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Filosofia

1. Analisar, explicar e debater a questão filosófica do conhecimento, considerando os principais


problemas e as teorias filosóficas estudadas.

Estrutura do ato conhecer:

Perspectivada como ato puro, como o fazem os fenomenologistas, e desligada de


quaisquer particularidades, a atividade «cognoscitiva» é reduzida ao ato de conhecer. A
análise fenomenológica considera apenas o conhecimento em si mesmo, atendendo
apenas à sua estrutura essencial. Assim, todo o ato de conhecer envolve um sujeito, um
objeto e uma imagem: o primeiro é aquele que conhece; o segundo é aquilo que é
conhecido; o terceiro é a representação do objeto na consciência do sujeito. O sujeito e o
objeto não se confundem, «são originariamente separados um do outro», são
transcendentes e estabelecem, entre eles, uma relação de oposição. Apesar de opostos,
um sem o outro não podem ser considerados sujeito e objeto. Com efeito, «cada um
deles apenas é o que é pela sua relação com o outro», o que significa que a sua relação
constitui uma correlação.

Conhecimento proposicional:

Quando perguntam - O que é o conhecimento? -, Os filósofos geralmente estão


interessados em esclarecer apenas o conhecimento proposicional. A perspetiva que
vamos examinar agora, apresentada por Platão no diálogo Teeteto, pode ser vista como
uma definição ou uma análise deste género de conhecimento. Note-se que, no Teeteto,
Platão não defende esta definição. Ela é introduzida e discutida neste diálogo, mas
acaba por ser colocada perante objeções que ficam por superar. Porém, dado que foi
Platão quem apresentou pela primeira vez a definição tradicional de conhecimento, não
deixa de ser apropriado designá-la por platónica. É também conhecida por "teoria
tripartida do conhecimento".

Conhecimento posteriori e priori:

Posteriori: O conhecimento a posteriori (ou conhecimento empírico) é aquele


que está dependente da experiência, seja ela sensorial ou introspetiva, para aferir da sua
verdade ou falsidade. A experiência sensorial advém dos nossos sentidos (visão,
audição, tato...), os quais nos colocam em contacto com o mundo exterior, com aquilo
que existe fora de nós. A experiência introspetiva advém daquilo que encontramos
dentro de nós (sentimentos, emoções, desejos...)

Priori: O conhecimento a priori é aquele que não depende da experiência


empírica para aferir da sua verdade ou falsidade. O conhecimento a priori é constituído
por crenças que se podem justificar recorrendo unicamente ao pensamento. Apenas as
proposições da lógica e da matemática, bem como quaisquer afirmações que possamos
saber que são verdadeiras apenas pelo esclarecimento do seu significado, constituem
conhecimento a priori.
A origem do conhecimento:

1) Racionalismo: Os racionalistas, entre os quais se inclui Descartes, geralmente


não negam que exista conhecimento a posteriori, mas pensam que, só recorrendo
à razão ou ao pensamento, podemos obter conhecimento verdadeiro. Para os
racionalistas, o conhecimento só o é quando é logicamente necessário e
universalmente válido. Por exemplo, muitos racionalistas pensam que podemos
saber a priori que Deus existe ou que a mente é distinta do corpo. Os
racionalistas supõem frequentemente que o conhecimento a priori, Descartes
chama-lhe inato, ainda que saibamos que existem diferenças, por oposição ao
conhecimento empírico, assenta em justificações certas ou infalíveis, porque
oriundas da razão. Para os racionalistas, todo o conhecimento verdadeiro
[necessário e universal] deriva da razão e constrói-se com ideias inatas.

2) Empirismo: Os empiristas, entre os quais se inclui David Hume, consideram


que o conhecimento a priori se circunscreve à lógica, à matemática e às verdades
meramente linguísticas. Os empiristas declaram que a lógica, a matemática e
todas as afirmações que são verdadeiras por definição nada nos dizem realmente
sobre o mundo, são estéreis. Pensam, portanto, que não pode existir
conhecimento a prioridos factos do mundo, ou seja, que todo o conhecimento
factual é a posteriori ou empírico. Para os empiristas, todo o conhecimento do
mundo deriva da experiência e todas as ideias têm uma base empírica; não
existem ideias inatas, a razão assemelha-se a uma "tábua rasa" onde, antes de
qualquer experiência, nada se encontra escrito.

Teoria de Descartes:
Descartes foi um filósofo racionalista, uma vez que considerava a razão a fonte
principal do conhecimento e a única origem para o verdadeiro conhecimento. Descartes
deposita uma grande confiança na razão e, por essa razão, procurou nela os
fundamentos metafísicos do conhecimento. Pois, só assim, julgava estabelecer os
fundamentos de todo o conhecimento. A Teoria do Conhecimento cartesiana (ou de
Descartes) é desenvolvida em várias obras.

O Método:

Acreditando que a razão é a origem do conhecimento verdadeiro (universal e


necessário), Descartes inspira-se na matemática para encontrar um método adequado ao
seu propósito, encontrar os fundamentos seguros para o conhecimento verdadeiro.
Descartes queria que o conhecimento tivesse uma origem exclusivamente racional e que
as ideias fundadoras assumissem um carácter evidente, propriedades que tinham as
proposições matemáticas.
A dúvida metódica:

Descartes tem o objetivo de encontrar as bases de todo o conhecimento e pensa


que, se seguir o método, poderá encontrar os princípios fundamentais e indubitáveis
para o conhecimento verdadeiro, isto é, infalivelmente justificado. Segundo Descartes,
para obtermos conhecimento verdadeiro, temos de encontrar um fundamento
inteiramente seguro para ele. Por outras palavras, temos de encontrar crenças ou
convicções que não possam ser colocadas em dúvida e a partir das quais seja possível
justificar infalivelmente outras crenças ou convicções. Segundo ele, devemos começar
por examinar as nossas crenças, utilizando a dúvida como método e rejeitar todas as
nossas crenças em que possamos imaginar a menor dúvida - talvez algumas delas até
sejam verdadeiras, mas, como não resistem aos argumentos dos céticos, não podem
servir de fundamento para o conhecimento, pelo que devem ser tratadas como se fossem
falsas. É nisto que consiste a dúvida metódica: colocar em dúvida todas as crenças,
rejeitando, provisoriamente, todas aquelas que não sejam inteiramente indubitáveis, que
não resistam ao crivo da dúvida.

O génio maligno é uma espécie de deus enganador - um ser extremamente


poderoso e malévolo que está empenhado em fazer-nos viver na ilusão. Sem que o
soubéssemos, este ser poderia controlar os nossos pensamentos e fazer-nos cometer os
erros de raciocínio mais elementares. Ora, se existir um génio maligno, mesmo na
matemática seremos induzidos sistematicamente em erro, e tudo aquilo que julgamos
existir à nossa volta não passará de uma ilusão. Descartes não está a dizer-nos que existe
um génio maligno - está apenas a dizer-nos que não podemos excluir à partida a
possibilidade de esse ser existir, e que, se ele existir, quase tudo aquilo em que
acreditamos será falso. Assim, (parece que) tudo aquilo em que acreditamos admite
alguma dúvida.

A dúvida cartesiana é uma suspensão do juízo, liberta o espírito dos erros que o
podem perturbar ao longo do processo de indagação da verdade e apresenta as seguintes
características: - metódica e provisória: é um meio para atingir a certeza, não
constituindo um fim em si mesma (esta última atitude seria típica dos filósofos céticos);
- hiperbólica: é exagerada, rejeita como se fosse falso tudo aquilo em que se note a
mínima suspeita de incerteza; -universal e radical: incide não só sobre o conhecimento
em geral, como também sobre os seus fundamentos, as suas raízes.

O Cogito:

Ainda que quase nenhuma das nossas crenças seja indubitável, Descartes pensa
que há algo de que não podemos duvidar. Afinal, se estamos a colocar as nossas crenças
em dúvida, estamos a duvidar, e duvidar é uma forma de pensar. E, se estamos a pensar,
então existimos. Cada um de nós pode então afirmar com toda a segurança:

■ Eu penso, logo existo.


Esta realidade, que Descartes admite no final do processo de colocação do
conhecimento em causa, é conhecida por cogito e é uma intuição racional, que surge
clara e distintamente no final de um percurso, apesar do seu enunciado parecer uma
dedução. [O problema da intuição é um dos problemas do conhecimento: o das espécies
ou formas de conhecer.] Para Descartes, o cogito constitui o fundamento indubitável do
conhecimento, pois nem mesmo um génio maligno, extremamente poderoso e malévolo,
poderia enganar-nos no que respeita à nossa própria existência.

A existência de Deus:

Apesar de evidente, o cogito não é suficiente para fundamentar o edifício do


saber. A certeza penso, logo existo é uma certeza subjetiva. Não se consegue alcançar
uma efetiva fundamentação do conhecimento sem se descobrir o que se encontra na
base do pensamento e na origem da existência do sujeito pensante. Partamos das ideias
que estão presentes no sujeito. Elas possuem um conteúdo que representa alguma coisa.
Dessas ideias, umas serão adventícias, ou seja, têm origem na experiência sensível (por
exemplo, as ideias de barco, copo, cão); outras, factícias, fabricadas pela imaginação
(por exemplo, as ideias de centauro, dragão, sereia); por fim, há também ideias inatas:
são ideias constitutivas da própria razão (por exemplo, as ideias de pensamento e de
existência, assim como as várias ideias matemáticas). As ideias inatas (já o sabemos)
são claras e distintas e podem ser caracterizadas como as sementes do conhecimento.

Círculo cartesiano:

Não é fácil aceitar os argumentos propostos por Descartes a favor da existência


de Deus. No que respeita ao primeiro argumento, pode-se contestar, por exemplo, o
princípio segundo o qual aquilo que é menos perfeito não pode causar ou criar algo mais
perfeito. No que respeita ao argumento ontológico, pode-se replicar, por exemplo, que a
existência nem sequer é uma propriedade, pelo que não faz sentido afirmar que um ser
perfeito tenha necessariamente a propriedade de existir.

Teoria de Hume:
David Hume perseguiu o objetivo de desenvolver uma teoria da natureza
humana, por meio da qual pretendia explicar o funcionamento da nossa mente. A sua
epistemologia empirista, que é a parte fundamental dessa teoria, encontra-se
essencialmente no Livro I do Tratado da Natureza Humana (1739) e na Investigação
sobre o Entendimento Humano (1748), mas ao contrário de Descartes, defende que o
ceticismo não pode ser totalmente refutado e que as nossas pretensões ao conhecimento
devem ser bem mais modestas. Hume escreveu na Investigação sobre o Entendimento
Humano que a dúvida radical e universal, recomendada por Descartes, não permite
reconstruir o edifício do conhecimento depois de o destruir. Se duvidarmos das
capacidades racionais, como exige a dúvida cartesiana, deixamos de poder recorrer a ela
(ao cogito) para deduzir o que quer que seja.
As impressões e as ideias:

Hume fala de perceções para se referir aos conteúdos da nossa mente. De acordo
com a sua perspetiva, as impressões e as ideias são as duas únicas espécies de
perceções. Estas diferem de uma forma puramente qualitativa: as impressões são mais
vívidas e intensas do que as ideias. As impressões são sentidas e as ideias são pensadas.
As impressões abrangem as nossas sensações externas (visuais, auditivas, tácteis, etc),
bem como os nossos sentimentos internos (emoções, desejos, etc). As ideias são as
perceções que constituem o nosso pensamento. Por exemplo, se estamos a ver um
objeto vermelho, estamos a ter uma impressão de vermelho, ao passo que se estivermos
a imaginar ou a recordar um objeto vermelho, estamos a ter uma ideia de vermelho. A
ideia de vermelho é menos intensa e vívida do que a respetiva impressão.

As relações de ideias e as questões de facto:

Se todas as ideias têm uma origem empírica, então não há conhecimento a priori
do mundo. Todo o conhecimento acerca do mundo é a posteriori. Hume diz-nos que as
relações de ideias e as questões de facto são os dois tipos fundamentais de objetos da
razão ou da investigação humana. Assim, se disser que o quadrado da hipotenusa não é
igual à soma dos quadrados dos catetos, cometer-se-á uma contradição, afirmar-se-á
algo que é logicamente impossível. Porém, se disser que o sol não irá nascer amanhã,
estar-se-á a afirmar algo que é logicamente possível, apesar de parecer muitíssimo
improvável. A ideia de o sol não nascer amanhã não envolve qualquer contradição, já
que consegue conceber perfeitamente essa hipotética situação. Podemos dizer, então,
que no domínio das relações de ideias conhecemos verdades necessárias, enquanto no
domínio das questões de facto conhecemos apenas verdades contingentes.

O ceticismo moderado:

Os resultados céticos de Hume são muito fortes. Não podemos ter uma crença
justificada na uniformidade da Natureza nem na realidade do mundo exterior. Um cético
pirrónico extrairia daqui a conclusão radical de que devemos deixar de acreditar que a
Natureza é uniforme e que o mundo exterior é real. Hume recusa-se a extrair esta
conclusão e é por isso que o seu ceticismo é mitigado ou moderado. Segundo Hume,
não podemos deixar de acreditar que a Natureza é uniforme e que o mundo exterior é
real. Estas crenças fazem parte da natureza humana e na vida quotidiana nós não
conseguimos pensar nem agir na sua ausência. Os argumentos céticos são impotentes
para as destruir.

Análise comparativa das teorias de Descartes e Hume:


Terminamos, este ponto programático, com uma breve comparação entre as
teorias de Descartes e de Hume para explicar o conhecimento, partindo do problema da
origem e do problema possibilidade do conhecimento.
a) A origem do conhecimento: Qual é a origem do conhecimento? A teoria do
conhecimento admite duas fontes principais de conhecimento: a razão e a experiência.
Também Descartes e Hume admitem estas proveniências do conhecimento, mas
conferem-lhes uma primazia diferente na origem do conhecimento. É este desacordo
que permite qualificar o primeiro como um racionalista (razão) e o segundo como um
empirista (empírica = experiência). Segundo Descartes, todo o conhecimento verdadeiro
e infalivelmente justificado encontra o seu fundamento no pensamento ou na razão. É na
intuição racional do cogito que Descartes encontra a primeira certeza e o fundamento a
partir da qual pode deduzir, de uma forma totalmente a priori, todo o conhecimento.
Hume, pelo contrário, encontra na experiência a única fonte do conhecimento. Só a
experiência nos permite saber se as questões de facto são verdadeiras ou falsas. Por si
só, o nosso pensamento consegue apenas estabelecer relações de ideias, mas estas nada
nos dizem acerca do mundo exterior. A experiência é o fundamento do conhecimento e
é a posteriori.

b) Os limites ou possibilidade do conhecimento: Será que sabemos realmente aquilo


que julgamos saber? Será que a nossa pretensão ao conhecimento é possível? Qual é o
valor das representações que temos das coisas? Estas questões levantam, já o sabemos,
o problema da possibilidade ou do valor do conhecimento. Para Descartes, as nossas
pretensões ao conhecimento, sem reflexão, não são válidas. Porém, o conhecimento
verdadeiro é possível. Se partirmos da dúvida metódica e seguirmos o método,
acabamos por descobrir o cogito. Depois, poderemos provar racionalmente que Deus
existe. E Deus, que é bom, garante que o nosso bom senso, quando devidamente
utilizado, pode construir conhecimento. Para Hume, as nossas pretensões ao
conhecimento são infundadas. Apenas conhecemos as nossas próprias perceções.
Porém, quando vamos além da experiência e da memória, das impressões e das ideias,
passamos a apoiar-nos em suposições que não podemos justificar. Nomeadamente na
crença de que a natureza é uniforme, na crença de que os fenómenos se seguem numa
relação de causa e efeito e na crença da realidade do mundo exterior. Como o nosso
conhecimento se apoiam nestas crenças e elas não estão justificadas, podemos inferir
que não podemos constituir conhecimento, porque também ele não está justificado.

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