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às vezes eu me pego pensando em como uma pessoa seguindo o curso natural da vida

que é acordar, não entender, se fuder e ir dormir, acaba conseguindo encontrar uma
forma mirabolante de se entitular crítico de cinema. ou de livro. ou de série.
quase como se com o advento da internet, a s pessoas estivessem como se fossem
uma turma de quinta série em que o professor sem muita paciência pergunta

"ok, quem quer ser o representante de turma?" e todo mundo se olhasse em silẽncio,
com uma impressão de que a qualquer momento aquela pessoa que todo mundo espera que
se disponha já saiba que é ela, e com um tom meio arrogante e despojado ela se
levanta e fala

"é, acho que tá na minha hora"

antes da internet, você não podia pegar qualquer material de produção audiovisual,
botar tua cara, voz, texto, e falar "agora isso representa ~a minha opinião~"

e agora não é que qualquer um pode. é que você pode. foda-se se fosse qualquer um,
assistir uns qualquer uns é muito maneiro. já viu aquele site que dá pra ver as
câmeras públicas de vários países diferentes? é muito mais interessante que bbb.
mesmo que nos dois casos você olhe e fale "eu não faço ideia de quem são essas
pessoas", as pessoas na rua sempre vão ser mais espontâneas que as do bbb.

mas aí alguém do nada, por ter twitter e mãos com dedos o suficiente pra digitarem
algumas opiniões tiradas de muito tempo livre pra ficar consumindo uma parcela
relevante de cultura pop, mais o tempo e o dinheiro de ir à lugares com pessoas que
também compartilham desse tempo livre e dessa cultura de usar camiseta do laranja
mecânica. sei lá, um cara que tinha uns 14 anos e viu laranja mecânica no cinema,
ter uma camisa do filme até faz sentido pra mim. eu tenho uma camiseta do móveis
coloniais de acaju e não me arrependo nem um pouco. mas a afirmação, ou como os
yuppies brasileiros que são justamente aqueles que sabem o que significa yuppie
como rótulo, e justamente por isso falam vários outros termos em inglês tipo
"statement" ao invés de afirmação… bom o ato de se afirmar como cinéfilo, pra mim,
sempre foi o símbolo perfeito de como temos um complexo de judas. porque eu vejo
esse sentimento de querer falar sobre filmes mas ter medo de ser tirado de
cinéfilo. é muito chato quem só fala "chatao o filme" ou "maneiro pra caralho". é
muito chato se expressar começando a frase com "é muito chato". porém, mais chato
ainda, é falar "essa cena é muito maneira pra fechar o filme porque no fim ela
representa o poder da linguagem né? o cara escreveu no muro a parada e logo após
morreu" (diálogo que já ouvi na linha da pavuna às 9 da noite)

eu só pensei nisso tudo porque eu vi um vídeo gastando o cara do mamae falei e as


criticas dele a bacurau, aí quando o vídeo citou o pablo villaça eu fiquei bem
confuso. fiquei pensando "eu nem sei se eu gosto ou desgosto do pablo villaça"
tipo, o cara tem opinião sobre todo e qualquer filme que já passou na frente dele,
e eu não consigo formar uma opinião sobre a pessoa dele.

mas só por ser cinéfilo eu já não dou muita moral.


se tu passa tempo demais vendo filme pra poder falar qual é melhor e qual é pior e
todos os porquês, eu já duvido que você seja uma pessoa legal. a não ser que seu
trabalho seja fazer filmes. aí eu entendo. mas se seu trabalho termina só em evocar
uma opinião sobre as coisas que você vê, aí eu provavelmente já não confio muito na
sua opinião. não é naqueles pique de "faz melhor então", mas pode ser que seja um
pouco.

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