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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO


PROCESSO SELETIVO - DOUTORADO

PEDRO REZENDE SANTOS FEITOZA

CULTURA VISUAL E LINGUAGEM FOTOGRÁFICA NO CONTEXTO ESCOLAR

Linha de Pesquisa: Educação, Comunicação, Linguagens e Movimento

Projeto de Tese apresentado ao Programa de Pós-


Graduação em Educação da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte como requisito parcial do
processo seletivo para admissão em Doutorado.

Link do Currículo Lattes:

http://lattes.cnpq.br/1601526278254230

2019
1 APRESENTAÇÃO E JUSTIFICATIVA

O Brasil tem hoje dois dispositivos digitais por habitante, incluindo smartphones,
computadores, notebooks e tablets. Em 2019, o País terá 420 milhões de aparelhos digitais
ativos. Entre os aparelhos, o uso de smartphone se destaca: segundo o levantamento, há hoje
230 milhões de celulares ativos no país1. Ou seja, mais de um smartphone por habitante.
Consoante com esse crescimento, o relatório Digital in 20192, feito pela We Are Social em
parceria com a Hotsuite, apontou que cerca de 140 milhões de brasileiros são usuários das
redes sociais, o que representa 66% da população do país.

Os números apresentados acima apenas comprovam o que muitas professoras e


professores conhecem: a enorme presença dos aparelhos celulares no ambiente escolar. A
rápida mudança ocorrida nos últimos dez anos de popularização dos smartphones e redes
sociais trouxe inúmeros desafios para os contextos pedagógicos. São várias as facetas dessa
mudança. Ao que é pertinente à discussão proposta pelo presente projeto de tese, destaca-se a
relevância do uso da imagem nas diversas formas de comunicação estabelecida pelos
inúmeros aplicativos utilizados. Não apenas do ponto de vista do consumo de imagens e
mediações que elas propiciam, mas também na produção pelos sujeitos através de vídeos e
fotografias de celular.

Quase tudo do pouco que conhecemos, em relação ao conhecimento produzido, nos


chega pelos meios de informação e comunicação. Estes, por sua vez, também constroem
imagens do mundo. Imagens para deleitar, entreter, vender, com mensagens sobre o que
devemos vestir, comer, aparentar, pensar. Em nossa sociedade contemporânea, discute-se a
necessidade de uma alfabetização visual que se expressa em várias designações como: leitura
de imagens e compreensão crítica da cultura visual.

Existe um longo acúmulo sobre a linguagem da fotografia em diversas áreas,


sobretudo no campo das artes visuais. No entanto, com a popularização da imagem nos
termos propostos acima, torna-se cada vez mais urgente a elaboração e apropriação
consistente pela educação da relação entre imagem, tecnologia e apreensão crítica pelos
estudantes, assim como as múltiplas possibilidades do uso da linguagem fotográfica nas
práticas pedagógicas.

1
Segundo a 30ª Pesquisa Anual de Administração e Uso de Tecnologia da Informação nas Empresas, realizada
2
Disponível em: https://wearesocial.com/global-digital-report-2019
pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP). Acessível em:
O que é ver o mundo através das telas e lentes? Que mudanças são desencadeadas na
percepção e imaginação através da mediação proporcionada pela tecnologia dos smartphones
e redes sociais? Quais as consequências dos usos destes aparatos nos modos de ser, agir e
conhecer? O que a produção e leitura compartilhada da imagem no ambiente pedagógico pode
proporcionar em comunicação e conhecimento? Estas questões são feitas porque a cada dia
sentimos com maior evidência o modo como a tecnologia da imagem se transformou numa
prótese do olhar, sendo praticamente impossível falar da nossa existência no mundo atual sem
os aparatos técnicos que acabaram por modificar a própria natureza humana.

Nesse sentido, os educadores devem estar atentos ao que está se passando no mundo,
seja nos saberes, na sociedade, nos sujeitos, e responder com propostas imaginativas que
possibilitem aos educandos elaborarem formas de compreensão e atuação na parcela do
mundo que lhes toca viver, de forma que possam desenvolver seus projetos de vida. A
situação que o educador cria para iniciar o processo de aprendizagem sinaliza sua orientação
educativa, o lugar que destina ao educando e a si mesmo.

Diante desse cenário, o presente projeto de tese justifica-se (a) pela necessidade de
refletir e elaborar sobre os impactos da presença massiva do uso da imagem, através dos
smartphones e redes sociais, no ambiente escolar; (b) pela baixa produção de pesquisas que
abordem a questão no campo da educação a partir de uma abordagem transdisciplinar que não
seja restrita as áreas da comunicação social e artes visuais; (c) pela possibilidade de criar
estratégias pedagógicas que viabilizem o processo de produção de novas formas de expressão
do conhecimento e da crítica da cultura a partir da fotografia; (d) pela necessidade de atualizar
a formação docente a partir dessas estratégias e (e) pela urgência da criação de espaços de
interlocução em que os sujeitos possam experimentar-se no ambiente pedagógico, não apenas
como sujeitos captados pela lente da câmera, mas, também, como participantes da construção
de suas próprias imagens.

2 PROBLEMA DE PESQUISA

A experiência atual com as imagens, quer sejam fotográficas, cinematográficas ou


televisivas, acontece na maioria das vezes de forma espontânea, intermitente, fragmentada, de
modo superficial. Com a proliferação das imagens, a cada dia elas perdem mais a sua
capacidade de dizer algo substancial a alguém, pois também as pessoas que vivem essa
dispersão perceptiva de modo permanente acabam por perder a sensibilidade para ver as
coisas, enxergando-as como signos, extraindo sentidos diferenciados da materialidade do
mundo e dos significados incorporados às imagens que nos rodeiam.

Fundado na relação entre cultura visual, linguagem fotográfica e educação, o presente


projeto tem as seguintes perguntas como problema de pesquisa: Quais são as consequências
dos usos de smartphones e redes sociais nos modos de ser, agir, conhecer e se comunicar dos
estudantes de ensino médio da rede pública de ensino? Que mudanças são desencadeadas na
percepção do cotidiano ocasionadas pela mediação proporcionada por essas tecnologias?
Quais os desafios enfrentados no ambiente escolar pelo uso frequente desses aparatos? Como
enfrentá-los? Qual o potencial de práticas pedagógicas ancoradas na linguagem fotográfica e
na produção e leitura crítica da imagem?

3 OBJETIVOS

3.1 OBJETIVO GERAL

O objetivo geral de pesquisa é criar condições para que o uso da linguagem fotográfica
no contexto escolar possa favorecer a construção de estratégias de interação com o mundo
físico e social que sejam promotoras de um modo crítico de ver as coisas, interpretando e
recriando o mundo de muitas e diferentes maneiras. Isso significa assumir o compromisso de
desencadear um conhecimento que desmascare a superficialidade e a padronização do olhar,
permitindo um mais profundo contato com a leitura e a interpretação das imagens que
circulam entre nós.

3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

a) Realizar uma ampla revisão de literatura sobre a temática no campo da educação,


comunicação e artes visuais;
b) Identificar os impactos da presença massiva dos smartphones e redes sociais no
ambiente escolar nos modos de ser, agir, conhecer e se comunicar em estudantes do ensino
médio da rede pública de ensino;

c) Identificar influências na cultura visual do cotidiano dos estudantes ocasionadas


pela mediação proporcionada por essas tecnologias, sobretudo pelo consumo e produção de
imagens;

d) Criar estratégias pedagógicas que viabilizem o processo de produção de novas


formas de expressão do conhecimento e da crítica da cultura a partir da linguagem fotográfica
e leitura crítica da imagem;

e) Sugerir, a partir das estratégias criadas, tópicos de atualização para formação


docente;

f) Identificar possíveis indicações de aprimoramentos para o campo da Educação e


contribuir para a solidificação do uso linguagem fotográfica como instrumento pedagógico.

(c) A partir da sistematização dos dados recolhidos, dar suporte a novas pesquisas
sobre cultura visual, fotografia e educação.

4 REFERENCIAL TEÓRICO

A relação dos jovens no contexto escolar com a produção, reprodução e leitura de


imagens, em especial a fotografia, através da redes sociais e smartphones, é a base central a
partir da qual se desenvolve a proposta de pesquisa. As fotografias desencadeiam um outro
modo de olhar o mundo, enriquecendo as possibilidades de apresentação e interpretação dos
fatos, objetos, pessoas e acontecimentos. Os referenciais teóricos que orientam o projeto de
pesquisa giram em torno da construção da compreensão crítica da cultura visual e da
utilização da linguagem fotográfica na educação escolar a partir de temas geradores que
problematizem narrativas hegemônicas sobre si e sobre o mundo em geral.

Neste sentido, mobiliza-se as categorias de “alfabetização visual” elaborada por


DONDIS (1997) e “compreensão crítica da cultura visual” debatida por HERNANDEZ
(2002), atravessando os debates críticos sobre a temática expostos por BOLIN e BLANDIN
(2003) e MIRZOEFF (2003). É de grande utilidade também as propostas metodológicas e
experiências investigativas narradas por SOUZA e LOPES (2002) em sua pesquisa-
intervenção realizada em uma escola que atende a portadores de necessidades especiais na
rede municipal de ensino básico da cidade do Rio de Janeiro, fundamentadas na educação
problematizadora defendida por Paulo Freire.

A leitura de imagens como uma atividade subjetiva, compromissada com a experiência


racional e sensível de tomada de consciência do mundo, deve ser uma conquista e, assim,
exige uma educação estética do olhar. Mas o que seria uma educação estética?

A obra A Primer of Visual Literacy de DONDIS (1997), publicada em 1973 pelo


Massachusetts Institute of Technology, introduziu o conceito de alfabetismo visual e seu livro
propõe um sistema básico para a aprendizagem, identificação, criação e a compreensão de
mensagens visuais acessíveis a todas as pessoas, e não somente àquelas especialmente
formadas como projetistas, artistas e estetas. Apoiando-se no sistema proposto por Dondis
para uma “alfabetização visual”, alguns professores começaram a aplicar um esquema de
leitura de imagens fundamentado na sintaxe visual, que destaca a disposição dos elementos
básicos como ponto, linha, forma, cor, luz em direção à composição.

Situando-se no marco dos estudos culturais, BOLIN E BLANDIN (2003) são


contrários à denominação de “visual” ao trabalho dos docentes com as imagens, já que a
expressão pode, na opinião desses autores, restringir a atividade educativa se comparada com
a gama de experiências que as imagens físicas e virtuais provocam. Esses autores recolocam a
questão do visual, a predominância e ou a relação desse sentido com ou sobre os demais. A
questão levantada por eles situa-se em uma corrente mais “restritiva” da cultura visual.
BARNARD (2001) identificou duas vertentes fundamentais nos estudos de cultura visual.
Uma das tendências, que seria a mais “restritiva”, enfatiza o visual, e trata de normatizar,
prescrever seus objetos de estudo como sendo a arte, o design, as expressões faciais, a moda,
a tatuagem etc. A outra vertente toma a cultura como traço que define o estudo, logo refere-se
aos valores e identidades construídas e comunicadas pela cultura via mediação visual, como
também à natureza conflitiva desse visual devido aos seus mecanismos de inclusão e exclusão
de processos identitários.

Tomando a cultura como traço que define o seu estudo, MIRZOEFF (2003) afirma que
a visualização caracteriza o mundo contemporâneo. Essa característica não significa que,
necessariamente, conheçamos aquilo que observamos. A distância entre a riqueza da
experiência visual na cultura contemporânea e a habilidade para analisar esta observação cria
a oportunidade e a necessidade de converter a cultura visual em um campo de estudo. O autor
afirma que a cultura visual é uma “tática para estudar a genealogia, a definição e as funções
da vida cotidiana pós-moderna a partir da perspectiva do consumidor, mais que do produtor”
(MIRZOEFF, 2003, p. 20). Enfatiza que não se trata de uma história das imagens, nem
depende das imagens em si mesmas, mas sim dessa tendência de plasmar a vida em imagens
ou visualizar a existência, pois o visual é um “lugar sempre desafiante de interação social e
definição em termos de classe, gênero, identidade sexual e racial” (p. 20).

No sentido indicado por MIRZOEFF, a cultura visual é uma estratégia para


compreender a vida contemporânea e não uma disciplina acadêmica. O autor busca
compreender a resposta dos indivíduos e dos grupos aos meios visuais de comunicação em
uma estrutura interpretativa fluida. Enfatiza que a noção de cultura visual é nova precisamente
por centrar-se no visual como um lugar no qual se criam e se discutem significados. Dessa
forma, se distancia das obras de arte, dos museus e do cinema para focalizar sua atenção na
experiência cotidiana. Do mesmo modo que os estudos culturais tratam de compreender de
que maneira os sujeitos buscam sentido ao consumo da cultura de massas, a cultura visual dá
prioridade à experiência cotidiana do visual, se interessa pelos acontecimentos visuais nos
quais o consumidor busca informação, significado e ou prazer conectados com a tecnologia
visual. O autor define a tecnologia visual “como qualquer forma de dispositivo desenhado
para ser observado e/ou para aumentar a visão natural, abarcando da pintura a óleo até a
televisão e a internet” (MIRZOEFF, 2003, p. 19).

Nessa concepção, a cultura visual carrega uma proposta bem mais ampla que a de
leitura de imagens baseada no formalismo perceptivo e semiótico. Trabalhar nesse enfoque
amplo é aceitar a capacidade de as imagens serem mediadoras das “velhas e novas formas de
poder, como também de ensaios contra discursivos de novas formas de sociabilidade”
(MORAZA, 2004). Essa abordagem fundamenta-se em uma base socioantropológica, o que
significa focalizar o conhecimento tanto nos produtores dessas experiências quanto no
contexto sociocultural em que são produzidas.

Trabalhar na linha da compreensão crítica da cultura visual “não pode ficar à margem
de uma reflexão mais ampla sobre o papel da escola e dos sujeitos pedagógicos nesses tempos
de mudança” (HERNANDEZ, 2002, p. 3). Nesse sentido, os educadores precisam estar
atentos ao que está se passando no mundo, seja nos saberes, na sociedade, nos sujeitos, e
responder com propostas imaginativas, transgressoras que possibilitem aos educandos
elaborarem formas de compreensão e atuação na parcela do mundo que lhes toca viver, de
forma que possam desenvolver seus projetos de vida. A situação que o educador cria para
iniciar o processo de aprendizagem sinaliza sua orientação educativa, o lugar que destina ao
educando e a si mesmo.

Nesse sentido, afirma SARDELICH (2006), já não cabe mais o educador se perguntar
o que aos educandos não sabem e se propor a ensinar-lhes, mas perguntar-se sobre o que já
sabem e como ampliar as conexões para que, juntos, possam organizar outros discursos com
os saberes mosaicos que todos possuem. A abordagem da compreensão crítica não enfatiza
nem as representações nem os artefatos visuais, pois ao trabalhar na perspectiva de projetos de
trabalho a ênfase recai na construção de uma história compartilhada que será narrada. Mais do
que pensar em representações e artefatos, o educador necessita pensar no que o grupo de
trabalho (o que implica educandos e educadores) quer aprender e o que pode aprender.

Essa abordagem requer uma mudança na forma em que tradicionalmente se organiza o


conhecimento escolar. Sugere aos educadores estarem especialmente atentos à
problematização dos objetos da cultura visual do grupo com o qual trabalhe, ou seja, as
imagens que estão nas capas dos cadernos e pastas dos educandos, as revistas que leem, os
programas de televisão a que assistem, seus grupos musicais e jogos preferidos, suas roupas e
seus ícones populares. É importante ressaltar que problematizar, para FREIRE (1985, 2005,
2008), vai muito além da ideia de se utilizar um problema do cotidiano do educando para, a
partir dele, introduzir conceitos pré-selecionados pelo educador. A problematização deve ser
um processo no qual o educando se confronta com situações de sua vida diária,
desestabilizando seu conhecimento anterior e criando uma lacuna que o faz sentir falta
daquilo que ele não sabe. Nesse sentido, a experiência de vida pode ser apreendida e
modificada.

Para SOUZA e LOPES (2002), a escola se apresenta como um espaço no qual é


possível propiciar o convívio e o diálogo entre o acervo de imagens pessoais, trazido pelos
educadores e educandos, e as produções artísticas e culturais reconhecidas universalmente e
pertencentes a diferentes culturas e épocas. Este exercício de ver o diferente, de desvelar
significados e critérios exige um trabalho continuado de educação do olhar que articule
percepção, imaginação, conhecimento, produção artística e, ao mesmo tempo, valorize e
respeite a multiplicidade e a diversidade de pontos de vista, dos modos de ver e de estar no
mundo. A educação estética do olhar é aquela que incentiva o educando a intervir no ritmo
dispersivo e intermitente que, em geral, estamos acostumados a exercitar quando interagimos
com as imagens no cotidiano (TV, vídeo, cinema, fotografia, outdoors, computador etc.). É
preciso aprender a olhar o mundo indo aos detalhes, melhor dizendo, decompor o mosaico
para melhor enxergar a figura que reina majestosa no todo de uma revelação figurativa. Nesse
exercício que propomos com as imagens, a palavra é companheira, uma vez que com ela a
imagem se enriquece e ganha contornos. Por mais que o mundo esteja se revelando aos nossos
olhos através de narrativas figuradas, há que se decompor essas imagem em palavras e
devolver ao outro as possíveis interpretações daquilo que é visto, tornando as imagens
técnicas mediadoras de um diálogo entre pessoas que buscam novos modos de narrar sua
experiência, recriando o mundo na imagem e no discurso. Torna-se, portanto, necessário criar
sentidos novos com as imagens, criar composições que alteram e libertam nossa percepção do
mundo em variadas direções. Aprender a ver o mundo com outros olhares, resgatando sua
condição de diversidade, é formar leitores de imagens que sabem dar um sentido estético e
ético ao modo como produzimos conhecimento na contemporaneidade. Este é um dos maiores
desafios para a educação nos dias atuais. Mas se a produção do conhecimento hoje não
dispensa a nossa capacidade de dialogar com os aparatos tecnológicos, cabe tanto ao educador
quanto aos jovens aprendizes construir, com esses aparatos tecnológicos, novas possibilidades
de usos, submetendo as máquinas ao nosso poder e desejo de inventar outros jogos ainda não
revelados na prática. Trata-se, portanto, de criarmos, por meio da educação, modos de
confronto com a experiência tecnológica, colocando tanto educadores como educandos na
posição de se sentirem responsáveis por inventar outras estratégias de interação na produção
de conhecimento.

De acordo com a proposta de compreensão crítica da cultura visual proposta por


HERNANDEZ (2002), a compreensão crítica dessas representações e artefatos tecnológicos
implica diferentes aspectos, a saber:

Histórico/antropológico: as representações e artefatos visuais são frutos de determinados


contextos que as produzem e as legitimam. Dessa forma, é necessário ir além de uma
abordagem perceptiva, daquilo que se vê na produção, para explicitar a conexão entre os
significados dessa produção e a tradição: valores, costumes, crenças, ideias políticas e
religiosas que as geraram.

Estético/artístico: este aspecto refere-se aos sistemas de representação. O aspecto estético


artístico é compreendido em relação à cultura de origem da produção e não em termos
universais, pois o código europeu ocidental não é o único válido para a compreensão crítica
da cultura visual.
Biográfico: as representações e artefatos fomentam uma relação com os processos
identitários, construindo valores e crenças, visões sobre a realidade.

Crítico/social: representações e artefatos têm contribuído para a configuração atual das


políticas da diferença e das relações de poder. Esses diferentes aspectos não são sequenciais,
mas sim interconectados e cabe às/aos educadoras/es fomentarem a compreensão destes ao
estimular relações entre a produção e seus contextos de produção, distribuição, e consumo
bem como os efeitos na construção dos processos identitários. Como pistas de caminhos
possíveis em um trabalho para a compreensão crítica da cultura visual, HERNANDEZ (2000,
2002) sugere:

a) explorar os discursos sobre os quais as representações constroem relatos do mundo


social e favorecem determinadas visões sobre ele e nós mesmos;
b) questionar a tentativa de fixar significados nas representações e como isso afeta nossas
vidas;
c) discutir as relações de poder que se produzem e se articulam por meio das
representações e que podem ser reforçadas pela maneira de ver e produzir essas
representações;
d) elaborar representações por procedimentos diversos como forma, resposta e modo de
diálogo com as representações existentes;
e) construir relatos visuais utilizando diferentes suportes relacionados com a própria
identidade e contexto sociocultural que ajudem a construir um posicionamento.

A partir desses referenciais teóricos iniciais, apresentamos abaixo o caminho


metodológico a ser percorrido no decorrer da pesquisa.

5. METODOLOGIA DO PROJETO

A metodologia que será utilizada para o desenvolvimento da pesquisa proposta pelo


presente projeto se baseará, fundamentalmente, na constituição de grupos focais compostos
pelo pesquisador, professores e estudantes de três escolas do ensino médio da rede pública na
cidade de Natal/RN. O caminho metodológico se dividirá em três etapas.
Na primeira etapa, após revisão de literatura, composição do estado da arte da temática
proposta e discussão com orientadora ou orientador sobre possíveis alterações no projeto de
pesquisa, serão escolhidas três escolas da rede pública de ensino situadas em diferentes
contextos socioeconômicos, com base em critérios de diferenciação que amplie as
possibilidades de generalização dos resultados obtidos.

Na segunda etapa, serão constituídos grupos focais compostos pelo pesquisador,


professores e estudantes do ensino médio nas escolas selecionadas. Os grupos focais terão
encontros semanais ou quinzenais, a depender da disponibilidade dos participantes, e terão
duração de seis a oito meses. Todos os encontros serão gravados em áudio (consoante
permissão pessoal), com transcrição posterior, e seguirão o seguinte roteiro:

1. Apresentação da pesquisa e exposição da proposta para os professores;


2. Escolha dos estudantes com base em critérios elaborados em conjunto com os
professores das escolas e interesses dos educandos, de acordo com os objetivos da
pesquisa;
3. Uma vez escolhidos os estudantes e constituídos os grupos focais, no primeiro
encontro será exposto a proposta de roteiro para os encontros do grupo e discutida
coletivamente, com possibilidade de alteração de acordo com sugestões feitas pelo
grupo;
4. Com a intenção de mobilizar um outro olhar sobre a realidade do espaço escolar,
no segundo encontro será proposta a produção de séries fotográficas com o celular
no ambiente da escola, com temática livre, por todos os participantes do grupo,
incluindo o pesquisador e os professores;
5. O terceiro e quarto encontros serão dedicados à análise e discussão coletiva das
fotografias resultantes na proposta do encontro anterior, a partir de dinâmicas na
qual os participantes, individualmente, apresentavam suas fotos comentando com o
grupo a razão pela qual haviam selecionado e realizado aqueles registros, com
aprofundamento das temáticas trazidas pelos participantes;
6. No quinto encontro, será realizada discussão e escolha de temas geradores que
possam ser foco de produção de nova série fotográfica, agora com temáticas
individuais delimitadas previamente a partir dos temas geradores;
7. No sétimo e oitavo encontro será realizada uma oficina de fotografia com o intuito
de fornecer recursos técnicos e estéticos a serem utilizados pelos participantes na
segunda rodada de produção fotográfica;
8. Após a produção da segunda série de fotografias pelos participantes no ambiente
escolar, o nono e décimo encontro será destino à análise e discussão das fotografias
resultantes, também em comparação à fotografias produzidas na primeira série
fotográfica;
9. No décimo primeiro encontro serão selecionadas fotografias a serem expostas para
toda a escola em exposição organizada coletivamente pelo próprio grupo;
10. Após a exposição, os últimos encontros serão destinados para avaliação coletiva de
todo o processo, assim como entrevistas individuais com os professores sobre a
experiência da participação no grupo focal.

Na terceira e última etapa, após o término de cada grupo focal, serão realizadas a
sistematização dos dados e análise dos mesmos junto a orientadora ou orientador da pesquisa.
A partir daí, terá início a escrita da versão final da tese a ser defendida.

O trabalho com fotografia de celular desenvolvido na escola tem como objetivo mais
amplo facilitar a experiência de educadores e educandos com a produção e fruição de imagens
visuais e mobilizar a produção de narrativas. A linguagem fotográfica é vista, assim, como
mais um recurso pedagógico a ser explorado na busca de alternativas e adaptações
curriculares que facilitem o processo de ensino-aprendizagem. Pensando a prática pedagógica
sob a ótica da “remoção de barreiras à aprendizagem” (CARVALHO, 1998), a fotografia
pode ser tomada como uma importante linguagem a ser explorada no processo de construção
de conhecimento e narrativas, de busca de sentidos e significados.

Essa proposta de trabalho pretende possibilitar uma aproximação da relação dos


participantes com a imagem fotográfica e os temas mobilizados, a partir do olhar e das
narrativas construídas pelos próprios estudantes. A investigação é feita a partir da construção
de uma leitura do sentido subjetivo e do conteúdo cultural das imagens fotográficas,
produzidas pelos jovens no contexto escolar. É possível pensar o grupo focal em dois
momentos distintos e complementares que se repetirão. Num primeiro momento, os
participantes são solicitados a produzir imagens fotográficas na escola. A solicitação
desencadeia um certo modo de observar o espaço escolar, buscando um conteúdo com o qual
a foto irá ganhar uma determinada expressividade. Posteriormente, as fotos são apresentadas
no grupo e discutidas coletivamente. Com essa estratégia incentiva-se, com as imagens e
através delas, a criação de um campo dialógico que amplia o significado original da imagem
fotografada, possibilitando que novos sentidos sejam refletidos. A partir dessa reflexão, as
imagens ganham interpretações que não estavam previstas pelo autor ou autora da foto no
exato momento de sua criação. Da imagem à palavra, e da palavra de volta à imagem,
ampliam-se não só os modos de observação como as possibilidades de interpretar uma mesma
imagem.

Por tratar-se de uma abordagem transdisciplinar, espera-se que um trabalho de


compreensão crítica da cultura visual nos mais variados ambientes de aprendizagem seja
capaz de problematizar as representações sociais entre tantas possíveis, nas imagens
produzidas no decorrer do grupo focal. O foco não estará no que pensamos dessas
representações, mas sim no que a partir delas nós possamos pensar sobre nós mesmos. O que
falam dos participantes as representações sociais discutidas? O que não falam? O que falam e
não falam das pessoas iguais e diferentes? O que pode-se pensar a partir dessas diferentes
representações? Por que determinadas representações são sempre recorrentes? Que interesses
são satisfeitos com essas representações?

A representação reiterada de determinados temas e ou grupos sociais acabam por


naturalizar e simbolizar um determinado grupo social e/ou um tema como normal, aceitável.
Como os educadores são representadas/os pelos estudantes? Como eles mesmos se
representam? De que maneira essas representações vêm tentando e ou conseguindo “fixar”
determinados significados para esses papéis? Como foram geradas essas representações? Por
quem, para quem e por quê foram geradas? Que cenários têm sido privilegiados nas
representações do espaço escolar? O que ainda não incluímos nas representações da escola?
Que ideias de ambiente de aprendizagem essas representações acabam por fixar? Trabalhar na
perspectiva da compreensão crítica da cultura visual pode auxiliar a encontrar algumas janelas
que, talvez, venham a dar passagem a outras formas de compreensão da realidade, de
representações que não as hegemônicas. Perspectiva essa que poderá ser utilizada para a
problematização dos mais diversos temas integrantes do currículo escolar.

6 CRONOGRAMA
Nome da Tarefa Início Termino
1 Cronograma de Mar-19 Mar-23
Execução -
Doutorado
2 Revisão Mar-19 Fev-20
Bibliográfica
3 Levantamento Mar-19 Fev-20
Bibliográfico
4 Fichamento do Mar-19 Fev-20
Material
5 Disciplinas Mar-19 Dez-20
6 Cursar Disciplinas Mar-19 Dez-20
Obrigatórias
7 Cursar Disciplinas Mar-19 Dez-20
Optativas
8 Escolha das Escolas Jan-20 Mar-20
9 Constituição dos Mar-20 Abril-20
Grupos Focais
10 Grupos Focais Maio-20 Dez-20
11 Sistematização e Jan-21 Mar-21
tratamento dos dados
12 Análise dos Dados Abril-21 Jun-21
13 Redação da Tese Jul-21 Jul-23
14 Entrega da Tese Ago-23 Ago-23
15 Defesa da Tese Out-23 Out-23

7 REFERÊNCIAS

BOLIN, P. E.; BLANDIN, D. Beyond Visual Culture: Seven Statements of Support for
Material Culture Studies in Art Education. Studies in Art Education: a journal of issues
and research, v. 44, n. 3, p. 246-263, 2003.

CARVALHO, R. E. Temas em educação especial. Rio de Janeiro: WVA, 1998.


DONDIS, D. A sintaxe da linguagem visual. São Paulo: Martins Fontes, 1991.

FREIRE, P. Extensão ou comunicação? São Paulo: Paz e Terra, 1985.


FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 2005.
FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. São Paulo: Paz e Terra, 2008.
HERNANDEZ, F. Cultura visual, mudança educativa e projeto de trabalho. Porto Alegre:
Artmed, 2000.
_____. Más allá de los limites de la escuela: un diálogo entre emergencias sociales y
cambios en las artes visuales y en la educación. In: JORNADAS FUNDACIÓN LA
CAIXA, 2002.
MIRZOEFF, N. Una introducción a la cultura visual. Barcelona: Paidós, 2003.
MORAZA, J. L. Estudios visuales y sociedad del conocimiento. In: CONGRESO
INTERNACIONAL DE ESTUDIOS VISUALES, 1., fev. 2004, Madrid. Trabalhos iniciais.
Disponível em: http://www.estudiosvisuales.net. Acesso em: Set. 2019.
SOUZA, Solange Jobim e; LOPES, Ana Elisabete. Fotografar e narrar: a produção do
conhecimento no contexto da escola. Cad. Pesqui., São Paulo , n. 116, p. 61-80, July 2002.
Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-
15742002000200004&lng=en&nrm=iso>. acessado em 27 Set. 2019.
http://dx.doi.org/10.1590/S0100-15742002000200004.

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