Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
9352
OLIVO DAMBRÓS
Universidade Tecnológica Federal do Paraná
RESUMO
O artigo inicia com abordagem teórica sobre a construção de uma proposta de Extensão
Rural Agroecológica (ERA), em seguida faz link entre os aspectos teóricos da ERA e dados
empíricos de uma ATER em rede, analisando nove projetos de Acompanhamento Técnico e
Extensão Rural desenvolvidos junto a agricultores familiares e assentados da reforma
agrária no estado do Paraná. Nesta análise, faz-se um breve histórico sobre o modelo de
Extensão Rural até a nova ATER no que se refere à participação das organizações sociais e
descreve sucintamente os nove projetos/experiências ressaltando aspectos, como: relação
projeto e processo; gestão e organização; formação de equipes de ATER e instrumentos
metodológicos utilizados na transição agroecológica dos sistemas familiares, grupais e de
comunidades rurais. Por fim, apresenta alguns impactos das ações executadas e conclui
destacando avanços e limites para desenvolver uma proposta teórica de Extensão Rural
Agroecológica.
ABSTRACT
The article begins with a theoretical approach on the construction of a proposal of Rural
Agroecological Extension (ERA), then links the theoretical aspects of the ERA and empirical
data of a network ATER, analyzing nine projects of Technical Accompaniment and Rural
Extension developed together to family farmers and settlers of agrarian reform in the state
of Paraná. In this analysis, a brief history is made of the Rural Extension model to the new
ATER with regard to the participation of social organizations and briefly describes the nine
projects / experiences highlighting aspects such as: project and process relationship;
Management and organization; Training of ATER teams and methodological tools used in
the agroecological transition of family, group and rural community systems. Finally, it
presents some impacts of the executed actions and concludes highlighting advances and
limits to develop a theoretical proposal of Agroecological Rural Extension.
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
275
Francisco Roberto Caporal e Olivo Dambrós
RESUMEN
El artículo comienza con una aproximación teórica a la construcción de una propuesta de
Extensión Rural Agroecológica (ERA), y a continuación, hace el vínculo entre los aspectos
teóricos de la ERA y los datos empíricos de una ATER en red, a partir del análisis de nueve
proyectos de asesoría técnica y extensión rural desarrollados en conjunto con los
agricultores familiares y asentados de la reforma agraria en el estado de Paraná. En este
análisis, se hace una breve historia del modelo de Extensión Rural hacia la nueva ATER en lo
que respecta a la participación de las organizaciones sociales y describe los nueve
proyectos / experiencias destacando aspectos tales como: relación entre el proceso y el
proyecto; gestión y organización; capacitación de los equipos de ATER e instrumentos
metodológicos utilizados en la transición agroecológica de los sistemas de producción
familiares o grupales y los sistemas de las comunidades rurales. Finalmente, se presentan
algunas repercusiones de las acciones y concluye destacando los avances y límites para
desarrollar una propuesta teórica de Extensión Rural Agroecológica.
1 INTRODUÇÃO
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
276
Extensão Rural Agroecológica: experiências e limites
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
277
Francisco Roberto Caporal e Olivo Dambrós
transferencista que vinha sendo criticado, embora os 1 Embora hoje muita gente
discursos oficiais das entidades públicas de Ater fale e escreva sobre
evidenciassem algumas expressões incorporadas a partir dos Extensão Rural
debates anteriores aos anos 1990, tais como: Agroecológica, sem falsa
modéstia, é preciso lembrar
desenvolvimento sustentável, proteção ao meio ambiente, que a construção conceitual
metodologias participativas, foco na agricultura familiar, da ERA foi iniciada pelo
entre outros discursos que apontavam ara mudanças na sua autor citado, em 1994 e se
prática. consolidou no capítulo VIII
De todo modo, as mudanças demandadas ao aparato de sua tese de doutorado,
em 1998.
extensionista estavam longe de se concretizar, por diferentes
razões, entre as quais, as posições ideológicas dominantes
dentro das instituições públicas de extensão rural,
notadamente conservadoras, bem como as resistências dos
próprios extensionistas formados a partir dos cânones da
Revolução Verde (CAPORAL, 1991).
Retomando o debate em torno das mudanças
necessárias para que a extensão respondesse positivamente
ao que vinha sendo demandado pela sociedade, foi
publicado, em 1994, um artigo intitulado Por uma Nova
Extensão Rural: fugindo da obsolescência (CAPORAL; COSTA
BEBER, 1994). Nele se fazia um alerta: “Não podemos nos
deixar levar pelo imobilismo conservador que continua
aprisionando as organizações públicas de extensão rural.”
(CAPORAL; COSTA BEBER, 1994, p.70) E se enfatizava que era
necessário que a ATER enfrentasse os desafios
socioambientais presentes no campo, e, para isso, a extensão
rural deveria “revolucionar suas bases teórico-conceituais e
seus referenciais metodológicos”, fugindo do modelo
convencional, já que para enfrentar estes novos desafios não
basta que os extensionistas sejam bons difusores de
tecnologias, mas exige que sejam bons mediadores,
articuladores e que suas intervenções sejam mais
democráticas, dialógicas e participativas.
Nasceria daí a noção de Extensão Rural Agroecológica
(ERA), que foi construída a partir da compreensão de que
ante os desafios do desenvolvimento sustentável, os
aparatos públicos de extensão terão que transformar sua
prática convencional para que possam atender às novas
exigências da sociedade. A crise socioambiental, gerada pelos
estilos convencionais de desenvolvimento rural e de
extensão, recomendava uma clara ruptura com o modelo
extensionista baseado na Teoria da Difusão de Inovações e
nos tradicionais pacotes da Revolução Verde. Assim, a
proposta teórica da ERA foi construída tomando como
referência as exigências de uma ação diferenciada de
Extensão Rural, que fosse social e ambientalmente
responsável (CAPORAL, 1998)1.
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
278
Extensão Rural Agroecológica: experiências e limites
Concretamente, vai ser somente em 2003 que a 2 Cabe lembrar que, entre
Agroecologia como ciência norteadora das ações 1999 e 2002, a Empresa de
extensionistas vai aparecer em uma política do governo Ater do Rio Grande do Sul,
federal, a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão ASCAR/EMATER-RS,
desenvolveu um grande
Rural (Pnater).2 Posta em marcha em 2004, a Pnater partia
esforço no sentido de
das críticas históricas à extensão rural brasileira e incorporava implementar a proposta da
um novo arsenal teórico e metodológico, dando consistência ERA na extensão rural
à orientação das ações extensionistas com base em uma daquele estado, tendo obtido
política pública. Era a hora de levar à prática a proposta avanços significativos, dentre
os quais vale destacar os
teórica da Extensão Rural Agroecológica (BRASIL, 2004).
Seminários de Agroecologia
Não obstante os esforços no sentido da sua efetivação que foram o embrião para a
na prática extensionista, pronto evidenciou-se que havia criação da Associação
obstáculos objetivos que dificultavam ou impediam as Brasileira de Agroecologia.
mudanças nas práticas das instituições públicas de extensão
rural. Em um primeiro balanço, evidenciou-se que havia uma
força de “inercia” e uma reação interna às instituições, fruto
de questões estruturais, políticas, ideológicas e mesmo de
formação dos extensionistas que impediam as mudanças.
(CAPORAL; RAMOS, 2006). Investigações posteriores
confirmaram esta tendência conservadora. (CAPORAL, 2014).
Ademais, para evidenciar empiricamente as
dificuldades de implementação da ERA no cotidiano das
ações extensionistas foi realizada uma pesquisa no estado do
Paraná a qual trouxe evidências sobre os avanços e
dificuldades presentes na vida real para colocar na prática das
entidades e dos extensionistas o conjunto de recomendações
da Pnater, em especial a partir do ano de 2010 quando entrou
em vigor a Lei nº 12.188 conhecida como Lei de Ater (BRASIL,
2010).
Assim, neste artigo, além de uma abordagem teórica
sobre a proposta de uma Extensão Rural Agroecológica, os
autores dedicam uma atenção especial para a análise de
experiências concretas de extensão rural levadas à prática
em diferentes territórios, evidenciando aspectos positivos e
limites objetivos para se por em marcha um modelo de
extensão rural diferenciado do convencional, mais
democrático, dialógico e participativo e tecnicamente
orientado pela Agroecologia.
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
279
Francisco Roberto Caporal e Olivo Dambrós
busca pela ecologização da agricultura. Esse processo, que foi considerado como
sendo a “segunda transição agroecológica” do século XX, se caracteriza, entre
outras coisas, pela “politização ecológica”, tanto da agricultura como dos
alimentos, de modo que “os movimentos ecologistas e afins passam a exercer uma
influência crescente sobre as políticas agrárias e alimentares”. (BUTTEL, 1995, p.11)
Neste marco, nasceu a proposta de desenvolvimento sustentável, expressão
que até hoje não logrou alcançar consenso sobre o que é e como se pode chegar a
este ideal de sustentabilidade socioambiental. Neste sentido, existem várias
tendências e discursos em disputa, cada uma das quais propondo, desde sua
posição teórica e ideológica, a perspectiva de “outro estilo de desenvolvimento”,
que surge mais como adaptação ou oposição aos modelos convencionais que,
propriamente, como uma concepção teórica acabada que pudesse superar a
anterior.
Entre as correntes de pensamento sobre a sustentabilidade na agricultura é
possível destacar duas que, em nossa opinião, se constituem nos extremos de um
processo de ecologização agrícola. Ambas querem garantir “nosso futuro comum”
neste planeta finito, ainda que para isso apresentem diferentes alternativas.
Por um lado, encontramos a corrente liberal, “oficialista”, que está
preocupada com a manutenção e incremento das taxas de crescimento econômico
e da produção e produtividade agrícola, subordinando a estas variáveis os aspectos
ambientais e sociais do desenvolvimento, que ficam em segundo plano. Trata-se da
chamada alternativa “ecotecnocrática” do desenvolvimento sustentável, a qual se
faz operativa, quanto ao desenvolvimento agrícola, mediante a proposição de um
processo de intensificação verde (SEVILLA GUZMÁN; ALONSO MIELGO, 1995).
A outra corrente que se pode destacar, parte de una visão crítica e defende
que o desenvolvimento para ser sustentável deve atender, entre outros requisitos,
os de equidade social, produtividade, estabilidade e sustentabilidade ambiental.
Neste caso, aparecem como aspectos fundamentais para esta corrente de
pensamento, as noções de variabilidade espacial dos agroecosistemas; de
coevolução do homem com seu meio ambiente; de reconhecimento das diferentes
estruturas culturais; da importância da biodiversidade; assim como a necessidade da
distribuição da riqueza como alternativa ao crescimento econômico ilimitado.
Dados tais condicionantes teóricos, sua proposta operativa para a agricultura
sustentável implicaria na necessária integração, em níveis de igualdade, dos
objetivos econômicos, sociais e ambientais do desenvolvimento, assim como na
observância das variáveis culturais, políticas e éticas da sustentabilidade. Trata-se,
neste caso, da perspectiva teórica e conceitual oferecida pela ciência da
Agroecologia.
Logo, uma extensão rural que possa contribuir para o desenvolvimento rural
mais sustentável deve trabalhar no apoio à implementação de tipos de agriculturas
mais sustentáveis, o que não é possível a partir da difusão de pacotes tecnológicos
verdes, mas sim seguindo os ensinamentos da Agroecologia e, portanto, tratar-se-ia
de uma Extensão Rural Agroecológica.
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
280
Extensão Rural Agroecológica: experiências e limites
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
281
Francisco Roberto Caporal e Olivo Dambrós
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
282
Extensão Rural Agroecológica: experiências e limites
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
283
Francisco Roberto Caporal e Olivo Dambrós
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
284
Extensão Rural Agroecológica: experiências e limites
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
285
Francisco Roberto Caporal e Olivo Dambrós
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
286
Extensão Rural Agroecológica: experiências e limites
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
287
Francisco Roberto Caporal e Olivo Dambrós
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
288
Extensão Rural Agroecológica: experiências e limites
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
289
Francisco Roberto Caporal e Olivo Dambrós
Cerro Azul), AOPA, Aprotunas – APRAF - Associação Rio Sul (ambas associações
comunitárias de agricultores), Secretaria de Agricultura de Cerro Azul, Prefeitura de
Adrianópolis, Sindicatos dos Trabalhadores Rurais e o Departamento de Estudos
Rurais (DESER). O objetivo principal foi desenvolver ações de acompanhamento
técnico junto às unidades familiares visando criar alternativas para mitigar a
migração da mão de obra do campo para os centros urbanos, ampliar a
diversificação produtiva das unidades familiares, melhorar a renda familiar, ampliar
a articulação e organização das entidades da agricultura e reivindicar melhoria das
condições de infraestrutura básica (estradas, saúde e educação) para a população
do campo que vive na região do Vale do Ribeira.
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
290
Extensão Rural Agroecológica: experiências e limites
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
291
Francisco Roberto Caporal e Olivo Dambrós
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
292
Extensão Rural Agroecológica: experiências e limites
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
293
Francisco Roberto Caporal e Olivo Dambrós
outras emprestavam um carro, outras uma sala e assim por diante, permitindo a
participação de diferentes atores e dentro de suas possibilidades reais.
O maior limite para a construção de Planos Municipais de ATER Agroecológica foi a
falta de compreensão do trabalho compartilhado. Enquanto estava na fase de
diagnóstico e planejamento a participação e construção coletiva era animada, mas
ao chegar no momento operacional, cada entidade voltava a cuidar de suas ações e
poucas restavam para cuidar do processo. A maioria abandonava a construção
coletiva.
6 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
294
Extensão Rural Agroecológica: experiências e limites
7 REFERÊNCIAS
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
295
Francisco Roberto Caporal e Olivo Dambrós
CAPORAL, F. R. La extensión agraria del sector público ante los desafíos del
desarrollo sostenible: el caso de Rio Grande do Sul, Brasil. 1998. 516f. Tese de
Doutorado. (Instituto de Sociología y Estudios Campesinos). Universidad de
Córdoba, Córdoba: Espanha, 1998.
CAPORAL, F. R. Extensão Rural como política pública: a difícil tarefa de avaliar. In:
SAMBUICH, R. H. R. et al. Políticas Agroambientais e Sustentabilidade: desafíos,
oportunidades e lições aprendidas. Brasília: Ipea, 2014, p. 19-48
CAPORAL, F. R.; COSTA BEBER, J. A. Por uma nova extensão rural: fugindo da
obsolescencia”. In: Rev. Reforma Agrária, nº 3, vol. 24, set/dez/. Campinas: ABRA, p.
70-90, 1994.
FONSECA, Maria Teresa Lousa da. A extensão rural no Brasil: um projeto educativo
para o capital. São Paulo: Loyola, 1985.
FREIRE, Paulo. Extensão ou Comunicação? 13ª Edição Editora Paz e Terra, São Paulo,
2006.
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
296
Extensão Rural Agroecológica: experiências e limites
Redes - Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, v. 22, n. 2, maio-agosto, 2017
297