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Música na Educação Básica

Música na Educação Básica

Música na Educação Básica

Conceitos de
psicomotricidade e
o ensino de música
Viviane Louro

Concepts of psychomotricity and


music teaching

Resumo Abstract
A psicomotricidade é a ciência que estuda o Psychomotricity is the science that studies
ser humano de forma global, considerando- human beings as a whole, by considering
-o como um indivíduo triádico: emocional, them as having three componentes: emo-
cognitivo e motor. Na escola básica, a psi- tional, cognitive and motor. In basic educa-
comotricidade pode ser uma ferramenta tion, psychomotricity can be an effective
eficaz na aula de música, que por si só já tool in music classes, as it promotes inte-
dialoga com todas as esferas do ser huma- raction with all spheres of human beings.
no. Portanto, esse artigo tem por objetivo Therefore, the aim of this article is to point
apontar caminhos para o uso da psicomotri- out ways to use psychomotricity in music
cidade dentro da escola básica no contexto classes in basic education. As a theoretical
da educação musical. Como embasamento basis, we will draw on the work of authors
teórico, usaremos autores que fundamen- that support the use of functional psycho-
tam o uso da psicomotricidade de forma motricity, such as Fonseca, Alves, Gomes,
funcional, tais como Fonseca, Alves, Lourei- Louro, among others.
ro, Louro, dentre outros.
Keywords: Psychomotricity. Music educa-
Palavras-chave: Psicomotricidade. Educa- tion. Basic education.
ção musical. Escola básica.

LOURO, Viviane. Conceitos de psicomotricidade e o ensino de música. Música na Educação Básica, V. 9, n. 10/11,
2019.
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Música na Educação Básica

A psicomotricidade
A psicomotricidade é uma fermenta efi-
caz no contexto educacional, pois visa tra-
balhar o ser humano em sua totalidade. O
cerne da psicomotricidade é o diálogo entre
a mente e o corpo. A mente é dada pelos
aspectos emocional e cognitivo, entendendo
cognição como o conjunto de habilidades
neurológicas que viabilizam a operaciona-
lização do pensamento e ações, tais como:
atenção, memória, raciocínio abstrato e ló-

Foto: VIviane Beineke


gico, teoria da mente, linguagem, tomada
de decisão, dentre outras (Lent, 2010). Já
o corpo é compreendido como percepção
sensorial e ação motora que está ligado aos
comandos centrais do cérebro. Em suma, o
corpo dá suporte ao desenvolvimento da
mente (cognição e emoção), e a mente é
responsável pela atuação funcional de todo
o corpo no meio em que o envolve, portanto
é uma via de mão dupla (Infograma 1) (Fon-
seca, 2007, 2008, 2010; Gomes, 2005).

Infograma 1: Representação dos conceitos básicos da


psicomotricidade (elaboração própria).
PSICOMOTRICIDADE

EMOCIONAL
MENTE
COGNITIVO

CORPO
AS VIVÊNCIAS COM O
CORPO ESTRUTURAM A
MENTE, QUE, POR SUA VEZ,
COORDENA O CORPO
SENSORIAL MOVIMENTO
(VIA DE MÃO DUPLA)

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Apesar de esta revista ter proposições


práticas para a sala de aula, devido ao fato da
psicomotricidade ser um assunto complexo
e que poucos conhecem, faz-se necessário
um embasamento teórico amplo para que o
assunto não seja visto de forma leviana.

Para tanto, parte-se do pressuposto de


que somos seres “neuropsicobiossociais”,
ou seja, somos formados por aspectos bio-
lógicos/neurológicos (genéticos e evolucio-
nários), psicológicos (nossas emoções) e so-
ciais (cultura, meio ambiente). Isto é, temos
uma estrutura fisiológica de base, que nasce
conosco, mas também temos a cultura, e am-
bas sãos responsáveis pelo desenvolvimento
de nosso ser integral: cérebro, funções psí-
quicas, cognição e corpo atuante (Infograma
2) (Martins; Vieira, 2010).

Infograma 2: Representação dos aspectos que


compõem a formação psicomotora das pessoas: o
que estrutura as questões emocionais, cognitivas e
motoras ao longo da vida (elaboração própria).
Estrutura
nerológica
Genética

Criação
familiar
Condição
biológica

Motivação
pessoal
Vivências e
estímulos
sensoriais

Religião/
Espiritualidade
Formação
escolar
Experiências
emocionais/
sociais

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Existem muitas definições de psicomotri-


cidade, mas todas giram em torno da rela-
ção mente-corpo-ambiente. A Associação
Brasileira de Psicomotricidade (ABP, 2018) a
define como a “ciência que tem como obje-
to de estudo o homem através do seu corpo
em movimento e em relação ao seu mundo
interno e externo”. De acordo com Loureiro
(2001, p.14),

A psicomotricidade é a otimização corporal


dos potenciais neuro, psico-afetivo
funcionais, sujeitos a leis de desenvolvimento
e maturação, manifestadas pela dimensão
simbólica própria, original e especial do ser
humano.

A psicomotricidade tem alguns princípios dissociando o eu do outro e nos tornando


básicos, dentre eles, o de que nosso cérebro seres autônomos nos aspectos emocionais,
está em constante evolução (filogênese) e cognitivos e motores (Fonseca, 2010). Para
que nosso desenvolvimento se dá de uma que tudo isso ocorra, faz-se necessário que
motricidade, emoção e cognição mais “pri- as pessoas passem pelas fases do desenvol-
mitiva” em direção ao refinamento. Isto é, vimento que darão suporte a todo esse me-
ao nascer, saímos de um tônus indissociado canismo: rolar, engatinhar, levantar tronco,
(simbiótico com a mãe) e, com o passar do sentar, andar com apoio, andar livremente
tempo (nossas experiências no mundo), va- (Trevisan; Macena, 2018). Tais fases ajudam a
mos estruturando esse tônus de forma cada definir aspectos fundamentais para um de-
vez mais consciente (praxias). Como con- senvolvimento global saudável, conforme o
sequência, vamos alicerçando a cognição e Quadro 1.

Elementos
Descrição
psicomotores
Base organizadora de todo ser (o corpo em si). Suporte físico
Tônus e e emocional do corpo e cognição. Postura, equilíbrio estático
equilibração (parado) e dinâmico (corpo em movimento). Energia psíquica
empregada no corpo, qualidade do movimento.
Percepção e uso funcional do corpo nele mesmo e em relação
Esquema corporal
ao meio externo.
Dominância hemisférica (destro ou canhoto). O que torna o ser
Lateralização
humano motoramente especializado frente a outros seres.
Conceito cognitivo e percepção corporal de direita, esquerda e
Lateralidade
de direcionamento em geral.
Atuação funcional do corpo em diversas velocidades e no
Noção
espaço físico em geral (desde escrever entre duas linhas,
espaço-tempo
acertar o pé dentro do sapato ou dançar num palco imenso).
Uso funcional e consciente do corpo, principalmente dos pés e
Praxias mãos com subsídio dos demais sentidos (coordenação óculo-
manual, óculo-pedal etc.).
Quadro 1: Elementos que alicerçam o desenvolvimento psicomotor de todo ser humano (baseado em Fonseca, 2008, 2010 e Alves, 2003).

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Em suma, se os itens colocados no Qua- cimento. Sendo assim, quando falamos da


dro 1 estiverem bem desenvolvidos, dizemos utilização da psicomotricidade como ferra-
que a pessoa é um ser equilibrado em sua menta pedagógica, estamos nos referindo a
totalidade (emocional, cognitivo e movimen- maneiras de nos munir desses conhecimen-
to). Portanto, essa pessoa, em princípio, é tos e conceitos e transformá-los em ativida-
alguém que tem domínio de seu corpo, pla- des práticas direcionadas para o ensino mu-
neja suas ações com destreza e qualidade, sical, levando sempre em consideração o uso
mantém o equilíbrio emocional quando ne- funcional do corpo, o movimento como base
cessário, toma decisões de forma consciente e a organização do corpo pela mente, ten-
e gerencia bem os aspectos de sua cogni- do como diálogo constante o ambiente ou
ção (Santos, 2002). Mas, para que isso seja a cultura. Nesse sentido, os educadores mu-
amplamente desenvolvido, a pessoa precisa sicais mais conceituados, tais como Kodally,
passar pelas vivências. Por isso, o fator cul- Dalcroze, Willems, Orff, Koellreutter, Payter,
tura (família, escola, costumes, experiências Gainza, dentre outros, mesmo que não sou-
sensoriais e motoras na primeira infância) é bessem, propuseram suas metodologias
fundamental, e o valor afetivo dado às expe- tendo a psicomotricidade como aliada, por
riências é que será responsável pela criação compreenderem que as vivências práticas
de mais ou menos conexões neurais que es- exercem grande influência no processo de
truturarão todo o suporte (cognição e men- aprendizagem e no desenvolvimento. Con-
te) para o indivíduo reger seu corpo de for- forme coloca Storolli (2011, p.132):
ma consciente (Lent, 2010; Santos, 2002).
A relação do corpo com a música remete-
se porém à própria gênese desta, sendo
anterior a treinamentos, códigos e sistemas.
Psicomotricidade e Podemos imaginar a manifestação musical no
âmbito das primeiras performances e rituais
educação musical na humanos, envolvendo sons e movimentos,
escola básica tendo o corpo como o principal condutor da
ação e do processo de criação. Longe de ser
Na escola básica, a música não tem o apenas um instrumento a ser treinado para
papel de formar grandes artistas, mas de se obter certos resultados, o corpo pode ser
considerado como o principal responsável
introduzir os alunos ao universo sonoro/mu- pela realização musical.
sical em muitos âmbitos. Como afirma Mo-
lina (2012, p.10), a prática musical na escola No universo da musicalização, é comum
básica “apresenta-se como laboratório pri- o emprego de danças circulares, movimen-
vilegiado para o exercício de determinadas tação corporal, bandinhas rítmicas e ativida-
qualidades transversais a toda educação, des com bolas, bambolês, panos, objetos em
como a cooperação, a paciência, a gentileza, geral e brinquedos. Sendo assim, o uso des-
a relativização da competição, a escuta de ses materiais em aulas de música, de forma
si e do outro”. Além disso, conforme Muskat organizada e objetiva, é o uso dos conceitos
(2012, p.73), “sabemos que a música aumen- da psicomotricidade como ferramenta pe-
ta a competência de várias áreas do cérebro dagógica (Mateiro; Ilari, 2011; Jordão, 2012;
emocional, do cérebro motor e do cérebro Louro, 2012). Também é comum em aulas de
sensorial”. Falar de cooperação, gentileza, música em grupos escolares, utilizar diversos
escuta, bem como de áreas cerebrais é falar instrumentos de percussão, o que fortalece
de psicomotricidade (Fonseca, 2008, 2010). postura e tônus de mãos, braços e tronco
e trabalha equilíbrio, esquema corporal e
A psicomotricidade em si é um arcabouço
destreza das mãos para movimentos mais
de conhecimentos sobre o desenvolvimento
específicos a posteriori (praxias e lateraliza-
do ser humano que dialoga com a neuroci-
ção). Jogos coletivos no espaço contribuem
ência, a psicologia e outras áreas do conhe-
com o esquema corporal, noção de tempo-

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Música na Educação Básica

-espaço, lateralidade, tonicidade e equilibra-


ção, pois a pessoa precisa planejar sua ação
A psicomotricidade
e utilizar seu corpo por completo e de forma como base para
funcional em um determinado espaço físico,
além de toda questão emocional de ativida-
a construção
des em grupo, que leva as crianças a terem metodológica: duas
que lidar com espera, frustração, perdas, ga- atividades
nhos e relações humanas em geral (Louro,
2012). Aplicar música com psicomotricidade é
empregar atividades que trabalhem conco-
Como coloca Storolli (2011, p.139): “Essas
mitantemente tanto os aspectos e conteú-
estratégias têm ainda como vantagem o fato
dos musicais quanto os itens do desenvolvi-
de poderem eventualmente se realizar como
mento psicomotor retratado antes (Quadro
um processo coletivo, o que é enriquecedor
1). Lembrando sempre que o emocional é
por permitir uma constante interação entre
importante nesse processo, sendo assim, as
os participantes”.
atividades precisam dialogar com os interes-
Em suma, o conceito da psicomotricida- ses dos alunos no que se refere ao repertório
de transformada em atividades práticas está musical empregado, propostas lúdicas apre-
em conformidade com o ensino de música, sentadas e vínculos interpessoais (profes-
na ludicidade dos jogos musicais (emocio- sor/aluno; alunos/alunos). Portanto, seguem
nal); em todo aspecto lógico estrutural da sugestões de duas atividades que unem a
compreensão do discurso musical (cogniti- psicomotricidade ao fazer musical. São ati-
vo) e no uso consciente do corpo como veí- vidades que utilizam poucos recursos e têm
culo do aprendizado (motor). Enfim, música propostas grupais, adequadas ao contexto
e psicomotricidade são literalmente cami- da educação básica.
nhos entrelaçados, e podemos desenvolver
a psicomotricidade e a musicalidade juntas
na sala de aula.

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Atividade 1

Lençol Vazado
Descrição: O professor faz vários orifícios conteúdo musical e adaptar tal atividade
num lençol, de forma que seja possível a pas- para qualquer idade. Essas sugestões aci-
sagem de uma bolinha de tênis (no orifício). ma foram pensadas para alunos que já pos-
Os buracos não devem ser próximos uns dos suem conhecimentos musicais, mas pode-se
outros e devem ser espalhados pelo lençol, adaptar para conteúdo mais simples para o
sem obedecer a um padrão. Em volta dos ensino fundamental ou para a educação in-
buracos pode-se fazer contorno com cores fantil.
diferentes. O objetivo do jogo é fazer com Objetivos musicais: A critério do professor,
que os alunos direcionem coletivamente a desde que esteja de acordo com sua realida-
bolinha para o buraco escolhido pelo pro- de de ensino musical .
fessor, sem deixar a bolinha cair em outro
buraco no percurso. Para tanto, cada aluno Objetivos psicomotores: Tônus e equilibra-
segura em um pedaço da borda do lençol na ção (manter pressão palmar no lençol, dire-
horizontal (na posição em que é colocado cionar a bolinha sem deixá-la cair no buraco
na cama) e, sem que encostem na bolinha, errado); planejamento motor, esquema cor-
fazem com que ela deslize pelo lençol entre poral, lateralidade, tempo-espaço (direcionar
os buracos, até chegar no buraco correto. O a bolinha em espaço limitado entre os bu-
professor, então, associa uma cor (do con- racos, numa velocidade adequada – tempo,
torno do buraco) com uma ação musical, planejar que tipo de movimento deve-se
por exemplo: (o professor faz uma legenda fazer no lençol para que a bolinha se movi-
na lousa): azul – acorde maior; vermelho – mente adequadamente, planejar como usar
acorde menor; bege – acorde diminuto etc., a musculatura do corpo para fazer o exercí-
e depois o professor toca um desses acor- cio de forma adequada); praxias (coordena-
des, que a turma precisa reconhecer auditi- ção motora grossa com o manejo do lençol).
vamente e depois encaminhar a bolinha para Espaço e mobiliário: Espaço amplo para
o buraco correspondente à cor, conforme a movimentação sem obstáculos que possam
legenda. Outras possibilidades são: associar ser perigosos. De preferência, um chão que
a cor a gêneros ou formações instrumentais não escorregue.
específicas (azul: jazz, vermelho: baião etc.)
Materiais: Um lençol de casal ou um pano
ou a compositores (aí colocam-se trechos
grande, conforme o desejo do professor.
de obras dos compositores e, reconhecendo
Uma bolinha de tênis ou uma borracha pe-
quais são, direciona a bolinha para o buraco
quena.
correto). Enfim, pode-se associar a qualquer

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Música na Educação Básica

Atividade 2
Gincana musical com percurso pode ser estipulada pelo professor). Depois,
motor ele precisa rolar pelos colchonetes sem pa-
rar o movimento e tocar os instrumentos ao
O professor cria na sala de aula um per-
lado, sem que esses saiam do lugar. Por últi-
curso direcionado com bambolês, bastões,
mo, passar pela cama de gato sem encostar
cordas, colchonetes ou tapetes e associa o
nos barbantes e, ao final, pegar uma ficha do
cumprimento de atividades musicais com
saco e responder à pergunta musical (Exem-
o cumprimento do percurso motor. Como
plo: “Qual é o nome do compositor que criou
exemplo, temos o seguinte percurso:
a música ‘O trenzinho do caipira’?”, “Qual ins-
8 bambolês enfileirados com cores dife- trumento musical possui 88 teclas?” etc.
rentes e, em seguida, vários colchonetes que
Objetivos musicais: A critério do professor,
culminam numa cama de gatos (barbantes
dependendo do conteúdo musical que a tur-
espalhados pela sala, de forma a produzir um
ma possui.
obstáculo para a passagem). Então o profes-
sor coloca no chão, ao lado dos bambolês, Objetivos psicomotores: Considerando o
figuras rítmicas diversas (conforme o que a percurso acima proposto: tônus, equilibra-
turma sabe fazer), por exemplo: verde: semí- ção, esquema corporal, noção de espaço/
nima, vermelho: duas colcheias, azul: quatro tempo, planejamento motor e praxia global
semicolcheias, branco: pausa etc. Ao lado do ao pular nos bambolês, rolar nos colcho-
tapete, pode-se colocar vários instrumen- netes e passar pela cama de gato, tocar os
tos musicais espalhados e, ao fim da cama instrumentos rolando. Praxia fina: olho-pés
de gato, um saco com fichas com perguntas ao pular nos bambolês ao mesmo tempo
sobre conteúdos musicais. Os alunos preci- em que lê os ritmos; organização emocional
sarão cumprir as comandas motoras e mu- para cumprir a ordem das atividades sem
sicais ao mesmo tempo, e “vencerá” o alu- ansiedade.
no ou o grupo que cumprir tudo em menor Espaço e mobiliário: Espaço amplo para
tempo. Ficaria assim: enquanto pula com os movimentação sem obstáculos que possam
dois pés juntos nos bambolês, o aluno lê as ser perigosos. De preferência, um chão que
figuras rítmicas ao lado, considerando cada não escorregue.
bambolê um pulso (a velocidade do pulso
Materiais: Materiais esportivos diversos.

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Música na Educação Básica

Considerações finais Sendo assim, uma atividade motora em


que o aluno imita, por exemplo, uma sequ-
As sugestões acima são somente ideias
ência de gestos corporais, mas não reflete
voltadas para a educação básica que podem
sobre eles e não compreende o sentido de
ser facilmente adaptadas para qualquer ida-
realizar aquilo, não pode ser considerada
de. A partir delas, bem como da compreen-
uma atividade psicomotora. Usar somente
são dos conceitos relatados na parte inicial
o corpo como uma imitação ou sem função
deste texto, o professor poderá criar ou adap-
específica não pode ser considerada ativi-
tar novas atividades tendo a psicomotricida-
dade que dialogue com a psicomotricidade.
de como base. Para tanto, é necessário, an-
Quando falamos do uso da psicomotricidade
tes de mais nada, conhecer a turma de forma
como ferramenta de aprendizado, estamos
aprofundada para que se possa pensar quais
falando do uso de atividades que usem o
objetivos musicais e psicomotores está se
corpo consciente (em diálogo com a mente),
buscando alcançar. É fundamental também
com um objetivo específico a ser atingido e
que o professor saiba se na turma há alunos
de forma afetiva. Os principais pontos da
com algum tipo de problema específico, pois
psicomotricidade são: o sentido emocional
certamente isso mudará o rumo das ativida-
do que se está fazendo; a consciência e a re-
des e poderá exigir estratégias diferenciadas
flexão cognitiva sobre o que se está fazendo
de atuação, ou mesmo atividades específi-
e o planejamento motor, visando qualidade,
cas para tais alunos (Louro, 2012).
funcionalidade e otimização do movimento.
Cabe ressaltar que não existe uma ativida-
Dorneles e Beneti (2012, p.1783) explica-
de correta a ser empregada para uma situa-
am: “A psicomotricidade tem-se mostrado
ção específica, nem para uma idade determi-
aliada, criando oportunidades de multiplicar
nada. O mais importante é o professor saber
sua ação em conjunto com outras ciências e
identificar as necessidades e potencialidades
teorias de maneira funcional para a melhoria
da turma e usar a criatividade para unir ele-
do ensino”. Por isso, é importante incentivar-
mentos musicais com os elementos psico-
mos nos círculos escolares não só o exercício
motores. Igualmente significativo mencionar
da psicomotricidade, mas também da inter-
é que toda atividade psicomotora precisa
disciplinaridade com a música, através da
ser elaborada a partir do diálogo: emocional,
manifestação da criatividade nos seus mais
cognitivo e motor, em diálogo com o contex-
diversos domínios e nas dimensões das múl-
to (cultura, gostos, estrutura física etc).
tiplas inteligências.

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