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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE

JANEIRO
Escola de Química

Ácido Nítrico

EQI-471 Processos Inorgânicos I

Profa. Mariana de Mattos Vieira Mello Souza

Ácido Nítrico
1. Introdução
O HNO3 é um ácido forte, monobásico. É difícil de ser preparado como
um líquido puro por causa da sua tendência em se decompor e liberar óxidos de
nitrogênio.
É completamente miscível em água e normalmente usado como solução
aquosa. Forma um azeótropo de máximo com a água na concentração de 68% em
peso.
É um forte oxidante e sua atividade como agente oxidante é dependente
da presença de óxidos de nitrogênio livres.

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2. Usos

Seu principal emprego é na fabricação de nitratos, inorgânicos ou


orgânicos, e de nitroderivados em todos os ramos da química orgânica.
ROH + HNO3  RONO2 + H2O

O principal consumidor é a indústria de fertilizantes, que consome 75-85%


de todo o ácido nítrico produzido, sobretudo para a síntese de nitrato de amônio.
Destaca-se também seu uso na indústria de explosivos.

3. Mercado

Produção mundial: 60 milhões t/ano

No Brasil: produção de 600 mil t/ano

O maior produtor é a Vale Fertilizantes (SP).

Destino das vendas internas: 77% fertilizantes


23% processos químicos

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4. Processo de Produção

Todas as plantas de produção de HNO3 estão baseadas em 2 etapas


fundamentais:
1. Oxidação da amônia com ar formando óxido nítrico (NO)
2. Oxidação do NO a dióxido de nitrogênio (NO2) e absorção em água, formando
solução de HNO3.

O processo pode ser representado pela equação global:


NH3 (g) + 2O2 (g)  HNO3 (aq) + H2O (l) H= -434 kJ/mol

A eficiência da 1ª etapa é favorecida a baixa pressão, enquanto a 2ª etapa


é favorecida a alta pressão.
Existem 2 tipos de plantas de HNO3:
- Processo de monopressão: P etapa 1 = P etapa 2
- Processo de pressão dual: P etapa 1 < P etapa 2

As plantas modernas de monopressão operam a P média (2,3-6,5 bar) ou


P alta (6,5-13 bar) e as plantas de pressão dual operam com P média na etapa 1 e P
alta na etapa 2.

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Comparação dos processos de produção de ácido nítrico:

Monopressão Pressão dual Monopressão


P média P média/alta P alta
(5/5 atm) (5/10 atm) (10/10 atm)
NH3 necessário (Kg/t HNO3) 284 284 288
Custo relativo de capital 120 110 100
Consumo de energia elétrica 22 22 28
(KWh/t HNO3)
Vapor gerado (Kg/t HNO3) 600 300 400
Perda de Pt (mg/t HNO3) 150 150 250
NOx no gás de saída (ppm) 1000-2000 100-200 100-200

A operação a alta P permite uma drástica redução no tamanho dos


equipamentos, por isso o custo de investimento é menor.
A oxidação da amônia a alta P aumenta o consumo energético (maior
temperatura requerida) e resulta em maior desgaste do catalisador de Pt.

A alta pressão no absorvedor resulta em menores emissões de NOx, reduzindo


os custos de tratamento do gás residual.

Etapa 1: Oxidação da amônia a óxido nítrico

4NH3 + 5O2  4NO + 6H2O H = -226 kJ/mol

É uma reação extremamente rápida que se efetua pela passagem da amônia


misturada com ar pré-aquecido através de uma tela muito fina, em várias camadas,
de platina, com 5 a 10% de ródio.
O ródio confere maior resistência mecânica ao fio de platina, aumenta a
atividade catalítica e reduz as perdas de catalisador.

As principais reações paralelas são:


4NH3 + 3O2  2N2 + 6H2O H = -317 kJ/mol
2NH3 + 2O2  N2O + 3H2O H = -275 kJ/mol
4NH3 + 6NO  5N2 + 6H2O H = -451 kJ/mol

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Para reduzir as reações indesejadas:
- aumentar a velocidade espacial
- dispor o catalisador em várias camadas sucessivas.
Existe uma velocidade limite a partir da qual começa a haver problemas de
erosão, aumenta-se a perda de catalisador e a oxidação de amônia torna-se
incompleta. A velocidade ótima aumenta com a temperatura.

O rendimento em NO depende da temperatura e pressão de operação:

Pressão (bar) Temperatura Velocidade do gás Rendimento em NO


(oC) (m/s) (%)
<2,3 820-850 0,4-1 97-98
2,3-6,5 850-900 1-3 96-97
6,5-13 900-950 2-4 93-95

Para uma mesma pressão, o rendimento aumenta com a temperatura, no


entanto, maiores temperaturas também aumentam a perda de catalisador por
vaporização.
A temperatura é mantida pelo ajuste da razão ar/amônia que entra no
conversor, sendo que o teor de amônia não pode ser superior a 12% molar devido ao
limite de flamabilidade.

Na saída do conversor coloca-se um filtro para a platina, que consegue


recuperar cerca da metade do catalisador perdido no processo de alta pressão (250-
500 mg/t ácido).
A filtração é normalmente feita através de lã de vidro ou fibras de silício.

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Etapa 2: Oxidação do óxido nítrico a dióxido de nitrogênio e absorção em água

2NO + O2  2NO2 H = -57 kJ/mol

Essa reação ocorre em fase homogênea, é lenta e o equilíbrio é mais


favorecido em baixas temperaturas e alta pressão. Abaixo de 150oC praticamente
todo o NO se combina com o O2 presente desde que haja suficiente tempo de
residência.
Essa reação ocorre durante o resfriamento dos gases provenientes da
oxidação da amônia e na própria torre absorvedora.

A principal reação paralela é a dimerização do NO2 a N2O4:


2NO2  N2O4 H = -28,6 kJ/mol
Essa reação também é favorecida a baixas temperaturas e alta pressão e
praticamente não se forma tetróxido de nitrogênio acima de 100oC.

Absorção do dióxido de nitrogênio em água:



 2HNO (aq.) + NO(g)
3NO2(g) + H2O(l) 
 3 H = -46 kJ/mol

Essa reação é a controladora da velocidade de fabricação de HNO3 e sua


velocidade pode ser aumentada pelo emprego de uma torre sob pressão e com
resfriamento, usando-se ácido diluído, em contracorrente, para efetivar a absorção.

Os sistemas de absorção variam em função do nível de pressão de operação.


Nas plantas que operavam a baixa pressão, utilizavam-se colunas recheadas de
anéis, com sistemas de resfriamento externo a torre. Nas plantas que operam a
média e alta pressão utilizam-se colunas com pratos perfurados, com resfriamento
através de serpentinas localizadas em cada prato.
Plantas com capacidade de 1800 t/dia de HNO3 possuem colunas de até 80
m de altura, com 30-50 pratos.

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O tamanho do equipamento pode ser diminuído para uma dada quantidade
e concentração do ácido ou a concentração pode ser aumentada através das
seguintes medidas:

- redução da temperatura  solubilidade do NO2


 decomposição do HNO3

- aumento da pressão favorece a oxidação do NO


maior velocidade de absorção

- aumento da razão NO2/NO no gás de alimentação

- aumento do volume da reação após o contato líquido/gás para favorecer a


reoxidação do NO liberado

O ácido que deixa a torre de absorção é rico em óxidos de nitrogênio


dissolvidos, que atribuem coloração amarelada ao ácido. Por isso, o ácido passa por
uma torre de alvejamento onde injeta-se fluxo de ar em contracorrente para
dessorver os óxidos de nitrogênio.

Etapas do processo de monopressão


ar amônia

Energia compressão evaporação energia para


compressão
Energia aquecimento filtração
vapor para outros
filtração turbina a vapor pontos da fábrica

Vapor superaquecido
recuperação de agua de
mistura reator catalítico
calor alimentação

agente
recuperação de gás residual quente redutor
calor
água de remoção de
refrigeração NOx
condensador
água de
processo
absorção expansor
água de
refrigeração
alvejamento energia pra
gás residual atmosfera
compressão
frio

ar HNO3
produto

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- Evaporação e filtração de amônia:
A amônia líquida é evaporada continuamente e superaquecida para evitar
o carreamento de gotículas líquidas que podem causar o bloqueio da trama do
catalisador no reator.
A amônia gasosa é filtrada para remover traços de ferrugem provenientes
do equipamento de aço carbono.

- Compressão e filtração de ar:


O ar é comprimido num compressor de recuperação e num compressor a
vapor e passa através de um trocador de calor onde é pré-aquecido até cerca de
250oC.
Nas plantas de alta pressão os compressores representam cerca de 50%
dos custos de equipamento da planta.
O ar é filtrado em dois ou três estágios para remover partículas de poeira
e óleo.

- Mistura ar/amônia:

A proporção entre ar e amônia deve ser cuidadosamente ajustada para se


obter o máximo de eficiência de conversão e eliminar o perigo de explosões.

O limite de explosão da amônia em ar é cerca de 12% molar e assim a


mistura ar/amônia contém normalmente 10% de amônia.

- Recuperação de calor:

Os gases quentes que saem do reator (NO com excesso de ar) são
resfriados numa caldeira a calor perdido e num aquecedor de gás residual para
aumentar a formação de NO2 e recuperar calor que pode ser utilizado em outros
pontos da fábrica. Em algumas plantas é possível recuperar até 82-85% de calor,
produzindo 1,1 t vapor/ t HNO3 100%.

- Condensação:

O gás é resfriado até cerca de 50oC, condensando-se uma solução de


ácido fraca que é separada e bombeada à torre de absorção.

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Concentração do ácido nítrico

A solução aquosa 50-70% HNO3 é adequada para a produção de fertilizantes, mas


para as reações orgânicas é necessário um ácido mais concentrado.
A concentração pode ser feita por reação adicional com óxidos de nitrogênio ou
por destilação extrativa com H2SO4 (agente de ligação com água para quebra do azeótropo
do HNO3 a 68%), produzindo HNO3 98-99%.

Tratamento do gás residual de plantas de HNO3

Os níveis de emissão de NOx (NO+NO2) numa planta moderna sem


equipamento de controle de poluição são:

- absorção a pressão média: 1000-2000 ppm

- absorção a pressão alta: 100-200 ppm

As emissões de N2O giram em torno de 300-350 ppm.

Principais métodos de redução do teor de NOx nos gases residuais:

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1. Absorção estendida

Aumenta-se a eficiência do sistema de absorção adicionando-se uma 2ª torre de


absorção, aumentando-se a altura da torre ou reduzindo a temperatura dos últimos
estágios da torre absorvedora.

2. Adsorção em peneiras moleculares

Para que a adsorção seja eficiente é preciso eliminar o vapor d’água do gás
residual. É um processo descontínuo, pois requer a regeneração do adsorvente.

3. Lavagem química
Diversos líquidos de lavagem podem ser usados, como soda cáustica,
hidróxido de magnésio, hidróxido de cálcio, amônia, ureia e até mesmo peróxido de
hidrogênio.

O NO e NO2 são absorvidos em NaOH em igual proporção, com formação


de nitrito de sódio:

2 NaOH  NO  NO2  NaNO2  H 2 O


Este processo possui um alto custo operacional e problemas de disposição
de rejeitos.

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4. Redução catalítica não-seletiva (NSCR)

Utiliza-se um combustível (gás natural, nafta ou hidrogênio) para


consumir o oxigênio livre no gás residual e converter o NOx a N2, através de um
catalisador de platina, paládio ou ródio.
Para se garantir a redução completa do NOx deve-se adicionar gás
combustível em quantidade suficiente para consumir todo o oxigênio do gás
residual. É necessário um excesso de agente redutor para reduzir os óxidos de
nitrogênio a N2.

CH 4  2O2  CO2  2H 2O
CH 4  4 NO2  CO2  2H 2 O  4 NO

CH 4  4 NO  CO2  2H 2 O  2 N 2

CH 4  4 N 2 O  CO2  2H 2 O  4 N 2

Vantagens:
- redução dos teores de N2O
- custo de 65% do SCR (custo de investimento)

Desvantagens:
- emissão de HCN, CO, CO2 e VOCs
- produz gases a 550ºC - 650ºC, exigindo materiais de construção mais caros para o
expansor, com maior custo de manutenção.

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5. Redução catalítica seletiva (SCR)

A amônia reage seletivamente com NOx, formando N2:

4 NO  4 NH 3  O2  4 N 2  6H 2 O

6 NO  4 NH 3  5N 2  6H 2 O

6 NO2  8NH 3  7 N 2  12H 2 O

Uma série de reações indesejadas pode ocorrer de acordo com a natureza


do catalisador, o conteúdo de O2 e a temperatura:

4 NH 3  3O2  2 N 2  6H 2 O

4 NH 3  5O2  4 NO  6H 2 O

2 NH 3  8NO  5N 2 O  3H 2 O

Parâmetros operacionais:
- Controle do grau de redução do NOx e da quantidade de amônia residual nos
gases efluentes: razão NH3/NO na alimentação deve ser mantida próxima à razão
estequiométrica da reação (1).
- Controle da seletividade a N2: excesso de oxigênio reduz a seletividade do
catalisador para N2 e favorece a formação de N2O ou mesmo a oxidação da amônia
a NO e NO2.
- Temperatura operacional: 250-450oC. A operação em temperaturas menores pode
causar a formação de nitritos e nitratos (risco de explosão) e a condensação de sais
de amônio, gerando entupimento, particulados e corrosão.

Os catalisadores utilizados no processo são V2O5/TiO2, Pt ou zeólitas.

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Vantagens:
- a amônia esta prontamente disponível na planta de HNO3
- alta eficiência de remoção de NOx
- não há liberação de poluentes quando um catalisador de alta eficiência é usado
- não há aumento na temperatura do gás residual

Desvantagens:
- não reduz a emissão de N2O
- necessidade de controle da temperatura para evitar deposição de sais de amônio

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