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Resumo: O trabalho propõe, a partir de dados concretos, uma abordagem sintagmática para o estudo do
forró e de outros gêneros populares. A partir dos conceitos de “tradição”, presentes nos textos de
Hobsbawm e Waterman, estabeleço um diálogo com o termo “de raiz” usado das mais diferentes formas
pelos atores de forró. São muitas as denominações encontradas para o gênero e cada uma delas apresenta
signos sonoros, de gestualidade e movimentação que são defendidos por seus autores como “de raiz.” O
agem simultaneamente numa sociedade urbana, enfatizando uma metodologia de análise dialética. Este
estudo é parte do trabalho de doutorado para a UIUC, “Music, Migrancy and Modernity: A Study of
Brazilian Forró,” que analisa o forró e a comunidade migrante nordestina em São Paulo, sob orientação do
Abstract: The present paper is an attempt of a syntagmatic approach to the study of Brazilian forró and
other popular genres. I relate concepts of “tradition”, presented by Hobsbawm and Waterman, with the
term “de raiz” (from root, grassroots) used in many ways by forró actors. There are many forró styles and
each of them present sound, body, and movement signs that are defended as “de raiz” by its practioners.
The goal is to make clear the dynamics, controversies and the many stylistic possibilities that work together
in an urban society, emphasizing dialectic methods. This study is part of a PhD dissertation, “Music,
Migrancy and Modernity: a Study of Brazilian Forró,” at UIUC, advised by Dr. Thomas Turino, which
analyses forró music and the Northeastern migrant community in São Paulo, Brazil.
Para este trabalho eu defino forró como sendo uma festa dançante com música ao
vivo, na qual a base instrumental é o acordeon (de botão ou de teclado). Existem forrós
de viola, de pife, de rabeca, mas estes não serão considerados neste trabalho. Também
existe uma limitação com relação ao repertório tocado pelos instrumentistas. As músicas
xaxados, arrasta-pés, xotes, cocos, cirandas, seja pelo padrão rítmico dançante
nordestina é um fator importante, pois, o forró surgiu naquela região do Brasil e este dado
será muito lembrado e buscado pelas diferentes vertentes do forró através do termo “de
Recife (PE) e São Paulo, capital, no período de junho de 2000 até março de 2001 e
propor uma metodologia de análise sintagmática onde a questão “de raiz” é o foco. Com
O forró passa a ser conhecido em todo o Brasil a partir do final da década de 1940
notoriedade e sucesso através da sua música na mídia. Esta música é carregada de suas
famoso na região de Exu, divisa de Pernambuco com o Ceará. Seu pai fazia o que ficou
conhecidos,vizinhos, além dos membros unidos por laços de sangue. Portanto, a relação
face e interativo.
Quando Gonzaga chega ao Rio de Janeiro, ele vai aprender a tocar as músicas da
grupo de estudantes nordestinos que o incentiva a voltar a tocar as músicas “da terra.”
época através da mídia, Gonzaga irá “criar” o baião, como uma novidade no cenário
nacional em termos de música dançante. Também vai tornar conhecidos na mídia o xote,
idiossincrática, mas que ficaram conhecidos como “tradicionais, puros, de raiz”. Luiz
Manezinho Araújo, dentre outros, irá compartilhar a sua “visão” de Nordeste através da
sua música. Visão esta jamais “pura,” mas sim, amalgamada de influências e vivências
com as quais ele também se identificava, como por exemplo o terno de linho cento e
Teixeira, advogado, e Zé Dantas, médico), músicas estas que passam a ser cantadas, ao
invés de fazer música instrumental como na terra natal, a sanfona de teclado e cento e
vinte baixos (ao invés dos “oito-baixos do seu pai”). O que eu enfatizo aqui é a
Popular Brasileira, mas que, com o passar do tempo, tornou-se numa figura mística, uma
lenda, pois, as controvérsias foram deixadas de lado em favor de uma pureza que não
existiu. Portanto, a música de Gonzaga, desde o seu início na mídia (e então, quando a
maioria de nós toma conhecimento dela), tem como característica um dinâmico diálogo
A música que lança Luiz Gonzaga na mídia é “Baião” onde o intérprete diz que
vai nos ensinar a dançar um novo tipo de música, o baião. Entra aqui um fator inerente ao
forró, a dança. Foi com a pesquisa de campo que pude descobrir que a dança do forró é
uma dança cordial, cortez, sutil onde o objetivo é a aproximação corporal afim de se
sentir o calor e o cheiro da outra pessoa. Logicamente pode-se estabelecer vários níveis
desta percepção, mas, de modo geral, em se tratando de um contexto mais familiar, essa
mais restrito a toques fortuitos durante a dança. Os pares dançam arrastando os pés,
corporal é um fato, portanto, os passos são mais repetitivos do que criativos e a dança
Jackson do Pandeiro (1919-1982). Na música de Jackson fica mais claro ainda a questão
influência do samba carioca que se entranha no coco conhecido e praticado por Jackson
desde criança, ensinado por sua mãe. Temos então o que veio a se chamar forró, um outro
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“impuro” quanto o baião de Gonzaga e com ele o círculo se fecha e o paradigma do forró
dentro da mídia está criado. São os estilos de Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro que
serão tomados como modelo, “de raiz,” “tradicionais”: modo de cantar, “grão” de voz
dançar. Mas esta categorização se detém nos meios intelectualizados mais do que nos
com o passado (p.9) As regras aceitas do forró de Jackson e Gonzaga são aquelas que os
indústria cultural. Esta visão relativa e conjuntural está relacionada com os estudos de
colonizadores, mas que, com o passar do tempo, afeta o imaginário do grupo de pessoas
ao qual ela se refere, tornando-se concreta, real. Para isso Waterman cita George Marcus
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e Michael Fischer: “as forças externas, de fato, são parte integral da construção e
supostamente nos legaram. Neste sentido, vou expor aqui duas manifestações atuais desta
com música ao vivo, um pouco diferente da lambada, que acabava de acontecer no meio
musical. Para isso, contratam trios nordestinos, ou seja, músicos que tocam na formação
divulgado principalmente por Gonzaga e Jackson nos idos 1940 e 50. O êxito de público
casas noturnas nordestinas na cidade como o forró Asa Branca, e o forró de Pedro
dança de par onde o xote faz muito sucesso. Eu atribuo essa quase automática empatia
com a música nordestina à questão da proximidade entre o xote e o reggae, apontada por
Gonzaga antes de morrer e por Gilberto Gil em meios de comunicação de massas. Esta
proximidade vai ficar mais clara no aspecto visual, quando mais casas são abertas como
praieiros, a chamada “surf wear,” e as boinas à la Bob Marley são freqüentes. Os trios
base do forró. Um dos grupos mais requisitados e que participou deste processo desde o
início foi o Trio Virgulino formado por migrantes nordestinos e reverenciado por aquele
público como âncoras do forró tradicional, pé-de-serra. Mas, eles não tocam música
jovens universitários os reverenciam como mantenedores do forró “de raiz,” que passa a
ser sinônimo de forró pé-de-serra, “tradicional.” Ocorre aqui uma compactação de tempo
platéia, casais de jovens absolutamente enlaçados dançam uma seqüência de passos que
mais parece uma coreografia ensaiada do que apenas um encontro casual entre duas
pessoas que querem dançar juntas. Movimentos provenientes da dança de salão ensinada
chinesa e dançam na ponta dos pés. O sexo está mais presente no “forró universitário” e
não raro, depois de uma noite no forró, os pares dirigem-se a motéis para relações sexuais
Nos meios nordestinos o forró é perene, segundo Dominguinhos, porque “se ele
virar moda, a moda acaba e os músicos ficam sem emprego” (Fernandes, 2001). Durante
o mesmo trabalho de campo, na mesma cidade de São Paulo, mas nos nichos
palco existem jovens bailarinas com uma grande porcentagem do corpo exposto. O
eletrônico”. O público é formado por pessoas mais maduras que dançam os passos
repetitivos ensinados por Luiz Gonzaga, só que mais rápido. Meus informantes no Centro
nova direção) me disseram que forró de sanfona é coisa do passado, bonito é teclado, é
Com estes dados é possível salientar alguns pontos importantes neste rápido
estudo. A questão “de raiz” é inicialmente colocada por estudantes no Rio de Janeiro para
Luiz Gonzaga como ‘da terra.” Também são estudantes intelectualizados que
forró do Trio Virgulino como “forró tradicional.” Portanto, como entre os Iorubás de
Waterman, é um grupo externo aos atores do forró que inventam uma “tradição” e uma
“raiz” para ele. Entre os nordestinos migrantes, “tradição, raiz” é coisa do passado, é
necessário “modernizar”. Trocam a sanfona pelo teclado mas continuam dançando como
antes e continuam trabalhando muito como antes. Hoje entre nós, podemos perceber que
Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro fizeram um tipo de música na sua época que
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embora propagada e reverenciada como “de raiz” já estava ligada a indústria cultural. Os
universitários reverenciam o forró “de raiz” e o praticam com outros instrumentos, outra
dança, outra indumetária e ainda cruzando influências entre forró, lambada, reggae e
mesmo tempo, afetando-os. Portanto, perguntar se forró é música e dança de raiz requer
perguntar também se forró é música e dança “muderna.” Com este trabalho fica
demonstrado que a cultura popular vai muito além de categorias binárias e a pluralidade e
flexibilidade é que estão no centro da questão. O importante aqui não são as respostas
para tais perguntas e sim este processo de refletir sobre o que acontece questionando os
Bibliografia:
Albuquerque Jr. Durval Muniz de. 1999. A Invenção do Nordeste e Outras Artes. São Paulo:
Cortez.
Hobsbawm, Eric. 1997. “Introdução: A Invenção das Tradições.” In: Hobsbawm, Eric e Terence
Waterman, Christopher. 1990. “Our Tradition is a Very Modern Tradition:” Popular Music and