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USO OU NÃO USO DO (INSTRUMENTO) SOFTWARE LIVRE PELO 
MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA

Março de 2009 – Frente Digital

A demanda da utilização da informática no MST para suprir necessidades internas 
e externas, vem aumentando a cada dia. É fácil fazer um retrospecto de não mais que 
uma   década   e   analisar   esta   situação   –   da   mesma   forma   que   esta   demanda   vem 
aumentando na sociedade como um todo.
Creio   que   esta   não   seja   a   hora   de   aprofundar­se   nos   motivos   da   ascensão   da 
demanda da utilização da informática dentro do MST e na sociedade como um todo, 
porém, alguns aspectos têm que ser discutidos neste momento (e esta discussão deve ser 
aprofundada em cunho social e econômico a frente).
Dentre os motivos, é importante salientar os seguintes:
a) praticidade e agilidade na troca de informações; e
b) confiabilidade no armazenamento de dados.
Transações financeiras em tempo real, armazenamento de relatórios financeiros, 
elaboração   de   projetos   para   captação   de   recursos,   comunicação   com   o   mundo   todo 
através de correios eletrônicos, pesquisas dos mais diferentes assuntos encontrados em 
um só lugar, publicação de informações para o Brasil e para o mundo através de páginas 
da Internet, elaboração de material textual e gráfico e mais um universo de coisas são 
permitidas devido os motivos citados acima.
Toda  a  nossa  operacionalização   depende  da   informática.  Sem  ela,  na  situação 
atual, seríamos operários sem ferramentas.

A utilização do software livre dentro do MST já vem ocorrendo a bastante tempo 
através   de   ações   isoladas.   Já   ocorreram   diversas   experiências   nas   secretarias, 
acampamentos e assentamentos. Algumas bem sucedidas, outras não. 
O que não é sabido e discutido, é que desde que o ser humano se organiza de 
forma coletiva, nunca nenhum outro movimento se não o Movimento de Publicação de 
Software Livre, foi e é capaz de se organizar e se articular tão bem através do mundo 
todo de uma forma completamente democrática. É importante termos consciência que 
uma das mais importantes características do software livre é a liberdade de uso, cópia, 
modificação   e   redistribuição,   o   que   transforma   a   produção   (programas)   em   bens 
públicos, disponíveis para toda a sociedade.
Também nunca se tocou em outro assunto para fazer um contraponto ao software 
livre: o software proprietário, que é o software produzido com a finalidade de obtenção 
de lucro.
A principal diferença entre os dois modelos de produção está no notável abismo 
que existe entre eles: de um lado, o modelo de produção de software livre, do social. De 
outro   lado,   o   modelo   de   produção   do   software   proprietário,   do   capital.   O 
desenvolvimento do software proprietário é orientado para o benefício do fabricante, 
enquanto que o do software livre é orientado para o benefício da sociedade.
Pela ótica de Eric Raymond, no seu artigo A Catedral e O Bazar (The Cathedral  
and The Bazaar), o modelo tradicionalmente empregado na industria é similar ao projeto 
de   uma  catedral  medieval,   no   qual   um   restrito   grupo   de   projetistas   exerce   controle 
férreo sobre o trabalho de um pequeno exército de operários. O modelo da catedral é 
empregado na maioria dos projetos de desenvolvimento de software proprietário, onde o 
modelo descreve o relacionamento entre a gerência do projeto (e o departamento de 
marketing) que estabelecem metodologias, tarefas e prazos, que devem ser cumpridos 
pelos programadores engajados no projeto.
Já o outro modo de organização, freqüentemente empregado pela comunidade de 
software livre, se assemelha  a um anárquico  bazar, onde não há hierarquia entre os 
participantes e todos cooperam para que o bazar seja atrativo. Na produção de software 
no   bazar   os   projetos   são   informalmente   organizados   ao   redor   da   proposta   de 
desenvolvimento de algum aplicativo 'interessante', do qual os interessados participam 
voluntariamente, e o/a líder do projeto emerge por seus méritos como programador/a ou 
projetista.
Dentre   as   vantagens   decorrentes   da   utilização   de   software   livre   algumas   são 
interessantes de serem citadas em nosso contexto: custo social baixo, independência de 
tecnologia   proprietária,   desembolso   inicial   próximo   de   zero,   não   obsolência   de 
hardware, robustez, segurança e independência dos padrões de tecnologias de mercado.
Porém, qualquer processo democrático verdadeiro deve discutir as vantagens e as 
desvantagens, cujo entre as desvantagens salientam­se: a interface do usuário não ser 
uniforme nos aplicativos, a instalação e configuração serem difíceis, o desconhecimento 
dos usuários e a mão de obra escassa para suporte.
Existem   também   algumas   desvantagens   imaginárias,   como   a   possibilidade   da 
ausência de proprietário legal ou responsável legal ser um fator que vá influenciar no 
caso de má funcionamento do programa, a inverdade de que suporte segundo o modelo 
tradicional   é   inexistente,   poucos   aplicativos   comerciais   e   a   instabilidade.   –   Todas 
desvantagens imaginárias.

Nós,   como   movimento   social   de   massa   revolucionário,   não   podemos 


simplesmente   analisar   as   vantagens,   desvantages   e   desvantagens   imaginárias   para 
avaliar   o   contexto   software   livre   no   MST.   Desta   forma,   estaríamos   sendo 
completamente analíticos e tradicionais na nossa forma de avaliação, o que não coincide 
com nossos ideais. É nosso dever visualizar e discutir a situação da forma mais ampla 
possível,   e   isso   quer   dizer   não   somente   holísticamente,   analisando   o   conjunto 
computador / software como um todo, e sim, ecologicamente, levando em consideração 
o computador, o software, os operadores da máquina, o modelo de produção do software 
livre e do software proprietário, a quem os modelos beneficiam, as conseqüências da 
utilização de um modelo ou de outro, os desafios a serem tomados, os problemas reais e 
imaginários, as situações individuais colocadas por grupos e indivíduos, a forma como 
um modelo ou outro afetam o ambiente como um todo, e com certeza outros pontos que 
não são possíveis visualizar sem uma discussão real de todas as realidades envolvidas 
neste processo.
É necessário que os nossos organismos coletivos vivos quebrem paradigmas.
Aí   entra   o   aspecto   ideológico:   temos   duas   opções,   as   duas   funcionam,   duas 
realidades: uma tradicional, velha, uma revolucionária, nova. ­ É sabido que o novo é 
desafio,   é   incerteza,   é   experiência,   é   aprendizado.   É   sabido   que   o   velho   é   burguês, 
tradicional,   é estático.  É  sabido  que apoiando um, apoiamos  o modelo  neoliberal, o 
capitalismo moderno, o incentivo ao acúmulo de riquezas, a desigualdade social, a fome. 
É sabido que apoiando outro, apoiamos o social, a sociedade, os povos, a ciência, o 
conhecimento   de   todos   para   todos.   Uma   revolução   quando   falamos   do   modelo 
tradicional de registro de patentes. É o conhecimento saindo da mãos de uns, e indo para 
o povo.
Cito um exemplo: A Internet. De quem é a Internet? A Internet é de todos.
Essa situação só é possível devido às licenças de softwares livres. Caso alguns 
anos   atrás   alguém   patenteasse   os   protocolos   nos   quais   a   Internet   é   organizada,   nós 
estaríamos   utilizando   uma   rede   de   alguém,   de   uma   corporação   provavelmente.   A 
situação só não é essa pois a forma como a Internet foi planejada e construída, não 
permite isso, pois grande quantidade dos protocolos estão registrados como livres.

Companheiros e Companheiras,

Este texto é apresentado com a intenção de iniciar um processo amplo de relflexão 
e discussão da utilização do instrumento de trabalho Software Livre pelo Movimento 
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. 

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