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Instituto Politécnico de Setúbal

Escola Superior de Educação


Mestrado em Educação Musical no Ensino Básico

Índice

Introdução......................................................................................................... 2

1.2 - Respostas sociais e educativas à multiculturalidade............................................4

2 – A ESCOLA E A EDUCAÇÃO MULTICULTURAL...........................................................5

2.1 – Abordagens à educação Multicultural.............................................................6

3 – O PROFESSOR E A EDUCAÇÃO MULTICULTURAL......................................................7

3.2 - Formação Contínua de Professores para a Multi/Interculturalidade.........................9

3.3 – As áreas curriculares de expressão e a educação Multicultural............................11

Conclusão........................................................................................................ 11

Bibliografia...................................................................................................... 13

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Em sociedades cada vez mais diversificadas, torna-se indispensável garantir uma interacção
harmoniosa entre pessoas e grupos com identidades culturais a um só tempo plurais,
variadas e dinâmicas, assim como a sua vontade de conviver. As políticas que favorecem a
inclusão e a participação de todos os cidadãos garantem a coesão social, a vitalidade da
sociedade civil e a paz.

Art. 2º da Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural

Introdução

A sociedade portuguesa tem vindo a sofrer grandes transformações nos últimos anos,
nomeadamente ao nível da sua composição demográfica. A abertura do país, iniciada em 1974
com a democracia e aprofundada com a adesão à comunidade europeia, trouxe até nós
populações migrantes dos quatro cantos do mundo, com particular incidência da Europa e
África.

A multiculturalidade passou a ser alvo das atenções nos anos noventa. As escolas portuguesas
passaram a deparar-se com uma realidade desajustada dos currículos monoculturais que as
caracterizavam. A democratização do estado português gerou uma política de alargamento da
educação escolar, mas que não tendo sido acompanhada de um ajuste curricular, provocou
situações de exclusão daqueles que não estavam dentro do padrão cultural escolar. Foi em
consequência deste facto que surgiu a necessidade de se criar condições para a inclusão, já
que a educação é um direito de todos.

Parafraseado Boaventura Sousa Santos, “ num mundo que muda, que está diferente, como é
que a educação pode arrogar-se ao direito de permanecer idêntica ao que era, ficando
indiferente à diferença? (citado por Stoer e Cortesão, 1999:44)

Efectivamente, os discursos políticos procuram resolver as questões da desigualdade social


face ao currículo escolar, o que não quer dizer que essas políticas sejam consequentes nos
seus resultados, nem que os próprios professores acreditem nestas ideologias. É por
actualmente estar a leccionar numa escola onde existe uma grande diversidade de culturas (no
seu geral africanas) que me tenho apercebido da existência de diferentes posturas e
abordagens por parte da classe docente perante este fenómeno. Estando a dar aulas há
apenas 3 anos, reconheço que esta escola fez com que o meu interesse surgisse, daí ter sido o
tema escolhido para o presente ensaio, visto o fenómeno da multiculturalidade ser uma

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realidade incontornável nas nossas escolas e dividir de forma inconfundível a classe docente
quanto à sua abordagem.

O objectivo deste ensaio consiste primeiro na definição do conceito de multiculturalidade, e


em seguida nas abordagens da escola e dos professores perante o fenómeno da
multiculturalidade. Outro aspecto que irei abordar será a formação de professores nesta área
que considero essencial para a abertura de mentalidades mas também para que os
professores consigam em conjunto com a escola gerar condições de sucesso iguais para todos
os alunos.

1 – Definição dos conceitos de Educação Multicultural/ Intercultural

O conceito de multiculturalidade e interculturalidade tem sido, de certa forma, consensual.


Estas questões, surgiram há mais de vinte anos atrás, nos países anglosaxónicos, depois na
Europa, e mais recentemente em Portugal, mais precisamente, na década de noventa.

É principalmente no sistema educativo que esta temática toma grande relevância, devido ao
insucesso e abandono escolar, tentando que as políticas educativas, pelo menos teoricamente,
incluam uma política da diferença e de alguma forma anulem esta lacuna da modernidade
nesta pós-modernidade, abandonando, gradualmente, o conceito e prática da educação
compensatória para dar lugar ao de Educação Multicultural (Formosinho, 1997)

Para Banks & Banks, citado por Banks “a educação multicultural é um processo cujos
objectivos principais são ajudar as crianças de diferentes grupos culturais, étnicos, sexuais e
sociais a ter acesso a oportunidades educativas iguais, e ajudar todos os alunos a desenvolver
atitudes, percepções e comportamentos transculturais positivos” (2002: 527).

Sendo a multiculturalidade uma emergência da escola pós-moderna, esta realidade pressupõe


a prática da Educação Multicultural.

Formosinho defende que o conceito de educação multicultural cobre “as diferenças de origem
regional (urbana ou rural), de classe social e de género, está claramente conotado com as
diferenças culturais de natureza nacional, étnica ou religiosa, ou seja com as diferenças de
natureza civilizacional” (1997: 271). Alguns autores defendem que a educação multicultural
deve ter como base o reconhecimento de todas as culturais presentes e fornecer iguais
oportunidades e contrariar a discriminação económica, étnica, cultural, religiosa, etc.

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Souta, entende que a Educação Multicultural “como um meio de combate eficaz ao


etnocentrismo, à xenofobia e ao racismo, não pode deixar de estar presente em ambientes
homogéneos do ponto de vista étnico-cultural” (1997: 56).

Sendo a multiculturalidade uma realidade existente em, em todas as sociedades, surge a


necessidade da interculturalidade. É perante esta emergência que é necessário manter uma
dinâmica entre o conceito de multiculturalidade e interculturalidade, sendo o multicultural
entendido como uma constatação da presença de diferentes culturas num determinado meio
e da procura de compreensão das suas especificidades, enquanto o intercultural é visto como
um percurso agido em que a criação da igualdade de oportunidades supõe o conhecimento de
cada cultura, garantindo, através de uma intervenção crescente, o seu enriquecimento mútuo,
dinâmica essa a implementar urgentemente nas escola

Ou seja, a multiculturalidade é a existência de diversidade na sociedade em geral, sendo que a


educação multicultural reconhece essa pluralidade, tendo a educação intercultural, a tarefa de
implementar a consagração da convivência, de uma forma saudável, equitativa, sem
preconceitos ou seja, partilhar as diferenças de uma forma construtiva.

Podemos então dizer que a Educação Multicultural pretende abrir consciências para a forte
diversidade existente lado a lado, à Educação Intercultural cabe pôr essas diferenças a coagir
em boa convivência e entendimento, a partir do seu conhecimento profundo, pela
compreensão e tolerância, a diferença e aquisição de mais riqueza cultural.

1.2 - Respostas sociais e educativas à multiculturalidade

Com a democratização da escola, dando acesso a todas as crianças e a todas as diferenças que
lhe fossem inerentes, surgiram grandes problemas ao nível do sistema educativo,
principalmente o aumento do insucesso escolar. Esta situação foi sendo atribuída às inerências
do próprio aluno, quer pelo meio social, económico e cultural envolvente, para em último se
questionar o desempenho da própria escola e dos próprios professores.

Aparecem algumas respostas sociais e educativas à multiculturalidade como sendo o


assimilacionismo, o integracionismo, o pluralismo e o biculturalismo.

A multiculturalidade teve como primeira etapa social e educativa o assimilacionismo. Para


Banks, o assimilacionismo é a aculturação dos grupos minoritários pela cultura dominante;
considera-se que a cultura de origem dos alunos minoritários dificulta o seu itinerário
académico e como tal devem renunciar à sua identidade cultural.

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Por sua vez, o integracionismo traduz-se na “necessidade de convivência e diálogo entre as


várias culturas, criando dispositivos educativos que respeitem a diferença” (Peres, 2000: 69),
ou seja, as práticas pedagógicas, assim como os currículos teriam que ser adaptados de forma
a reduzir gradualmente até desaparecer por completo todos os sintomas de xenofobia e
racismo.

O Pluralismo pretende que na sociedade pluralista convivam, lado a lado, grupos portadores
de múltiplas diferenças, para que o grupo minoritário mantenha a sua identidade e
características próprias e existam no mesmo patamar e em circunstâncias iguais do grupo
maioritário. No plano educativo pode ainda servir para fundamentar uma maior
democratização do sistema educativo, currículos mais abertos à diversidade, inovação
pedagógica etc.

Banks afirma que em sociedades pluralistas é necessário desenvolver um novo paradigma que
ele designa por biculturalismo, paradigma esse “que se centre nas escolhas biculturais e bi-
raciais que as crianças fazem, que interprete as diferenças importantes no seio dos grupos
étnicos e que assuma que as preferências bigrupais - e não as preferências pelo próprio grupo
– são saudáveis numa sociedade multicultural” ( 2002: 547).

Só quando este paradigma estiver devidamente inculcado na sociedade multicultural, se


poderá transpor para a escola, ou seja, será através dessa vivência e formação na família e
sociedade com que interagem que as crianças trarão essas atitudes para a vida da escola.

Segundo Banks “toda a escola deve ser conceptualizada como uma unidade e devem ser
efectuadas alterações significativas em cada uma das suas variáveis, tais como os valores e
atitudes do pessoal da escola, o currículo e materiais didácticos, os processos de avaliação e
testes, os estilos de ensino e motivação, e os valores e normas sancionados e mantidos pela
escola” (Banks, 2002: 549), será numa base de vontade e mudança, por parte da escola e
docentes, que a Educação Multicultural passará da utopia à prática.

2 – A ESCOLA E A EDUCAÇÃO MULTICULTURAL

A escola numa assunção da multiculturalidade e no intuito da implementação da Educação


Multi/Intercultural, tenta abordar estas questões nas dimensões curriculares e metodológicas,
sociomorais e organizacionais (Formosinho, 1997 e Banks, 2002).

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Uma vez que não há orientações do Estado para a Educação Multicultural, as abordagens
curriculares e metodológicas far-se-ão de forma transversal a todas as áreas curriculares. Em
todas as áreas estabelecidas se pode introduzir a multiculturalidade, aproveitando as
motivações e propostas dos alunos, trabalhando o currículo oculto, com a orientação
permanente e perspicaz do professor multicultural.

Banks (2002) expõe quatro categorias relativamente à abordagem curricular: abordagem dos
contributos, aditiva, transformadora e abordagem de acção pessoal. Quanto à primeira
categoria, abordagem de contributos, os conteúdos curriculares já definidos pelo Ministério da
Educação não se alteram, só são introduzidas datas ou pessoas importantes da etnia ou grupo
minoritário, ficando este trabalho somente pela referência sem aprofundar os antecedentes e
os precedentes a essa referência. Na segunda, a aditiva, embora o currículo não mude é
privilegiado com um acréscimo, ou seja, beneficia da “adição de conteúdos, conceitos, temas e
perspectivas étnicas e características básicas” (Banks, 2002: 550). Nesta abordagem, há um
enviesamento do conhecimento a adquirir. Surge assim, a abordagem transformadora.

Por acção do método pedagógico praticado pelo professor vai-se efectuar uma transformação
ao nível das relações alunos/professor e alunos/conhecimentos. Há portanto um
desenvolvimento pessoal, social e cívico de todos. Banks afirma que esta quarta abordagem
“coexiste e mistura-se na prática real da sala de aula” (2002: 552).

2.1 – Abordagens à educação Multicultural

As abordagens sociomorais têm a ver directamente com a pedagogia e praxis dos professores
na sua sala de aula, com o seu grupo de crianças, relativamente à multiculturalidade. Nesta
abordagem integram-se as acções educativas que visam directamente influenciar as crenças,
valores e atitudes das crianças e jovens .

Apresentam-se por último as abordagens organizacionais, sendo que estas pretendem


organizar a escola no seu todo, para que a Educação Multicultural se consagre
verdadeiramente e promova efectivamente a interacção das diversidades múltiplas dos
alunos.

É perante os aspectos organizacionais que se torna necessário rever as zonas de recrutamento


escolar que, normalmente, coincidem com as de residência das famílias. Se é uma zona de
condições sociais e culturais baixas, a escola dessa área geográfica comportará somente
crianças desfavorecidas (e o contrário também é verificável), o que produz situações
conducentes à segregação. É perante esta realidade que se impõem políticas de
dessegregação.

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Outro aspecto organizacional a considerar e que tem efeitos na Educação Multicultural, é a


constituição das turmas. Aqui, a escola tem um maior poder de actuação, é benéfico não
juntar na mesma turma crianças de uma só etnia, do mesmo credo etc., mas heterogeneizar. É
nesta abordagem que actua a pedagogia, que tem a ver com a forma como o professor
desenvolve o seu trabalho dentro da turma. O método pedagógico a utilizar pode ser decisivo
para a implementação da Educação Multicultural.

3 – O PROFESSOR E A EDUCAÇÃO MULTICULTURAL

É atentando nas possibilidades da pós-modernidade que as escolas e os professores tentam


ultrapassar habitus homogeneizadores e políticas educativas uniformizantes. É através da
construção do professor consciente das diferenças sociais, que as reconhece e promove, que
ele próprio recorre à construção de dispositivos pedagógicos dentro da sala de aula, e de
acordo com as diferenças aí em coexistência.

As respostas da escola à multiculturalidade não podem ser unilaterais por correr o risco de
subverter a sua verdadeira função. O professor continua a deter o papel principal na função
que a escola tem de ensinar e educar na e para a multiculturalidade, a ele cabe o papel de
arranjar estratégias para transformar, quer o discurso pedagógico quer o currículo uniforme,

Na medida em que no campo educativo nada é estático mas dinâmico, espera-se que os seus
actores educativos, na pessoa do professor, se mantenham em permanente construção.
Construção essa, suscitada pela especificidade do contexto de trabalho, das características da
população escolar e da comunidade envolvente. É neste cenário que o professor precisa ter o
discernimento suficiente para dar respostas adequadas à diversidade existente na escola e na
comunidade que a serve, adequação essa, que impele o professor monocultural a evoluir para
o tipo multicultural, construindo-se progressivamente. Pois se o professor monocultural
mantém “o olhar passivo sobre a diferença, lendo-a como algo que é necessário corrigir, como
um olhar que a reconhece sem a querer conhecer”, o multicultural adopta a educação
inter/multicultural não só como filosofia educativa mas também como projecto a realizar nesta
época de globalização.

Actualmente, as políticas educativas propõem “a escola para todos” e a “igualdade de


oportunidades” para todas as crianças, mas na realidade, só se verifica o cumprimento da
primeira proposta através da obrigatoriedade de sua frequência escolar a partir dos seis anos
de idade. Como a sociedade pós-moderna é fragmentada, por encerrar várias culturas torna-se
complexa pela sua interacção, mas sendo a escola, o lugar onde a reprodução dessa sociedade

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acontece, impõem-se desafios a si própria e aos professores. Daí, a segunda proposta, a escola
para todos, só se traduzir em eficácia no acesso mas não no sucesso para todas as crianças. A
sua implementação só será efectiva e equitativa quando assumida pela escola e professores
como um processo a percorrer na diferença, na individualidade e na heterogeneidade, a bater-
se constantemente pela permanência e sucesso das crianças na escola.

Como as realidades escolares e os seus contextos de vida são muito diversificados, espera-se
professores analistas, multiculturais-críticos e promotores de práticas adequadas a cada
realidade, defendendo “a descentração da escola – a escola faz parte da comunidade; criação
de laços entre a escola, família e a comunidade local e global” (Peres, 2000: 282), ou seja,
como não há receitas práxicas pré-definidas, será o professor, no seu papel de actor
multicultural, a reflectir sobre a constituição das margens do rio para a construção da ponte,
numa base de respeito, essencialmente, pelos direitos das crianças.

É neste percurso que o professor mono se constrói em multicultural, assumindo uma posição
crítica relativamente à pluralidade e posicionando-se numa política da diferença, em que o
objectivo da educação por si veiculada é fazer decrescer o imperialismo da escola e da cultura
dominante, transformando a Educação Multicultural num espaço de produção e construção de
saber a partir das crianças, de uma forma tácita mas consciente e crítica. É neste sentido que o
professor multicultural detém um papel de destaque no processo ensinoaprendizagem.

O professor multicultural-crítico transforma-se mental e pedagogicamente porque trabalha em


função da diversidade sem subverter a verdadeira função da escola, que tem de transmitir a
parte curricular que prepara as crianças com conhecimentos que a sociedade lhes vai exigir,
sem folclorizar as diferenças, pois desta forma não há a assunção consciente do respeito pela
diferença, mas sim, por o que ela tem de mais proporcionador de boa disposição e ainda, com
a preocupação de não guetizar as diferenças.

Pode afirmar-se que o professor monocultural foi o primogénito na prática educativa e na


“verdade, pode dizer-se que todos os professores são, até certo ponto, mono e
inter/multiculturais.

O professor monocultural orienta-se pela democracia representativa, ou seja pela vontade da


maioria e exclusão de minorias, o multicultural caminha em busca de um equilíbrio dinâmico,
entre os dois conceitos da cidadania, democracia representativa e participativa, onde cada um
possa ter voz e lugar para a sua diferença.

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3.2 - Formação Contínua de Professores para a Multi/Interculturalidade

Actualmente as sociedades são cada vez mais multiculturais e diversificadas, tendo os países
de proceder a políticas de integração e dar respostas adequadas às novas diferenças.

Com a “escola para todos”, após o 25 de Abril, esta massifica-se, subvertem-se as diversas
características da população escolar através do currículo uniforme e o professor monocultural,
dando à escola o papel de transmitir saberes nacionais, de aprender a ler, escrever e contar,
banalizando a individualidade de cada ser humano que a frequenta.

Envoltos na reflexividade da actualidade e numa assunção da pós-modernidade como gestão


correctiva dos défices e excessos da modernidade, as questões da diversidade cultural
constituem um dos maiores, desafios que a modernidade ignorou e que a pós-modernidade
tem de solucionar como condição essencial para o futuro da humanidade, na pretensão que se
torne mais tolerante e solidária, com intervenção urgente e eficaz no campo da
multiculturalidade que actua diariamente na escola.

Na década de 60, num estado extremamente regulador, dão-se algumas mudanças,


relativamente à educação, pouco significativas. Na década de 70 aposta-se no aumento da
quantidade de professores, investindo-se na sua formação inicial e fundando-se nessa altura, o
debate sobre a sua formação. Defende-se que o homem, quanto mais conhecedor for de tudo
o que o rodeia, mais possibilidades um país tem de exercer a democracia e a liberdade.
Investe-se então no capital humano como condição necessária para o progresso.

Nos anos 80, esse debate é posto em prática, surge então a formação de professores já em
exercício, que em lugar de vir de encontro às suas problemáticas, vem vincar ainda mais o
papel controlador do estado, uma vez que os professores começaram a perder prestígio
intelectual, social, cultural e económico, tornando-se funcionários públicos, assistindo-se
mesmo, a uma certa desprofissionalização e proletarização. É em 1986, com a publicação da
Lei de Bases do Sistema Educativo, que a formação contínua ganha relevo e é sujeita a um
enquadramento normativo. A década de 90 é marcada pela formação inicial de professores,
em paralelo com a contínua em serviço, que tende a articular-se em primeira linha com os
objectivos do sistema, nomeadamente com o desenvolvimento da reforma. É uma visão
inaceitável, uma vez que não concebe a formação contínua na lógica do desenvolvimento
profissional dos professores e do desenvolvimento organizacional das escolas.

A formação de professores assume assim duas vertentes, a inicial e a contínua. Embora a


formação inicial dos professores se vá adaptando às transformações sociais, reconstruindo os
seus programas, esta torna-se insuficiente para apetrechar os professores de conhecimentos

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para toda a sua vida profissional. Uma vez que a formação inicial de professores não é, por si
só suficiente, tem de ser complementada com uma aprendizagem, já em serviço, para que os
professores consigam o devido equilíbrio entre o saber, saber fazer e o saber ser. Pois, embora
todos estes requisitos sejam exigidos dum professor, será ao nível do último que mais se
espera, uma vez que a heterogeneidade patente dentro duma sala de aula é uma constatação
que deve ser atendida e respeitada na escola actual.

Toda a formação deve ser abrangente e capaz de transformar os professores em


investigadores reflexivos e críticos das suas próprias práticas. Pois será através deste exercício
que se vão apercebendo das alterações sociais da população escolar, da emergência de outras
e novas necessidades educativas, assim como da incompletude das suas práticas. Para fazerem
esta conscientização, os professores, têm de, no decorrer do seu percurso profissional,
preencher vazios educativos por eles percebidos nessas práticas.

A formação contínua, para ser eficaz e frutífera, deve responder às necessidades educativas,
não só dos professores mas também de cada escola, deve visar também, uma melhor
preparação do seu corpo docente em função do modelo educativo adoptado, dos seus
projectos, assim como do contexto da comunidade educativa e das suas características
multiculturais.

É nesta área que a formação contínua tem de investir, dotar os professores de conhecimentos
e estratégias suficientes, para que se sintam seguros das suas competências e capazes de
encarar a multiculturalidade como algo que existe entre as crianças e que tem de ser
trabalhada, de forma a não transformar a pluralidade em uniformidade, anulando as
diferenças e tratar a todos como sejam um só.

Para que a multi/interculturalidade seja efectiva dentro das salas de aula, o professor tem de
partilhar a educação e o ensino-aprendizagem, dos seus alunos, com os pais e abrir a escola e a
sua sala de aula a toda a comunidade envolvente. Só perante esta atitude se constitui uma
comunidade educativa e a escola passa a trabalhar em verdadeira parceria, só dessa forma a
ponte entre culturas é estabelecida.

Assim, a formação contínua encerra uma importante função de mudança no ensino através da
“pressão” implícita aos professores. Além de os ajudar a mudar mentalidades educativas, dota-
os de mais competências ao nível da reflexão-crítica sobre as suas práticas, motivando-os para
a mudança e inovação, alerta-os para novas realidades sociais reflectidas na população escolar
e oferece novos conhecimentos e estratégias de atendimento

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3.3 – As áreas curriculares de expressão e a educação Multicultural

As próprias áreas de expressão, de cumprimento curricular obrigatório (dramática, musical,


plástica e física), são óptimas áreas para trabalhar a diversidade. Se forem trabalhadas de uma
forma transversal e interdisciplinarmente operacionalizadas, podem ser proporcionadoras de
outras aprendizagens ligadas a disciplinas tidas como fulcrais (matemática e língua materna)
pelos professores. Estas áreas podem servir de complemento a todo o processo ensino-
aprendizagem, na medida em que as artes permitem participar em desafios colectivos e
pessoais que contribuem para a construção da identidade pessoal e social. Exprimem e
enformam a identidade nacional, permitem o entendimento das tradições de outras culturas e
são uma área de eleição no âmbito da aprendizagem ao longo da vida.

Por vezes não lhes é dada a devida importância nem trabalhadas na devida substância, ou por
falta de formação específica ou porque o aprender a ler, escrever e contar, continua a usufruir
do maior tempo curricular. Estas áreas continuam a ser muito enriquecedoras para o
apetrechamento do espaço físico e ricas, quer no conteúdo, como na produção para o
embelezamento e qualidade do ambiente educativo, pela variedade e pela alegria e bem-estar
que proporcionam.

Na operacionalização das áreas de expressão surge a necessidade de criar espaços específicos,


pelos materiais que envolve a sua prática para a sua execução, constituindo essas zonas,
espaços onde as crianças diversificam aprendizagens, cooperam e interagem com as diferenças
existentes. É nestes espaços pedagógicos que se cria um ambiente de abertura e de grandes
possibilidades de trocas culturais, da sua aceitação e do seu respeito. Verificam-se
oportunidades de trocas de saberes culturais duma forma informal e de carácter apreciativo,
onde se torna fácil a recontextualização desses saberes.

Conclusão

A escola é, por excelência, o local onde a crescente multiplicidade cultural da sua população
constitui desafios inovadores à igualdade de oportunidades e, portanto, mais do que nunca,
torna-se necessário um reajuste de atitudes e de práticas. O desafio de promover uma
educação intercultural não se confina a determinadas populações particulares (às
minoritárias), como se apenas a elas coubesse o esforço de reconhecer, valorizar e aceitar as

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culturas diferentes da sua. Cabe a todos, aos grupos minoritários e aos maioritários, evitar o
fechar das culturas sobre si próprias e empenhar-se na abertura às diferenças e na partilha de
elementos culturais comuns que proporcionem interacções construtivas num clima de paz, de
respeito pela expressão diversa e justiça.

A convicção e reflexão dos professores, são duas atitudes fundamentais para a mudança das
práticas em sentidos multiculturais. Convicção acerca da necessidade de institucionalizar a
educação multicultural nas escolas portuguesas e convicção de que os professores são
elementos centrais para a realização desse objectivo. Permanente reflexão acerca do que se
fez e vai fazendo nessa direcção de modo a ir avançando para níveis cada vez mais elevados de
igualdade de oportunidades educativas. A escola tem de respeitar e acolher as diferenças
culturais e linguísticas, promover a auto-estima e a auto-confiança das crianças, promover
interacções livres de preconceitos e discriminações.

Como neste início do século XXI, são as questões da diversidade cultural que mais desafios
colocam às escolas e aos professores, espera-se que através da formação contínua, os
professores se apropriem de skills (habilidades), para melhor perceberem a multiculturalidade
entre os seus alunos e promover a interculturalidade entre as múltiplas diferenças, duma
forma assumida e isenta, sem subterfúgios ou daltonismo.

É cada vez mais importante que para além do professor reconhecer a diferença, este adopte
uma pedagogia que a todos inclua, procurando proporcionar um ensino diferenciado,
organizando as actividades e as interacções de modo a que cada um seja frequentemente
confrontado com situações enriquecedoras de acordo com as suas características e
necessidades pessoais.

É importante re-contextualizar e reflectir sobre a necessidade de uma organização e práticas


curriculares com as quais as minorias se identifiquem e se sintam reconhecidas. A escola
deverá evitar o favorecimento de processos e/ou atitudes que em nada favorecem a formação,
e ser uma instituição que contribua para uma real inserção social dos alunos de minorias
étnicas.

Com um longo caminho a percorrer, o multiculturalismo parece ser a melhor escolha para a
gestão da diversidade étnica desde que seja visto como um projecto em constante construção,
com direitos e obrigações, sem preconceitos. Será importante para as minorias a participação
social que não implique abdicar das sua origens e importante para a sociedade de acolhimento
sublinhar a tolerância e as vantagens por demais evidentes numa sociedade multicultural.

O multiculturalismo poderá ser conseguido não apenas com uma política multiculturalista, mas
sim com um conjunto crescente de políticas, que visem a igualdade, o direito à diferença, a
luta contra a discriminação, que possam sustentar as sociedades multiculturais.

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Bibliografia

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 Souta, Luís (1997). Multiculturalidade e Educação. Porto: Profedições.

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Inter/Multicultural às Políticas Educativas numa época de Transnacionalização.
Biblioteca das Ciências do Homem/Ciências da Educação, Edições Afrontamento, 1999

 http://www.paulofreire.org.br/Textos/Conferencia%20de%20Carlinda%20Leite.pdf

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