Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
522
Passei aquele primeiro dia fazendo buracos no papel e depois fui para casa com um
humor péssimo.
"O que aconteceu, querido? Você não gostou da escola?"
"Eles nunca me deram o presente."
"Presente? Que presente?"
"Eles disseram que iam me dar um presente."
"Bem, olhe, eu tenho certeza de que eles não disseram isso."
"Disseram1. Disseram: Você é Laurie Lee, não é? Sente-se ali para receber presente. Eu
me sentei ali o dia todo, mas
não consegui ganhar nada. Não vou voltar lá de novo amanhã."
Laurie Lee, Cider with Rosie
- Que habilidades especiais o ensino requer, e que fatores são responsáveis pelo sucesso
na escola?
FIGURA 13.1
O relacionamento entre os anos de ensino e a renda nos Estados Unidos.
Observe que, em todos os níveis de ensino, as mulheres tiveram salários inferiores aos
dos homens em 1998, (Extraída do U.S. Bureau of the Census, 1999, p. 28.)
Conceitos:
Educação: Uma forma de socialização em que os adultos se envolvem no ensino
deliberado dos jovens para garantir que eles adquiram conhecimento e habilidades
especializados.
523
Há ... muito pouco ensino explícito ... O que a criança sabe, ela aprende através de
interação direta com a comunidade de adultos, seja aprendendo a dizer a idade do
antílope macho envenenado observando seu rastro endireitar o cabo de uma flecha,
fazer uma fogueira, ou tirar uma lebre da sua toca ... Está tudo implícito. (Bruner, 1966,
p. 59)
524
1989; Lave e Wenger, 1991). Os locais em que os aprendizes aprendem não são
organizados fundamentalmente com o propósito de ensino.
As primeiras formas de ensino formal remontam a cerca de 4000 a.C, no Oriente Médio,
quando mudanças na tecnologia possibilitaram que um setor da população plantasse
alimentos suficientes para sustentar um número grande de pessoas além deles próprios.
Essa mudança possibilitou uma divisão substancial de trabalho e o desenvolvimento de
cidades-estados. Também suscitou a necessidade de criação de sistemas de escrita e
aritmética (Damerow, 1998; Schmandt-Besserat, 1996). Os lugares em que as pessoas
se reuniam para aprender a ler e escrever foram as primeiras escolas (ver a Figura 13.2).
Como tem-se desenvolvido desde então, o ensino difere do ensino informal na
família e do treinamento do aprendizado de quatro maneiras principais (Lave e
Wenger, 1991; Singleton, 1998).
1. Motivação. Os alunos devem trabalhar durante anos para aperfeiçoar suas habilidades
antes de poderem pôr em prática o seu conhecimento no trabalho adulto. Nesse meio
tempo, são solicitados a se envolver em tarefas que, em geral, acham monótonas.
525
o ensino obrigatório e se esforçar para difundir a alfabetização. Quando a freqüência
obrigatória à escola estava em seus primórdios, havia dois tipos de educação. A
educação em massa era destinada à grande maioria das crianças da classe trabalhadora.
Ela lhes permitia recitar desde um texto religioso, como a Bíblia ou o Alcorão, até
escrever para propósitos simples e calcular pequenas somas. Essa instrução obvia-
mente não se destinava a dar às crianças uma educação geral como entendemos o
termo hoje. Ela enfatizava o "domínio do básico", porque não esperava que a classe
trabalhadora usasse a alfabetização ou a numeração para propósitos complexos. Os
professores do sistema de educação em massa ficavam caracteristicamente na frente
dos alunos e baseavam seu ensino em grande parte no exercício e na prática,
combinados com a exposição em grupo (Gallego e Cole, 2000).
Em contraste, as crianças da elite política e econômica e um número crescente
de crianças entre as classes profissionais de crescimento rápido recebiam uma educação
liberal, em que o ensino individual era ministrado por um tutor ou acontecia em
pequenos grupos. Esperava-se que essas crianças fossem além do "básico" e
dominassem temas mais complexos, incluindo história, artes e ciências. O Presidente
Woodrow Wilson articulou os diferentes propósitos das duas formas de educação
em 1910, quando escreveu: "Queremos que uma classe de pessoas tenha uma educação
liberal e que outra classe de pessoas, uma classe muito maior, abstenha-se do
privilégio de uma educação liberal e se ajuste para desempenhar tarefas manuais
específicas, difíceis" (citado em Lucas, 1972, p. 42).
Nenhuma sociedade contemporânea atingiu esse ideal; muitas crianças não conseguem
terminar o número de anos de ensino prescritos e muitos fracassam no domínio até das
habilidades básicas que, freqüentemente, dependem da aprendizagem adicional. O
fracasso na escola é mais que um problema pessoal para as crianças cujo
desenvolvimento é restrito devido ao desempenho acadêmico deficiente. É, também, um
problema político e econômico, devido às suas implicações para a sociedade como um
todo. O primeiro passo para remediar esse problema é entender os processos através dos
quais as crianças adquirem habilidades acadêmicas.
FIGURA 13.2
Os primeiros escritos, que datam de cerca de 4000 a.C, foram na forma de tábuas de
barro gravadas com símbolos cuneiformes. Esse tipo de escrito originou-se dos
pictogramas, desenhos dos contornos básicos dos objetos a que se estava referindo. Com
o tempo e o uso, os pictogramas tornaram-se simplificados e se transformaram em
símbolos com forma de cunha (cuneiforme) que podiam transmitir sons e conceitos
abstratos, assim como objetos. A tábua aqui mostrada, de Telos, no sul da antiga
Mesopotâmia, é um registro sobre carneiros e gansos.
Conceito:
Ensino: Uma forma de educação caracterizada por formas especiais de motivação,
relações sociais, organização social e comunicação usando a linguagem escrita.
526
Aprendendo a ler
Há um amplo acordo entre psicólogos e educadores de que a leitura não é uma
habilidade unitária, mas um sistema complexo de habilidades e conhecimentos
coordenados (Snow et al., 1998). Sabe-se muito sobre a maneira como os leitores
527
transformam as marcas realizadas em uma página em mensagens significativas.
Mas, apesar de esforços de pesquisa intensos, durante todo o século passado, e em
especial nas duas últimas décadas, os processos usados para a aprendizagem da
leitura ainda não são bem compreendidos (Bransford et al., 1999).
Conceito:
Consciência fonêmica: A capacidade para "ouvir fonemas" (por exemplo, para
reconhecer que "balão" começa com um b).
Pré-leitura O primeiro passo que as crianças devem dar ao aprender a ler é compreender
que há uma correspondência entre as marcas na página impressa e a linguagem
falada. Quando elas entendem que cada palavra é representada por um grupo de
sinais gráficos, ainda têm que descobrir o significado do texto escrito. De início, a
maior parte das crianças acredita que há um símbolo para cada palavra. Elas, então,
começam a se concentrar nas sílabas, agrupamentos mínimos da linguagem falada.
Finalmente, percebem que as letras devem corresponder a cada um dos fonemas de
uma palavra (Tolchinsky e Teberosky, 1998).
Peter Bryant e seus colegas conduziram muitas pesquisas para demonstrar que
as crianças de diferentes países que acham difícil fragmentar as palavras em suas
sílabas e fonemas constituintes em uma tarefa puramente oral têm dificuldade
para ligar sons e letras (Bryant, 1993; Bryant e Nunes, 1998; Ho e Bryant, 1997).
Os resultados dessa instrução especial podem ser dramáticos (para críticas, ver
Adams et al., 1998, e Snow et al., 1998). Por exemplo, Benita Blachman (1987;
Blachman et al., 1997) implementou um programa desse tipo em duas escolas do
interior durante a primeira e segunda séries (e na terceira série para as crianças que
ainda estavam experimentando dificuldade de leitura). Depois, as crianças foram
testadas na quarta série. Antes do programa de Blachman ser introduzido, o desempenho
de leitura na quarta série nas escolas estava sete meses atrasado em relação à norma
nacional. As crianças do programa experimental, em compensação, estavam sete meses
à frente da norma nacional e os ganhos foram ainda maiores um ano
528
mais tarde. Esses resultados não somente corroboram o vínculo teórico entre a análise
da linguagem e a aquisição da leitura, mas também mostram que a teoria pode ser
proveitosamente aplicada na prática.
Mesmo depois de terem adquirido a capacidade para segmentar a linguagem falada em
fonemas, as crianças que estão aprendendo a ler e escrever em inglês enfrentam uma
dificuldade adicional: não há um relacionamento único entre as letras do alfabeto e os
fonemas que compõem as palavras inglesas. Em vez disso, as 26 letras do alfabeto
inglês representam 52 fonemas básicos. Então, por exemplo, uma criança que se está
alfabetizando em inglês precisa perceber o fato que o í é pronunciado diferentemente
nas palavras "tea" e "both", e letras aparentemente tão diferentes como o^e o podem ser
usadas para produzir um único som, como em "muff" e "rough". Lições similares devem
ser dominadas para todo o alfabeto.
Processamento de baixo para cima versus de cima para baixo Até agora descrevemos o
processo de aprender a ler como se as crianças começassem a ler as palavras primeiro
decodificando as letras que compõem as palavras, ou seja, "de baixo para cima".
N. de .R. Em português, temos o exemplo do x, pronunciado diferentemente em
"sintaxe" e "praxe" e das letras c e s em "cerco" e "selo", que produzem o mesmo som.
529
Procedendo dessa maneira, poderíamos conceber a aprendizagem da leitura como
um processo em que a criança decodifica as letras individuais de uma palavra para
obter acesso ao seu significado e, depois, une as palavras em frases, daí em parágrafos
e assim por diante.
O coelho disse: "Eu posso correr. Eu consigo correr depressa. Você não consegue correr
depressa.".
A tartaruga disse: "Olhe, Coelho, veja o parque. Você e eu vamos correr. Vamos correr
para o parque.".
O Coelho disse: "Eu quero parar. Eu paro aqui. Eu consigo correr, mas a Tartaruga não
consegue. Eu chego mais depressa no parque.".
A Tartaruga disse: "Eu não consigo correr depressa. Mas não vou parar. O Coelho não
consegue me ver. Eu vou chegar no parque.". (Citado em Grecn, 1984, p. 176.)
530
FIGURA 13.3
Aprendendo matemática
Aprender matemática requer que as crianças adquiram um conjunto distinto de
conceitos e que dominem um sistema de notação especial para lidar com a quantidade e
a forma.
531
alunos de primeira série podiam começar com o 2 e, então, usar seus dedos para
acrescentar mais 9; mais ou menos um ano mais tarde, as crianças mais provavelmente
transformariam 2 + 9 em 9 + 2, uma estratégia que tanto simplifica a tarefa, quanto
mostra seu entendimento do princípio de que a ordem não altera o resultado da soma. E,
é claro, se acham que sabem a soma "de cor", as crianças diretamente lembrarão a
resposta (ou o que acreditam ser a resposta). À medida que as crianças ficam mais
velhas e adquirem mais conhecimento, a lembrança direta passa a dominar a adição de
pequenos números, e vários procedimentos de lápis e papel substituem os dedos como
instrumentos estratégicos na maior parte das circunstâncias.
Conceitos:
Conhecimento: conceitual A capacidade para entender os princípios que
sustentam o problema.
da linguagem falada. Embora números como 203 ("duzentos e três") sejam, digamos
assim, pronunciados da esquerda para a direita, eles são, na verdade, construídos da
direita para a esquerda a partir do ponto decimal, que é normalmente escrito apenas
quando alguma fração de um número inteiro deve ser indicada. Então, por exemplo,
"Duzentos e três e quarenta e cinco centésimos" é escrito 203,45. (Ver a Figura 13.4
para um tipo muito diferente de sistema de notação.)
A maior parte das crianças precisa de vários anos para dominar essa complexidade, um
fato que influencia sua capacidade para realizar no papel operações básicas como a
adição e a subtração. Erros comuns são adicionar números na ordem em que são ditos -
da esquerda para a direita - e alinhar os números a partir da esquerda. Confusões desse
tipo produzem erros como escrever 123 + 1 como 123 + 1
533
que os processos básicos, de baixo para cima, e os processos de ordem mais elevada,
de cima para baixo, sejam adequadamente integrados, mas conseguir o equilíbrio
certo é um desafio difícil (Sfard, 1999).
FIGURA 13.4
Conceitos:
Discurso instrucional: Uma maneira particular de falar e de pensar característica na
escola, mas raramente encontrada nas interações cotidianas na comunidade ou no lar.
Esse arranjo permite que Ramona aprenda com a resposta de Kim e com a
resposta do professor a ela, ao mesmo tempo em que permite ao professor avaliar a
necessidade de Ramona de mais estudo. Em outras ocasiões, o professor poderia
usar a avaliação como um meio para incluir novos aspectos do tópico que está
ensinando, ou envolver outra criança na discussão (Nassaji e Wells, 2000).
534
segundo lugar, observe que, para os propósitos dessa lição, a correção do que as
crianças dizem é menos importante do que a maneira como a dizem. Cindy deu a sua
resposta na forma que o professor estava desejando, mas, como Richard percebeu,
Cindy disse a cor errada. Ela estava correta nos termos da escola, mas violou claramente
as normas do uso cotidiano da linguagem.
TABELA 13.1
SEQÜÊNCIA PERGUNTA-RESPOSTA-AVALIAÇÃO
Iniciação - P: Kim.
Resposta - Kim: Primeiro
Avaliação - P: Certo.
Embora o uso da aula expositiva esteja disseminado nas salas de aula do mundo
todo, muitos estudiosos do desenvolvimento declaram que essa não é a melhor
maneira de organizar o ensino. Por exemplo, Marilyn Adams estimou que cerca de
aproximadamente 25% das crianças que aprendem a ler usando uma estratégia de
"primeiro decodificar" não obtêm sucesso (Adams, 1990). Entre outros insucessos,
as crianças que aprendem dessa maneira são colocadas no papel de receptores passivos
de informação pré-digerida. Elas obtêm muito pouca prática na formulação de
problemas para si mesmas. Mas expandir o conhecimento da criança sobre as
535
TABELA 13.2
AULA SOBRE O USO DAS PREPOSIÇÕES
Pergunta:
P (Professor): Coloque uma flor vermelha sob a árvore, (pausa) Certo, vamos observar a
flor vermelha. Você sabe me dizer onde está a flor vermelha?
Resposta:
Crianças: Aqui, aqui.
Pergunta: P: Dora?
Resposta: Dora: Sob a árvore.
Richard: [percebendo que Cindy, na verdade, desenhou a flor "vermelha" com um lápis
amarelo] Ei, essa não é vermelha.
Conceito:
ensino recíproco: Um método de ensinar leitura em que os professores e as
crianças se alternam em ler um texto de tal maneira que integrem as habilidades
de decodificação e compreensão.
Ensino recíproco O ensino recíproco foi projetado por Ann Brown e Annemarie
Palincsar (1984) como uma maneira de integrar as habilidades de decodificação e
as habilidades de compreensão. Tinha como alvo as muitas crianças que "aprenderam
a ler" no sentido em que conseguiam decodificar textos simples, mas que tinham
dificuldade para extrair sentido do que liam.
536
DESTAQUE 13.1
COMPUTADORES NAS ESCOLAS
Nas duas décadas passadas, o aumento do uso do computador nas escolas foi
fenomenal. Em 1983, havia aproximadamente um computador para cada 168 alunos nas
escolas norte-americanas. Em 1998, havia um computador para cada seis alunos. Além
disso, espera-se que o uso dos computadores nas escolas aumente nas próximas décadas
(Anderson e Ronnkvist, 1999).
Esse aumento na quantidade de computadores foi acompanhado pela queda dos custos
pelo incrível aumento da velocidade de processamento e de capacidade da memória e
pelo advento da Internet e do World Wide Web, que coletivamente permitiram que os
computadores se tornassem um meio de comunicação poderoso. Essas mudanças no
custo, na capacidade e na função permitiram que os computadores tivessem impacto nas
salas de aula de todo o mundo industrializado.
Uma vantagem que a IAC tem sobre os livros didáticos de exercício e prática é a
capacidade de acompanhar o desempenho exato de cada criança e reagir em
conformidade com isso. Em um programa planejado por Patrick Suppes (1988), por
exemplo, o computador repete as matérias em que o aluno tem dificuldades e apresenta
"lembretes" organizados das matérias anteriormente aprendidas para, garantir que o
aluno retenha todas as informações a serem aprendidas.
A terceira abordagem sobre uso dos computadores na escola enfatiza o fato de que,
apesar de tudo que possa colocá-lo separado das outras tecnologias desenvolvidas pelos
humanos, o computador é, no fundo, um instrumento que pode ser usado para
proporcionar uma ampla extensão de recursos aos aprendizes. Essa idéia, que sustenta
grande parte do atual entusiasmo pelo uso dos computadores na sala de aula, supõe que,
se for possível proporcionar informações abundantes aos aprendizes ativos, certamente
a aprendizagem acontecerá. Não há dúvida de que os computadores, com suas atuais
habilidades multimídia, podem proporcionar enormes quantidades
537
Vários grupos de pesquisa têm usado redes de computador para forjar relacionamentos
entre as escolas em diferentes partes do mundo, permitindo aos alunos engajar-se em
projetos de aprendizagem conjunta em que, por exemplo, eles medem e registram os
níveis de chuva ácida ou comparam as histórias de seus grupos culturais em relação um
ao outro (Levin et al., 1990; Riel, 1998). O uso das redes de computador também
permite aos alunos participarem de projetos que acham genuinamente interessantes. Por
exemplo, eles conseguem interagir on-line com cientistas engajados em atividades
interessantes como explorar o espaço, as regiões polares ou os desfiladeiros submarinos,
ficando diretamente envolvidos na análise de dados importantes e na descoberta do que
significam.
Vários estudos têm mostrado que os computadores podem realizar uma diferença
positiva na sala de aula quando adequadamente usados. O desafio atual é entender o seu
potencial, fazendo usos efetivos da nova tecnologia, como uma parte rotineira da
educação espaço de toda criança.
538
Holanda (Cobb et al., 1997). Esses pesquisadores oferecem três idéias básicas como
o cerne da sua educação realística da matemática:
3. À medida que as crianças se adiantam nas lições, espera-se que usem modelos para
representar quantidades e realizem ações matemáticas. Cobb descreve vários estudos
que usam uma "estante aritmética", com duas prateleiras contendo 10 contas cada. Para
o contexto do condutor no ônibus, a estante aritmética proporciona um modelo espacial
bastante preciso, com cada uma de suas prateleiras correspondendo a um andar do
ônibus. Mas as contas na estante também podem ser usadas para representar os doces
colocados ou retirados de um pote de doces e vários outros contextos de uma loja que
tenham propriedades matemáticas equivalentes.
FIGURA 13.5
O ensino recíproco (a) não apenas se mostrou mais eficaz do que a instrução explícita
ou a modelagem, (b) mas também produziu uma melhora marcante no sucesso da leitura
das crianças em estudos sociais e ciências. Tanto a instrução explícita quanto o ensino
recíproco conduziram a uma melhora da leitura, mas o ensino recíproco foi o
procedimento mais eficaz. Os alunos aos quais foi proporcionada uma prática na leitura
recíproca mostraram melhoras maiores mais prolongadas em suas aulas de estudos
sociais e ciências, enquanto os alunos que não receberam ensino especial em leitura
tiveram um desempenho bastante deficiente. (Extraída de Brown et al., 1992.)
539
O sucesso contrastante dos diferentes modos de ensino devem deixar claro que o
que as crianças aprendem na escola depende, de certa forma, do tipo de ensino que
recebem. Entretanto, como comentamos anteriormente, uma proporção muito elevada
de escolas seguem métodos expositivos para a classe inteira, de forma que os
psicólogos do desenvolvimento podem, grosso modo, tratar a escola como um tipo
uniforme de experiência, procurando avaliar como o conhecimento sobre o mundo
através da leitura e da escrita nas escolas afeta o desenvolvimento cognitivo durante
a segunda infância e além. Independente da abordagem instrucional, o ensino
expande a base de conhecimento das crianças, proporciona-lhes experiência maciça na
lembrança deliberada e as treina na resolução sistemática dos problemas. As últimas
décadas de pesquisa demonstram que essas experiências afetam as crianças,
mas que os efeitos dependem dos processos cognitivos particulares em questão.
540
Os pesquisadores que usaram essa estratégia acham que a primeira série de ensino
proporciona um aumento marcante na sofisticação de alguns processos cognitivos, mas
não de outros. Frederick Morrison e seus colegas (1995), por exemplo, compararam a
capacidade dos alunos de primeira série da educação infantil para lembrar as gravuras
de nove objetos comuns. Os alunos de primeira série eram, em média, apenas um mês
mais velho que aqueles da pré-escola, e no início do ano escolar os desempenhos dos
dois grupos eram virtualmente idênticos. No final do ano escolar, no entanto, os alunos
de primeira série conseguiam se lembrar do dobro de gravuras que se lembravam no
início do ano, enquanto os alunos da pré-escola não mostraram melhora na memória.
Significativamente, os alunos de primeira série envolveram-se em repetição ativa
durante a testagem, o que não ocorreu com os alunos da pré-escola. Evidentemente, um
ano de ensino produziu marcantes mudanças nas estratégias e no desempenho. O
mesmo padrão de resultados foi obtido para os testes padronizados de leitura e
matemática (Morrison et al., 1997).
Há uma exceção interessante a esses achados. Jeffrey Bisanz e seus colegas testaram as
respostas das crianças a um teste piagetiano padronizado de conservação dos números
(ver o Capítulo 12) e também pediu às crianças para adicionar números pequenos
(Bisanz et al., 1995). Descobriram que o desempenho na tarefa de conservação
melhorou muito como conseqüência da idade, mas que a aritmética mental
melhorou quase exclusivamente como uma conseqüência do ensino. Esses achados
tanto confirmam a importância do ensino na promoção de várias habilidades
cognitivas relativamente específicas, quanto corroboram a crença de Piaget de que
a capacidade para conservar a quantidade se desenvolve sem nenhuma instrução
especial em algum momento entre os cinco e os sete anos de idade.
Conceito:
Estratégia da admissão à escola: Um meio de avaliar o impacto da educação,
controlando pela idade, pela comparação de crianças que são quase da mesma idade,
mas que entram na escola com um ano de diferença, devido às regras de admissão da
escola.
EFEITOS DO ENSINO
Pensamento lógico
541
FIGURA 13.6
(a) Cartões usados para testar a memória de curto prazo. Sete cartões são escolhidos e,
depois, virados de face para baixo. É, então, mostrado à pessoa que está sendo testada
uma duplicata de um dos cartões e ela é solicitada a escolher o cartão correspondente
dentre os sete que estão de face para baixo, (b) Que cartão tem uma figura
correspondente? (Extraída de Wagner, 1978.)
Memória
Da mesma maneira que aconteceu em uma pesquisa semelhante realizada nos Estados
Unidos (Hagen et al., 1970), Wagner descobriu que o desempenho das
542
FIGURA 13.7
O desempenho na memória de curto prazo como uma função da idade e do número de
anos de escolarização. Na ausência de educação adicional (como entre os povos rurais
testados nesse estudo), o desempenho não melhoro com a idade. Por isso, o ensino
parece ser um fator fundamental na capacidade de uma pessoa para desempenhar bem
essa tarefa. (Os números entre parênteses representam o número médio de anos de
escolarização para o grupo designado.) (Extraída de Wagner, 1974;
Habilidades metacognitivas
O ensino parece influenciar a capacidade para refletir e falar sobre os próprios processos
de pensamento (Luria, 1976; Rogoff, 1981; Tulviste, 1991). Quando as crianças foram
solicitadas a explicar como chegaram à resposta de um problema lógico, ou o que
fizeram para conseguir se lembrar de algo, aquelas que não freqüentavam a escola
provavelmente disseram algo como "fiz o que minha cabeça mandou", ou não
ofereceram nenhuma explicação. As crianças que freqüentavam a escola, por outro lado,
provavelmente falaram sobre as atividades mentais e lógicas subjacentes às suas
respostas. Os mesmos resultados aplicam-se ao conhecimento metalingüístico. Sylvia
Scribner e Michael Cole (1981) pediram a pessoas instruídas e não-instruídas do povo
Vai da Libéria para julgar a correção gramatical de várias frases faladas em vai.
Algumas frases eram gramaticais;
543
outras, não. O ensino não teve efeito sobre a capacidade dos entrevistadores para
identificar as frases não-gramaticais; mas as pessoas instruídas conseguiam, em
geral, explicar o que tornava uma frase não-gramatical, enquanto as não-instruí-
das não conseguiam.
Uma das linhas de evidência mais intrigantes para a maneira como o ensino afeta o
desenvolvimento vem da pesquisa realizada por Robert LeVine e seus colegas, que
estudaram o impacto da escolarização nas práticas de educação dos filhos de pais
que freqüentaram ou não a escola (LeVine et al., 1996). Esses pesquisadores
descobriram que as mães que tiveram vários anos de escolarização conversavam
mais com seus filhos e usavam métodos de educação menos diretivos, um padrão
similar àquele dos pais de classe média na América do Norte. Mais significativo
ainda, seus filhos exibiam um melhor desempenho na escola e nos testes padronizados
de desenvolvimento cognitivo.
Talvez o aspecto mais importante do ensino para a maioria das pessoas seja
social; o ensino é um portão de entrada para o poder econômico e para a posição
social. Como já observamos anteriormente nesse capítulo (Figura 13.1), as associações
entre os anos de escolarização, a renda e a situação no emprego são fortes (U.S.
Census Bureau, 1995). Na média, quanto mais anos de ensino as pessoas recebem,
maior a sua renda e maior a probabilidade de obterem empregos especializados.
Nas sociedades desenvolvidas, o sucesso na escola é um contribuinte tão importante
para o bem-estar econômico posterior das crianças que os psicólogos do
desenvolvimento e os educadores estão muito interessados em entender os fatores
que o promovem ou o inibem. Uma crença popular comumente compartilhada reza
que muitas crianças que têm sucesso simplesmente possuem uma especial "aptidão para
a aprendizagem" que as outras carecem. Mas, como veremos, há mais
fatores responsáveis pelo sucesso na escola do que a aptidão acadêmica. Vários
fatores físicos, psicológicos e socioculturais desempenham um papel essencial no
sucesso das crianças na escola.
544
aprendizagem que ocorrem na escola? Durante todo o século passado, as respostas
a essas perguntas têm sido influenciadas pela idéia de que as pessoas variam em
uma aptidão chamada "inteligência" e que essas variações explicam as diferenças
em seu desempenho na escola.
Por exemplo, Robert Serpell (1993) relata que o equivalente mais próximo à
expressão "inteligência" entre os chewa de Zâmbia enfatiza qualidades como a
cooperação e a obediência. Pierre Dasen e seus colegas relatam que entre os baoulé da
Costa do Marfim, o conceito de ríglouelê, que parece funcionar como a palavra
"intelligence" em inglês, inclui duas dimensões (Dasen et al., 1985). Uma dimensão
envolve os componentes sociais (obediência, honestidade, responsabilidade, polidez,
reflexão, sabedoria), enquanto a outra envolve componentes tecnológicos (observação,
aprendizagem rápida, destreza manual, capacidade de memorização). Uma ênfase na
dimensão social da "inteligência" parece bastante disseminada nas sociedades mais
tradicionais (Segall et al., 1999, p. 145ff), mas é a dimensão tecnológica que domina os
conceitos de inteligência na Europa e na América do Norte.
Apesar das incertezas sobre o que "realmente é" inteligência, quase todas as
crianças que estão crescendo hoje na América do Norte realizarão um teste de
inteligência, em algum momento, antes de completarem sua educação. Esses testes são
usados para decidir que tipo de educação vão receber e o tipo de trabalho que realizarão,
o que, por sua vez, vai influenciar suas vidas quando adultas. Por isso, é importante
entender a natureza da inteligência incorporada nesses testes, assim como a
natureza da testagem em si como um fator importante no desenvolvimento das crianças.
545
Está vendo essa chave? Você deve colocá-la sobre aquela cadeira (apontando para a
cadeira); depois, feche a porta; depois, vá ver perto da porta uma caixa que está sobre
uma cadeira. Vá pegar essa caixa e trazer para mim. (p. 206)
Aos quatro anos de idade, poucas crianças conseguiram realizar todas as partes
dessa tarefa sem ajuda. Aos cinco, cerca de metade das crianças responderam
adequadamente e, aos seis, quase todas as crianças completaram toda a tarefa. Esse
padrão de realização ligado à idade proporcionou a Binet e Simon as características do
teste que eles precisavam. Uma criança de quatro anos de idade que passasse no
teste era considerada precoce, enquanto uma de seis que não conseguisse realizá-lo
era considerada atrasada com relação a essa capacidade.
Para comprovar que sua escala refletia mais que uma seleção fortuita de itens
de teste, Binet e Simon testaram seus achados em comparação aos julgamentos do
professor sobre a inteligência das crianças. Os resultados obtidos pelas crianças em
sua escala coincidiu em alto grau com as avaliações dos professores.
Voltando sua atenção para as causas do fracasso na escola, Binet e Simon sugeriram que
uma criança poderia carecer da "inteligência natural" (a "natureza") necessária para ela
ser bem-sucedida na escola ou da "origem cultural" (a "criação") proporcionada pela
escola. Uma criança muito inteligente podia ser privada de ensino por circunstâncias
estranhas. Ela pode ter vivido distante da escola; ela pode ter tido uma doença
prolongada ... ou talvez alguns tivessem preferido manter seus filhos em casa, fazer com
que eles lavassem garrafas, servissem os clientes de uma loja, cuidassem de um parente
doente, ou pastoreassem o rebanho. Nesses casos, ... basta desconsiderar um pouco os
resultados dos testes que têm um caráter notavelmente escolástico e dar maior
importância àqueles que expressam a inteligência natural, (p. 253-254)
Nosso exame da inteligência não pode levar em conta todas essas qualidades, atenção
desejo, regularidade, continuidade, docilidade e coragem que desempenham um papel
546
tão importante no trabalho escolar e, também, na vida posterior; pois a vida não é tanto
um conflito de inteligências quanto um combate de caracteres, (p. 256)
Da idade mental ao QI
QI = (IM/IC) 100
Nas últimas décadas, o método para o cálculo do QI foi aperfeiçoado para levar
em conta o fato de que o desenvolvimento mental é mais rápido no início da vida da
pessoa. Por exemplo, as pontuações brutas do QI não levavam em consideração o
fato de que a diferença entre o funcionamento mental das crianças de quatro e
cinco anos de idade fosse maior do que a diferença entre os adolescentes de 14 e 15
anos de idade. Para superar essa dificuldade, os psicólogos usam atualmente uma
pontuação chamada de "desvio de QI" (Wechsler, 1974). O cálculo das pontuações
do QI como desvios tira proveito do fato estatístico, ilustrado na Figura 13.10, de
que as pontuações de QI bruto calculadas para uma amostra grande constituem uma
distribuição aproximadamente normal. Quando os psicólogos baseiam as pontuações de
QI atribuídas a crianças, nas diferenças entre suas pontuações brutas e a média
padronizada de 100, eles têm um padrão estatístico que é o mesmo para todas as
crianças.
Apesar de várias revisões, a lógica dos procedimentos criados por Binet e Simon
ainda é a base dos testes de inteligência padronizados. As tarefas fundamentais na
criação de um teste de QI são as seguintes:
547
2. Dispor os itens em ordem de dificuldade, de tal forma que à medida que as crianças
vão ficando mais velhas elas tenham maior probabilidade de responder corretamente a
mais itens.
FIGURA 13.8
Itens simulados da Escala de Inteligência de Wechsler para Crianças. (Copyright 8
1948, 1974, 1991 da Psychological Corporation. Reprodução autorizada. Todos os
direitos reservados.)
Conceito:
Quociente de inteligência (QI): A razão da idade mental em relação à idade
cronológica, calculada como QI = (IM/ IC) 100. O cálculo do QI dessa maneira
garante que, quando as crianças estão tendo um desempenho precisamente como é
esperado para a sua idade, a pontuação resultante será 100; assim, 100 é, por definição,
um "QI médio".
FIGURA 13.9
Um item de amostra de um teste de inteligência amplamente usado destinado a avaliar a
capacidade para perceber padrões. Observe que, embora esses itens do teste não
requeiram uma formulação verbal elaborada, eles supõem que aquele que está sendo
submetido ao teste esteja familiarizado com representações bidimensionais das figuras,
uma convenção que não existe em muitas culturas. (Extraída de Raven, 1962, Publicada
com autorização de J.C. Raven Limited)
FIGURA 13.10
Uma curva idealizada em forma de sino com distribuição das pontuações do QI.
uma curva em forma de sino é uma distribuição das pontuações em um gráfico em que o
valor mais freqüente, a média, está no centro e os valores menos freqüentes estão
distribuídos simetricamente em cada lado. Por definição, a pontuação do QI modal é
100.
548
Robert Sternberg (1985, 1999) propôs o que ele chama de uma teoria "triárquica" da
inteligência, governada por três princípios distintos. Segundo Sternberg, os três tipos de
inteligência são:
549
- Os problemas escolares são formulados para o aprendiz por outra pessoa, enquanto os
problemas do cotidiano requerem que os próprios aprendizes reconheçam ou formulem
problemas.
-Os problemas escolares, em geral, têm pouco ou nenhum interesse intrínseco para os
aprendizes, enquanto as tarefas do cotidiano são intrinsecamente
importantes para eles.
- Os problemas escolares, habitualmente, têm uma única resposta certa e que só pode ser
alcançada por um único método, enquanto os problemas do cotidiano têm várias
soluções aceitáveis e que podem ser alcançadas por vários caminhos.
- Os problemas escolares vêm com todas as informações necessárias para se lidar com
eles, enquanto os problemas do cotidiano requerem que as pessoas busquem novas
informações.
TABELA 13.3
INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS DE GARDNER
Tipos de inteligência e Características
550
A pesquisa de Yerkes iniciou uma controvérsia que continuou até a época atual.
Dois resultados pareciam ser particularmente problemáticos. Em primeiro lugar, a
idade mental média dos anglo-americanos nativos foi avaliada como sendo de 13
anos. Como, pelos padrões da época, uma idade mental de 8 a 12 anos era considerada
subnormal para um adulto, parecia que uma parte substancial da população anglo
consistia de "idiotas". Em segundo lugar, havia uma diferença substancial entre as
pontuações conseguidas pelos recrutas de origem euro-americana e afro-americana.
Em geral, a média para os recrutas de origem européia foi uma idade mental de
13,7 anos, enquanto os afro-americanos obtiveram em média pouco mais de 10 anos.
Uma das linhas de evidência mais notáveis para a hipótese ambiental da inteligência é o
fato de que, no mundo todo, tem havido um aumento constante no desempenho nos
testes de QI desde que a testagem teve início (Flynn, 1999). Embora essa quantidade
seja diferente segundo o tipo de teste usado e o país particular em que ele é
administrado, o resultado geral para os 20 países em que essa testagem tem sido
amplamente realizada, há muitas décadas, indica que as pontuações de QI
têm aumentado em uma média de 10 a 20 pontos para cada geração. Isso significa,
por exemplo, que o adulto afro-americano médio, em 1990, tinha um QI mais alto
que um adulto euro-americano médio em 1940, e que a pessoa inglesa média, em
1900, teria uma pontuação em um nível atualmente considerado como indicador
de deficiência mental.
Não há consenso claro sobre que fatores ambientais estão fazendo com que as
pontuações de QI aumentem, mas é certo que a mudança é ambiental em sua origem,
pois não pode provir de uma mudança rápida na constituição genética das pessoas
do mundo todo. Como declara Flynn (1999), é quase impossível determinar como o
ambiente contribui para o desenvolvimento da inteligência, porque todos os fatores
causais possíveis estão intimamente conectados uns com os outros e todos conduzem
a mudanças que seguem na mesma direção. A lista dos fatores causais possíveis
varia desde uma nutrição melhor e mais anos de escolaridade, até um aumento na
complexidade da vida e, até mesmo, a disseminação de videogames interativos.
(Para discussões mais detalhadas dos fatores ambientais que podem estar atuando
na elevação das pontuações de QI, ver Neisser, 1998.)
FIGURA 13.11
Itens do teste de completar figuras usado por Robert Yerkes e seus colegas para
testar os recrutas durante a Primeira Guerra Mundial. Cada figura está de alguma
maneira incompleta; a tarefa é identificar o que está faltando. (Extraída de Yerkes,
1921.)
551
552
contribuição genética para um traço, pouco pode ser dito sobre precisamente
que genes estão interagindo com o ambiente e de que maneira. Os esforços para separar
as várias influências da natureza e da educação sobre o fenótipo são mais complicados
ainda pelo fato de que os pais contribuem tanto para a constituição genética dos seus
filhos quanto para o ambiente em que eles crescem. E, então, surge o elo final na análise
da interação entre o gene e o ambiente: em resposta às influências genéticas e
ambientais, as crianças moldam ativamente seus próprios ambientes.
553
estaria errada. O sistema de números usado pelos Ikung não é o mesmo que aquele
usado pelas pessoas de Minnesota e representa um papel diferente em suas vidas.
Na sociedade kung, a importância relativa de saber o número de dedos de uma
mão é menos importante do que saber como fazer nós com esses dedos.
Várias tentativas têm sido feitas para criar testes "independentes da cultura",
mas ainda não foi encontrada uma solução em geral satisfatória: todos os testes de
inteligência baseiam-se em uma origem da aprendizagem que é específica da cultura
(Cattell, 1949; Davis, 1948). (Tentativas mais recentes para lidar com as dificuldades
de se comparar a inteligência entre linhas raciais e culturais estão descritas em
Irvine e Berry, 1987, e em Neisser et al., 1996.)
O fato de que a inteligência não pode ser testada independentemente da cultura
que dá origem ao teste limita muito as conclusões que podem ser extraídas da testagem
do QI em diferentes grupos sociais e culturais. Vários estudos têm usado comparações
de gêmeos idênticos e fraternos para distinguir as contribuições genéticas das
contribuições ambientais para a inteligência, mas esses estudos têm uma limitação
importante. Segundo a lógica dos estudos de gêmeos, os ambientes dos "gêmeos" deve
diferir bastante para ser possível detectar com o teste suas distintas contribuições. Mas,
se a variação ambiental é muito grande, como no caso de uma criança transportada de
Minnesota para o deserto de Kalahari, a inteligência de ambos os gêmeos não pode ser
medida de uma maneira válida pelo mesmo teste.
554
À primeira vista, os dois primeiros fatos podem parecer entrar em conflito com
o terceiro: se a herança é responsável por uma parte das diferenças entre os grupos
na inteligência testada, por que não seria razoável concluir que a fonte das diferenças
entre os grupos é a mesma fonte das diferenças entre os indivíduos?
Há duas respostas para essa questão: uma lógica e a outra empírica. A resposta
lógica foi proporcionada por Richard Lewontin (1976). Pode ser ilustrada por um
exemplo da genética das plantas (veraFigura 13.12). Suponhamos que um
fazendeiro tenha dois campos, um fértil e o outro desprovido de nutrientes. Ele pega
sementes de milho ao acaso de um saco contendo várias variedades genéticas e as planta
nos dois campos. Cuida delas da mesma maneira. Quando as plantas atingiram a
maturidade, ele vai descobrir que em cada campo algumas plantas cresceram mais alto
do que outras. Como todas as plantas dentro de um dado campo experimentaram mais
ou menos o mesmo ambiente, sua variação pode ser atribuída a fatores genéticos.
Mas o fazendeiro também vai descobrir variação entre os campos: as plantas crescidas
no campo fértil vão, em média, ser mais altas que as plantas crescidas no campo
pobre em nutrientes. A explicação para essa diferença média nas alturas das plantas
estão em seus ambientes, ainda que os graus de hereditariedade nos dois campos
possam ser iguais.
As evidências sugestivas relacionadas aos fatores ambientais que são responsáveis por
diferenças étnicas, raciais e de classe no QI testado vêm de um estudo de etnicidade e
QI entre uma amostra grande de crianças de cinco anos de idade afro-americanas e euro-
americanas, que nasceram prematuras e com baixo peso, oiginárias, a maior parte delas,
de famílias relativamente pobres (Brooks-Gunn et al., 1996). Os pesquisadores
estudaram essas crianças desde o nascimento e, além de aplicar às crianças testes de QI
quando elas tinham cinco anos de idade, coletaram dados sobre a pobreza familiar e do
bairro, a estrutura social das famílias, as características maternas como educação e QI e
o grau de estimulação cognitiva no ambiente doméstico. Assim como a pesquisa
anterior, as pontuações de QI das crianças afro-americanas foram significativamente
mais baixas que as pontuações das crianças brancas (85 versus 103). Entretanto, quando
foram feitos os ajustes relacionados à variável pobreza entre os grupos étnicos, a
diferença na pontuação do QI foi reduzida em mais da metade. Quando as diferenças na
estimulação cognitiva proporcionadas no ambiente doméstico foram também
controladas estatisticamente, o diferencial étnico no QI foi reduzido em mais 28%.
Como observam os autores, esses resultados não implicam que a hereditariedade não
desempenhe um papel no QI porque não são baseados nos estudos de gêmeos que
permitem estimativas de hereditariedade. No entanto, eles mostram
555
claramente que, quando as diferenças socioeconômicas nas vidas das crianças afro-
americanas e euro-americanas são levadas em conta, as diferenças de QI entre os grupos
são quase eliminadas.
Figura de dois homens conversando:
"Você não consegue construir uma cabana, não sabe como encontrar raízes comestíveis
e não sabe nada sobre previsão do tempo. Em outras palavras, você teve um
desempenho horrível no seu teste de QI."
FIGURA 13.12
A diferença nas alturas das plantas de cada caixa reflete as variações genéticas
nas sementes plantadas nela. A diferença entre as alturas médias das plantas nas duas
caixas é melhor explicada pela qualidade do solo, um fator ambiental. As diferenças nas
pontuações dos grupos humanos nos testes de QI são explicadas pelo mesmo princípio.
(Adaptada de Gleitman, 1963.)
Conceito:
Deficiências específicas de aprendizagem: Um termo usado para nomear as dificuldades
acadêmicas de crianças que têm um mau desempenho na escola, apesar de possuírem
inteligência normal.
O método mais amplamente usado para distinguir as crianças com uma deficiência
específica de aprendizagem de seus colegas de classe é analisar seu desempenho
tanto em um teste de inteligência quanto em um teste de desempenho acadêmico
que abranja muitas partes do currículo. Segundo essa abordagem, para ser qualificada
como especificamente portadora de deficiência de aprendizagem (e não deficiente),
uma criança deve ter uma pontuação geral no teste de QI dentro da variação normal,
mas uma grande discrepância entre diferentes partes do teste (por exemplo, uma
pontuação elevada em um subteste ligado à capacidade verbal, mas pontuações
baixas em subtestes ligados à capacidade de compreensão de quantidades). O perfil
do desempenho acadêmico das crianças deve corresponder ao padrão no teste de
QI. Ou seja, esperaríamos que uma criança com uma baixa capacidade verbal e alta
capacidade de compreensão de quantidades fosse capaz de aprender aritmética
556
normalmente, mas que tivesse dificuldade para aprender a ler. Esse padrão de
desempenho, chamado dislexia, é a forma mais freqüente de deficiência de
aprendizagem específica. Outras crianças exibem um padrão de desempenho chamado
discalculia, em que o QI verbal é elevado e o QI quantitativo é baixo. Sendo assim, sua
capacidade para ler é normal, mas elas têm grande dificuldade para aprender aritmética.
Outro padrão, ainda, caracteriza a disgrafia ou dificuldades especiais para aprender a
escrever, e assim por diante. Nós concentramos a nossa discussão na dislexia, que é a
deficiência específica de aprendizagem mais freqüentemente encontrada e aquela
sobre a qual mais se sabe.
557
Tallal e seus colegas descobriram que as crianças disléxicas podiam ser divididas
em dois grupos - aquelas que exibiam atrasos gerais no desenvolvimento da linguagem
oral e aquelas que não o exibiam. Parece muito provável que a razão para as
dificuldades de leitura das crianças com deficiência na linguagem oral seja uma
incapacidade para processar informações críticas com bastante rapidez. As razões
para as dificuldades das crianças disléxicas que não têm deficiências na linguagem
oral permanecem incertas.
Conceito:
Motivação acadêmica: A capacidade para se esforçar muito e persistir nas tarefas
escolares diante das dificuldades.
558
Pode ser sugerido que os alunos mais capazes seriam aqueles a exibir
caracteristicamente o padrão orientado para a superação do desafio ou conquista, e que
os alunos menos capazes seriam aqueles que rapidamente desistiriam diante da
dificuldade e evitariam os desafios. Mas Dweck e seus colegas descobriram que esses
dois padrões não estavam relacionados às pontuações de QI das crianças ou ao seu
desempenho acadêmico. Eles relatam que muitos alunos capazes desistem diante da
dificuldade e muitos alunos mais fracos exibem uma orientação para a conquista
(Dweck, 1999; Licht e Dweck, 1984).
As teorias das crianças do ensino médio sobre a inteligência também incluem idéias
sobre como o esforço está relacionado ao resultado. Algumas crianças acreditam que o
sucesso acadêmico depende, fundamentalmente, da capacidade, que eles acreditam ser
uma categoria estabelecida; outras acreditam que o sucesso acadêmico depende do
esforço, e que despender esforço pode conduzir a uma maior inteligência.
Cada um dos fatores discutidos até agora aplica-se ao desempenho escolar das crianças
de todas as origens familiares. Agora, afastamos o nosso enfoque dos processos
psicológicos universais "na criança" e passamos às circunstâncias culturais e
econômicas que estruturam a experiência de ensino da criança. Vários fatores culturais
gerais foram identificados, alguns concentrados em padrões culturais amplos, outros
559
Estilos culturais Vários estudiosos têm proposto que toda cultura pode ser descrita
em termos da sua própria visão particular de mundo, uma maneira de pensar dominante
sobre o mundo que surge e relaciona a ele uma experiência histórica comum de um
povo (Greenfield e Cocking, 1994; Kagitçabasi, 1997). Uma dessas descrições situa as
culturas em um contínuo em termos da sua ênfase na importância do indivíduo versus o
grupo. Algumas culturas, como a dominante nos Estados Unidos, por exemplo,
enfatizam a independência e a importância do indivíduo, enquanto outras, como a
cultura japonesa, por exemplo, enfatizam mais a interdependência e a importância das
relações entre os indivíduos.
Patrícia Greenfield e seus colegas propuseram que as práticas culturais das salas
de aula americanas favorecem as crianças que vêm de culturas domésticas que
enfatizam a independência, com o objetivo de socializar as crianças para se tornarem
indivíduos autônomos, que entram nas relações sociais por escolha pessoal (uma
orientação individualista). Da mesma forma, acreditam que a cultura das
escolas americanas representam uma desvantagem para crianças de culturas que
enfatizam a interdependência, com o objetivo de socializar as crianças para se tornarem
adultos que valorizem bastante as redes sociais, especialmente a família, e que reduzem
a importância da realização pessoal (uma orientação coletivista). (A Tabela 13.4 resume
as diferenças entre os modelos culturais independente e interdependente.) Segundo
Greenfield e seus colegas, na sala de aula, é improvável que as crianças de lares
orientados para interdependência reajam bem quando escolhidas para fazer um elogio
ou uma crítica diante das outras crianças e podem engajar-se em comportamentos de
ajuda que os professores interpretam como tal.
Outros pesquisadores descobriram que, mesmo que as crianças venham de famílias que
adotem um modelo cultural interdependente que entre em conflito com as normas
culturais da sala de aula, a família pode desempenhar um papel positivo forte no sucesso
da instrução de seus filhos. Um exemplo envolve os filhos de refugiados do Vietnã, do
Cambodja e do Laos para os Estados Unidos nas décadas de 1970 e 1980. Essas
crianças, cujas culturas domésticas são caracterizadas por um modelo cultural
interdependente, foram visivelmente bem-sucedidas no retorno à escola (Caplan et al.,
1989). Embora elas tenham perdido um a três anos de educação formal em campos de
refugiados, e a maioria não falasse inglês quando ingressou na escola nos Estados
Unidos, 8 entre 10 alunos pesquisados alcançaram uma média B ou melhor dentro de
três a seis anos. Quase metade recebeu A em matemática. Esses resultados são
absolutamente notáveis, porque foram obtidos em escolas de áreas de baixa renda,
localizadas no centro da cidade e tradicionalmente associadas a alunos mais rebeldes,
com menos recursos e menos motivados.
TABELA 13.4
ESTILOS CULTURAIS: INDEPENDENTE (INDIVIDUALISTA) VERSUS
INTERDEPENDENTE (COLETIVISTA)
Individualista:
Desligamento emocional do grupo.
Os objetivos pessoais têm primazia sobre os objetivos do grupo.
Comportamento regulado pelas atitudes e pela análise custo-benefício.
A confrontação é esperada.
Coletivista:
Autodefinido em termos do grupo.
Comportamento regulado por normas do grupo.
Hierarquia e harmonia dentro do grupo.
O grupo é encarado como homogêneo.
Distinções fortes dentro do grupo - fora do grupo.
560
DESTAQUE 13.2
O ENSINO EM TRÊS CULTURAS
As salas de aula e os currículos escolares característicos parecem muito semelhantes,
quer eles se encontrem em cidades superpovoadas como Nova York e Tóquio ou em
aldeias rurais da África Ocidental e da Austrália. Mas muitos estudos sobre o cotidiano
na sala de aula e sobre desempenho acadêmico em diferentes sociedades revelam que,
apesar das aparentes semelhanças, os dois processos e os produtos do ensino variam
muito de uma cultura para outra (Serpell e Hatano, 1997).
Nas salas de aula da Libéria rural, por exemplo, ensina-se às crianças a leitura, a escrita
e a aritmética básicas através de instrução de rotina (Cole et al., 1971). Um método
favorito usado pelos professores liberianos é fazer com que a classe toda recite as lições
em uníssono, com pouca atenção dedicada ao significado da exposição. Quando John
Gay e Michael Cole (1967) fizeram perguntas de aritmética a um aluno liberiano, ele
começou a cantar um jargão ("La laia laia, Ia laia laia, Ia laia laia"). Questionado sobre
o que estava fazendo, ele respondeu que estava somando números, mas disso, até agora,
ele só tinha aprendido a música, não as palavras. Não surpreende que o desempenho
acadêmico de uma criança liberiana típica seja baixo, segundo os padrões americanos.
Os diagramas que aparecem no final deste Destaque proporcionam uma visão concisa
do desempenho das crianças das três sociedades em três testes de avaliação de
matemática: habilidade em computação, questões sobre linguagem e conhecimento
conceitual da Matemática. Com a única exceção do teste de compreensão conceitual
da matemática na primeira série, as crianças americanas tiveram um desempenho bem
abaixo do nível dos dois grupos asiáticos. Como poderia ser esperado, essa evidência de
diferenças nacionais marcantes no desenvolvimento do pensamento matemático
provocou um debate sobre suas causas. Richard Lynn (1982) comentou, tendo como
base o desempenho comparativo nos testes de QI, que as crianças japonesas desfrutam
de uma superioridade genética na inteligência. No entanto, avaliações cuidadosas dessa
hipótese demonstraram que ela é falsa. Grandes estudos comparativos demonstrando as
diferenças no desempenho em matemática não revelaram diferenças correspondentes
nos escores de inteligência (Stevenson et al., 1985).
Uma conclusão fácil é que, se os educadores americanos querem que as crianças tenham
um desempenho correspondente ao das crianças asiáticas, tudo o que precisam fazer é
alongar o ano letivo e copiar os métodos asiáticos de ensino em classe. Entretanto,
Giyoo Hatano e Keiko Inagaki acreditam que essa abordagem de "importação" pode
fracassar, porque a eficácia do sistema japonês não está em um método (Hatano e
Inagaki, 1996), mas resulta da maneira como as salas de aula japonesas inserem
tradições profundas da cultura japonesa, que se tornaram uma parte de suas práticas
educacionais durante muitas décadas. Em vez de tentar "importar" um ou outro método
de ensino específico, declaram Hatano e Inagaki, "énecessário 'traduzir' as tecnologias e
as crenças [japonesas] para que elas possam ser harmoniosas com as práticas locais"
(1996, p. 101-102).
Stigler e Perry (1990) fazem uma observação semelhante. Eles dizem que, embora sua
pesquisa sugira que o ensino pode ser organizado de forma que as crianças aprendam
matemática em um nível mais elevado do que estão aprendendo nas escolas americanas,
isso não indica utilizar as tradições culturais americanas para atingir esse resultado.
Citando a socióloga Merry White (1987), eles nos lembram que a pesquisa intercultural
não proporciona uma receita pronta que possa melhorar a educação das crianças, mas
um espelho que reflete nossas próprias práticas culturais e proporciona algumas
sugestões sobre a maneira como podem ser modificadas para tornar o ensino e a
aprendizagem mais eficientes.
561
Seis gráficos
Distribuição e número médio das respostas certas em três testes relacionados à
matemática em escolas de Sendai (Japão), Taipei (Taiwan) e Chicago. (Extraídos de
Stigler e Perry, 1990.)
562
Shirley Heath (1983) estudou três populações durante um período de anos para
conseguir entender como a língua oral e escrita usada em casa difere daquela associada
ao sucesso na escola. As populações que ela estudou, todas da mesma área geográfica,
incluía as famílias de um grupo de professores euro-americanos, um grupo de
trabalhadores têxteis euro-americanos e um grupo de afro-americanos engajados
na agricultura e em empregos têxteis. Conduzindo as observações, tanto nas casas
das pessoas quanto nas salas de aula de seus filhos, Heath descobriu que as famílias
dos professores euro-americanos experimentavam a menor disparidade com a escola.
Como já vimos, o "discurso instrucional" envolvendo perguntas com resposta conhecida
é uma característica proeminente das salas de aula e Heath descobriu que também
aparecia em quase metade das conversas que ela registrou nas casas dos professores.
Além disso, os professores envolviam seus filhos na rotulação dos objetos, nos nomes
das letras e na leitura. Quando liam com seus filhos, iam bem além do texto em si para
deixar claro os relacionamentos entre o que estava no livro e outras experiências que a
criança podia ter tido ou podia ter no futuro. Em certo sentido, os professores estavam
sendo professores tanto em casa quanto na escola. Em vista disso, seus filhos tinham um
bom desempenho na escola.
Um terceiro padrão de uso da língua era característico nos lares das crianças
afro-americanas. Essas crianças foram raramente solicitadas a responder perguntas
com respostas conhecidas sobre algum fato ("de que cor é a sua jaqueta?"). Em vez
disso, os adultos mais freqüentemente faziam perguntas às crianças que as
estimulasse a pensar sobre semelhanças entre situações relacionadas à sua própria
experiência ("você acha que pode ir com seu primo nessa visita?"). Essas perguntas, em
geral, serviam de pretexto para discutir algum evento interessante e ajudavam as
crianças a pensar sobre seus papéis e responsabilidades aplicados a diferentes situações.
563
menos que algo seja feito rapidamente para resolver os problemas que essas crianças
enfrentam porque não conseguem falar inglês, suas oportunidades de vida são reduzidas
devido ao fracasso escolar.
564
concluíram que não há evidência de que os programas bilingües sejam melhores do que
a simples imersão no inglês. Essa conclusão foi imediatamente contestada por Stephen
Krashen (1996), que comentou que quando se considerou apenas aqueles estudos
que tinham bases adequadas para a comparação e dados quantitativos confiáveis, a
evidência mostrou que os programas bilingües são mais eficazes que os programas
de imersão. Essa mesma conclusão foi alcançada por um painel do Conselho Nacional
de Pesquisa (Augusta e Hakuta, 1998).
Krashen (1996) baseou sua conclusão em uma extensa revisão da literatura, que sugeriu
que quatro características conduzem à criação de um ambiente eficaz para ajudar as
crianças imigrantes a aprender inglês:
Como um ponto de partida para uma educação bilingüe eficaz, essa abordagem
requer que os professores levem a sério o contexto cultural da criança, como ele
está incorporado na língua, nos valores e nas práticas da sua casa.
565
ciona uma ponte entre o mundo cotidiano da criança e o mundo cada vez mais
abstrato da escola e do seu conhecimento socialmente codificado. Dois estudos
importantes ilustram os tipos de ajustamentos que têm de ser feitos para que as
abordagens tradicionais da sala de aula desses programas funcionem.
Um exemplo de uma adaptação cultural mínima que pareceu fazer uma enorme
diferença ocorreu em uma classe de alunos da tribo de índios odawa, no Canadá,
que tinha como professora uma especialista em sua cultura (Erickson e Mohatt,
1982). Aparentemente, a professora parecia utilizar uma abordagem expositiva,
falando a maior parte das aulas, formulando muitas perguntas de resposta conhecida
e limitando o papel dos alunos a responder suas perguntas. Na verdade, embora a
professora se engajasse em procedimentos de aula expositiva, ela o fazia de uma
maneira especial, consistente com o uso da linguagem e com os padrões culturais
utilizados nos lares odawa. Quando ela estava dando aula, organizava os alunos em
pequenos grupos, em vez de fileiras, aproximando-se da organização social das
atividades nas casas das crianças. A professora, em geral, tratava as crianças como um
grupo e não destacava as crianças individualmente. Em vez de dizer "bom", como
avaliação para suas respostas às perguntas dela, demonstrava sua aceitação das respostas
dos alunos passando para a pergunta seguinte. Jamais repreendia os alunos, mas
os elogiava em público, de acordo com as normas odawa contra a crítica desse tipo.
Essa maneira sensível à cultura de implementar as aulas em classe funcionava bem.
Uma adaptação cultural muito diferente das aulas em classes padronizadas envolvia um
programa de leitura bem-sucedido, destinado às crianças havaianas de baixa renda e
que, tradicionalmente, apresentavam um mau desempenho (Au e Mason, 1981). Esse
programa incluía práticas de ensino, organização da classe e manejo da motivação
culturalmente eongruentes com as práticas havaianas nativas (Vogt et al., 1987). Os
professores desse programa faziam com que as crianças trabalhassem juntas na classe,
permitindo-lhes basear-se nos padrões culturais domésticos familiares de dar e buscar
ajuda dos amigos e dos irmãos. Os professores não elogiavam as crianças simplesmente
por fazerem as tarefas, mas as elogiavam ou criticavam pela qualidade do trabalho
realizado, mais uma vez copiando conscientemente as práticas culturais dos lares das
crianças havaianas. O sucesso desse programa foi demonstrado não apenas em notas
mais altas em leitura, mas em maior envolvimento e maior entusiasmo pelas atividades
em classe.
Esses exemplos poderiam ser multiplicados para abranger uma grande variedade de
grupos étnicos e de classe social amplos o bastante para convencer de que é
possível organizar contextos eficientes para a educação, levando em conta as variações
locais na cultura e na classe social (Tharp et al., 2000). Ao mesmo tempo, a
pesquisa é unânime em mostrar que as escolas que proporcionam uma atmosfera
cálida e amigável combinada com instrução rigorosa, altas expectativas de sucesso
e boa comunicação com o lar têm mais chances de sucesso (Scheurich, 1998).
FORA DÁ ESCOLA
Por mais importante que a forma de instrução seja para a segunda infância, ela não
é o único contexto extrafamiliar que influencia as crianças. Há também o novo e
importante contexto das interações independentes com o grupo de amigos. Nas
tardes e noites dos dias de semana, nos fins de semana e nos feriados, as crianças
dessa idade provavelmente serão encontradas junto com seus amigos, engajadas
em atividades de sua própria escolha. Alguns desses locais têm um ou dois adultos
presentes, mas, em muitos casos, não há adultos em cena.
566
DESTAQUE 13.3
EXPECTATIVAS DOS PROFESSORES E SUCESSO NA ESCOLA
A maioria de vocês passou mais de 12 anos em salas de aula e sabe, por experiência
própria, que as atitudes dos professores em relação aos alunos variam. Os professores
esperam que alguns alunos tenham um desempenho melhor que outros no domínio do
material acadêmico. A pesquisa tem mostrado que essas atitudes e expectativas
influenciam de várias maneiras o desempenho dos alunos.
Talvez a mais famosa - e certamente a mais controvertida – pesquisa sobre o efeito das
expectativas dos professores foi iniciada na década de 1960 por Robert Rosenthal e seus
colegas (Rosenthal, 1987; Rosenthal e Rubin, 1978). Esses pesquisadores descobriram
que as expectativas de um professor sobre a capacidade acadêmica de uma criança pode
tornar-se uma profecia de auto-realização, mesmo quando as expectativas são
infundadas. Ou seja, as expectativas do professor podem conduzir a um comportamento
que faz com que as expectativas sejam realizadas.
Para demonstrar o poder das expectativas dos professores, Rosenthal e Lenore Jacobsen
(1968) aplicaram nas crianças de todas as sextas séries de uma escola elementar um
teste que, segundo disseram aos professores, identificaria as crianças com probabilidade
de "florescer" intelectualmente durante o ano seguinte. Após o teste, os pesquisadores
deram aos professores os nomes dessas crianças que supostamente prometiam melhorar
o desenvolvimento intelectual durante o próximo ano letivo. Na verdade, os nomes dos
previstos "sucessos" foram escolhidos ao acaso (com algumas exceções, que serão
descritas no devido curso).
567
A pesquisa realizada por Carol Dweck e seus colegas mostrou como a interação entre as
expectativas dos professores e o comportamento das crianças pode moldar o
desenvolvimento acadêmico. Dweck estudou as expectativas diferentes dos professores
em relação aos meninos e às meninas. Em geral, as meninas se comportam melhor
que os meninos durante os anos do ensino fundamental. Conseqüentemente, os
professores esperam que os meninos desafiem o decoro em classe e que as meninas o
apoiem. Dweck e seus colegas descobriram que essas diferenças no comportamento das
crianças e nas expectativas dos professores levam os professores a reagir de maneira
diferente aos meninos e às meninas (Dweck e Bush, 1976; Dwecketal,, 1978; Dweck e
Goetz, 1978). No geral, os professores criticam mais os meninos do que as meninas.
Freqüentemente, essa crítica se concentra na falta de decoro dos meninos, em sua falta
de capricho nos trabalhos de casa ou na sua falta de atenção. Sua crítica para as
meninas, ao contrário, em geral se concentra na sua capacidade e no seu desempenho
intelectual. Ao mesmo tempo, quando os professores elogiam, provavelmente o seu
enfoque é o comportamento social cooperativo das meninas e as realizações intelectuais
dos meninos.
Foi descoberto que essas diferenças nas expectativas dos professores em relação aos
meninos e às meninas e o tipo de avaliação que proporcionam estão relacionadas aos
tipos de expectativas que as crianças criam sobre o seu próprio comportamento (Dweck
e Elliott, 1983). Quando é dito às meninas que elas falharam, elas em geral, acreditam
que o professor avaliou corretamente a sua capacidade intelectual, de forma que tendem
a parar de se esforçar. Os meninos interpretam essa crítica de maneira diferente: eles
responsabilizam seu desempenho ruim à outra pessoa ou à sua situação, ou ainda, à
boa sorte, e mantêm a fé na sua própria capacidade para fazer melhor da próxima vez.
As evidências de que o desempenho escolar das crianças pode ser afetado pelas
expectativas dos professores levou muitas escolas a elevar seus padrões de desempenho
aceitável e a iniciar programas como "olimpíada de matemática" para encorajar o ideal
de excelência acadêmica.
RESUMO
A educação formal nas escolas difere dos treinamentos tradicionais nos objetivos para
aprender e também nas relações sociais, na organização social e no meio de ensino.
568
As teorias sobre a melhor maneira de ensinar leitura e matemática variam entre dois
extremos, um enfatizando a necessidade de experiência e prática, e o outro enfatizando
a centralidade da compreensão conceitual. A maior parte das técnicas atuais de ensino
tentam equilibrar a experiência com o raciocínio.
A instrução em sala de aula tem lugar em ambientes caracterizados por modos
especializados de interação social e por uma forma especial do uso da linguagem
chamada discurso instrucional.
1. Os modos tradicionais do discurso em sala de aula usam aulas expositivas, nas quais
os professores formulam perguntas de resposta conhecida e avaliação proporcional
direta baseada nas respostas das crianças.
2. Grande ênfase é colocada no uso de formas lingüísticas corretas no discurso em
classe, organizado em torno de uma aula expositiva.
3. Formas alternativas de organização de classe enfatizam o papel da interação do
pequeno grupo e o uso de tarefas destinadas a serem significativas para as crianças.
569
PALAVRAS-CHAVE
aprendizado, p. 523
conhecimento conceituai, p. 530
conhecimento procedimental, p. 530
conhecimento da utilização, p. 530
consciência fonêmica, p. 527
decodificação, p. 527
deficiências específicas de
aprendizagem, p. 555
discurso instrucional, p. 533
educação, p. 523
ensino, p. 524
ensino recíproco, p. 535
estratégia da admissão à escola, p. 540
hipótese ambientalista da inteligência, p. 550
hipótese inatista da inteligência, p. 550
idade mental (IM), p. 545
motivação acadêmica, p. 557
quociente de inteligência (QI), p. 546
seqüência de pergunta-resposta-
avaliação, p. 533
3. Parafraseie a argumentação de Binet e Simon de que "a vida não é tanto um conflito
de inteligências, mas um combate de caracteres". Como essa idéia está ligada às
disputas sobre a importância da testagem do QI como um meio de avaliar o
desenvolvimento cognitivo?
4. Suponhamos que lhe foi atribuída a tarefa de criar um teste de inteligência
independente dos aspectos da cultura. Como você lidaria com isso? Que obstáculos
importantes você esperaria encontrar?
5. Como um maior conhecimento das culturas dos lares das crianças poderia ser útil na
organização de uma instrução eficiente em sala de aula?