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J ò rn Rusen

Raz ã o histó rica


Teoria da hist ória:
os fundamentos da ci ê ncia hist órica

Tradução
Estevão de Rezende Martins

EDITORA
Equipe editorial : Airton Lugarinho ( Supervisão editorial ): Fá tima Rejane
de Meneses ( Acompanhamento editorial ): Sonja Cavalcanti ( Preparação
de originais): Mauro Caixeta de Deus e Sonja Cavalcanti ( Revis ã o ):
Fá tima Rejane de Meneses, Sonja Cavalcanti e Yana Palankof (índice):
Eugê nio Felix Braga (Editora ção eletró nica ): Leonardo Branco ( Capa ).

Copyright © 1983 hy Vandenhoeck & Ruprecht .


Copyright © 2001 hy Editora Universidade de Bras ília, pela tradu ção.

Título original: Historische Vernunft: Grundziige einer Historik I : Die


Grundlagen der Geschichtswissenschaft

Impresso no Brasil

Editora Universidade de Brasília


SCS Q. 02 Bloco C n- 78 Ed. OK 2- andar
70300-500 - Brasília. DF
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escrito da Editora.

Ficha catalogr á fica elaborada pela


Biblioteca Central da Universidade de Bras ília

R íisen , J õ rn
R 951 Razão histó rica : teoria da histó ria : fundamentos da
ci ê ncia hist ó rica / J õ rn R íisen ; tradu çã o de Estev ã o
de Rezende Martins. - Brasília : Editora Universidade de
Bras í lia , 2001.
194 p.

Tradu ção de: Historische Vernunft: Grundziige einer


Historik T: Die Grundlagen der Geschichtswissenschaft
ISBN: 85-230-0615-x

1. Ci ê ncia hist ó rica. 2. Histó ria - teoria . I . Martins.


Estev ão de Rezende . II. Título.

CDU 930.1
Cap ítulo 4

A constitui çã o narrativa do
sentido histórico
(Ap ê ndice à edi çã o brasileira)

A histó ria é a narrativa dos acontecimentos;


tudo o mais vem da í.
Paul Veyne 1

A complexidade do paradigma narrativista

O pensamento hist órico, em todas as suas formas e versões,


est á condicionado por um determinado procedimento mental de o
homem interpretar a si mesmo e a seu mundo: a narrativa de uma
hist ória. Narrar é uma pr á tica cultural de interpretação do tempo,
antropologicamente universal. A plenitude do passado cujo tornar-
se presente se deve a uma atividade intelectual a que chamamos de
“história” pode ser caracterizada, categorialmente, como narrativa.
A “ hist ória ” como passado tornado presente assume, por princípio,
a forma de uma narrativa . O pensamento histó rico obedece, pois,
igualmente por princípio, à lógica da narrativa.
Essa tese é tratada, na teoria da hist ória, como o paradigma
narrativista . Esse paradigma foi objeto de uma curiosa mescla de
entusiasmo e de rejeiçã o. A adesão deu -se sobretudo no plano da
reflex ã o sobre os princípios do pensamento hist ó rico, no plano
da teoria da hist ória ou da “ meta-hist ória ”. De toda maneira, não
conheço caso algum , no debate teórico recente, de tentativa de

Paul Veyne , Geschichtsschreibung - und was sie nicht ist, Frankfurt/M, 1990,
p. 13.
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contestar o cará ter narrativo do pensamento hist órico. Existem,


certamente , trabalhos historiogr á ficos cujo ponto principal n ã o est á
no aspecto narrativo, mas isso n ão significa que neguem o cará ter
fundamental e constitutivo do narrar.
Gostaria de explicar o paradigma narrativista de forma tal que
fique clara sua aptidão a tornar transparentes, compreensí veis e
discut íveis racionalmente as divergê ncias e as contrové rsias do
trabalho hist ó rico 11a pesquisa , 110 ensino e na representaçã o exter -
na.
Qual é a quest ã o em debate? 2
Com respeito à ciê ncia da história, trata-se da especificidade
do pensamento hist ó rico , de seu estatuto de disciplina no complexo
das ci ências humanas e de suas funções culturais. Será possível
identificar e descrever um í ipo especí fico de racionalidade para a
história como disciplina especializada? Essa quest ão torna -se can-
dente diante da amplitude da crítica da racionalidade e da ci ência
feita pelo pensamento sob influ ê ncia do pós-modernismo. Nessa
tend ê ncia , o cará ter liter á rio da “ hist ó ria ” como constructo de uma
constituição mental de sentido é contraposto à pretensã o de cienti-
ficidade do conhecimento hist órico. Em outras palavras: uma qua -
lidade est é tica da histó ria é contraposta à racionalidade metódica
de seu conhecimento.
Em suma, a questã o é clara: 0 que significa “pensar historica-
mente ”? Para respond ê-la sã o necessá rias distin ções para com ou -
tros modos de pensar e a diferenciação da ciência da história, como
disciplina especializada, com respeito às demais ciê ncias e disci-
plinas. Esse modo de especificação do pensamento histórico medi-
ante distinção de tipos de racionalidade pertence aos conte ú dos
tradicionais da teoria da história. Lembremo-nos das famosas dis-
tinções entre explica çã o e compreensã o ( Droysen , Dilthey ) ou en -
tre particularização e generalizaçã o ( Rickert ). A narratividade
surgiu como tema , 110 â mbito da teoria da hist ó ria , no contexto

2
Registro meus agradecimentos aos integrantes do Grupo de Pesquisa “Constitui -
ção Histórica de Sentido”, no Centro de Pesquisa Interdisciplinar (ZIF) da Uni-
versidade de Bielefeld , pelos m ú ltiplos incentivos e sugest ões. Encontrei
elementos de grande valia no livro recente de Wolfgang Welsch, Vemunft. Die
zeitgnõssische Vermmftkrilik imd das Konzept der transversalen Vemunft,
Frankfurt/M , 1996.
Razã o hist ó rica 151

desse tipo de argumenta çã o. A narrativa foi concebida como um


modo de explicaçã o pr ó prio à explica çã o “ histórica”, distinto de
um outro tipo de explicaçã o, elaborado a partir do modelo das
ci ê ncias naturais e contraposto a ele.
Nosso tema é, pois, a racionalidade espec í fica do histórico.
Para poder tratar dele, deve-se começar pela quest ã o do que seja
racionalidade em si . O que é a forma racional do trato interpretati -
vo do homem consigo mesmo e com seu mundo e como esta se
distingue das demais? Na linha de Jiirgen Habermas, Wolfgang
Welsch formulou a seguinte resposta: a racionalidade est á presente
sempre que “assertivas sã o criticá veis e fundament á veis com base
nas suas pró prias pretensões de validade”. ' Na teoria da hist ória ,
por conseguinte, a quest ão tem o seguinte teor: como os enuncia-
dos especificamente hist óricos podem ser criticados e fundamenta-
dos e que pretensões pr óprias de validade possuem ?
Criticabilidade, fundamentabilidade e pretensões de validade
aparecem de maneira extremamente diversificada nas diferentes
formas de pensamento e argumenta ção. Essas diferenças podem ser
caracterizadas por uma tipologia da racionalidade. Tipos de racio-
nalidade são tipos de argumentação e podem ser definidos como
“ unidade de procedimento da fundamenta çã o argumentativa ”.4
Essas diferencia ções sã o necessá rias para identificar o plano
do trato racional do homem e de seu mundo pró prio à ci ê ncia da
hist ória, por exemplo, para distingui-la, como ciê ncia , das artes.
Simultaneamente, essas tipologias altamente abstratas são necessá -
rias para se poder demonstrar que, mesmo no n ível dos princípios,
sempre se d ão formas mistas. Dessa forma, a racionalidade cogni-
tiva no caso do pensamento hist órico n ão pode ser isolada de uma
racionalidade pol ítica e de uma est é tica . Com efeito, os argumentos
elaborados no n ível dos princípios ainda n ã o bastam para abranger
os debates concretos dentro dos campos que cobrem , como a dis-
cussão sobre a delimita ção e as rela ções entre as diversas ciê ncias,

3
Welsch , Vermmft ( vide nota 2), p. 116.
4
Jiirgen Habermas, Theorie des kommunikativen Handelns [Teoria do agir comu -
nicativo ], vol . 1, Handlimgsrationalitàt und geseUschaftliche Rationalisierung
[ Racionalidade do agir e racionalização social ] , Frankfurt / M, 1981, p . 486 ,
apud Welsch , Vermmft (vide nota 2), p. 452.
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a exemplo do que ocorre hoje no caso da ciência da hist ória e da


antropologia cultural .
O plano da concepção de tipos de racionalidade e da an á lise de
suas diferenças e semelhan ças tem, pois, de ser ultrapassado, para
poder chegar ao n ível de uma concretiza çã o maior. A racionalidade
caracterizada tipologicamente tem de ser concretizada, “encarna-
da” no sentido de sua localizaçã o no contexto pr á tico das argu-
menta ções dos especialistas.
Nesse plano, trata-se de contextos concretos de comunicação,
nos quais os tipos de racionalidade aparecem como paradigmas.
Paradigmas podem ser definidos como consolida ções de um de-
terminado tipo de racionalidade. “Consolidação” quer dizer um
determinado modo de o pensamento proceder no discurso de seus
sujeitos. Existem diversos modos de consolida çã o. O mais comum
é o da especialização nos diversos campos, como, por exemplo, no
da ci ê ncia da hist ó ria como disciplina acad ê mica ou no plano dos
estilos de pensamento ou nas escolas dos diferentes grupos de es-
pecialistas, que concorrem entre si como autores da realiza ção mais
apropriada da especialidade acad ê mica. Os paradigmas sã o, pois,
m ú ltiplos e evoluem com o tempo. Não raro atuam muitos ao
mesmo tempo, de forma imbricada, que necessita de esclareci -
mento. As propostas inspiradas pela tese de Thomas S. Kuhn
(como a minha també m) de identificar e descrever uma “ matriz
disciplinar” ou um “paradigma ” na evolução da história n ão escla -
receram suficientemente essa pluralidade e essa imbrica çã o.
Para se compreender o que um paradigma como o narrativista
significa para a ci ê ncia da hist ó ria, é necessá rio distinguir e articu -
lar três planos da tematiza çã o, nos quais se busca a especificidade
do histórico: o plano dos princípios da racionalidade em si , o plano
dos diferentes tipos de racionalidade, em que se efetivam concre-
tamente os campos do pensar e do saber e a especificaçã o do tra-
balho científico prático, e por fim o plano dos paradigmas, que
determina a l ógica da pesquisa nas diversas disciplinas e subdisci -
plinas cient íficas, ou seja , nos processos cognitivos concretos.
Tematizado em um contexto de argumenta ção como este, o
paradigma narrativista revela -se em sua complexidade, abertura ,
utilidade e eficá cia e permite uma aproxima çã o do trabalho dos
especialistas.
Raz ão histó rica 153

Narrativa como tipo de racionalidade da constituição histórica


de sentido

Atribuir à narrativa um tipo de racionalidade não tem nada de


óbvio. Pelo contr á rio: um dos principais motivos para os especia -
listas em hist ória olharem o paradigma narrativista da teoria da
história com desconfiança est á no fato de que a racionalidade da
pesquisa hist órica que progrediu ao longo do tempo, pelo menos
com respeito aos m é todos de investigaçã o, era considerada incom -
patível com o princípio da narratividade e, este, como exclusão
dessa racionalidade do cerne da teoria da hist ó ria , se n ã o como
equivalente a seu abandono.
O princípio da narrativa passou a ser um tema no debate teóri-
co na hist ó ria quando se tornou necessá rio levar em conta a especi-
ficidade do pensamento hist ó rico ao se tratar do padrão de
racionalidade da explicação cient ífica . ' O modelo de uma “explica-
'

çã o racional ’ baseado nas ci ê ncias matem á tico-experimentais, co-


7

nhecido pelo nome de Hempel - Popper, foi apresentado como


universalmente v á lido e aplicado, com essa pretensão de validade,
à ciê ncia da histó ria.6 O reconhecimento de uma racionalidade ci-
ent ífica universal causou , entre os especialistas da ci ência da hist ó-
ria, rea ções desencontradas, pois esse modo de explica ção e sua
racionalidade dependem decisivamente da argumentação com base
em leis gerais. Mas justamente isso n ã o pode ser provado com
rela ção às opera ções cognitivas básicas do pensamento hist ó ri -
co. A especificidade da história aparecia como uma lacuna. No
entanto, quando a pr ó pria narrativa pôde ser reconstru ída como

5
A esse respeito, cf . uma colet â nea recente: Jerzy Topolski (ed . ) , Narration and
explanation. Contributions to the methodology of tlie hist órica / research
( Poznan Studies in the Philosophy of the Sciences and the Humanities),
Amsterd ã , 1990.
6
O texto cl ássico é de C. G. Hempel, The function of general laws in history,
Journal of Philosophy 39 (1942), p. 35-48; acerca do debate sobre os diversos
tipos de racionalidade da explicação, ver o segundo volume desta sé rie: Jõrn
Riisen , Rekonstruktion der Vergangenheif . Grundziige einer Historik II: Die
Prinzipien der historischen Forschung (Gõttingen , 1986 ), p. 22 ss. [ Reconstrução
do Passado. Elementos de uma teoria da história II: Os princí pios da pesquisa
histórica. Trad . brasileira pela Editora Universidade de Brasí lia ].
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modo de explicaçã o - um de seus pioneiros foi Arthur C. Danto ,


o que aparecia como lacuna passou a ser visto como uma qualidade

positiva. Nesse momento nasceu , em princípio, o paradigma narra-
tivista.
A an álise subsequente da narrativa acabou por negligenciar o
fato de que narrar é um tipo de explicação que corresponde a um
modo próprio de argumenta çã o racional.s O narrar passou a ser
visto, doravante, como uma pr á xis cultural elementar e universal
da constitui çã o de sentido expressa pela linguagem . N ã o havia
muito interesse em investigar sua racionalidade, porque, diante do
predom ínio do modelo n ão narrativo em ci ê ncia e tecnologia , a
narrativa nã o parecia ter muitas chances de valer como recurso
heur ístico para que se pudesse compreender os seus procedimentos
mentais e a sua lógica. A racionalidade da narrativa foi perdida de
vista , em benef ício da prá tica lingu ística como procedimento da
constituiçã o hist ó rica de sentido e da regula çã o - desse procedimen -
to. Em si, n ã o foi ruim que a tematização do tipo de racionalidade
pró prio ao pensamento hist ó rico e de sua origem tenha come çado
com essa abordagem lingu ística e com as típicas categorias de
sentido e da constituição de sentido. Sentido é inais fundamental
que racionalidade . Assim, a racionalidade do pensamento histó rico
pode ser descrita como um modo da constituiçã o de sentido que
consiste na forma de comunicaçã o do raciocí nio argumentativo.
Para obter esse resultado, a narrativa precisa ser concebida como
uma opera çã o mental de constituiçã o de sentido e ponderada quanto
à sua fun çã o constitutiva do pensamento histórico.
A narrativa n ã o é sempre e basicamente hist órica, no sentido
coloquial do termo. “Histórico ’ significa aqui que o passado é in-
1

terpretado, com rela çã o à experi ê ncia , no constructo pr ó prio a uma


“ hist ória” e que essa interpretação passa a ter uma fun çã o na cultu -
ra contempor â nea . Como nem toda narrativa de hist órias est á rela-
cionada com a experiê ncia do passado e serve para torn á-la

7
Arthur C. Danto, Analytische Philosophie der Geschichte [ Filosofia analítica da
história ] , Frankfurt , 1974.
Cf. Jõrn Rusen , Zeit und Sinn. Strategien historischen Denkens [ Tempo e senti-
do. Estratégias do pensamento histórico ], Frankfurt , 1990, p. 135 ss. ( Historio-
grafia como problema teó rico da ci ê ncia da histó ria ).
Raz ã o histó rica 155

presente, é necessá rio especificar a narrativa hist órica no conjunto dos


elementos comuns às narrativas hist ó rica e n ã o hist ó rica . É comum
ambas atuarem como um modo específico de constituição de senti-
do sobre a experiência do tempo? Narrar a partir do tempo faz
sentido na medida em que a sequ ê ncia temporal dos acontecimen-
tos ( na maior parte ocorr ê ncias ou conte ú dos empíricos de tipo
estrutural) é situada no contexto pró prio a esses mesmos aconteci-
mentos. Esse contexto é tal que a particularidade (contingê ncia)
dos acontecimentos nele n ã o desaparece, mas aparece como uma
mudan ça temporal reconstitu ível . A reconstitui çã o mental da mu -
dan ça temporal atribui a esta significado para a compreensã o e para
a interpreta çã o dos processos de evolu çã o no tempo, no qual vivem
os sujeitos da narrativa ou , dito de outra forma , no qual o pró prio
processo comunicativo da narrativa se d á. A especificidade da
narrativa hist ó rica est á em que os acontecimentos articulados nar -
rativamente sã o considerados como tendo ocorrido realmente no
passado. Alé m disso, sua coesã o interna é concebida como uma
representa çã o da evolu çã o temporal vinculada à experiê ncia e
como significativa para o auto-entendimento e para a orienta çã o
dos sujeitos dos narradores. Com ela , os processos temporais atuais
da vida prá tica dos narradores podem ser entendidos. Para a narra-
tiva hist órica é decisivo, por conseguinte, que sua constituiçã o de
sentido se vincule à experiência do tempo de maneira que o passa-
do possa tornar-se presente no quadro cultural de orienta çã o da
vida prá tica contemporâ nea. Ao tornar-se presente, o passado adqui-
re o estatuto de “ hist ó ria ”. Retomando a famosa express ã o de
Johann Gustav Droysen, pode-se dizer que a narrativa hist ó rica
“faz”, dos feitos do passado, a hist ória para o presente.10 ( Esse “fa -
zer ” corresponde ao sentido do termo grego jroir|Giç, poiesis .)
Para se entender o que a narrativa realiza , é necessá rio caracte-
rizar melhor a categoria de sentido. A constituição de sentido pro-
duzida pela narrativa hist órica a partir da experiência do tempo
opera -se em quatro planos: a) no da percepçã o de contingê ncia e
diferen ça no tempo; b) no da interpreta çã o do percebido mediante a
articula çã o narrativa; c) no da orientaçã o da vida pr á tica atual me-

Cf., para mais detalhes, R íisen , Zeit undSinn (vide nota 8), p. 11 ss.
10
Droysen , Historik ( vide nota 2 do cap ítulo 1), p. 69 e passim.
156 Rusen
J õ rn

diante os modelos de interpreta çã o das mudan ças temporais plenos


da experi ê ncia do passado e, por fim , d ) no da motiva çã o do agir
que resulta dessa orientaçã o. “Sentido” articula percepçã o, inter-
pretação, orientação e motiva çã o, de maneira que a rela çã o do ho-
mem consigo e com o mundo possa ser pensada e realizada 11a
perspectiva do tempo. Sentido hist ó rico na relação com o mundo
significa uma representa çã o da evolu çã o temporal do mundo hu -
mano tanto baseada 11a experiê ncia quanto orientadora e motivado-
ra do agir. També m 11a rela çã o do homem com si mesmo, 0 tempo
é interpretado em consecução, de modo que seja alcan çado um
m í nimo de consist ê ncia do “eu ”: a identidade hist órica.! 1
E de todo recomend á vel concretizar essas considerações ex-
tremamente abstratas. Para tanto, escolhi dois exemplos, comple-
tamente fora da pr á tica acad ê mica da pesquisa e da historiografia
do passado. Ambos são da África do Sul. O primeiro é a tentativa
de um zulu de defender a cultura de um povo contra a predomin â n-
cia ocidental ( branca) mediante retorno e revitaliza ção da narrativa
de hist ó rias que são, segundo ele, as ú nicas a poder contar aos zu -
lus quem eles são. O autor publicou essas histó rias sob a pressão da
experi ê ncia do apartheid e com a inten çã o de “ contar a verdade
sobre o povo bantu e de evitar a muitos e muitos de meus com -
patriotas a agonia do abandono que sofremos” . 12 O que interessa
nesses exemplos n ão é o conte ú do da narrativa, mas sua forma,
0 tratamento lingu ístico 11 a comunica çã o da narrativa hist ó rica .
O exemplo representa, ao mesmo tempo, algo de arcaico e de t ípi -
co. Ele apresenta uma “ cena origin á ria ” da narrativa hist ó rica .
Mostra como, ao longo da cadeia das gerações, as experi ê ncias e as
interpreta ções sã o conservadas e consolidadas, para o fim da pre-
serva çã o e da estabiliza çã o da comunidade e do pertencimento a
ela, de sua especificidade e da autopercepçã o positiva.

11
Uma excelente visã o de conjunto do debate sobre identidade pode ser encontra -
da em J íirgen Straub, Identit ã tstheorie im Ú bergang? Uber Identitã tsforschung,
den Begriff der Identitãt und die zunehmende Beachtung des Nicht- Identischen
in subjekttheoretischen Diskursen , Soziahvissenschaftliche Literatur-Rimdschau
23 (1991), p. 49-71.
12
Em ingl ês no original : “ to tell the world the truth about the Bantu people and to
save many of my countrymen the agony of the bereavement we felt ”. Vusuma-
zulu Credo Mutwa: Indaba, my children ( Londres, 1985), p. XIII .
Raz ã o histó rica 157

À luz das estrelas sorridentes, o velho est á sentado, um gibão


colocado sobre os ombros vergados pela idade. Seus olhos
avermelhados fixam o semic írculo de rostos curiosos e ansiosos
diante dele - rostos de quem apenas fez alguns poucos passos
de uma trilha obscura e insegura chamada vida, ainda sem co-
nhecer o sofrimento , amargo preço da vida , rostos jovens, sem
temor da tristeza, da doen ça e da ira - os rostos luminosos, des-
contra ídos das criancas
o
.

O fogo dan ça no meio da fogueira redonda de barro, como


uma menina em sua alegria simples de viver. Ele consome os
gravetos e a lenha seca , com que uma garota o alimenta , e nada
deixa al é m de cinzas quentes. Manda para o domo estrelado de
um cé u tranquilo sua fumaça avermelhada e suas pró prias e
ef é meras estrelinhas.

Subitamente o velho sente um grande peso sobre seus om -


bros - uma grave responsabilidade para com esses jovens que o
cercam , t ão cheios de esperan ça. Seus velhos ombros magros
caem ainda mais, ele suspira; um pigarro áspero arranha sua
garganta, ele engole e sopra o fogo , como o fizeram antes dele
seus pais e antepassados, e começa a velha , velha hist ó ria, que -
como sabe - repetirá tal qual a ouviu h á muito tempo, sem nada
alterar ou mesmo acrescentar ou retirar uma simples palavra:
Indaba - Meus filhos!13

O segundo exemplo é retirado de um manual de serviço social


para as favelas em torno de Johannesburgo, publicado em 1981.14
Nesse manual h á uma hist ó ria em quadrinhos intitulada Vusi goes
back , cuja finalidade é esclarecer às massas desfavorecidas dos
negros os motivos dessa situação e abrir -lhes uma perspectiva de
futuro dependente de sua pr ó pria atuação política . Aqui també m
n ã o é o conte ú do que vem ao caso, que afinal só apresenta uma
interpreta çã o hist órica da “esquerda branca”, mas a forma. O dese-
nho começa com um resumo de todo o percurso da hist ória sul -
africana em seis quadrinhos, que apresentam uma determinada
13
Vusamazulu Credo Mutwa: Indaba. Ein Medizinmann der Bantu erzã hlt die
Geschichte seines Volkes (Munique, 1983), p. 9.
14
Vusi goes back. A comic book about the history of South África. (Prezanian Comix,
E.D.A.); de um manual para “ trabalhadores comunitá rios”, 1981, fig. p. 2.
158
Jõm Rusen

sequência temporal. Esse resumo representa , em primeiro lugar,


uma “ cena origin á ria ” de constitui çã o hist ó rica de sentido seme -
lhante à que se viu no primeiro exemplo: um anci ã o conta uma
hist ória a um jovem, a fim de fazê-lo compreender sua situação
presente. Ao mesmo tempo, contudo, a imagem - resumo representa
a “forma origin á ria ” de uma hist ó ria , na qual o passado é tornado
presente como história. Esse exemplo ilustra a estrutura elementar
de sentido de uma “ histó ria ” na organização temporal de seu con-
te údo como articula ção narrativa de acontecimentos, situa ções ou
ocorrê ncias em tempos diversos. Como no primeiro exemplo, fi-
cam claras també m a rela çã o com o presente e a função prá tica que
Razão histórica 159

caracterizam o modo narrativo de tornar presente o passado em


uma hist ó ria .
Como o bal ã o mostra com limpidez ideal t í pica , essa hist ória
possui começo, meio e fim . O fim é o momento presente da situa -
çã o narrativa. O começo est á no ponto em que a vida humana go-
zava de condições cuja falta no presente exige a interpreta çã o do
tempo atual . O meio mostra a sequ ê ncia dos acontecimentos desse
início até o presente, de maneira que pareça plausível um futuro em
que as condições atuais da vida possam ser mudadas e em que, de
certo modo, se retorne ao come ço.
Mesmo com a variaçã o das narrativas em que o passado é
apresentado com o fito de orientar o presente , esses dois exemplos
parecem - me mostrar bem dois elementos essenciais, constitutivos
mesmo, da narrativa hist ó rica. lr Eles sã o “arcaicos” no sentido do
>

termo grego para “origem”, que significa simultaneamente algo


muito antigo, algo duradouro no tempo e algo v á lido para todos os
tempos. Estou convencido de que esse “arca ísmo” da narrativa
histórica pode ser encontrado hoje em dia sem maiores dificuldades. 16
Naturalmente , é raro que se veja um exemplo puro desse modo
de narrar. O quotidiano est á cheio de elementos fragmentados das
hist ó rias, de alusões a hist órias, de parcelas de mem ória, de “ nar -
rativas abreviadas” . 1 ' O que esses diferentes fen ô menos exemplifi -
cam , com sua grande diversidade, pode ser esclarecido e entendido
a partir do tipo puro de uma situa çã o narrativa: algu é m conta a
algu é m uma história, na qual o passado é tornado presente , de for-
ma que possa ser compreendido, e o futuro é esperado.18

15
Este ponto foi tratado, na versão original , no cap. 2; ademais, cf . também outros
textos meus: Zeit imd Sinn (vide nota 8), p. 153 ss., e Historische Orientierung .
Ú ber die Arbeit des GeschichtsbewuBtseins, sich in der Zeit zurechtzufinden
( Col ó nia , 1994), p. 3 ss.
16
Ver, a t ítulo de exemplo, as an á lises de Mike Seidensticker, Werbimg mit Ges -
chichte. À sthetik und Rhetorik des Historischen . Beitr á ge zur Geschichtskultur,
vol . 10, Col ó nia , 1995.
17
Riisen , Historische Orientierung (vide nota 15), p. 11. An á lises minuciosas
desses resultados est ão em Heidrun Friese , Bilder der Geschichte, in : Klaus E.
Mi.iller, Jõm Riisen (eds.), Historische Sinnbilchtng. Problemstelhmgen, Zeitkon
zepte, IVahrnehmungshorizonte, DarstelhmgsstrcUegien, Reinbek , 1997.
-
Is
Refiro- me, aqui , às conhecidas formulações de Karl-Emst Jeismann para caracteri -
zar as operações da consci ência histó rica. Cf. Karl-Emst Jeismann , Geschichte ols
160
J õm Rusen

A constitui çã o hist ó rica de sentido d á -se, pois, n ã o apenas na


forma de uma narrativa elaborada a partir de uma pr á tica cultural
oriunda das rotinas do quotidiano, como em uma celebra çã o cívica ,
em um discurso gratulatório, em um curso universit ário ou na pro-
du çã o e recepçã o de textos historiogr á ficos, em exposições hist ó ri-
cas, em jogos hist óricos, etc. Ela perpassa todas as dimensões das
mais diversas manifesta ções da vida humana. Ela pode efetuar -se
na forma de procedimentos inconscientes que influenciam a vida
concreta , como o recalque , o afastamento ou a reinterpreta ção das
lembran ças, experi ê ncias e interpretações impostas que incomo-
dam. Ela perpassa a comunicaçã o no dia -a-dia , na forma de frag-
mentos de mem ó ria e de hist ó rias, de refer ê ncias a hist ó rias, de
sí mbolos, cujo sentido só transparece na narrativa.
Se toda essa imensid ã o de formas possíveis de tornar presente
o passado deve ser resumida com o conceito de “ constituição hist ó-
rica de sentido”, ent ã o tem de ser demonstrado que cada um dos
diversos fenômenos preenche as condições para que a narrativa de
uma hist ória possa ser caracterizada de “ hist órica ” . Para tanto, é
ú til recorrer à an álise das situações arquet ípicas de comunica ção na
narrativa hist ó rica. Com esse arqu étipo pode-se estipular com mais
exatid ão em que sentido símbolos, imagens, palavras isoladas, alu-
sões e semelhantes podem ser considerados “ hist ó ricos”. Eles sã o
“ históricos” se e quando o sentido que possuem nas situações de
comunicação da vida humana pr á tica emerja plenamente na forma
de uma história na qual o passado é interpretado, o presente enten -
dido e o futuro esperado mediante essa mesma interpretação.
É exatamente isso que quer dizer o termo “ narrativismo”.
O cará ter de um enunciado, de uma simbolizaçã o, de uma apre -
sentaçã o, enfim , de uma articula çã o ou manifesta çã o de sentido, é
hist ó rico se o sentido intencionado abrange um contexto narrá -
vel entre o passado, o presente e ( tendencialmente) també m o
futuro, sentido esse no qual a experi ência do passado é interpretada
de forma que o presente possa ser entendido e o futuro, esperado.
O sentido hist órico requer três condi ções: formalmente, a estrutura

Horizont der Gegemvart. Uber den Zusammenhcmg von Vergangenheitsdeutimg,


Gegemvartsverstándnis undZukunftsperspektive , Paderbom, 1985.
Raz ã o histó rica 161

de uma hist ória; materialmente, a experiê ncia do passado; funcio-


nalmente , a orientação da vida humana prática mediante repre-
sentações do passar do tempo. Uma teoria da narrativa hist ó rica
que organize os pressupostos, os modos, o alcance sincrônico e
diacrô nico, assim como as fun ções da constituiçã o hist órica de
sentido, fornece també m o quadro de referê ncias para a an á lise
empírica , pragm á tica e normativa no trato com a hist ó ria.

Uma forma do paradigma narrativista

Um “ paradigma" ou uma “'matriz disciplinar” é uma explica-


ção teó rica do tipo de racionalidade da constitui çã o hist ó rica de
sentido. Os termos sã o de Thomas S. Kuhn , mas seu significado
original sofreu modifica ções substanciais ao longo da reflex ã o so-
bre os processos cognitivos próprios às ciências da cultura e sobre
outras prá ticas culturais de constituição de sentido. Inalterada ficou
a pretensão de explicitar os m ú ltiplos fatores regulativos do pro-
cesso cognitivo ou da pr á tica interpretativa de uma cultura como
um contexto sistem á tico que possa servir para delimitar um deter-
minado tipo de conhecimento e de interpreta çã o. Com respeito à
ciê ncia , um paradigma descreve um determinado modelo, uma
escola , uma direçã o, mas també m - de acordo com o grau de uni -
versalidade com que os fatores da pr á tica cognitiva são tratados -
uma é poca ( como, por exemplo, “ Iluminismo tardio”, “ historicis-
mo” em sentido estrito).
Um paradigma da constitui çã o narrativa do sentido hist órico
leva em conta os fatores mentais determinantes da narrativa histó-
rica e seu contexto sistem á tico. Ele precisa identificar , distinguir e
articular os princípios, necessá rios um a um e suficientes em seu
conjunto, que fazem a constitui ção hist ó rica de sentido aparecer
como um processo que obedece a determinados fatores e que pode
ser reconstru ído e entendido a partir deles.
162 J õ rn Rusen

1 j
Considero determinantes cinco desses fatores:

1) carências de orientação da vida humana prá tica, decorren -


tes das experi ê ncias da contingê ncia na evolu çã o temporal
do mundo humano;
2) diretrizes de interpretaçã o que se referem à experiê ncia do
passado, se baseiam na memória e assumem a forma de
teorias, perspectivas e categorias impl ícitas e expl ícitas;
3) mé todos, com os quais o passado empírico tornado pre -
sente é inserido nas diretrizes de interpreta çã o, mediante o
que estas se concretizam e se modificam;
4) formas de representaçã o da experi ê ncia do passado incor -
porada à diretriz de interpreta çã o;
5) fun ções de orienta çã o cultural mediante a experi ê ncia in -
terpretada e representada na forma de uma direçã o temporal
do agir humano e na forma de concepções da identidade
histórica.

Esses fatores condicionam -se mutuamente em um conjunto


sistem á tico complexo. Eles n ão constituem uma sé rie de etapas
sucessivas estanques. Diretrizes de interpreta çã o podem estar da-
das, por exemplo, nas formas de representa çã o; estas, por sua vez,
podem depender de concepções teóricas do processo hist órico.
Para a constru ção e a utiliza çã o desse conjunto, é importante que
os elementos da vida pr á tica (car ê ncias e funções de orienta çã o)
sejam articulados com os elementos “ te óricos” de maneira a tornar
visí vel e inteligível o enraizamento da constitui çã o de sentido na
vida pr á tica , assim como é importante que esta constituiçã o possua
autonomia com respeito aos atos concretos dessa mesma vida.
Na rede relacional dos fatores, podem-se identificar tr ês dimen-
sões da constituiçã o hist ó rica de sentido, cuja diversidade e inter -
depend ê ncia transparecem em todos os modos do saber hist ó rico:

19
Cf. cap. J , no qual a versão anterior da matriz é explicada, e també m Hans-Jurgen
Goertz, Umgang mil Geschichle. Eine Einfuhnmg iu clie Geschichtstheorie,
Reinbek , 1995, p. 67 ss.
Raz ã o hist ó rica 163

1) Na inter -rela çã o entre as carê ncias de orienta ção e as fun -


ções de orientaçã o cultural, a constitui çã o hist órica de
sentido é determinada por uma estratégia política da me -
mória coletiva;
2) na inter-rela çã o entre as diretrizes de interpreta çã o e os
métodos de elabora çã o da experiê ncia , a constitui çã o his-
t ó rica de sentido é determinada por uma estratégia cogni-
tiva da produção de saber hist órico;
3) e na inter - rela çã o entre as formas de representa çã o e as
fun ções de orienta çã o, a constituição hist órica de sentido é
determinada pela estrat égia estética da poética e da ret ó-
rica da representação hist órica.

Esse dimensionamento diversificado impede que se restrinja o


olhar à mera narrativa hist ó rica , por se preferir seja a abordagem
cognitiva , que predomina no auto-entendimento e na pr á tica da
ci ê ncia da hist ó ria , seja a polí tica, em que o saber hist órico é usado
na luta pela politiza çã o dos argumentos, seja a est é tica, que acentua
a força de convencimento do meio e das formas de representação.20
Tanto a diversidade dos fatores regulativos quanto as m ú ltiplas
dimensões da constitui ção hist órica de sentido suscitam a quest ã o
daquilo que assegura a inter -rela çã o e a coerência dos fatores e das
dimensões. Essa quest ão visa, pois, a um metacritério sintetizador
(de alguma forma a matriz de todos os crit é rios), que pode ser
identificado e descrito como o crit ério de sentido da narrativa
hist órica ou como o princí pio do sentido hist órico .
Paradigmas podem surgir como esquemas da matriz discipli -
nar da ciê ncia da hist ória. Eles ilustram, por conseguinte, a inter -
rela çã o esboçada , com respeito à constituiçã o da histó ria como
disciplina cient ífica. A matriz disciplinar pode ser concebida da
seguinte maneira:

20
Sobre a relação entre essas trê s dimensões, cf. Riisen , Historische Orientierung
( nota 15), p. 225 ss.
164
J õ rn Rusen

Métodos
[ regras da pesquisa empí rica ]

Perspectivas Formas
da interpreta ção
[ teorias, perspec-
[ Ci ê ncia especializada ] [de representação ]
tivas, categorias]

Princí pios
do sentido ( hist ó rico)
(D

[Vida pr á tica ]
Interesses
[carê ncias de orientaçã o na Funções
mudan ça temporal do mundo [ de orientação cultural
contempor â neo] sob a forma de um dire-
cionamento do agir hu -
mano e de concepções da
identidade histó rica]

(1) estratégia política da mem ó ria coletiva


(2) estratégia cognitiva da produ ção do saber hist órico
(3) estrat égia est ética da poé tica e da ret ó rica da representa çã o
histó rica

.
Fig. 2 Esquema da matriz disciplinar da ciê ncia da história

A concepção de uma matriz disciplinar pode ser utilizada


como quadro de referê ncias para a an álise e a interpretaçã o dos
processos cognitivos que, na hist ó ria, pretendem ser cient íficos.21

21
Cf. a grande pesquisa de Horst Walter Blanke, Historiographiegeschichte ais Histo
rik (Fundamenta Histó rica , vol. 3), Stuttgart-Bad Cannstatt, 1991. Sobre o debate
-
acerca da possibilidade de utilizar o modelo da matriz na histó ria da historiografia ,
Razã o histó rica 165

Com pequenas modificações, ademais, ela pode ser igualmente


empregada como quadro teó rico de referê ncias para a interpreta çã o
das prá ticas do pensamento hist órico e das representações historio-
grá ficas, nas quais a cientificidade ( no sentido atual ) é irrelevante.22
A cientificidade diz respeito sobretudo ao fator “ métodos”. So-
mente se os m é todos tomarem a forma de regras da pesquisa empí-
rica, a matriz corresponderá ao esquematismo de uma pr á tica
cognitiva cient ífica especializada. A experiê ncia n ão é elaborada ,
por é m , apenas nas diretrizes de interpretaçã o internas à constitui -
çã o científica especializada do pensamento hist órico. E possível,
por conseguinte ( mediante uma generaliza çã o adequada , 11a qual se
trate exclusivamente das regras de elaboração da experiê ncia e n ão
da especificidade dos fatores reguladores da pesquisa ) , conceber o
esquema de maneira a permitir registrar e analisar as formas t ípicas
da constituição hist ó ria de sentido. Que uma investiga çã o da est é ti -
ca e da pol ítica da mem ó ria e do hist ó rico venha a dar bons resul -
tados decorre diretamente da distin çã o entre as três dimensões.

Sobre o uso do paradigma

Que fun çã o possui a elabora çã o e a explica çã o desse tipo de


paradigma do pensamento histórico? N ã o se trata apenas de inte-
resses cognitivos que se voltam para o pensamento histórico e fa -
zem dele objeto de uma an á lise filosófica ou epistemol ógica. Em
primeiro lugar, esse paradigma serve à auto-afirmação reflexiva da
pr á tica do pensamento hist ó rico. Nessa fun çã o, o paradigma goza
de uma longa tradição na ciência da história e na historiografia.23

cf. Jõ m Riisen, Historismus ais Wissenschaftsparadigma . Leistung und Grenzen ei -


nes strukturgeschichtlichen Ansatzes der Historiographiegeschichte, in : Otto
Gerhard Oexle, Jõ rn Riisen (eds.), Historismus in den Kultunvissenschqften. Ges
chichtskonzepte, historische Einschdtzimgen, GnmdJagenprobletne (Beitrã ge zur
-
Geschichtskultur, vol.12). Col ónia, 1996, p. 119-138.
22
A afirmação de que a concepção teó rica da matriz adota uma ó tica distorcida
por práticas pré- modernas no m ínimo passa ao largo de minhas intenções.
Cf . meu debate com S. Fisch , Geschichte und Gesellschaft .
'
Cf . Horst Walter Blanke, Von Chytraeus zu Gatterer. Eine Skizze der Historik
in Deutschland vom Humanismus bis zur Spá taufkl á rung, in : Horst Walter
Blanke, Dirk Fleischer, Aujklárung und Historik. Aufsátze zur Ennvickiung der
166
J õ rn Rusen

Essa auto-afirmação refere-se à s rela ções internas e externas do


pensamento histórico, da pr á xis da pesquisa hist órica e da historio-
grafia.
Trata -se de uma operaçã o mental na qual sã o investigados e
apresentados o tipo de racionalidade do pensamento hist ó rico e a
forma característica com que esta aparece nos crit é rios determi-
nantes da pr áxis historiográfica. Nesse procedimento, é funda-
mental a intenção de preservar e de desenvolver essa racionalidade ,
assim como de modificá -la em sua respectiva tipicidade. A id é ia do
paradigma é um elemento argumentativo da racionalização. Ela
exerce uma função ordenadora dos m ú ltiplos procedimentos da
pr á xis hist ó rica . Isso ocorre mediante uma reflexã o que desvele as
pretensões de racionalidade dessa pr á xis e se articule em torno
delas. A raz ão é tematizada e buscada, como crit é rio de sentido do
pensamento histó rico e da historiografia , no trato reflexivo de sua
estrutura paradigmá tica.
Essa tend ê ncia racionalizadora no uso do paradigma é mais
antiga do que a profissionalizaçã o e a cientificização do pensa-
mento hist ó rico. No período moderno de seu desenvolvimento,
poré m, ela alcan ça um refinamento especial ao concentrar-se no
m é todo hist ó rico como garantia regulativa do progresso do conhe-
cimento . Cientificizaçã o significa , pois, que os crit é rios racionais
do sentido hist ó rico são formalizados no processo de interpretaçã o
que traz a experi ê ncia do passado ao presente , do ponto de vista
met ódico. ( Modifica -se, assim, a concepçã o de mé todo: de um
conjunto de regras da produ ção historiográfica , ele passa a um con -
junto de obras dos processos de conhecimento.)24
A pretensão de racionalidade da auto-afirmaçã o reflexiva do
pensamento hist ó rico, concentrada no m é todo, vem sendo criticada
h á algum tempo. A crítica toma como ponto de partida a correlaçã o
íntima entre a pretensã o de racionalidade mediante reflex ã o sobre
paradigmas e a id éia de progresso moderna. Com a perda de plau-
sibilidade da id é ia de progresso, desapareceria a capacidade de

Geschichtswissenschqft, Kirchengeschichte und Geschichí stheorie in der


deutschen Aufklârung , Waltrop, 1991, p.113-140.
Cf . J õ rn Rusen , Konjlgurationen des Historismus. Studien zur deutschen JVis-
senschaftsku/ tur, Frankfurt , 1993, p. 58 ss.
Raz ã o hist ó rica 167

convencimento das noções de paradigma em que predomine uma


racionaliza çã o metodológica progressiva. Na medida em que o
progresso apareça como catastrófico em si, a racionalidade do pen -
samento hist ó rico explicada por paradigmas sucumbe à crítica ra-
dical . Com uma frustra çã o crescente com respeito à emancipa çã o e
com a experiê ncia da crise de sentido, dela decorrente, a pretensã o
de racionalidade do pensamento hist ó rico fragiliza-se . Ela aparece
como elemento de uma evolu çã o civilizat ó ria incapaz de evoluir
para o futuro, como parte de uma pretensão universal de hegemo-
nia de uma racionalidade que coloca cada vez mais em risco a pos-
sibilidade de se viver em um mundo humano mediante apropriaçã o
da natureza .
Essa cr ítica tem aparecido com ê nfases diferenciadas e em
muitas formas de argumentação. De forma esquem á tica e reduzin -
do a quest ão de modo ideal-t ípico a oposi ções simplificadas, trata-
se de uma crítica que prefere a id é ia de divergê ncias e contradi ções
à noçã o de uma ordem transversal do mundo humano. Wolfgang
Welsch , por exemplo, diagnostica uma “ perda definitiva do orde-
namento disciplinado e da bela transparê ncia do mundo”,25 à qual
teria de corresponder uma nova concepção de razão. Diversidade e
diferen ça opõem -se a unidade e identidade , assim como formas
dialogais de pensamento opõem -se às monológicas, racionalidade
estética à met ódica, sentido difuso a sentido intenso, razã o simbó-
lica (que se preocupa com as lacunas estruturais) à razã o narcisista
(que corre atrás de ilusões da totalidade - Lacan), feminilidade
contra masculinidade, estrat égias da inclusão 11a formação de iden-
tidades segundo princípios do reconhecimento às estrat égias da
exclusã o com suas consequ ê ncias discriminat ó rias, um relativismo
culturalista a um universalismo eurocêntrico.
Essas contraposições expressam resumidamente a crítica pós-
moderna à racionalizaçã o como crit é rio hist órico de sentido, que vê
nesta a expansão da hegemonia da raz ã o humana.
Contra isso buscam -se novos potenciais da razã o. Natural -
mente essa crítica n ã o é nova , pois vem sendo formulada desde o
in ício do processo moderno de racionalização. Isso n ã o quer dizer,
todavia , que ela deveria ser ignorada ao se usar o paradigma para a

7:1
Welsch , Vermmfí (nota 2), p. 47.
168
Jorn Rusen

auto-reflex ã o do pensamento histórico. Com respeito à histó ria, as


oposi ções podem ser esboçadas da seguinte maneira:
• Uma experi ê ncia catastrófica da ruptura, com relev â ncia cate -
gorial , é oposta à categoria tradicional de progresso e à id éia
an á loga de hist ó ria como inter -rela çã o gen é tica entre passado
e presente.
• A percepçã o do sentido, na acepção da aceita çã o e da adoção
dos potenciais de interpreta çã o e compreensã o do passado, é
contraposta ao ju ízo do passado com base em crit é rios da ra -
zão cr ítica.
• Representa ções de um controle da hist ória, mediante intui çã o
da regularidade legaliforme intrínseca a seu processo, sã o re -
jeitadas em benef ício das propostas hermen ê uticas de busca
de um sentido próprio à vida humana passada, que poderia
funcionar como cr í tica da domina çã o no contexto cultural de
orientação atual.
• Estrat égias excludentes da constituiçã o hist órica da identidade
e o respectivo eurocentrismo são recusadas e substituídas por
propostas de uma constituição includente da identidade , na di -
reçã o do reconhecimento da diferença cultural, vale dizer, a
categoria da identidade hist ó rica é problematizada em favor
da ê nfase no n ão-id êntico.26
• A predomin â ncia da racionalidade metódica tem de ser revertida
em favor de uma atenção maior aos elementos est é tico-racionais,
em benef ício da historiografia como fator de constituição do
sentido da representa ção hist ó rica .
• M é todos hermen ê uticos sã o contrapostos aos anal íticos, o
sentido pró prio ao passado é destacado, em contraste com sua
vincula çã o gen é tica ao presente .
A considera çã o do agir tem de ser pelo menos completada
com a consciência do sofrer, quando n ã o substitu ída por esta .27
Uma “ teoria hist ó rica do perigo”, baseada na filosofia da his-
t ória de Walter Benjamin, é contraposta às tradições at é agora
~
’ Por exemplo, em J íirgen Manemann , Nach dem Historikerstreit. Versuch einer
Situationsbeschreibung der deutschen Geschichtswissenschaft nach 1945 (2),
Orientierung 59 (1995), p. 198-201, especialmente p. 200.
97
Johann Baptist Metz, Monotheismus und Demokratie . Uber Religion und Poli -
tik auf dem Boden der Moderne, in: J íirgen Manemann (ed .), Demokiatiefàhi-
gkeit (Jahrbuch Politische Theologie, vol . 1, 1996), Miinster, 1995, p. 39-52,
especialmente p. 45 .
Raz ã o histó rica 169

dominantes na ciê ncia da hist ória, nas quais a história é entendida


como um processo evolutivo abrangente, sustentado por crit é rios
objetivos de socialização humana. Esses crit é rios sã o dilu ídos herme-
neuticamente pela lembrança de esperan ças frustradas, do sofrimento
e da decad ê ncia. Dessa alteridade do passado assim radicalizada em
contraposição à auto-afirma ção hist órica do presente são engendradas
novas representação ut ópicas do futuro, desestabilizadoras da segu -
rança das orientações culturais estabelecidas.
As formula ções paradigm áticas já não devem mais servir para
identificar a plenitude da diversidade do pensamento hist órico
como um tipo inequ ívoco de racionalidade, mas sim destacar sua
pluralidade, sua divergê ncia e ambival ê ncia, suas m ú ltiplas e hete-
rogé neas media ções das muitas estrat é gias de pensamento e formas
de apresenta çã o. Agora, os temas sã o: diferença, pluralidade, mu -
tabilidade, ambivalê ncia, contingê ncia, proximidade com a experiê n-
cia real , d éficits de sentido, sentidos difusos.
Isso tudo aparece como sendo o fim da tematiza ção tradicional
dos paradigmas hist ó ricos, como a rejei çã o definitiva de sua pre-
tensão de racionalidade e como a obsolescê ncia irreversível do
objetivo do pensamento hist órico de fundamentar reflexivamente o
paradigma de suas pretensões de racionalidade. Mas o que aconte-
ce é justamente o contrá rio. Os pontos de vista listados são todos
enunciados como sendo racionais, contra a desrazão - criticamente
combatida - das pretensões de racionalidade levantadas at é hoje.
Permanece, por conseguinte , a opera çã o reflexiva em que os para-
digmas sã o desenvolvidos e fundamentados. Ela chega mesmo a
alcançar novas dimensões e potencialidades cr íticas. Como n ã o
existe uma racionalidade ú nica, mas sim diversos tipos de raciona-
lidade, trata -se agora de desenvolver um tipo de racionalidade da
constituiçã o histórica de sentido na forma de um paradigma que
resista à crítica feita á racionalidade at é agora dominante no pen -
samento hist órico moderno e que se exprima em pretensões con -
vincentes de racionalidade. 28

21
^ A filosofia iniciou -se com a renovação das pretensões de racionalidade. Cf . em
particular Welsch , Vemnift ( nota 2), e també m: Karl -Otto Apel , Matthias Kettner,
(eds.), Die eine Venmnft tmd die vielen Ratioualitàten , Frankfurt/ M., 1996; um
outro exemplo: Bert Olivier, Beyond hierarchy ? The prospectus of a different form
of reason , South African Journal ofPhilosophy 15 (1996), p. 41-50.
170
J õrn Rusen

A concepção de um paradigma do histórico que resista a essa


cr ítica e que satisfa ça essas pretensões de racionalidade tem de
desvencilhar-se da id éia de que somente exista um paradigma ú ni -
co, de forma un ívoca e determinadora da pr á xis. N ão se abre m ã o,
todavia , da id éia de que o pensamento histórico seja conformado
por paradigmas e de que seu tipo pr óprio de racionalidade apareça,
como paradigma, na pr á xis da histó ria; essa id éia é apenas reduzida
a um esquema, cujo preenchimento pode assumir as mais diversas
formas, admitindo assim , em si mesmo, a pluralidade e a diferen ça .
A idéia desse esquema serve ent ão para esclarecer e tornar acessí-
vel a complexidade das estrat égias determinantes da constitui ção
de sentido. Diferen ça e pluralidade n ão são incompat íveis com
coer ê ncia . A tarefa e a pretensã o de racionalidade de uma hist ó ria
cuja auto-afirmação passa pelo paradigma consistem , por conse-
guinte, na identificaçã o de um perfil coerente para essa pluralidade
e diferen ça , e em sua explicitaçã o reflexiva , sem manipul á -la ou
descart á -la. Essa pretensão capacita o paradigma narrativo da prá-
xis hist ó rica , que se realiza na plenitude do diferente, a emergir e a
motivar a hist ória a n ão proceder mais de maneira cega, mas sim
esclarecida sobre si mesma . Uma pretensão de racionalidade dessa
vai al é m de uma mera racionalidade metódica. Ela se espraia pela
rede das dimensões cognitivas, pol íticas e est é ticas da constitui ção
hist órica de sentido e desperta potenciais de racionalidade no mais
das vezes impl ícitos ou mesmo velados na autodefiniçã o da hist ó-
ria como disciplina cient ífica especializada (o potencial racional
dos princípios universais do direito na política, e os da criação li -
vre , na est ética , por exemplo).

A narração do não-narrável - o malogro da constituição histó-


rica de sentido como condi çã o necessá ria de seu ê xito

A narrativa hist ó rica tem de negar -se a si própria , tem de supe-


rar-se como narrativa para poder convencer como constitui çã o
histórica de sentido no horizonte das experiê ncias modernas do
tempo. Em nossos dias, a narrativa hist órica só convence quando o
constructo significativo de uma história, por ela configurado, torna
transparentes e cognoscíveis a ausência, a lacuna ou a nega çã o de
Raz ã o histó rica 171

sentido nos conte ú dos interpretados do passado experimentado.


Uma hist ó ria que sustente , no â mbito da experiê ncia histórica,
existir um significado cont í nuo e sem quaisquer rupturas da cons-
tituição temporal do homem e de seu mundo, de maneira que a
hist ó ria assim apresentada possua um sentido fechado, é uma men-
tira . Diante das experiê ncias do vazios de sentido vividas no século
XX, das quais a mais radical e t ípica é certamente o Holocausto,
n ã o se pode argumentar de outra forma .
Seria terrível para o pensamento hist órico em geral, mas igual-
mente para a elabora çã o interpretativa do Holocausto, se a deficiê n -
cia fundamental de sentido que se revela nele, sua absoluta falta de
sentido como experi ê ncia hist órica, se esgotasse nele. O Holocausto
assumiria assim sí aí ns quase mítico, desistoricizado, com o qual se
elevaria a uma espécie de significado pararreligioso (correspon -
dente a uma constituição de sentido29 compar á vel a uma teologia
negativa), transformando-se assim em material explosivo para a
orientaçã o pol ítica.30 De forma alguma. Como experi ê ncia-limite, o
Holocausto serve para reforçar uma qualidade gené rica da inter -
pretaçã o que torna presente o passado, como exemplo do lado
sombrio da história, das trevas do sentido hist ó rico, do car á ter rui -
noso do prolongamento temporal do passado até o presente.31
O Holocausto representa , pois, uma qualidade da experiê ncia
na rela ção temporal tensa entre passado e presente , a ser devida -
mente levada em conta por um tipo apropriado de constituição nar-
rativa de sentido. As formas historiogr áficas de narra çã o adequadas

29
Sobre suas potencialidades e limites, cf . Christoph Miinz, Der JVe /í ein Ge-
ddchtnis geben. GescIiiclitstheologisdws Denken im Judentwn ncicJi Ausclnvi/ z
(Giitersloh , 1995).
30
Um exemplo atual da problematização, na qual o Holocausto é instrumentaliza -
do para fins pol íticos de formação de identidade, é o livro de Daniel J . Goldha-
gen ; cf . Gulie Ne eman Arad , Ein amerikanischer Altraum . Zum kulturellen
7

Kontext von Daniel Goldhagens “ Hitler’s Willing Executioners”, Frankfurter


Rundschau, 14 de maio de 1996.
31
“ Der Engel der Geschichte mu!3 so ausselien . Er hat das Antlitz der Vergange -
nheit zugewendet. Wo eine Kette von Begebenheiten vor uns erscheint, da sieht
er eine einzige Katastrophe , die unabl ãssig Triimmer auf Triimmer h á uft und sie
ilim vor die FiiBe schleudert ” (Walter Benjamin. Ú ber den Begriff der Gesclii -
chte, in: Rolf Tiedemann , Hermann Schweppenh ã user (eds.), GesatmneUe
Schriften, vol . I, tomo 2, Frankfurt/M., 1991, p. 691-704, cit. p . 697.)
172
J õ rn Rusen

a essa realidade ainda n ã o foram encontradas. A literatura narrati -


va, em suas formas paradigmá ticas do século XX ( Kafka, por
exemplo), pode fornecer alguns exemplos, ao revelar a ausê ncia de
sentido como um sentido est é tico. Como realizar essa dialética
negativa da constituição de sentido na especificidade da narrativa
hist ó rica é uma quest ã o aberta . Que ela tenha de ser formulada , no
entanto, quando se trata de realizar os procedimentos mentais e as
prá ticas culturais da constituiçã o hist órica de sentido no n ível da
experiê ncia histórica do sé culo XX, decorre da evid ê ncia mesma
de um passado objetivo que nos confronta com a ausê ncia traum á -
tica de sentido, mesmo que comecemos a lidar com procedimentos
e pr á ticas para interpret á-la. A reflex ão sobre o paradigma da
constituição hist ó rica de sentido pode servir, por conseguinte, para
explicitar essa experiê ncia pr é via e para torn á-la plaus ível na
perspectiva dos fatores regulativos do pensamento hist ó rico e da
historiografia, em conjunto com os quais ela forma um elemento
irrenunci á vel de nossa cultura .
Com isso, “sem sentido” passou a ser um ponto de vista para a
racionalidade hist ó rica . O que significa isso? Seria equivocado
concluir teoricamente, das experiê ncias horripilantes do sé culo
XX, que a história n ão tem (mais) sentido. Dessa forma, todo pen -
samento hist ó rico e toda apropriação interpretativa da experi ê ncia
do passado para fins de orientaçã o no presente tornar-se-iam ob-
soletos. A experi ê ncia da falta de sentido com que o pensamento
histórico se confronta desagregar-se -ia e a orientação temporal da
vida humana pr á tica desvirtuar -se-ia em cegas obsessões.
“ Falta de sentido” como elemento da racionalidade hist órica
quer dizer , no entanto, outra coisa . A significaçã o do passado tor -
nado presente como hist ó ria tem de ser incondicionalmente preser -
vada - e de maneira que o sentido do tempo, como fator de
orienta çã o da vida humana prá tica , vigorosamente evidenciado
pelo constructo narrativo de uma história, vá alé m dos limites da
experi ê ncia , possa mesmo contrapor -se à experi ê ncia histórica e
se torne plausível. “Sentido’7 receberia a marca empírica e lógica da
ausê ncia e da falta , sem tornar-se , contudo, um mero “ vazio”. Pelo
contrá rio: transcender a experi ê ncia dos conte ú dos emp í ricos da
mem ó ria do passado ganharia, mediante o procedimento de torn á-
la presente , uma for ça ut ó pica voltada para o futuro. N ã o se trata
Razã o histó rica 173

aqui de uma perspectiva de ação que tencione mudar o mundo por


interven ções diretas. Trata-se, isso sim, da qualificaçã o de um signifi -
cado (de uma “ plenitude de sentido ) que transcenda a experiê ncia
'7

direta e que somente por ir al é m desta pode atuar sobre as determi -


na ções de sentido do agir , dot á - lo da capacidade de durar e de
resistir na experi ê ncia possível da “falta de sentido , cuja conscienti-
'7

zação se dá no processo de interpreta ção.


A narrativa hist ó rica pode levar em conta essa dial ética nega-
tiva da constituição do sentido mediante um modo do narrar - pela
recusa e pela inversã o das estratégias tradicionais da narrativa que
constroem a hist ó ria a partir da experi ência hist ó rica , e mediante
uma reflexividade intensificada do modo narrativo, com a qual se
demonstra o alcance limitado dos crit é rios de sentido utilizados.
Pela integração da “inenarrabilidade da hist ória, como condi -
"

çã o da narrativa hist órica , a razã o hist ó rica torna-se modesta e apta


a tomar conhecimento de algo diverso dela mesma . Ela abre a vi-
sã o hist órica ao inconsciente e articula sua rela çã o com a experiê n -
cia e com os super ávits de sentido do agir humano que v ão além da
experiência concreta . Ela confere ao princ í pio da diferen ça , da plu -
ralidade, da particularidade e da negatividade uma força regulativa
na interpreta çã o do passado, de que as concepções modernas de
razã o histórica , identidade coerente, universalidade do desenvol -
vimento e efetividade das idéias de sentido (como, por exemplo, 11a
categoria do progresso) n ã o dispunham .

Observação final sobre a razão da história

As reflexões sobre o paradigma narrativista que potencializa a


racionalidade do pensamento hist ó rico n ã o sã o um apê ndice a esse
pensamento, mas um momento dele. Como se relacionam razão e
racionalidade? A raz ã o é mais do que a racionalidade, mas nada é
sem esta. O que é ela , a mais? Razã o é um saber referente aos mo-
dos de opera çã o da argumentaçã o racional e, simultaneamente , a
capacidade de sintetizar com coerê ncia os diversos tipos de racio-
nalidade presentes no pensamento hist ó rico, sem reduzir sua plura-
lidade à uniformidade. E racional articular o leque dos m ú ltiplos
tipos de racionalidade em uma racionalidade própria ao pensa -
174 J õrn Rusen

mento hist ó rico. Raz ã o é “ transi çã o ( Wolfgang Welsch) de um


"

modo de argumentar para o outro, de uma relação com a experiê n -


cia para uma rela çã o com a práxis, dos elementos n ã o narrativos
para os elementos narrativos da constitui çã o hist órica de sentido.
Somente a racionalidade hist órica que tematiza a si mesma e se
auto-esclarece é racional. Somente nesse auto-esclarecimento os
crit é rios de sentido constitutivos da narrativa hist ó rica tornam -se
visíveis e , destarte, argumentativamente exprim íveis, percept íveis,
intercambi á veis. A racionalidade faz-se “constituidora de sentido”
e, assim , racional. Enunciam-se e levam -se claramente em conta,
enfim, as diferenças e a diversidade de fatores e modos do acesso à
experi ê ncia do passado, à apreensã o da experi ê ncia , a sua inter-
pretação e à aplicação dos constructos hist óricos de sentido produ-
zidos pela interpreta çã o das carências de orienta çã o da vida prá tica .
E ó bvio que isso n ã o acontece de forma arbitrá ria , mas exclusiva -
mente de maneira que os diversos potenciais de sentido se amplifi-
quem 11a rela çã o entre si, també m e sobretudo quando se tratar da
preserva çã o de cada “sentido pró prio” respectivo ao estético, ao
pol ítico, ao cognitivo e a todos os demais campos e perspectivas de
sentido. A razã o promove a intera çã o entre todos esses campos,
sem dissolver um 110 outro. Ela media, sintetiza e amplia a coerê n -
cia na diversidade. '2

32
Tradicionalmente, esse modo de racionalidade é chamado de “ dial é tico ” .
Wolfgang Welsch chama -o de “transversal”, mas a semelhan ça com a dial é tica
é inegá vel . Ele chega a utilizar os termos “dial é tico ” e “ transversal ” no mesmo
sentido; cf ., por exemplo, Vermmft ( vide nota 2), p. 897 e diversas outras pas-
sagens.
Horizontes

Tem todo autor, ao escrever.


Algo que o leva a fazer .
Algo assim tinha també m Alexandre
E com ele todo herói grande.
Johann Wolfgang Goethe 1

A quest ã o inicial sobre a razã o na hist ó ria devia ser respondida


com a demonstra ção das potencialidades racionais que o pensa-
mento hist órico, em princípio, detém, e que devem (deveriam ) fru-
tificar de modo especial na hist ória como ci ê ncia. A metodiza çã o
das opera ções de fundamenta çã o do pensamento hist órico, deter -
minantes para a ci ê ncia como hist ória , apresenta potencialidades
ó timas de racionalidade. A hist ória como disciplina especializada ,
tal como a teoria da hist ória faz transparecer em seus fundamentos,
é uma instituiçã o em que essas potencialidades est ã o institucionali-
zadas. Como essa institucionaliza çã o ocorre, em pormenor, ou seja ,
como a hist ó ria se constr ói a partir dos fundamentos mostrados
aqui , precisa ainda ser exposto.
Como institui çã o, a hist ó ria continua sendo uma atividade
cient ífica , isto é , um constructo no qual cada realiza çã o das po-
tencialidades racionais institucionalizadas est á permanentemente
exposta a influ ê ncias e exigê ncias heterogé neas, a obst á culos, a
bloqueios e mesmo a recuos. O quadro complexo da objetividade
hist órica , exposto no capítulo 3, nunca é claramente transparente,
nos processos e produtos concretos do pensamento histórico, na
elaboração de suas teorias, nas suas regras met ódicas e no modo
como a hist ória é apresentada e utilizada nos processos de orienta-

J. W. Goethe, 28.8.1765 (Edição do Jubileu 3, p. 41).


176
J õ rn Rusen

ção temporal da práxis social , de maneira que seja possível vê-lo


imediatamente. As potencialidades de o conhecimento histórico ser
racional podem ser mais ou menos utilizadas ou desperdiçadas.
Assim sendo, a racionalidade do pensamento hist órico n ã o decorre
de uma mera vontade de manter em atividade a ci ê ncia da hist ória
ou de buscá -la como fim em si mesma. Essa racionalidade alimenta -se
de considerar a atividade científica como a oportunidade de utili-
zar, da melhor forma possível , a razão de que cada um dispõe, nas
diversas modalidades dessa atividade . Nessa medida , as potenciali -
dades racionais do pensamento histó rico esboçadas aqui são um
constructo intermedi á rio entre o que a ci ê ncia da hist ó ria é e o que
se desejaria que ela fosse.
Com tudo isso ainda n ã o se mostrou a razã o da hist ó ria na es-
trutura especializada da ci ência da história. A teoria da hist ó ria tem
de ir al é m do cí rculo profissional da disciplina e examinar també m
os efeitos da ci ê ncia da hist ó ria . Como o pensamento hist ó rico
exerce uma fun çã o pr á tica e fundamental de orientação, é inevit á-
vel a pergunta sobre como se pode utilizar, na pr á tica , as potencia -
lidades racionais peculiares da ciência da história. Objetividade
hist ó rica n ã o pode significar que o produto cognitivo da ci ê ncia da
história deixe de ter qualquer função orientadora. A questã o é saber
como a ciê ncia da hist ó ria a exerce.
Os processos científicos espec íficos do progresso cognitivo, da
amplia çã o das perspectivas e da consolidação da identidade levam
o pensamento hist órico para al é m da realidade concreta da vida
pr á tica, da qual se origina. A ciê ncia da hist ória n ã o se restringe
aos horizontes da experiê ncia , aos significados e aos crit é rios de
sentido que lhe sã o dados no contexto social , mas supera esse
quadro de orienta çã o da vida pr á tica na medida em que em parte
confirma, em parte critica conte ú dos empíricos do pensamento
histó rico e completa -os qualitativamente com novas experi ê ncias
histó ricas. O mesmo acontece com respeito às diversas situações
contempor â neas de interesses sociais, verdadeiras perspectivas
pr é vias da rememora çã o hist ó rica: a ciê ncia da hist ó ria n ã o fica
presa a elas, como a instru ções, mas modifica -as e amplia-as se-
gundo suas possibilidades cognitivas. Algo semelhante se d á com
as idé ias formadoras de sentido: com efeito, os historiadores n ão
desativam metodicamente as id éias correntes na vida pr á tica social ,
Raz ã o histó rica 177

com as quais se forma o sentido da experi ê ncia do tempo, e ado-


tam, em seu lugar, id é ias pr óprias com pretensã o de validade uni -
versal . Eles tampouco seguem cegamente as id é ias correntes em
sua cultura e as interpreta ções que se fazem , com essas id é ias, do
sentido das mudan ças do homem e de seu mundo no tempo. Pelo
contr á rio, eles enriquecem e modificam qualitativamente os mo-
delos interpretativos da experiência do tempo, empregados pelo
senso comum na vida social, com o princípio de um debate racio-
nal e argumentativo, determinante do pensamento histórico como
ciê ncia.
O pensamento hist ó rico fornece, no â mbito de suas potenciali-
dades racionais institucionalizadas como ciê ncia , mais orientações
no tempo que os processos concretos da vida pr á tica social conse-
guem absorver. Como ci ê ncia, a hist ó ria possui também a faceta
que Arist óteles chamava de “divina ( na medida em que, para ele ,
'7

o saber que n ã o - é produzido por sua utilidade, mas por si mesmo,


faz o homem participar da essê ncia divina).2
Hoje em dia , fala -se mais em “ ideol ógico” do que em divino e,
11a melhor das hipó teses, em “fantasioso ” ( porque muitos n ã o
conseguem mais imaginar algo de racional para o divino). Esse
superá vit cognitivo com respeito às carê ncias prá ticas de orienta-
çã o n ã o se torna , com isso, supé rfluo, mas um est ímulo e uma
oportunidade de liberar, intensificar e utilizar as potencialidades
racionais presentes na vida pr á tica dos historiadores e de seu
p ú blico.
Com outras palavras: se indiv íduos, grupos e sociedades se
encontram em um contexto interativo no qual buscam interesses
diferentes e mesmo contradit órios, ent ã o podem meter -se em um
conflito de interesses na melhor das t é cnicas estratégicas e procura-
r ã o servir -se do conhecimento hist ó rico como arma nessa guerra
(e n ão faltarão historiadores a fornecer-lhes a munição necessá ria).
Na medida , por é m, em que o pensamento hist órico utiliza suas
potencialidades racionais, esse tipo de arma é de pouca utilidade.
Há muito mais a conseguir se as partes conflitantes se decidirem a
resolver seus conflitos pacificamente . Nessa hipó tese, n ão se trata
mais de negar m ú tua e teimosamente os diversos interesses de cada

2
Aristóteles, Metafí sica, 982 b.
178
J õ rn Rusen

um , mas esforçar -se pelo reconhecimento recíproco do modo pelo


qual buscam seus interesses respectivos. A hist ó ria como ci ê ncia
teria condi ções, com sua pretensão de racionalidade , de fornecer as
orienta ções hist ó ricas necessá rias para esse reconhecimento. Nessa
função pr á tica ela n ã o estaria sofrendo abuso, mas estaria sendo
honrada .
Essa honra tem um avesso: o padr ão de objetividade do co-
nhecimento histórico exige da disciplina especializada sensibilida-
de para as carê ncias de orienta çã o de seu tempo. A ci ê ncia da
hist ó ria só poderia ignorar as carê ncias de orienta çã o de seu tempo
pagando o preço do enfraquecimento de sua validade, isto é, da
debilita çã o de sua objetividade. As carências de orienta çã o da vida
social concreta , na qual a hist ó ria como ci ê ncia se efetiva , podem
ultrapassar as orienta ções produzidas pela ciê ncia da hist ória. Se e
at é que ponto a ci ê ncia da hist ó ria é capaz de evoluir ( de acordo
com as regras metódicas do progresso cognitivo, da amplia çã o de
perspectivas e da consolida çã o de identidade) depende, afinal,
també m da medida em que for sensível ao fluxo cont ínuo das
quest ões da vida humana pr ática que v ão al é m de suas respostas.
Bibliografia

A bibliografia selecionada , aqui apresentada , re ú ne apenas as


obras que foram importantes para minha reflex ã o própria, que
apresentam outros referenciais e com as quais se pode aprofundar
no vasto campo da teoria da hist ória . Certo arbítrio foi inevit á vel , e
seguramente deixei escapar coisas importantes (sobretudo na bibli-
ografia mais recente). Como escusa permito-me dizer que, 11a con -
corrê ncia permanente entre ler tudo o que se escreve e produzir
uma teoria d á hist ória, prevaleceu esta ú ltima (do contrá rio, jamais
teria conseguido escrever este livro).

Bibliografias, coletâ neas, obras gerais e peri ódicos

Bibliografias

BERDING, H. Bibliographie zur Geschichtstheorie. Gõttingen, 1977.


KLEIN, M. Bibliography of writings on historiography and the
philosophy of history. I11: GOTTSCIIALK (ed .). Generalisation
in the wrilingof history. Chicago, 1963, p. 213-247.
LlGOTA, C. R ., STRASSFELD, R . Bibliography of works in the
philosophy of history 1973-1977. Wesleyan, 1979.
NOWICKI, M . Bibliography in the philosophy of history 1958- 1961 .
Haia, 1964.
PRUITT, S., WiTSCHI - BERNZ, A. Bibliography of works in the philo-
sophy of histojy 1969-1972, 1966-1968: Addenda , Wesleyan,
1974.
RULE, J . C. Bibliography of works in the philosophy of history
1973- 1977. Haia, 1961.
SOCIÉTÉ PHILOSOPHIQUE DE LOUVAIN (ed .). Répertoire bibliogra-
pliique de Ia pliilosophie, vol . 1. Lovaina, 1949 ss.
180
J ò rn Rusen

Coletâneas e obras gerais

FABER , K.-G . Zuni Stand der Geschichtstheorie in der Bundesrepu -


blik. Jahrbuch der historisclien Forschung 1976/77 . Stuttgart ,
-
1978, p. 13 28.
MUHLACK , U . Probleme einer erneuerten Historik. Historisclie
Zeitschrift, vol . 28 (1979 ) , p. 335-364.
R ÒTTGERS, K. Neue und erneuerte Historik. Beitrá ge zu einer
Theorie der Geschichte. Zeitschrift fiir philosopliische Fors
chung, vol . 33 (1978), p. 264-281.
-
SCHLEIER , H. Theorie der Geschichte, Theorie der Geschichtswis
senscliaft. Zu neueren theoretischen und methodologischen
-
Arbeiien der Geschichtsschreibung in der BRD. Berlim , 1975.
SELFERT, A. Geschichte oder Geschichten . Historie zwischen Meta -
physik und Poetik. Historischer Jahrbuch 96 (1978), p. 390-410.
. Geschichtstheorie. Eine Bestandsaufnahme in
reorientierender Absicht. Philosophische • Rundschau 27 (1980),
p. 161-185.
WEYMAR, Ernst . Geschichtswissenschaft und Theorie. Ein Litera
turbericlit. Stuttgart , 1979.
-
. Dimensionei] der Geschichtswissenschaft. Ges -
chichtsforschung - Theorie der Geschichtswissenschaft - Didaktik
der Geschichte. Geschichte in Wissenschaft und Unterricht 33
(1982), p. 1-11, p. 65-78, p. 129-153.

Periódicos

HlSTORYAND THEORY . V á rios n ú meros ( Ia ed . 1960).


HISTOR1CAL METHODSNEWSLETTER. V á rios n ú meros ( Ia ed. 1967).
THEORETISCHE GESCHIEDENIS . V á rios n ú meros ( Ia ed . 1974).
STORIA DELLA STORIOGRAFIA. RJVISTA INTERNAZIONALE. V á rios
n ú meros ( Ia ed . 1982). (Em italiano, francês, inglês e alem ã o).

Manuais e dicioná rios

BERGMANN, K ., KUHN, A., R úSEN , J ., SCHNEIDER , G . (eds.).


ITandbuch der Geschichtsdidaktik . D íisseldorf , 1979. 2 v.
BESSON , W. (ed.). Das Fischer Lexikon. Geschichte. Frankfurt , 1961.
í ndice

A Competê ncia de pesquisa, compe-


tê ncia profissional, 16, 27, 38,
Agir e sofrer, 12, 23, 30-31, 57-60, 41-42, 47, 144
66, 81, 93, 99 Comunicação, 44, 51, 143- 145
Agostinho (santo ), 78
Comunicação, comunidade de, 143-
Apel , Karl -Otto, 145
Apresentação, 34-38, 45-47 147
Argumentar, argumenta ção, 19, Conhecimento, processo do ( pro-
21-23, 44, 47, 111, 123, cesso cognitivo), 25 , 27, 33,
134-135, 140-145 47, 72, 128
Aristóteles, 177 Conhecimento, progresso do (pro-
gresso cognitivo), 28, 43-45,
B 47, 103-104, 108, 115, 118,
124, 126, 138-139, 143, 146,
Baumgartner, Hans Michael , 64 176, 178
Beard , Charles, 133
Consciê ncia hist ó rica, 12, 22, 30,
Becher, Ursula , 56
Benjamin , Walter , 168 36, 48-67, 71-75, 77-86
Berding, Helrnut, 16 Conte ú do factual, 91, 100-110,
Berger, Peter, 57 113, 139
Burckhardt , Jacob , 28, 121-122 Contingê ncia, 60
Continuidade, representação da,
C 64-66, 81, 89-91, 111, 127,
143, 145-146
Carê ncias: cf. interesses; orientação Cr ítica, 14, 81, 83, 90, 102, 142
Ci ê ncia especializada, 27, 33-36, Cronografia , 131
54, 123, 175-176
Ci ê ncias naturais, 95-98, 121
Cient ífica, 95-97 D
Cientificidade, 37, 40, 96, 144,
147, 150, 166 Danto, Arthur C., 154
Cientificismo, 95-96 Decisionismo, 71-72
Raz ão histórica 193
192 Jõrn Rúsen

Didática, 48 -51, 92 H K Natureza, 57, 66, 78-79, 133


Normas, normalividade, 19-20,
Dilthey, Wilhelm, 150
Dogmatismo, 71 -72, 111, 114.137 .
llabermas, Jiirgen 145, 151 Kafka, Franz, 172 88 -93, 100-118, 122 128- .
Droysen, Johann Gustav, 19, 27- ória, 11-15, 22-23, 25 -26,
Hist .
Kant Immanuel, 22 133, 136, 140- 142

. .
28 67-68, 77 121, 123, 150, -
31 33, 36-39, 44, 53 56, . .
Kocka Jiirgen, 16, 72, 119-122
155 - .
67 76, 78-85 96, 118- 119 Kon, Igor, 136 O
Historicidade, 77 -81 Koselleck, Reinhardt, 16
Historicismo, 136 Kuhn, Thomas, 29, 152 Objetividade, 39, 100, 126 - 139,
E
Historiografia, cf. pesquisa liist ó- -
146 - 147, 175 176, 178
rica L Objetividade construtiva, 142-
Emancipação, 127, 142 Humanidade, 126, 128, 143 -146 147
Enciclopédia, 28 llusserl, Edmund, 57 Lacan, Jacqucs, 167 Objetividade de consenso, 140 -141
Esquecer, 84 Lembranç a(s), 62-72, 84, 176 Objetivismo, 67, 71
Experimentar, experiência, 12, I .
Liibbe, Hermann, 66 121, 138 Orientação, carências de orien-
20, 23, 32, 44, 57-58, 61, Luckmann, Thomas, 57 tação, 13, 22, 30-36, 40- 44,
69 -73, 88-91, 99-104, 108 - Ideia regulativa, princípio regu- Lutz, Heinrich, 142 .
49, 63-64 73, 105 - 106, 109,
110, 122, 162 lativo, 116-117.143 -146 125- 128, 145- 146, 162-163,
Ideias (perspectivas orientado - M 177-178
F ras), 31-36, 44, 91-92, 100, -
Orientação existencial, 34 36, 63,
. .
102, 105 107 118, 120, Marx, Karl, 57 77-78, 91, 118, 143
Faber, Karl- Gcorg, 53, 132 133, 142-145, 176- 177 Marxismo, marxismo-leninismo,
Facticidade, 62, 106 Identidade, 56, 66, 86, 90, 125 - 70, 136 P
Ficção, 61 -62, 80 .
128 132, 142, 146, 176, 178 Materialismo histórico, 70, 72
Ideologia, 40, 124, 177 Matriz disciplinar, 29 -32, 35 -38, Paradigma, 152, 161, 165-170
Fontes, 16, 32, 34, 41, 91, 102-
103, 107, 120, 130
Intencionalidade, 31-32, 57 -58 . 44, 50 Particularidade, 27, 114, 130

Formação histórica, 48-51


.
76 78-81, 88, 108 .
Meier Christian, 16 Partidarismo, 100, 126-127, 129 -
Fundamentação, objetividade da,
. . .
Interesses, 30 -38 40, 43 46 71, Metateoria, 15 - 18, 38 139

138, 140
111-114, 126-136, 140- 141, .
Método, metodização 33 -36, 44, Perda de si, 60, 66

Fundamentar, fundamentação, 14-


176- 178 .
97- 103. 108 113. 115. 117 - .
Pcrspectiva 46, 63-65, 109 -118,
-
Interpretação, auto interpretação, 118, 120-126, 130, 140, 142, 124, 126, 130, 133, 140 143, -
-
15, 17, 19 23, 26, 33, 41, 43 - 28, 32, 40, 55, 57-60, 68, 143 -144, 162, 175 146- 147, 176 - 178
46, 53-54, 86-87, 91-92, 99- 72, 87, 98, 162 Pertinência, cf. verdade
Mommsen, Wollgang, 131
101 Interpretação, modelo de, 32, 177 Pesquisa histórica, 13 -17, 26 27,.
Irracionalidade, 40, 142 N .
34, 36, 45- 47 101, 103 -107
Plausibilidade, cf. verdade
J Narrativa, 61-66, 69, 73-75, 89- Pluralismo, 72, 133, 137
G .
90, 104 111, 116 -123, 132, Práxis, funções práticas, 13, 22 -
Jeismann, Karl -Ernst, 56 146, 149 ss., 160- 161, 163, .
23, 26, 30-38 41-42, 48 - 49,
.
Gumbrccht Hans Ulrich, 61 Junker, Dctlef, 131 170 53-60, 73 -80, 88-91, 116, 126
194 Jõm Rusen

Pré - hist ória, 73 -77. 90 Subjetivismo, 67 -71


Profissionalização, 27, 38, 41-42,
46 T

R .
Tempo, 12 23, 33, 36, 54, 56-66,

.
Racionalidade, 17, 21 34, 38, 42, 177
.
69 71, 74, 77-84, 88-90. 126,

45-47, 49, 59, 111, 120, 134- Teoria c prá xis, 15 -22, 25 -26, 55
. .
135, 144, 151, 166 169 177 Tipo ideal. 159
Rankc, Lcopold von, 119 .
Tradição, 73, 76 -84 90, 102
Razão, 12- 15, 21-23, 44 -51, 126, Transcendência, transcender, 77,
144- 145, 147, 150-152, 173- 79-80
.
174, 175-178
Reconhecimento, 144 - 145 U
Referencial, dependência dc,
129, 136 Universalidade, 60, 140
Referencial, reflex ão sobre refe-
.
rencial, 109- 118, 124 126, V
128, 133, 140- 147
Reflex ão, auto-reflex ão, 15 -22, Validade, 99-103, 105.128, 151
25-27, 40, 42, 54, 82 Validade, pretensão dc, 85, 91-
Relatividade, 86, 103, 111- 115 101, 110-112, 117, 123, 127-
Rickert, llcinrich, 150 128, 135
Rittcr, Joachim, 122 .
Validade universal, 85 95, 127-
129, 133, 138, 144-145, 177
S .
Valores, liberdade de, 105 107,
113, 131
.
Schórkcn Rolf, 50 Verdade, 84 -97.102- 104, 156
Senso comum, 91-92, 123, 177 Vestígios, 83, 102
.
Significado, 88-91 108- 118, 122, .
Vcyne Paul, 149
127- 128 Vida prá tica, 30, 55 -57, 60, 62,
Schutz, Alfrcd, 57 66, 73, 86, 92-98, 112
Sentido, 8, 12, 21, 31- 32, 37, 40,
. .
59-62, 66 68 74- 75, 88-92, W
122- 125, 127- 132, 154-156,
160, 163, 176 Webcr, Max, 17. 31-32, 68. 72.
Sistemática, sistematização, 19-22, 107, 113, 124
35, 147 Wehlcr, Hans-UIrich, 72
Subjetividade, 39- 42, 66, 112 . Welsch, Wolfgang. 150-151, 167
Mooca » WI Sao fo ^Jo
. »
128, 132- 133, 136-141 White. Hayden, 62
ff > a
M (II ) 600 0457/60099329
*
066.047 /0001-44 .
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