A crise atual e a construção de elementos para sua superação
A crise atual por que passa o Brasil tem pelo menos 3 elementos que levam a sua constituição e aprofundamento:
As políticas fiscalistas, o desmonte do Estado e das empresas estatais e os
efeitos da chamada “Operação Lava-Jato” sobre a renda e o emprego, que levaram à recessão de 2015-2016, e à estagnação nos anos subsequentes, 2017-2019; A pandemia em 2020, agravada pelas políticas insanas do Governo Federal que aprofundaram e podem estender os efeitos perversos da pandemia, sejam mortes, seja o debilitamento da população massivamente contagiada. A pandemia levou à recessão de 2020, a maior em muitas décadas e, pela inação do Governo Federal, já compromete, pelo menos até aqui, o primeiro semestre de 2021; Um quadro internacional altamente desfavorável, com volatilidade dos preços das commodities e aversão ao risco dos investimentos internacionais, com forte impacto em especial sobre a taxa de câmbio dos países ditos emergentes, entre os quais se inclui o Brasil – aliás, um dos países onde esses movimentos são mais agudos. Assim, o Brasil se encontra em uma situação extremamente complicada, com uma população economicamente debilitada pela estagnação econômica, pelo desmonte do Estado (que atinge fundo as áreas sociais, como Saúde, Previdência, Assistência Social, Saneamento, Transporte, Habitação e Educação, entre outras) e pela desregulação e flexibilização trabalhistas. Ou seja, além da queda do nível de atividade econômica, os componentes da reforma trabalhista, implementada no Governo Temer, contribuem para jogar ainda mais para baixo as condições de trabalho e renda dos trabalhadores. Isso acaba inviabilizando que se possa contar com o consumo de boa parte da população para a dinamização da atividade econômica. No setor externo, embora a balança comercial tenha voltado a ter saldo nos últimos seis anos, esse saldo é decrescente a partir de 2017 (caiu de cerca de US$ 67 bilhões em 2017 para cerca de US$ 42 bilhões em 2020). Ou seja, o impulso que pode advir do saldo comercial não se amplia, o volume é pequeno perto do PIB brasileiro, e portanto com impacto reduzido, e nos últimos dois anos temos saídas de capitais e investimentos externos decrescentes. Ou seja, não se pode esperar muito do desempenho do setor externo para a ativação do crescimento. Os investimentos também se apresentam fragilizados pela falta de perspectivas. O investimento externo é cadente, o investimento público tende a inexistir ou a se fixar em patamares muito retraídos, e o investimento privado não vê perspectivas de crescimento, e portanto, patina. Assim, do investimento também não pode se esperar muito para a dinamização da economia nacional. Resta o gasto público, como componente autônoma, porém extremamente debilitado pelas políticas fiscalistas, que restringem os gastos públicos quando o país mais precisaria deles para sair da estagnação e recessão onde se meteu. Retirar portanto o Estado da restrição fiscal e voltar a gastar é fundamental para ativar a economia e sair da UTI econômica em que nos encontramos. Assim, visando escapar exatamente desse quadro dramático, são aqui sugeridas cinco orientações, que podem se desdobrar em um conjunto de medidas:
Instituição de um programa de renda de cidadania para uma parcela
expressiva da população, que deveria incluir não apenas os quase 15% de desempregados, como uma parcela ampla de desalentados e subocupados, e trabalhadores com renda insuficiente, de modo a que possamos garantir, em um primeiro momento, que esses trabalhadores possam garantir situações de isolamento social no período da pandemia, mas posteriormente que tenham garantia de renda para consumir, entendido aqui também o consumo básico como elemento fundamental da cidadania – portanto, esse programa não pode pura e simplesmente ser confundido com o auxílio emergencial. O objetivo aqui é também expandir o consumo, já que a aplicação do auxílio emergencial em 2020 mostrou que é possível transcender em muito o Bolsa Família. Também esse auxílio deve ser pensado como estruturante de um programa de renda futuro que leve em conta as modificações estruturais pelas quais está passando o mercado de trabalho no Brasil e no Mundo;
Uma política de ampliação consistente do gasto público visando ativar
rapidamente a economia e alavancar o investimento privado (uma política de obras públicas em setores fundamentais de infraestrutura social). O objetivo aqui é conseguir o mais rapidamente possível uma taxa de crescimento robusta, que ajude a ampliar a arrecadação a níveis que possam permitir escapar da discussão sobre cortes de gastos, através da inversão dos resultados negativos das contas públicas oriundos da estagnação e da recessão;
Articulação de políticas industriais e tecnológicas abrangentes e encadeadas,
em especial a partir dos investimentos em áreas sociais. Assim, o investimento em saúde tem que ser encadeado, de modo que represente não apenas construção de unidades de saúde e contratação de pessoal, assim como a formação de cadeias produtivas na área, que permitam a produção de material para os hospitais (leitos hospitalares, respiradores, etc.) como o desenvolvimento de pesquisa e tecnologia nessa área, que possa ser utilizada na melhoria da qualidade do atendimento (medicamentos, vacinas, material para exames, desenvolvimento da aplicação da informática para comunicação para atendimentos ou avaliação dos exames, etc.). Idem em educação, onde além da contratação e qualificação de docentes e demais funcionários, se poderia pensar na reforma das unidades escolares com ampliação do conteúdo tecnológico utilizado no ensino, além de disponibilização para os estudantes de notebooks, tablets, etc.. O fundamental é articular políticas industriais e tecnológicas a partir do encadeamento com a expansão do gasto social.
Reestabelecimento imediato de políticas de segurança energética, mediante a
reconstituição da autonomia nacional com a reversão do desmonte da Petrobrás, a ampliação do conjunto de refinarias sob o controle desta empresa estatal e a mudança na política de formação de preços de combustíveis hoje atrelada a variação do dólar norte-americano. Fortalecimento da Eletrobrás e do complexo de geração e distribuição de energia elétrica em todo território nacional. Política de compras públicas nas três esferas de governo privilegiando a pequena agricultura com foco no mercado interno, vinculada a políticas de crédito e assistência técnica que assegurem o fortalecimento deste setor e a expansão da oferta de alimentos básicos a segurança alimentar no Brasil.
Junto com o efetivo enfrentamento da pandemia, estas são as diretrizes fundamentais
para a reversão da crise econômica, política e social em que nos encontramos.