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Sumário:
- 1. Introdução - 2. Conceito de segurança jurídica - 3. Historicidade da segurança
jurídica - 4. Direitos fundamentais na Constituição de 1988 e princípio da segurança
jurídica - 5. Segurança jurídica no âmbito do direito público: os princípios da estrita
legalidade e da igualdade - 6. Segurança jurídica no âmbito do direito privado e a análise
do art. 2.035, do CC/2002 - 7. Segurança jurídica: análise de casos concretos - 8.
Conclusões acerca do tema - 9. Referências bibliográficas
Resumo: Trata-se de estudo que procura analisar o tema da segurança jurídica frente
às grandes transformações econômicas, sociais e tecnológicas ocorridas sobretudo nos
últimos cinqüenta anos. Para tanto, foi necessária a análise do tema frente à
Constituição de 1988, bem como a sua historicidade, desde a Idade Antiga até a Idade
Contemporânea, para que fosse possível desenhar as perspectivas para o futuro. Desta
forma, o autor procura desmitificar o tema, ao considerar a segurança jurídica não
somente como preceitua o art. 5.º, XXXVI, da CF/1988 (LGL\1988\3), mas ao tratar as
garantias individuais e os demais direitos fundamentais como fenômeno garantidor da
segurança jurídica. Ainda, discorre o presente artigo acerca do funcionamento da
segurança jurídica nas relações de direito público, a partir da conceituação e análise dos
princípios da estrita legalidade e da igualdade, bem como a polêmica envolvendo o art.
2.035, do CC/2002 (LGL\2002\400). Por derradeiro, dois casos concretos, decididos pelo
Supremo Tribunal Federal, ilustram a utilização - ou não - do princípio da segurança
jurídica.
Abstract: This study is intended to review the issue of security of legal relationships in
face of the significant economic, social and technological changes that have been taking-
up speed in the last fifty years. To that effect, the issue was analyzed from the
standpoint of the 1988 Constitution; nevertheless, in order to have a more accurate
picture of the perspective that lay ahead, a quick investigation on its historical
background, from Ancient times to the Contemporary Age had to be performed.
Accordingly, the author seeks to demystify the subject, by addressing legal security not
only within the boundaries of the provision of 5.º, XXXVI, of the Federal Constitution, but
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also dealing with individual warranties and other fundamental rights as social
phenomenon that assures legal security. This paper also addresses the mechanism of
legal security in public-law relationships based on the definition and review of the
doctrine of strict legality and equality, as well on the controversy that involves article
2.035 of the Civil Code. Moreover, two cases ruled by the Federal Supreme Court
illustrate application - or not - o the principle of legal security.
1. Introdução
Dessa forma, é necessário que os cidadãos saibam que, além de obrigações, possuem
certos direitos e que muitos desses direitos são - ou deveriam ser - de aplicabilidade
imediata, como é o caso dos direitos fundamentais.
Outrossim, revela-se particularmente importante o conhecimento das leis por parte dos
indivíduos de uma determinada sociedade, uma vez que a confiança ou não em um
ordenamento específico está condicionado ao seu conhecimento por parte dos membros
da sociedade. A esse conhecimento Pérez Luño caracterizou como a face subjetiva da
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1
segurança jurídica.
Un système de droit doit concilier dans l'élaboration de ses règles, des interest varies et
des impératifs divers: pour être bien acceptée et efficace, la loi doit présenter, entre
autres, une certaine sécurité, notamment par son accessibilité et as conférence et ne pás
surprendre excessivement les sujets de droit dans leur pratiques, leur prévisions et leurs
attente. 2
Contudo, data venia da melhor doutrina, nossa opinião é a de que são numerosos os
dispositivos constitucionais que evidenciam a presença marcante do princípio da
segurança jurídica na Constituição Federal (LGL\1988\3), constituindo o inciso
supracitado um dos muitos exemplos da presença da segurança jurídica na Carta
Política, conforme será oportunamente analisado. 4
"A segurança jurídica é, por excelência, um sobreprincípio. Não temos notícia de que
algum ordenamento a contenha como regra explícita. Efetiva-se pela atuação de
princípios, tais como o da legalidade, da anterioridade, da igualdade, da irretroatividade,
da universalidade e de outros mais." 5
Assim, para o bom desenvolvimento do tema, far-se-á uma análise histórica acerca do
princípio da segurança jurídica, com o intuito de revelar em que momento o mesmo
tornou-se um tema de grande importância.
Outrossim, buscar-se-á conceituar o tema, bem como analisar a sua relação com os
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Por derradeiro, revela-se necessária a análise da segurança jurídica sob a ótica do direito
privado, mas especificamente no âmbito das relações contratuais.
Outrossim, o termo segurança significa convicção, certeza. De fato, sentir-se seguro com
relação a algo presume certa confiança, estabilidade, é contar com algo certo, que
dificilmente será aniquilado. Assim, pode-se ter segurança quanto ao conhecimento de
determinada matéria, quanto ao domínio de uma língua, quanto ao acontecimento de
determinado evento, etc.
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Ainda, analise-se o fato de que a República Federativa do Brasil, além de ser um Estado
de Direito, constitui um Estado Democrático. Em outras palavras, um Estado onde o
povo, titular do poder soberano, elege seus representantes.
É sempre válido ressaltar ainda que, se das normas infraconstitucionais cobra-se a sua
constitucionalidade e dos demais comandos normativos cobra-se a sua legalidade, da
Constituição, pelo patamar e importância que ocupa, é cobrada a sua legitimidade, a sua
aceitação pela sociedade.
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"Se, feita uma opção legítima em face do direito posto, interpretado, revelado,
executado, cumprido e aplicado, pudesse, futuramente ser tida como ilícita, ou ser
desfeita, não mais haveria segurança, nem, conseqüentemente, liberdade, mas
dependência, sujeição, risco. O cidadão voltaria a ser súdito." 12
Sem pretender esgotar o tema, não poderia deixar de citar Celso Antônio Bandeira de
Mello, que brilhantemente conceituou a segurança jurídica:
"Essa 'segurança jurídica' coincide com uma das mais profundas aspirações do Homem:
a da segurança em si mesma, a da certeza possível em relação ao que o cerca, sendo
esta uma busca permanente do ser humano. É a insopitável necessidade de poder
assentar-se sobre algo reconhecido como estável, ou relativamente estável, o que
permite vislumbrar com alguma previsibilidade o futuro; é ela, pois, que enseja projetar
e iniciar, conseqüentemente - e não aleatoriamente, ao mero sabor do acaso -,
comportamentos cujos frutos são esperáveis a médio e longo prazo. Dita previsibilidade
é, portanto, o que condiciona a ação humana. Esta é a normalidade das coisas". 13
Conclui-se que a certeza de que há um conjunto de leis que tutelam os interesses dos
cidadãos, a segurança que a existência desse conjunto de leis gera nas pessoas, bem
como a noção de que a conveniência política do momento não seria capaz de derrubar
um ordenamento vigente, a isso devemos chamar de segurança jurídica.
Com efeito, a confiança que se tinha era baseada num poder maior e inexplicável física e
racionalmente, o poder divino. Assim, revela-se mais esclarecedor tratar não da idéia de
segurança, mas da idéia de "insegurança", predominante dos primórdios da civilização
até a época medieval.
"La Antiguedad y el Medievo fueram edades de básica inseguridad. Los hombres de estas
etapas están expuestos a innumerables y constantes riesgos, su vida se halla acechada
por mil lados. Si rebasa los confines de lo conocido le aguardan comarcas terribles: los
mares y parajes tenebrosos. Su vivier cotidiano se configura por la amenaza constante
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Del hambre, la peste, las plagas, la camada de lobos, las huestes de invasores y
bandidos, em suma, la incertidumbre devoradora." 15
Outrossim, durante a Idade Média, o domínio exercido pela Igreja influenciou muito as
relações humanas. Com efeito, a cultura teocêntrica pregava a justiça divina, que
acabou por justificar as atitudes mais arbitrárias, como o que ocorreu com o advento da
inquisição, onde milhões de pessoas foram mortas.
3.2 Renascimento
Segurança essa não obtida por meio de guerras, que eram tão custosas à sociedade
renascentista, mas baseada em certos compromissos, que ocorreram primeiramente
entre o rei e o povo (durante o absolutismo) e, posteriormente, entre as leis e o povo
(no período iniciado a partir das revoluções francesa e norte-americana).
Nesse sentido, pode-se afirmar que somente com o estopim da Revolução Francesa
princípios como a igualdade e da legalidade ganharam importância, uma vez que nessa
época o quadro de poder modificou-se e o período revolucionário representou a ascensão
ao poder de uma nova camada social, formada por comerciantes emergentes, que
possuíam dinheiro, mas não tinham influência política nem os privilégios da nobreza - a
burguesia.
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Neste período, por volta de fins do século XVII, surgem doutrinas como a de Kant e
Montesquieu. Pela teoria de separação de poderes de Montesquieu, o juiz deve ser o
"boca da lei", restringindo-se a aplicar o direito assim como consta da letra da lei.
Sem pretender esgotar o tema, Montesquieu, na célebre obra O espírito das leis afirma:
"Quanto mais aqueles que se opusessem mais vivamente ao poder executivo, não
podendo confessar os motivos interessados de sua oposição, aumentassem os terrores
do povo, que nunca saberia com certeza se está em perigo ou não. Mas isso mesmo
contribuiria para fazê-lo evitar os verdadeiros perigos aos quais poderia, em seguida,
estar exposto.
Mas, se o corpo legislativo tiver a confiança do povo e for mais esclarecido do que ele,
poderá fazê-lo perder as más impressões que tiver recebido e acalmar seus movimentos.
(...)
Como, para gozar da liberdade, é preciso que cada qual possa dizer o que pensa e, para
conservá-la, é também preciso que cada qual possa dizer o que pensa, um cidadão,
neste Estado, diria e escreveria tudo o que as leis não lhe proibissem expressamente
dizer ou escrever."
Destarte, as leis surgiriam com o intuito de não somente garantir direitos e deveres
como também para tutelar os aspectos essenciais da vida dos indivíduos. Verifica-se
nesse período que o Estado Liberal possuía uma atuação meramente garantidora.
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Estado Social de Direito, de cuja legislação mais marcante foram exemplos a constituição
de Weimar e a Constituição Mexicana.
Com efeito, foi na Idade Contemporânea que a questão da segurança no direito veio à
baila com toda a força. Os regimes totalitaristas como o fascismo e o nazismo
mostraram ao mundo que era perfeitamente possível a formação de sociedades
desiguais e racistas com respaldo não só legal, mas constitucional.
Para garantir essa proteção, essa segurança frente às mudanças, existem institutos
especificamente protegidos na Carta Magna (LGL\1988\3) de 1988, como é o caso do
art. 5.º, inciso XXXVI, onde "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico
perfeito e a coisa julgada", no intuito de que o direito se preserve frente às mudanças
cada vez mais profundas e rápidas da sociedade atual.
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Ainda, todas as espécies de garantias, conforme será analisado mais adiante, possuem o
intuito de proteger os indivíduos das arbitrariedades, seja do Estado, seja dos próprios
indivíduos entre si, revelando que a preocupação com a segurança jurídica tem assento
em todo o ordenamento jurídico.
Assim, dedicou-se na Carta Magna (LGL\1988\3) brasileira um título inteiro (Titulo II)
aos direitos e garantias fundamentais, dos quais dois capítulos - Capítulos I e II -
discorrem exclusivamente acerca dos direitos e deveres individuais e coletivos e dos
direitos sociais, respectivamente, e cujos destinatários são todos os indivíduos.
Isso porque a Constituição Federal de 1988 é pautada por um superprincípio, que baliza
todo o ordenamento e é fundamento do Estado Social e Democrático de Direito,
denominado princípio da dignidade da pessoa humana, consubstanciado em seu art. 1.º,
inciso III.
Com a clareza que lhe é peculiar, afirma Pietro de Jesús Lora Alarcón acerca do tema:
"O artigo 1.º, III, da CF/1988 (LGL\1988\3) assegurou a dignidade da pessoa humana
como fundamento do Estado Democrático de Direito. É um princípio que engloba todas
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as demais normas jurídicas e orienta as demais regras, razão pela qual todas as normas
infraconstitucionais que não se compatibilizem devem ser, conforme o caso, tidas como
não recepcionadas ou inconstitucionais (eis aqui, aliás, a função negativa dos princípios
jurídicos, no sentido de evitar o ingresso na ordem jurídica de normas-regras em
descompasso com os valores fundamentais consagrados pelo grupo social). Além do
mais, agasalha o respeito, a proteção física e emocional, à saúde, o direito à liberdade, à
individualização, à honra, e à igualdade. Assim, cada ser humano é, em virtude de sua
dignidade, merecedor de igual respeito e consideração, ainda que este mesmo ser
humano não se porte de forma honrosa, nobre, em relação com os seus semelhantes." 17
Com efeito, a partir do momento em que o Poder Constituinte Originário elenca todo um
rol de direitos e deveres que protegem não somente o cidadão, mas o ser humano como
um todo, ele está afirmando claramente aos indivíduos que os mesmos devem confiar no
sistema.
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Referida proteção reside no fato de que, no âmbito do direito público, além de todos os
princípios e garantias consubstanciados na Constituição Federal (LGL\1988\3), merecem
destaque dois princípios norteadores de todo o sistema: são eles o princípio da estrita
legalidade e o princípio da não-surpresa.
É dizer que as autoridades públicas só estão autorizadas a fazer o que a lei obrigar,
havendo verdadeiro controle sobre a legalidade dos atos emanados do poder público.
Referida situação é ainda mais patente nos chamados Estados de Direito, como o Estado
brasileiro, uma vez que não só os atos do poder público devem obedecer estritamente
aos ditames legais, mas a própria existência do Estado é conferida por meio de um
conjunto de leis superiores hierarquicamente - a Constituição Federal (LGL\1988\3).
"Nos países onde existe o chamado Estado de Direito, a lei - norma geral, abstrata e
igual para todos os que se encontram em situação jurídica equivalente - provém do
Legislativo, cujos membros são eleitos pelo povo. Por exprimir, como vimos, a vontade
geral, possui um primado sobre os atos normativos emanados dos demais Poderes.
Deveras, a administração pública, que a realiza nos casos concretos, apóia-se
exclusivamente na lei. O judiciário, de seu turno, é o garantidor máximo da legalidade.
Assim, a administração pública deve sempre atender ao princípio da legalidade, não lhe
cabendo realizar nada que esteja fora dos comandos legais. Referida exigência,
conquanto não impeça, por certo dificulta alguns favoritismos que sempre ocorreram,
sobretudo quando o princípio da legalidade não era aplicado.
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Desta maneira, pode-se afirmar que a lei é fonte de segurança jurídica, ao obrigar os
entes de direito público a agirem de acordo com seus preceitos, evitando
comportamentos arbitrários.
Por esse princípio, deve-se se tratar as pessoas da mesma forma, sem distinção de cor,
raça, sexo, condição financeira etc., evitando-se, desta forma, qualquer favoritismo em
proveito de uma pessoa ou uma classe, como ocorreu em toda a história da
humanidade.
Todavia, há que se levar em consideração que os indivíduos não são iguais, e que
alguns, sobretudo, possuem deficiências que devem ser tuteladas pela lei. Em outras
palavras, afirma-se que o Estado deve possuir leis especiais destinadas às pessoas
especiais.
Por este motivo, para garantir que o princípio da igualdade seja aplicado, remonta-se à
antiga, porém sempre atual, máxima Aristotélica, na qual se deve tratar de forma igual
os iguais e de forma desigual os desiguais, na exata medida de sua desigualdade.
Ademais, muitas outras garantias, das quais são exemplos a irretroatividade da lei
penal, os princípios da razoabilidade e da eficiência na esfera administrativa e o princípio
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Com efeito, sabe-se que o direito privado é pautado pelo princípio da autonomia da
vontade, que garante ao indivíduo a faculdade de agir conforme a sua vontade, em
relação a todos os atos que a lei não proibir.
De fato, não pode a lei nova modificar ou até mesmo extinguir um contrato, sob o
argumento de que o mesmo teria se tornado "ilegal". Referida hipótese revela-se
absurda do ponto de vista jurídico, uma vez que um contrato firmado sem vícios é ato
jurídico perfeito e os direitos e deveres nele contidos são direitos adquiridos.
"A teoria do ato jurídico perfeito e do direito adquirido teve especial desenvolvimento no
campo dos contratos, tendo em conta a importância da autonomia da vontade nesse
particular. Ao manifestarem o desejo de se vincular em um ajuste, as partes avaliam as
conseqüências dessa decisão, considerando as normas em vigor naquele momento. É
incompatível com a idéia de segurança jurídica admitir que a modificação posterior da
norma pudesse surpreender as partes para alterar aquilo que tinham antevisto no
momento da celebração do contrato.
(...)
"Em suma: as relações contratuais regem-se, durante toda a sua existência, pela lei
vigente quando de sua constituição. Isto é: a lei nova não pode afetar um contrato já
firmado, nem no que diz respeito à sua constituição válida, nem à sua eficácia. Os
efeitos provenientes do contrato, independentemente de se produzirem antes ou depois
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Assim, não importa se surgiu um comando normativo que tornou a relação contratual
eivada de quaisquer vícios. Pelo contrário: a relação contratual continua sendo
perfeitamente válida, uma vez que, na época da assinatura do contrato, a relação estava
em absoluta conformidade com o ordenamento jurídico, sendo tal situação preservada
mesmo com a incidência de lei contrária.
"Art. 2.035 - A validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da
entrada em vigor deste Código, obedece ao disposto nas leis anteriores, referidas no
artigo 2.045, mas os seus efeitos, produzidos após a vigência deste Código, aos
preceitos dele se subordinam, salvo se houver sido prevista pelas partes determinada
forma de execução.
Isso porque de nada adiantaria um negócio jurídico que, embora constituído na vigência
de uma determinada legislação, restasse subordinado em seus efeitos à legislação
futura.
Outra inconstitucionalidade patente pode ser verificada no parágrafo único do art. 2.035,
do CC/2002 (LGL\2002\400), onde se pode entender que a norma de ordem pública
seria capaz de modificar os efeitos de um negócio jurídico realizado antes dela.
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"O princípio constitucional do respeito a ato jurídico perfeito se aplica também, conforme
é o entendimento desta Corte, às leis de ordem pública. Correto, portanto, o acórdão
recorrido ao julgar que, no caso, ocorreu afronta ao ato jurídico perfeito, porquanto, com
relação á caderneta de poupança, há contrato de adesão entre o poupador e o
estabelecimento, não podendo, portanto, ser aplicada a ele, durante o período para a
aquisição da correção monetária mensal já iniciado, legislação que altere, para menor, o
índice dessa correção". (STF, AgIn 181.317-2, 1.ª T., rel. Min. Moreira Alves). 21
Conclui-se que os negócios jurídicos, como atos jurídicos perfeitos que são, devem ser
respeitados, não importando de que ordem seja a legislação posterior, sob pena de
desrespeito à garantia constitucional consubstanciada no art. 5.º, XXXVI, da
Constituição.
Foi o caso da EC 41, de 19.12.2003, que, em seu art. 4.º, instituiu a contribuição para o
custeio do regime de previdência para os servidores inativos e os pensionistas da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Eis o art. 4.º, da EC 41:
"Os servidores inativos e os pensionistas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, em gozo de benefícios na data de
publicação desta Emenda, bem como os alcançados pelo disposto no seu art. 3.º,
contribuirão para o custeio do regime de que trata o art. 40, da CF/1988 (LGL\1988\3)
com percentual igual ao estabelecido para os servidores titulares de cargos efetivos."
Por este motivo, os servidores ajuizaram a ADIn 3.218-DF, alegando ofensa ao direito
adquirido no ato da aposentaria.
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Conforme se pode observar, o STF entendeu pela não ocorrência de direito adquirido,
com o fundamento de que não havia norma expressa de imunidade tributária absoluta
aos contribuintes inativos, e preservou os princípios da solidariedade e do equilíbrio
financeiro e atuarial, tendo em vista a situação de extraordinário déficit sofrido pelo
Estado brasileiro, que todo ano acarreta prejuízo da ordem de bilhões de reais.
Em outro caso, o STF julgou inconstitucional as leis Municipais que não respeitavam a
exigência contida no art. 29, IV, da CF/1988 (LGL\1988\3), de que o número de
Vereadores seja proporcional à população dos Municípios, observados os limites mínimos
e máximos fixados pelas alíneas a, b e c.
De fato, ocorre a situação em que Municípios menos populosos têm mais Vereadores
proporcionalmente do que outros com um número de habitantes várias vezes maior, não
somente desrespeitando a Constituição como, com isso, gerando grande prejuízo ao
erário público todos os anos.
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Conclui-se que a questão da segurança jurídica deve ser analisada de forma específica,
dependendo do caso concreto, uma vez que há determinadas situações em que, embora
seja absoluta exceção, a mesma pode ser sopesada, tendo em vista algum valor maior
envolvido, no sentido já julgado pelo Supremo Tribunal Federal.
Uma análise de toda a matéria exposta no presente trabalho permite concluir que a
segurança no direito é necessidade intrínseca à vida dos indivíduos, que necessitam de
estabilidade em suas relações, para que possam se desenvolver.
De fato, a análise histórica do tema realizada no item III revelou que nunca a segurança
foi tão importante - e tão discutida - como nos dias atuais, uma vez que as guerras,
aliadas às mudanças cada vez mais rápidas e mais profundas ocorridas sobretudo nos
últimos cinqüenta anos acarretaram na necessidade de se garantir aos indivíduos a
mantença de certos direitos em períodos de transição.
9. Referências bibliográficas
AFONSO DA SILVA, José. Aplicabilidade das normas constitucionais. 3. ed. São Paulo:
Malheiros, 1998.
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ARAÚJO, Luiz Alberto. NUNES JUNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 7.
ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 13. ed. São Paulo:
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NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Manual da monografia jurídica. São Paulo: Saraiva, 1997.
PÉREZ LUÑO, Antonio Enrique. La seguridad jurídica. Barcelona: Editorial Ariel, 1991.
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segurança jurídica: direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada. Estudos em
homenagem a José Paulo Sepúlveda Pertence. Belo Horizonte: Fórum, 2004.
RODRIGUES, Ney Lobato. Vida, morte e dignidade do ser humano. In: ARAÚJO, Luís
Alberto David , SEGALLA, José Roberto Martins (Coords.). 15 anos da Constituição
Federal (LGL\1988\3) em busca da efetividade. Bauru: Edite, 2003.
1 Afirma Pérez Luño: "(...) En la segunda, que representa su face subjetiva, se presenta
como certeza del Derecho, es decir, como proyección en las situaciones personales de la
seguridad objetiva. Para ello, se requiere la possibilidad del conocimiento del Derecho
por sus destinatários. Gracias a esa información, realizada por los adecuados medios de
publicidad, el sujeto de um ordenamento jurídico debe poder saber com claridad y de
antemano aquello que le está mandado, permitido o prohibido. Em función de esse
conocimiento los destinatários del Derecho pueden organizar su conducta presente y
programar expectativas para su actuación jurídica futura bajo pautas razonables de
previsibilidad". La seguridad jurídica, p. 22. Tradução: (...) na segunda, que representa
sua face subjetiva, se apresenta como certeza do Direito, é dizer, como projeção nas
situações pessoais da segurança objetiva. Para ele, se requer a possibilidade do
conhecimento do Direito por seus destinatários. Graças a essa informação, realizada
pelos adequados meios de publicidade, o sujeito de um ordenamento jurídico deve poder
saber com claridade e de antemão aquele que o está mandado, permitido ou proibido.
Em função desse conhecimento os destinatários do Direito podem organizar sua conduta
presente e programar expectativas para sua atuação jurídica futura baixo pautas
razoáveis de previsibilidade".
2 Tradução: Um sistema de direito deve conciliar, na elaboração de suas regras,
interesses variados e imperativos diversos: para ser bem aceito e eficaz, a lei deve
apresentar, entre outros, uma certa segurança, notadamente por sua acessibilidade e
sua coerência e não surpreender excessivamente os sujeitos de direitos em suas
práticas, previsões e seus anseios.
3 No preâmbulo da Lei Fundamental, o Poder Constituinte considerou a segurança como
um valor supremo da sociedade, ao lado de outros direitos, tais como a liberdade, o bem
estar e o desenvolvimento, entre outros.
4 Vide item 5 do presente trabalho.
5 Revista da Associação dos Pós-Graduandos da PUC-SP, p. 130.
6 Novo dicionário da língua portuguesa.
7 Revista do Advogado, n. 73, estudos de direito constitucional em homenagem a Celso
Ribeiro Bastos, p. 113.
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1988, p. 454.
17 Vida, morte e dignidade do ser humano, pp. 417-418.
18 Segurança jurídica e direitos humanos: o direito à segurança de direitos, p. 48.
19 Curso de direito constitucional tributário, pp. 224-225.
20 Constituição e segurança jurídica: direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa
julgada, p. 157.
21 MORAES, Alexandre. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional, p.
302.
22 Nesse mesmo sentido, o caso em que a Infraero havia contratado servidores sem
concurso público, de acordo com o seu regimento interno que, na época, que não previa
tal exigência, e contrariando assim o disposto no art. 37, II, da CF/1988 (LGL\1988\3),
que obriga a realização do referido concurso. Tendo em vista o longo período de tempo
transcorrido, e com base no princípio da confiança, o STF houve por bem manter as
contratações. Veja-se ementa: "Mandado de Segurança. 2. Acórdão do Tribunal de
Contas da União. Prestação de Contas da Empresa Brasileira de Infra-estrutura
Aeroportuária - Infraero. Emprego Público. Regularização de admissões. 3. Contratações
realizadas em conformidade com a legislação vigente à época. Admissões realizadas por
processo seletivo sem concurso público, validadas por decisão administrativa e acórdão
anterior do TCU. 4. Transcurso de mais de dez anos desde a concessão da liminar no
mandado de segurança. 5. Obrigatoriedade da observância do princípio da segurança
jurídica enquanto subprincípio do Estado de Direito. Necessidade de estabilidade das
situações criadas administrativamente. 6. Princípio da confiança como elemento do
princípio da segurança jurídica. Presença de um componente de ética jurídica e sua
aplicação nas relações jurídicas de direito público. 7. Concurso de circunstâncias
específicas e excepcionais que revelam: a boa fé dos impetrantes; a realização de
processo seletivo rigoroso; a observância do regulamento da Infraero, vigente à época
da realização do processo seletivo; a existência de controvérsia, à época das
contratações, quanto à exigência, nos termos do art. 37 da Constituição, de concurso
público no âmbito das empresas públicas e sociedades de economia mista. 8.
Circunstâncias que, aliadas ao longo período de tempo transcorrido, afastam a alegada
nulidade das contratações dos impetrantes. 9. Mandado de Segurança deferido". (MS
22.357-DF, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 27.05.2004, DJ 05.11.2004).
23 O STF já cassou o mandato de Prefeito e absolveu o Vice-Prefeito de um Município.
Por captação ilegal de sufrágio, sendo a cassação do mandato ocorrida em seu segundo
ano. Ver AC 112-RN, rel. Min. César Peluso, j. 01.12.2004, DJ 04.02.2005.
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