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A
palavra democracia é uma velha conhecida. Ela está presente na história, nos
contos, nos romances, no direito, nas constituições, engolfada pelas crises dos
sistemas democráticos e almejada pela alma humana. É uma técnica de liberdade,
um espírito livre, pleno de um sentido igualitário[1].
Representa uma indefinição semântica que traduz um processo sujeito a uma contínua invenção
e reinvenção. Percebe-se a pluralidade de núcleos que se submete às condições históricas e
altera-se naturalmente com a transição da conjuntura política de uma realidade para outra.
Possui vida há pelo menos dois mil e quinhentos anos, traduzindo significados diferentes para os
povos, tempos e lugares[2].Por isso, ela pressupõe e representa uma luta incessante pela justiça
social, como bem marcado por Julien[3]não podendo “resignar-se com as ‘favelas’, os alojamentos
insalubres, os salários miseráveis, as condições de trabalho infames”. É de Jackson[4]a afirmação
de que a visão do direito constitucional deve perceber a democracia como “uma árvore viva” –
uma metáfora que capta a ideia de que um documento “vivo” não é limitado por suas origens.
[6]
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Significa dizer que não basta que se faça menção ao seu nome para legitimar sua atuação,
representando, segundoSen[9], um sistema exigente e não apenas uma condição
mecânica.Percebe-se aí o irrealismo desta noção simples e unitária, tendo em vista que a
democracia não se configura em uma coleção de indivíduos entre si, mas tem por destinatário
um conjunto complexo de classes, raças, clãs, estamentos, grupos religiosos, cujo poder e
influência variam enormemente de época a época e de país a país[10].
Tem uma importância construtiva, especialmente com a garantia da discussão aberta, do debate,
da crítica e do dissenso, que são fundamentais para o processo de geração de escolhas[11]. Como
explica Rancière[12], na democracia o sujeito define a si mesmo, a partir de seu lugar central na
atividade política. Não só é um rompimento da lógica da separação absoluta entre governante e
governado, mas a ruptura da ideia segundo a qual todo tipo de distribuição de poder significa
um modelo preexistente. O desenvolvimento da democracia se tornou e é o principal
instrumento para a defesa, seja dos direitos de liberdades, seja os nascidos das revoluções[13].
A decadência do sistema democrático tem sido usada por alguns estudiosos para capturar a
degradação incremental[14]das estruturas[15]e substância[16]da democracia constitucional
liberal[17]. Abre-se caminho para o exercício do “legalismo autocrático”, “retrocesso
constitucional”, “enfraquecimento oportunista e reacionário das estruturas democráticas por
atores políticos” que, em muitas das vezes, são expressos em contextos políticos que
caracterizam um declínio da fé pública na democracia.
controlarão a atuação pública, a incluir-se aí a própria ação do poder judiciário[18]. Como? Esta é
uma pergunta que pretendemos responder nas próximas sessões.
Repensar a democracia nos moldes até então forjados, de controle de poder pelo próprio poder,
da ideia de soberania popular e representatividade, acaba por justificar uma doutrina puramente
teórica para o governo[19].
Como a democracia não constitui retórica e necessita de promoção, portanto, não basta a mera
enunciação de seu nome para denominar um ambiente democrático. Sendo híbrida, é ao mesmo
tempo um fim e um meio. Fim porque vai acomodar os principais fundamentos de uma
sociedade igual e participativa e meio porque vai exigir uma variação de intérpretes e
mecanismos para sua realização e promoção do desenvolvimento humano[20]. Para Gouvêa, se
fim e meio ao mesmo tempo, necessita que haja conexão entre o direito e as estruturas formais
do poder, podendo-se aqui pensar em uma democracia cooperada. O que seria uma alternativa
para enfrentar as atuais crises dos sistemas democráticos.
[1]
FERREIRA, Pinto. A constituição e o poder de reforma constitucional. 3 ed. Recife: Faculdade
de Ciências Humanas de Pernambuco, Sociedade Pernambucana de Cultura e Ensino, p. 167.
[2]
DAHL, Robert A. Sobre a democracia. Tradução Beatriz Sidou. Brasília: Editora Universidade de
Brasília, 2001, p. 13.
[3]JULIEN, Claude. O suicídio das democracias. Rio de Janeiro: Editora Artenova, 1975.
[4]JACKSON, Vicki C. Paradigms of public law: transnational constitutional values and democratic
challenges. International Journal of Constitutional Law, 2010, Vol. 8, Nº 03, p. 517-562.
[5]
GONÇALVES, Bernardo Fernandes. Curso de Direito Constitucional. 3 ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2011, p. 209.
[6]
Democracia para as Nações Unidas constitui um ideal universal e é um dos valores
fundamentais que compõe a organização.
[7]
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[7]
GONÇALVES, Bernardo Fernandes. Curso de Direito Constitucional. 3 ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2011, p. 210.
[8]
MANIN, Bernarb. La democracia de los modernos: los principios del gobierno representativo.
Trad. Clara Gimenéz. Revista Sociedad da Facultad de Ciencias Sociais(UBA), 1995, p.1-20.
[9]SEN, Amartya. Democracy as a universal value. Journal of Democracy, Vol. 10, Nº 3, 1999, p. 3-
17.
[10]COMPARATO, Fábio Konder. Para viver a democracia. São Paulo: Brasiliense, 1989, p. 70.
[11]
GOUVÊA, Carina B. As Intervenções da ONU no Processo de Constitution-Making nos Estados
em Transição Política: O Papel das Nações Unidas no Resgate da Ordem Democrática. 1. ed.
Curitiba/PR: Juruá Editora, 2016.
[12]RANCIÈRE, Jacques. Ten theses on politics. Theory & Event, Vol. 5, Issue 3, 2001, p.1-16.
[13]BOBBIO, Norberto. Liberalismo e democracia. Trad. Marco Aurélio Nogueira. 6ª ed. São Paulo:
Brasiliense, 2000, p. 41-44.
[18]SAMPAIO, José Adércio Leite. Direitos fundamentais. 2 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2010, p.
273.
[20]
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Estados em Transição Política: O Papel das Nações Unidas no Resgate da Ordem Democrática. 1.
ed. Curitiba/PR: Juruá Editora, 2016.
e-mail: nunescnt@gmail.com
blog: josenunes.com.br
OBSERVATÓRIO DA DEMOCRACIA
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