicentenário de Pelotas
Vol. 3.
9. Tratado celebrado em 1º de outubro de 1777 entre as coroas portuguesa e espa-
nhola, e que definiu o Rio Grande de São Pedro como território português e a cidade
Colônia do Sacramento (no atual Uruguai), como domínio Espanhol, dando trégua
a constantes conflitos.
10. Estabelecimentos onde era preparado o charque – carne salgada e seca ao sol – e
seus subprodutos.
11. Termo do espanhol platino equivalente a charqueada.
12. Esta sessão ordinária traz a primeira menção ao termo porto nas atas Câmara
Municipal, instalada em 7 de abril daquele ano.
13. Esse trecho – que em parte corresponde ao espaço hoje ocupado pelo porto pú-
blico de Pelotas – ia, aproximadamente, da atual praça Darci Pinho (na região onde
se apanhava a balsa para Rio Grande), à praça Domingos Rodrigues.
14. Mais detalhes sobre a Barca Liberal e a primeira tentativa de desobstrução da
barra do canal São Gonçalo nas páginas 46 a 55.
15. O assunto é abordado nas páginas 66 a 79.

103
16. Acompanhado de seu genro Louis Philippe Marie Ferdinand Gaston (ou Gastão 28. Natural de Caçapava, Pedro Luís da Rocha Osório foi de tropeiro a destacado
de Orléans, o Conde d’Eu), Dom Pedro II chegou a Pelotas de navio no porto do empresário e líder político de Pelotas, alcunhado Rei do Arroz. Desde seu falecimen-
canal São Gonçalo, proveniente de Jaguarão. O imperador já havia visitado Pelotas to, em 1937, dá nome à praça principal da cidade.
em fevereiro de 1846.
29. Prática de negociação do solo e dos imóveis visando apenas o lucro, transfor-
17. Na época, respectivamente chamadas de rua São Domingos e rua do Imperador, mando-os em meras mercadorias, em desconsideração dos valores culturais, sociais
em função de Dom Pedro II ter se hospedado em prédios localizados nesta rua, nas e históricos dos espaços, bem como da função social da propriedade, prevista na
duas visitas que fez a Pelotas, em 1846 e 1865. Constituição Federal.
18. Os quatro chafarizes foram importados de fundições artísticas francesas. A caixa 30. O historiador, poeta e literato Alfredo Ferreira Rodrigues, em seu Almanaque
d’água metálica foi fabricada na Escócia. Literário e Estatístico do Rio Grande do Sul para o ano de 1903, esclareceu que Fe-
lisberto Caldeira Brant Pontes, antes de ser titulado Marquês de Barbacena, havia
19. Notícia pormenorizada destes acontecimentos é dada na Revista do 1º Centená- construído o primeiro barco a vapor brasileiro, com maquinaria importada da
rio de Pelotas, de João Simões Lopes Neto, reproduzida no Almanaque do Bicente- Inglaterra, inaugurando viagens em um trecho do litoral da Bahia no dia 4 de ou-
nário de Pelotas Vol. 1. tubro de 1819. Domingos José de Almeida e Felisberto nasceram ambos em Dia-
20. Foi a primeira vez que o leito carroçado das ruas do porto recebera pavimento. mantina, Minas Gerais. O historiador militar Cláudio Moreira Bento supõe que
O corte da pedra era irregular, entremeado por capistranas (pavimentação com lajes Domingos possa ter conversado sobre o assunto com Felisberto em 1827, quando
atravessando o centro da rua, formando calçadas). No final da década de 1920, pela este se encontrava na Província de São Pedro comandando tropas na Guerra Cis-
importância do acesso ao porto, o pavimento da rua Benjamin Constant foi refeito, platina (1825-1828).
desta vez com o granito disposto em peças de corte regular (paralelepípedos), aspec- 31. Domingos José de Almeida (1797-1871), mineiro de nascimento, gaúcho e pe-
to que mantém na atualidade. lotense de coração, foi um comerciante, estancieiro, charqueador, empresário, ve-
21. São os armazéns que, conservados com poucas modificações, compõem o as- reador e deputado com significativa presença e atuação política no Rio Grande
pecto atual. do Sul. Fixou-se em Pelotas no início da década de 1820, onde casou, formou
família e passou o restante de sua vida. Homem culto, foi o intelecto à frente dos
22. Local de passagem facilitada em um rio, arroio ou canal. Farroupilhas.

23. Pretendida faixa neutra de terras, compreendida entre o banhado do Albardão, 32. Antônio José Gonçalves Chaves (c.1781 - 1837), português natural da Comarca
o arroio Chuí, as lagoas Mirim e Mangueira e o Oceano Atlântico, estabelecida no de Chaves (daí seu sobrenome), foi caixeiro, estancieiro, charqueador, conselheiro,
Tratado de Santo Ildefonso (1777), com o propósito de pacificar o território do atual vereador, deputado e escritor. Aportou em Rio Grande em 1805, vindo para Pelo-
Rio Grande do Sul, em disputa pelas coroas portuguesa e espanhola. Tornou-se uma tas, onde começou a vida como caixeiro. Em 1811, casou-se, formando família e
grande encerra natural para o gado chimarrão. vivendo em Pelotas até 1835, quando partiu, em função da guerra Farroupilha, para
Montevidéu, Uruguai. É autor do livro Memórias ecônomo-políticas sobre a adminis-
24. Como é chocante escrever isso! Pensar que o ser humano foi capaz de explorar tração pública do Brasil, escrito em 1817 e publicado entre 1822 e 1823. No ano de
seu semelhante a ponto de tratá-lo como uma mercadoria... Escravidão: um assunto 1820, hospedou em sua charqueada, à beira do arroio Pelotas, o viajante naturalista
que precisa ser sempre (e mais) discutido. francês Auguste de Saint-Hilaire, a quem deixou positivamente impressionado pela
biblioteca e erudição.
25. O local foi retratado na aquarela Le Passo Rico de St. Gonzales, do pintor francês
Jean-Baptiste Debret, reproduzida nas páginas 40 e 41. 33. Quatro personagens com forte atuação comercial e política na sociedade lo-
cal, destacando-se especialmente os dois primeiros. Dentre eles, apenas Canarim
26. Felício Joaquim da Costa Pereira Furtado de Mendonça, primeiro vigário da ca-
não era charqueador. À exceção de Domingos de Almeida, nascido no Arraial do
pelinha que deu origem à atual Catedral Metropolitana São Francisco de Paula, em
Tijuco, atual município de Diamantina, Minas Gerais, os demais eram portugueses.
terras adquiridas por Antônio Francisco dos Anjos. Irmão de Hipólito José da Costa
Bernardino evidenciava em seu nome ser natural de Kanara, então território por-
Pereira Furtado de Mendonça, patriarca do jornalismo brasileiro.
tuguês na Índia. Domingos de Almeida e Gonçalves Chaves, muito além de sócios,
27. O local é conhecido como Primeiro Loteamento urbano. foram grandes e fraternos amigos.

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34. Primeira vez em que a informação do fabricante da máquina da barca Liberal viveu seu auge, indo além do domínio do mercado de motores a vapor e caldeiras
é corretamente nominada em uma publicação. Chegamos ao nome de James Peter daquele país, construindo também cascos e mesmo embarcações completas. Foi
Allaire, modestamente complementando a excelente pesquisa – a mais aprofun- justamente neste seu período áureo que a Allaire Iron Works forneceu o motor e
dada, substanciosa e completa feita até os dias de hoje – sobre a barca Liberal, de a caldeira da barca Liberal, o que demonstra a visão de Domingos de Almeida e
autoria do pesquisador e médico pelotense Paulo Duval. Em seu texto, A barca de seus sócios, que buscaram não somente um mero fornecedor, mas um dos mais
vapor Liberal – Início da navegação a vapor no Rio Grande do Sul e na Marinha de notáveis e respeitados de sua época. A Liberal contou, portanto, com o que havia
Guerra do Brasil, publicado em 1946, quando aborda a questão sobre os constru- de mais avançado em termos de maquinaria até então. James Peter Allaire esteve à
tores da barca, Duval relata ter encontrado os seguintes apontamentos de Alfredo frente da Allaire Iron Works até 1850, quando aposentou-se, tendo a firma seguido
Ferreira Rodrigues (ver nota 43) na Bibliotheca Riograndense, em Rio Grande: em operação até 1869.
“Barca Liberal. Carlos J. Harah [sic], construtor naval norte-americano”. Não escla-
réce se a veiu construir [sic], ou se foi o autor do risco [desenho; projeto], enfim, qual 35. Na data, oficialmente mantinha seu nome original, rua de Santa Bárbara, embo-
a relação entre êle e a Liberal. Com a planta da caldeira (remetida ao Ministro da ra popularmente fosse também conhecida como rua do Apois (latinismo equivalente
Marinha na Guerra dos Farrapos, estando então a Liberal encorporada á Armada a ‘pois’, com acepção de ‘depois, ‘detrás’), e fosse então referida como rua do Estaleiro.
Nacional) as indicações de seu “fabrico”: – James Alave Esq. [sic], Steam Engine Buil- Passou ao nome atual alguns anos após a Proclamação da República.
der. Charvey street [sic]. New York. (Esq., abreviatura de Esquire, é um título formal
36. Localização em relação ao leito original do arroio Santa Bárbara. Desde 1964,
usado após o nome de um homem, especialmente em uma carta oficial endereçada
esse arroio tem outro leito, desviado a oeste e canalizado para formação de uma
a ele). Sendo Alfredo Ferreira Rodrigues outro excelente e sério pesquisador, cre-
barragem. O estaleiro ficava no exato local onde em 1904 se estabeleceu a Fábrica de
mos que a imprecisão na transcrição dos dados do fabricante deveu-se, talvez, em
Conservas Alliança (figura das páginas 44 e 45), e mais tarde, a filial pelotense da fá-
virtude do estado de conservação da referida planta, ou mesmo por eventual difi-
brica rio-grandina de gêneros alimentícios Leal Santos, nas proximidades da antiga
culdade imposta pela paleografia, ou ambos os motivos. Sem dúvidas, trata-se de
Caieira Carpena e da ponte do ramal ferroviário fluvial.
James Peter Allaire (1785-1858), dono da Allaire Iron Works, também conhecida
como Allaire Works. A informação foi confirmada compulsando jornais estaduni- 37. A residência urbana de João Simões Lopes Filho, Visconde da Graça – atual sede
denses de época (ver imagem da página 48). Membro de uma família de orienta- da Casa da Criança São Francisco de Paula, na esquina das atuais ruas XV de Novem-
ção religiosa huguenote, James P. Allaire começou a trabalhar em uma fundição bro e Uruguai –, era conhecida naquela família como Casa do Estaleiro, por exemplo.
de latão em 1802 em Nova Iorque. Nesta mesma cidade, já em 1804 operava sua
própria fundição, com endereço no nº 466 da Cherry Street, Corlear’s Hook, Lower 38. Primeiro teatro inaugurado no Rio Grande do Sul, e um dos mais antigos do
East Side. Entre 1807 e 1808, uma importante encomenda marcou o início de sua Brasil.
grande carreira como fabricante de motores marítimos, bem como de um ótimo
relacionamento comercial com a Fulton Livingston Works e seus proprietários. Em 39. A abdicação de Dom Pedro I ocorreu no dia 7 de abril de 1831.
1816, com o sucesso dos negócios, naquele mesmo endereço criou a Allaire Iron 40. Domingos de Almeida é considerado o cérebro, o principal articulador dos Far-
Works, consolidando sua reputação como fabricante e desenvolvedor de motores roupilhas.
navais. O perfeccionismo levou-o a ser um dos profissionais cuidadosamente sele-
cionados para produzir peças para o navio híbrido (movido a vela e vapor) SS Sa- 41. Santa Bárbara era a santa a quem os primeiros moradores da povoação, fiéis ca-
vannah, o primeiro com propulsão a vapor a cruzar o oceano Atlântico, em 1819. tólicos fervorosos, recorriam em oração, quando sob os raios e trovões das grandes
O feito comprovou ao mundo a viabilidade da navegação transatlântica. Allaire tempestades e tormentas.
ficou a cargo da fundição do cilindro do motor – o maior construído até então,
o que lhe rendeu a entrada para os anais da história da Marinha e sua colocação 42. A milha náutica é uma unidade de distância derivada do sistema inglês equiva-
entre a vanguarda da construção mecânica naval de seu tempo. No ano seguinte, lente a 1.853,25 metros.
Allaire já era responsável pela fabricação de mais da metade de todos os motores
marítimos fabricados nos Estados Unidos da América, além de possuir a maior 43. Obra citada anteriormente. Alfredo Ferreira Rodrigues foi um dos mais impor-
oficina do ramo, tendo registradas em seu nome várias patentes tecnológicas, de tantes nomes da cultura riograndense no final do século XIX e início do século XX.
melhorias em motores a vapor que desenvolveu. Em 1824, inovou ao construir o Contribuiu significativamente para a historiografia e a literatura do Estado. Uma de
motor do barco a vapor Henry Eckford, empregando, pela primeira vez no mundo, suas maiores contribuições foi idealizar e organizar o célebre Almanak Litterario e
um motor composto em uma embarcação. Entre 1822 e 1836, a Allaire Iron Works Estatistico do Rio Grande do Sul, editado pela Livraria Americana entre 1889 e 1917.

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44. Na data, a Vila de São Francisco de Paula ainda não possuía jornais. A primeira 57. Nome dado aos navios de pequeno calado dotados de artilharia grossa, geral-
folha a ser impressa em Pelotas foi O Pelotense, saído a 7 de novembro de 1851. Seu mente usados em operações fluviais.
proprietário e redator foi Cândido Augusto de Mello.
58. A rendição legalista ocorreu no sobrado da esquina da atual praça cel. Pedro
45. Impressões curiosas, com inspirada redação da reportagem, cheia de rimas. Osório com a atual rua Félix da Cunha, que servia de quartel e depósito de munições.
O prédio é conhecido popularmente como Casa da Banha, devido ao nome de um
46. Flutívago é aquele que anda sobre as ondas; undívago. Argonautas foram os he- estabelecimento comercial, ali sediado na segunda metade do século XX.
róis mitológicos gregos que partiram na nau Argo em busca do velocino (pele, re-
coberta de lã, dos ovinos) de ouro. Por extensão de sentido, pessoa com espírito de 59. Sinônimo para qualquer peça de artilharia.
aventura e coragem bastante para buscar ideais e bens.
60. Um canhão, oriundo de uma dessas canhoneiras imperiais, afundada nesta ba-
47. Apenas três anos depois, em 27 de junho de 1835, já seria elevada à condição talha, encontra-se hoje exposto em frente ao atual quartel da Brigada Militar, na
de cidade. Domingos José de Almeida foi quem argumentou em favor da escolha avenida Bento Gonçalves (ver imagem da páginas 56 e 57 e sua respectiva nota).
do nome Pelotas, sugerido por Francisco Xavier Ferreira. As outras sugestões eram:
Calópolis (bela cidade), Pelotapes e Próspera Cidade. 61. O comandante era João Manuel de Lima e Silva, que seria o primeiro general da
república rio-grandense. Foi ferido por um tiro no rosto, fraturando um osso da
48. No original, 10 braças. Sessão ordinária de 10 de outubro de 1832. A medida face. Antes de ser levado para o hospital em Montevidéu, atual Uruguai, recebeu os
contemplava também as margens do arroio Pelotas. primeiros socorros no solar de Domingos de Almeida, no Areal. Na ocasião, João
Manuel e Domingos definiram com clareza a proclamação da república rio-gran-
49. Sessão ordinária de 7 de outubro de 1834. dense pela primeira vez.
50. A foz (ou barra) de um rio é o ponto onde este deságua. O canal São Gonçalo 62. Bombeador é aquele que bombeia; que espiona campo inimigo, outrem etc.
deságua na Laguna dos Patos.
63. Antônio Caringi (1905-1981), entre inúmeros outros trabalhos, é autor de algu-
51. Calado é a distância vertical medida entre a quilha da embarcação e sua linha de mas das mais importantes peças da estatuária figurativa histórica gaúcha. São cria-
flutuação. ções suas a estátua equestre de Bento Gonçalves da Silva, o monumento ao Colono,
52. A luta pela criação e permanência da Alfândega de Pelotas foi uma longa disputa a estátua do cel. Pedro Osório, o Monumento Nacional ao Imigrante e a estátua do
política travada com Rio Grande, que desejava evitar a consequente perda de receita Laçador.
dos impostos relativos. 64. O monumento foi transferido para a praça 20 de Setembro e, depois, para a ave-
53. O capital reunido foi de 40 contos de réis. nida Duque de Caxias, onde permanece, mirando a direção oeste.

54. Sabe-se que este profissional atuou em Pelotas entre 1832 e 1835, tendo sido 65. O Arquipélago de Açores, formado por nove ilhas, é hoje território autônomo de
contratado como arquiteto da câmara municipal. Em 1834, foi encarregado da ela- Portugal.
boração da Planta da Cidade de Pelotas. Sua nacionalidade é incerta, supostamente 66. Patente militar, equivalente no Brasil à de segundo-tenente.
norte-americana. Também a grafia de seu sobrenome é incerta, anotada de diversas
formas. Teria sido autor do projeto arquitetônico original da sede definitiva do Thea- 67. O território do atual Estado do Rio Grande do Sul foi administrado pelos por-
tro Sete de Abril e das plantas do primeiro estudo para desobstrução da foz do canal tugueses, respectivamente, como Comandância Militar do Rio Grande de São Pedro,
São Gonçalo, feito no mesmo período. Capitania do Rio Grande de São Pedro, Capitania-Geral de São Pedro do Rio Grande
do Sul e Província de São Pedro do Rio Grande do Sul.
55. Plantas arquitetônicas.
68. O casal emigrou com as cinco filhas e os dois filhos. Aqui, as moças casaram-se
56. A Guerra dos Farrapos, Revolta dos Farrapos ou “Revolução” Farroupilha, como com militares. Uma das irmãs de Mariana, Isabel Francisca da Silveira, veio a ser
ficou conhecida, foi a mais duradoura revolta do período imperial brasileiro, e teve dona da Sesmaria de Nossa Senhora dos Prazeres de Pelotas, da qual se origina o atual
como principal causa a insatisfação dos estancieiros gaúchos com a política fiscal balneário do Laranjal.
vigente, contrária ao interesse de seus negócios.

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69. Uma das mais significativas elevações do relevo local, em termos geográficos e 79. Terreno quadrático medindo 660m por 660m, conformação atípica para uma
históricos. Dá nome a um dos atuais distritos de Pelotas. Sobre a antiga Sesmaria do charqueada, normalmente constituída em terreno longilíneo. A propriedade figura
Monte Bonito é que está situada a cidade de Pelotas, e a maior parte de seu território na planta em que estão assinaladas as terras de Mariana.
como município.
80. Conforme a pesquisadora Ester Gutierrez, constavam do inventário (ação judi-
70. Entre outras obrigações, a posse das terras por Mariana estava condicionada à cial para arrecadação e posterior partilha dos bens patrimoniais de pessoa falecida)
doação de terrenos para servidão pública da nascente povoação. A não-observância do capitão Domingos Rodrigues, aberto em 1818 por sua viúva Luzia: uma “morada
destas cláusulas implicava a anulação da posse. de casas térreas de vivenda coberta de telha e paredes de tijolos forradas e assoalha-
das”, na qual residia a família; um armazém de despejo, próximo da residência e em
71. A Freguesia de São Francisco de Paula foi estabelecida em 7 de Julho de 1812; a semelhante arquitetura - porém ladrilhado - e um galpão da charqueada, coberto
elevação à categoria de Vila deu-se por decreto imperial de 7 de dezembro de 1830, de palha, contendo objetos de lida campeira e navais. A residência era servida por
e sua efetiva instalação ocorreu em 7 de abril de 1832, com o nome de Vila de São seis mulheres escravizadas. Outros 42 cativos serviam o saladeiro. Seis marinheiros
Francisco de Paula; a elevação à categoria de cidade deu-se pelo Decreto Provincial atendiam seu iate e seus dois bergantins (veleiro de dois mastros com velas latinas
de 27 de julho de 1835. triangulares, também chamado bragantim). Possuía ainda duas datas de terras na
72. O Primeiro Loteamento urbano foi aquele promovido por Antônio Francisco dos Serra dos Tapes, também atendidas por seus servos escravizados.
Anjos, com auxílio do padre Felício, no sítio da atual Catedral Metropolitana São 81. O termo sobrado, antes de ser relacionado a edificações de mais de um pavi-
Francisco de Paula e entorno. mento, tinha a acepção original, em arquitetura, de fazer referência a qualquer piso
73. A rua Dona Mariana desemboca na praça Domingos Rodrigues e no cais do por- “sobrado”; ou seja, que “sobra”, “que está acima”, “que eleva-se”, com sua estrutura, em
to. Poeticamente, esse encontro parece celebrar a boa relação de ambas as famílias. relação ao chão ou ao solo.

74. Em espanhol, Rodriguez era usualmente abreviado Roiz. 82. A data constava inscrita em baixo relevo no centro de um escudo feito a cal, na
fachada frontal.
75. Galícia, hoje território autônomo da Espanha, com idioma próprio. Antigo Reino
de Galiza, em galego, que perdurou do ano 410 ao ano de 1833. Atualmente, a capital 83. Vigia, sentinela.
da Galícia é Santiago de Compostela, maior destino de peregrinação cristã depois de 84. Repartição fiscal onde se faz a cobrança de direitos de exportação e, de modo
Jerusalém e Roma. geral, pagamentos de impostos.
76. Conforme informações levantadas pelo pesquisador Paulo Duval. 85. Extensão medida entre a extremidade do dedo polegar e a do mínimo, na parte
77. Nome aportuguesado. Originalmente grafado Luzia Firmiana del Pilar. Chama- interna da mão bem aberta. Por convenção, equivale a 22 centímetros.
da de Doña/Dona Luzia. Dom/Don para homens e Dona/Doña eram títulos hono- 86. Barreira formada pela disposição sucessiva de estacas de madeira. Assim foi es-
ríficos aplicados a monarcas e outros membros da nobreza de Portugal, Espanha e truturado o cais do porto de Pelotas até o ano de 1905.
Brasil, também concedidos a outros homens e mulheres, membros destas cortes.
Precediam os nomes de batismo dos agraciados. Por extensão de sentido, são larga- 87. Vereadores.
mente empregados como tratamento, para demonstrar respeito.
88. Pessoa, não necessariamente formada em Direito, antigamente eleita em deter-
78. Quanto aos irmãos, Domingos e João foram agraciados com a comenda da im- minada comunidade, a quem se atribuía o conhecimento e o julgamento de peque-
perial Ordem da Rosa pelo imperador Dom Pedro II; João foi nomeado Veador de nas demandas.
Sua Majestade a Imperatriz (veador é um antigo título honorífico em Portugal e no
Brasil, dado membros da nobreza e fidalguia que serviam junto à imperatriz, dentro 89. Antiga medida portuguesa, usada também no Brasil. Cada braça linear equivale
ou fora do paço); Cecília foi Viscondessa de Piratinim. Foram, por duas vezes, anfi- a 2,20 metros.
triões da família imperial em Pelotas, nos anos de 1865 e em 1885, no palacete man- 90. 88 metros.
dado construir por seu pai, à esquina das atuais ruas Félix da Cunha e Tiradentes.
91. Canal São Gonçalo, então comumente referido como rio.

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92. 154 metros. 106. Pacote, naquele idioma. Alusão a um pacote postal, cuja entrega era referência
de pontualidade.
93. 33 metros.
107. Curiosamente, nos anos 1930, pelo mesmo motivo, o termo virou sinônimo
94. 17,60 metros. para menstruação, no Brasil.
95. Estavam vigentes as Posturas policiaes, aprovadas pelo conselho geral, para a Câ- 108. Atual Catedral Metropolitana São Francisco de Paula.
mara Municipal da Villa de São Francisco de Paula, editadas em 1835.
109. Culto católico de ação de graças, então tradicionalmente celebrado. Musicaliza-
96. Futuro Duque de Caxias. Na data, seu título nobiliárquico era Conde de Caxias. ção em forma de salmo do hino latino Te deum laudamus, exaltação a Deus.
97. 60 réis, em moeda corrente. 110. Erguido em 1832, mesmo ano de elevação da Freguesia a Vila de São Francisco
98. Profissional encarregado de projetar e construir ruas. de Paula e da construção da barca Liberal. Hospedou também Dom Pedro II, em sua
segunda visita a Pelotas, no ano de 1865. Atualmente conta apenas dois pavimentos.
99. Da mesma forma, a atual praça Cel. Pedro Osório, cujo terreno foi doado na
década de 1830, só recebeu benfeitorias (paisagismo, gradis, calçamento etc.) na se- 111. O Instituto Histórico e Geográfico de Pelotas, no volume 1 de seus Cadernos do
gunda metade da década de 1870. Antes disso, ficou conhecida como o campo que IHGPel, editado em novembro de 2010, publicou os relatos da imprensa local de
foi, servindo mesmo de pasto para vacas de chácaras circunvizinhas. A gravura do época sobre a visita da princesa a Pelotas, transcritos pelo pesquisador Ângelo Pires
Theatro Sete de Abril do artista Peter Ludwig retratou isto (ver nota da imagem das Moreira.
páginas 16 e 17). 112. Esta charqueada teve outros proprietários, anteriormente.
100. Nesta data, muitas ruas de Pelotas receberam nomes de santos católicos, re- 113. No auge do ciclo do charque, entre as décadas de 1860 e 1890, Pelotas chegou a
fletindo a devoção dos portugueses e seus descendentes, principais formadores da contar com mais de 40 charqueadas em funcionamento simultâneo.
sociedade pelotense.
114. A maioria das charqueadas que teve Pelotas situava-se à margem do arroio Pe-
101. Esta condição foi reconhecida no III Plano Diretor de Pelotas (2008), que a lotas. Outras estavam localizadas às margens do canal São Gonçalo e do arroio Santa
definiu como Eixo rua Benjamin Constant (entre a rua XV de Novembro e o Cais Bárbara.
do Porto) – artigo 76º, Inciso I, item LXXXV do Foco de Especial Interesse Cultu-
ral (FEIC) Zona do Porto. Interessante observar a preponderância da rua Benjamin 115. À página 45 do fascículo Nº 3 (30 de dezembro de 1911) daquela publicação.
Constant sobre a rua Conde de Porto Alegre, sobre a qual foi instalado um trecho
dos trilhos do ramal ferroviário do porto, e que também alcança a praça Domingos 116. Uma das primeiras bandas musicais de Pelotas. Santa Cecília é a santa padroeira
Rodrigues e o cais. dos músicos.

102. Escola Municipal de Ensino Infantil mal. Inácio de Freitas, até hoje ali sediada. 117. Colocação em barricas – pequenos barris, usados especialmente para armaze-
namento de líquidos.
103. Conhecido popularmente como Chafariz das Três Meninas (originalmente no-
meado Fontaine aux putti) (o termo provém do italiano putto e refere-se a figura 118. A decoração festiva com bandeiras ao longo de cordões, pendurados nos mas-
pintada ou esculpida de uma criança nua, geralmente usada em grupo). A artística tros dos navios, era muito comum no século XIX e no início do século XX. Ver
fonte é uma das quatro importadas da França pela Cia. Hidráulica Pelotense, e uma imagens das páginas 10 e 11; 80 e 81; 92 e 93; 96 e 97.
das três ainda existentes.
104. Esse era o tom da imprensa da época, bastante ufanista e laudatório.
105. Rua em homenagem a Mariana Eufrásia da Silveira, imigrante açoriana dona
das terras ao sul da cidade que deram origem ao porto e a todo o Segundo Loteamen-
to urbano na década de 1830.

112 113
Imagem de guarda
Panorama do Porto de Pelotas. Início da década de 1920. Fotografia de Fre-
derico Carlos Marx. Excerto. COSTA, Alfredo Rodrigues da. (org.). O Rio
Grande do Sul (completo estudo sobre o Estado). Obra histórica, descritiva e
ilustrada organizada e editada por Alfredo R. da Costa. Porto Alegre: Livraria
do Globo, 1922.

Imagem das páginas 2 e 3


Cais, praça e rua. Aspecto do Porto de Pelotas nas últimas décadas do Século
XIX. Lojas de artigos navais com letreiros em português e inglês; navios atra-
cados; cais de estacada de madeira equipado com bondes de tração animal;
chafariz com água encanada cercado por gradil ao centro da antiga rua São

Notas iconográficas
Domingos – atual rua Benjamin Constant –, que ali tinha seu limite leste;
praça Domingos Rodrigues ainda sem paisagismo ou outras benfeitorias, etc.
Fotógrafo desconhecido. Acervo Bibliotheca Riograndense.

Imagem das páginas 10 e 11


Regatas – Pelotas. R. G. do Sul. Brasil. Cartão Postal. Edição da Livraria Mei-
ra. Nº 16. Público observando um vapor festivamente embandeirado, durante
uma regata. Observa-se o acesso do público ao limiar da margem, no antigo
cais. Acervo Guilherme Pinto de Almeida.

Imagem das páginas 16 e 17


Huma parte da povoação de Pellotas, subindo pelo caminho do porto. Lito-
graphia do Commercio de Ludwig & Briggs. Litogravura de autoria de Peter
Ludwig, artista litógrafo prussiano. Publicada originalmente em 1846 no pe-
riódico carioca Ostensor Brazileiro – Jornal Literário e Pictorial (1845-1846)
de Vicente Pereira de Carvalho Guimarães e João José Moreira. No mesmo
jornal foi também publicada uma importante representação – a mais antiga
conhecida – do Theatro Sete de Abril, de autoria do mesmo litógrafo. Acervo
Biblioteca Nacional do Brasil. Disponível em: http://objdigital.bn.br/objdigi-
tal2/acervo_digital/div_iconografia/icon1424737/icon1424737.html.

115
Imagem das páginas 20 e 21 Brazil suas riquezas naturaes, suas industrias. Tome II [Tomo II]. Troisième
Bugres transpondo um rio. Pelota. Aquarela do artista e soldado mercenário Partie [Terceira parte]. Voies et moyens de communication [Vias e meios de
germânico Herrmann Rudolf Wendroth (c. 1852). Acervo família Orléans e comunicação]. Première Section [Primeira Seção]. Chemins de Fer [Ferrovias].
Bragança. Aquarelas de Herrmann Rudolf Wendroth. Álbum editado em 1983 Paris (França): Librairie Aillaud & Cie., 1910. p. 231.
pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul. Reproduções a cores das aqua-
relas do artista, produzidas entre 1851 e 1852. Imagem das páginas 40 e 41
Le Passo Rico de St. Gonzales. Passo Rico de São Gonçalo. Aquarela do pintor
Imagem das páginas 24 e 25 francês Jean-Baptiste Debret, 1827. Movimento intenso no Passo dos Negros,
Barra do São Gonçalo de Pelotas. Jan 1º 1847. Gravura. Autor desconhecido. com a travessia de passageiros e de gado. À direita, o arraial formado no local,
Desenho a lápis. Mais antiga representação conhecida da barra do canal São com a Freguesia de São Francisco de Paula e sua capela, ao fundo. Ponto de
Gonçalo. BIBLIOTHECA RIO-GRANDENSE. Aspectos Brasileiros. Meados do vista desde a Vila de Rio Grande, lado da margem em primeiro plano. Acervo
Século XIX. [álbum]. [Série Iconográfica]. Rio Grande: Bibliotheca Riogran- Fundação Castro Maya, Rio de Janeiro. BANDEIRA, Julio; LAGO, Pedro Cor-
dense, 1937. rêa do. Debret e o Brasil: obra completa. 1816-1831. [catálogo raisonné]. 6 ed.
rev. Rio de Janeiro: Capivara, 2020. p. 321.

Imagem das páginas 28 e 29


Imagem das páginas 44 e 45
Navios no Porto de Pelotas. Fotografia de Augusto Amoretty. Década de 1870.
Ocasião em que a barca nacional Tigre, o patacho italiano Giuseppine e outros Fabrica Alliança. Leite, Nunes & Irmão. Pelotas. Cartão Postal. Edição da Li-
navios carregaram charque, couros salgados, graxa e outros artigos na char- vraria Commercial. Pelotas. Década de 1900. Vista do trecho do leito original
queada de Heleodoro de Azevedo e Souza Filho. Acervo Biblioteca Nacional do arroio Santa Bárbara, ao extremo sul da atual rua mal. Deodoro, onde fica-
do Brasil. va o antigo estaleiro em que foi construído o casco e montada a barca de vapor
Liberal, e que deu nome à região sudoeste da vila, conhecida como Bairro do
Estaleiro. Extinto o estaleiro, em 1904 este trecho da margem esquerda do
Imagem das páginas 32 e 33 arroio deu lugar às instalações da Fábrica de Conservas Alliança e, posterior-
Chemin de fer de Rio Grande à Bagé. Pont du São Gonçalo - En Construction. mente, à filial pelotense da fábrica rio-grandina de gêneros alimentícios Leal
Estrada de Ferro Rio Grande-Bagé. Fotografia de Augusto Amoretty. Excerto. Santos. Acervo Eduardo Arriada.
Data aproximada: 1881. Construção da ponte ferroviária sobre o canal São
Gonçalo, ligando Pelotas a Rio Grande. Acervo Biblioteca Nacional do Brasil.
Imagem da página 48
Disponível em: http://objdigital.bn.br/objdigital2/acervo_digital/div_icono-
grafia/icon820561_69/icon820562.jpg. Anúncio da firma Allaire Works, fundada e erguida por James Peter Allaire. Em-
presa fabricante da máquina a vapor da barca Liberal. The Evening Post. Nova
Iorque [NY, EUA], 14 de dezembro de 1850. vol. XLIX. p. 3. Neste anúncio de
Imagem das páginas 36 e 37 1850, ano em que se aposentou, James atesta a manutenção da qualidade dos
Gare fluviale de l’embranchement de Pelotas. Estação fluvial do ramal de Pelo- serviços. Acervo The New York State Historic Newspapers project. Disponível em:
tas. Data aproximada: 1905. Registro da estação ferroviária fluvial do ramal do https://nyshistoricnewspapers.org/lccn/sn83030390/1850-12-14/ed-1/seq-3/
Porto de Pelotas logo de sua construção, com sua respectiva locomotiva, junto
ao primitivo cais. Ao seu lado, uma draga e materiais de construção das obras
Imagem da página 49
do porto. CENTRE INDUSTRIEL DU BRÉSIL [CENTRO INDUSTRIAL DO
BRASIL]. Le Brésil. Ses richesses naturelles, ses industries. [O Brasil. Suas ri- Reconstituição de parte da esquadra de John Pascoe Greenfell durante a toma-
quezas naturais, suas indústrias]. Extraite de l’ouvrage [Extrato da obra]: O da da ilha de Fanfa (rio Jacuí, município de Triunfo), destacando-se a barca a

116 117
vapor Liberal, operada por aquele comandante. Ilustração de Fernando para carregam flores. Aspectos de uma recepção no Porto de Pelotas no início do
o texto A Marinha Brasileira na Revolução Farroupilha, de Théo-Filho. COR- século passado. Acervo Almanaque do Bicentenário de Pelotas.
REIO DA MANHÃ. Farrapos. 1835-1935. [Suplemento]. 22 de setembro de
1935. pág. de capa. Rio de Janeiro, RJ. Acervo Biblioteca Nacional do Brasil.
Imagem das páginas 64 e 65
Disponível em: http://memoria.bn.br/DocReader/089842_04/29900.
Pelotas – Porto de Embarque. Cartão Postal. Edição da Livraria Universal de
Echenique Irmãos & C.ia. Pelotas. Década de 1900. O aspecto do atracadouro do
Imagem das páginas 52 e 53 porto e da porção sul da praça Domingos Rodrigues, extensão natural do antigo
Detalhe e placa na face frontal do Obelisco Republicano. Areal, Pelotas. Fo- cais, no limiar do século XX. O prédio mais alto ao centro da imagem seria o
tografia de Tiago Klug. Excerto. Outubro de 2014. Primeiro monumento ao antigo sobrado erguido em 1784, que foi residência do capitão Domingos Ro-
ideal republicano erguido no Brasil, ainda no regime monárquico. A data in- drigues e Mesa de Rendas – de 1904 até ser demolido, em 1907, para franquear o
dicada nesta placa assinala a data de sua aprovação entre os republicanos pe- prolongamento da rua Benjamin Constant. Acervo Eduardo Arriada.
lotenses, seus idealizadores. Foi inaugurado em 7 de abril de 1885. Trata-se
do primeiro bem pelotense tombado em nível Federal, inscrito no Livro do
Imagem das páginas 68 e 69
Tombo Histórico em dezembro de 1955. Está representado no brasão da cida-
de, criado em 1962. Porto, Caes e Praça Domingos Rodrigues. Pelotas, Rio Grande do Sul. Cartão
postal (original colorizado) (foi também editado monocromático). Edição de
A Miscellanea. Década de 1910. Vista do primeiro cais estruturado em alve-
Imagem das páginas 56 e 57 naria de pedra e da porção sul da praça Domingos Rodrigues, na direção leste.
Canhão imperial. Canteiro central da avenida Bento Gonçalves da Silva, em Vê-se alguns prédios modificados em relação à imagem das páginas 64 e 65,
frente ao quartel do 4º batalhão de polícia militar. Fotografia de Eduardo De- em função da abertura do prolongamento da rua Benjamin Constant. Desta-
vens. Maio de 2021. A placa fixada em uma pedra, junto ao monumento, traz ca-se a demolição do antigo prédio que servira de residência para Domingos
a seguinte inscrição: Êste canhão pertenceu à canhoneira SÃO PEDRO, destro- Rodrigues. Ao fundo, percebe-se a chaminé da fábrica Fiação e Tecidos Pelo-
çada pelos Farroupilhas e que era uma das três da flotilha imperial comandada tense, fundada em 1908. Acervo Eduardo Arriada.
por Greenfell, que no dia 2 de junho de 1836 travou combate com as fôrças de
terra do General João Manoel de Lima e Silva, no Passo dos Negros, no canal
Imagem das páginas 72 e 73
São Gonçalo, imediações de Pelotas./ Foi retirado do fundo do canal em 1936.
Esteve desde então na posse do Eng. Agr. Sylvio da Cunha Echenique, ex-prefeito Pelotas. Vista do Porto. Cartão postal (original colorizado). Edição da Casa
de Pelotas e ex-deputado federal, que o dedicou à cidade nesta data./ Mandado Filial de Krahe & Cia. Década de 1910. Vista do cais desde sua beira, olhando
colocar neste local pelo Conselho Municipal de Turismo em 20 de setembro de na direção oeste, com a rua Conde de Porto Alegre ao fundo. O letreiro
1971, em ato solene e público quando discursou o doador. Shipchandler, grafia comum de ship chandler, diz respeito a uma pessoa ou
empresa especializada em fornecer, com agilidade, suprimentos a navios,
abastecendo-os com alimentos, equipamentos e itens de manutenção, entre
Imagem das páginas 60 e 61 outras necessidades. Desta forma, os tripulantes são dispensados de fazer o
Aglomeração no cais do porto por ocasião chegada de José Barbosa Gonçalves, abastecimento por si, poupando também tempo de atracação junto ao cais.
novo intendente de Pelotas, em 14 de agosto de 1908. Ao fundo, está a ilha Acervo Eduardo Arriada.
do José Mallandro. Em um púlpito, em meio à multidão em primeiro plano,
a gestuália de um homem em discurso é talentosamente capturada pelo fo-
Imagem das páginas 76 e 77
tógrafo. Em um grupo, diversos estandartes de entidades reunidos. Em outro
canto, uma das duas bandas de música da cena (complementada pela imagem Porto de Pelotas. Vista apanhada de um drone, desde a altura da rua Almirante
das páginas 80 e 81), prepara seus instrumentos e partituras. Algumas pessoas Tamandaré na direção sudoeste, destacando a praça Domingos Rodrigues, o

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trecho de cais com o Terminal de Toras e a paisagem do canal São Gonçalo. do Século XX. O original, bastante raro, traz a inscrição Porto - 1910, anotada
Fotografia de Nei Borges. Maio de 2021. a mão. Acervo Eduardo Arriada.

Imagem das páginas 80 e 81 Imagem das páginas 126 e 127


Chegada de José Barbosa Gonçalves, novo intendente de Pelotas, em 14 de Local, no arroio Santa Bárbara, onde existiu o estaleiro em que foi construída a
agosto de 1908. Desembarque no Trapiche São Pedro. Cena complementada Barca de Vapor Liberal, em 1832. À esquerda, ao fundo, ocupando o sítio do
pela imagem das páginas 60 e 61. Acervo Almanaque do Bicentenário de Pelotas. antigo estaleiro, figura a filial pelotense da fábrica rio-grandina de gêneros
alimentícios Leal Santos. Década de 1940. DUVAL, Paulo. A barca de vapor
Liberal. Início da navegação a vapor no Rio Grande do Sul e na Marinha de
Imagem das páginas 84 e 85
Guerra do Brasil. In: Anais do Quarto Congresso de História e Geografia Sul
Vista d’uma parte do fundeadouro do Porto da cidade de Pelotas, tirada da char- Rio-grandense. Vol. I. Porto Alegre: Livraria do Globo, 1946.
queada de Heleodoro na ocasião em que atracados ao trapiche da mesma carrega-
ram charque, couros salgados e mais artigos a Barca Nacional Tigre I, o Patacho
italiano Giuseppine e mais navios. Fotografia de Augusto Amoretty. Década de Imagem de guarda final
1870. Acervo Biblioteca Nacional do Brasil. Disponível em: http://objdigital. Aspecto do Porto de Pelotas visto desde o canal. Década de 1920. Acervo
bn.br/objdigital2/acervo_digital/div_iconografia/icon821997/icon821997.html. Eduardo Arriada.

Imagem das páginas 88 e 89


Quarta parte das cinco tomadas de uma panorâmica do Porto de Pelotas, feita
desde um navio atracado junto à ilha do José Mallandro, fronteira ao cais. Fi-
nal do século XIX (provavelmente, década de 1890). À margem do canal, ao
fundo, podem ser vistos os galpões da charqueada de Heleodoro de Azevedo
e Souza Filho, visitada por Sua Alteza, Princesa Isabel, em 1885. A fotografia
completa pode ser apreciada no Almanaque do Bicentenário de Pelotas, vol. 2,
páginas 298-299. O sentido da captura do panorama é nas direções oeste-nor-
te-leste. Acervo Eduardo Arriada.

Imagem das páginas 92 e 93


Vista d’uma parte do fundeadouro do Porto da cidade de Pelotas, tirada da char-
queada de Heleodoro na ocasião em que atracados ao trapiche da mesma carre-
garam charque, couros salgados, pipas de graxa e mais artigos a Barca Nacional
Tigre I, o Patacho italiano Giuseppine e mais navios. Fotografia de Augusto Amo-
retty. Acervo Biblioteca Nacional do Brasil. Disponível em: http://objdigital.
bn.br/objdigital2/acervo_digital/div_iconografia/icon821998/icon821998.html.

Imagem das páginas 96 e 97


Populares junto a navios festivamente embandeirados no cais do porto pelo-
tense, recentemente estruturado em alvenaria de pedra. Cartão Postal. Início

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Guilherme Pinto de Almeida. Arquiteto e Urbanista formado pela Uni-
versidade Federal de Pelotas. Mestrando de Arquitetura e Urbanismo da
mesma universidade. Pesquisador-membro da OTROPORTO Indús-
tria Criativa. Teve o interesse pela pesquisa despertado – em especial a
pesquisa iconográfica relativa à cidade de Pelotas – quando, entre 2010
e 2011, foi Bolsista de Iniciação Científica sob orientação da professo-
ra Dr.ª Ester Gutierrez, no Núcleo de Estudos de Arquitetura Brasileira
(NEAB) da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAUrb), ambiente
que contribuiu significativamente para sua formação. Realizou, em maio
de 2012, uma edição digital da Revista do 1º Centenário de Pelotas de João
Simões Lopes Neto, comemorativa do centenário da publicação. Em fun-
ção deste trabalho, veio a ser convidado para integrar a equipe responsá-
vel pela elaboração da obra em três volumes Almanaque do Bicentenário
de Pelotas, como pesquisador iconográfico. Entre 2016 e 2018, a convite
da 222 Produtora, com apoio das empresas Sagres Agenciamentos Maríti-
mos e CMPC Celulose Riograndense, passou a desenvolver o projeto Porto
O autor Memória – estudo histórico da região portuária de Pelotas –, iniciado
na forma de colunas publicadas no jornal Diário Popular, adaptado em
2017 para oficinas, realizadas em três escolas municipais da região do
Porto, sob o nome de Porto Memória nas Escolas. Em 2018, a pedido da
OTROPORTO, realizou um dossiê de pesquisa que subsidiou a abertura
solene, em maio de 2019, da cápsula do tempo do monumento a Yolanda
Pereira – Miss Universo 1930 –, na praça cel. Pedro Osório. No ano de
2019, a convite da OTROPORTO, e com apoio da Sagres Agenciamentos
Marítimos através da Lei de Incentivo à Cultura, começou a transformar
o projeto Porto Memória no presente livro, no qual são revisitadas 20 das
61 colunas anteriormente publicadas, acrescidas de novas informações
de pesquisa. Entre 2020 e 2021, em parceria com Duda Keiber, realizou a
pesquisa iconográfica e a coordenação editorial dos álbuns Figurinhas de
Pelotas Nº 1 – projeto aprovado em primeiro lugar no edital ProCultura
Pelotas 2019 – e Figurinhas de Pelotas Nº 2. Ainda em 2020 teve sua traje-
tória cultural reconhecida no Movimento - Prêmio de Reconhecimento da
Cultura Pelotense, promovido pela Secretaria de Cultura do Município no
âmbito da Lei Aldir Blanc. Desde janeiro de 2021, também a convite da
OTROPORTO, com apoio da empresa Connexion Export, tem adaptado
o Porto Memória para o formato de postagens nas redes sociais da asso-
ciação, sob o nome #TBT Porto Memória.

127
Ao amigo Duda Keiber e à OTROPORTO, ao amigo Marcos Fonseca
e à Sagres Agenciamentos Marítimos. Obrigado, de coração, pela ide-
alização, incentivo e oportunidade de realizar este trabalho.
Agradecimentos À amiga Fernanda Salomão Hackbart e à Connexion Export,
pela oportunidade de dar continuidade ao trabalho.

Ao amigo Eduardo Arriada, pela imensa generosidade.

Ao amigo Valder Valeirão, pela competência e ternura.

Aos amigos Taís Diniz Martins, Duda Keiber e Mariana Heineck


pelas atentas revisões.

À amiga Gabriela Mazza, pela contribuição com o quadro Você Sa-


bia?, que acompanhava as colunas no jornal Diário Popular, trazen-
do curiosidades da atualidade.

Aos amigos Geovani Corrêa, Nei Borges e Eduardo Devens, pelas


fotografias atuais.

Muito obrigado!

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1. Referência a Heloísa Assumpção Nascimento em seu primeiro romance, Har-
monia Excelsa (1932).

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