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gloBalizadoS
de produção
de alimentoS,
deSigualdade
eStrutural e
Covid-19 309
311. wu, J. et al. “74,000 Missing Deaths: Tracking the True Toll of the Coro-
navirus Outbreak”, New York Times, 19 mai. 2020. Disponível em: https://
www.nytimes.com/interactive/2020/04/21/world/coronavirus-missing-
-deaths.html.
312. “Vietnamese Children Donate 20,000 Face Masks to uk After Saving
Up ‘Lucky Money’”, The Independent, 24 abr. 2020. Disponível em: https://
www.independent.co.uk/news/uk/home-news/vietnamese-children-dona-
te-face-masks-uk-coronavirus-ppe-shortage-a9483276.html.
313. “Cuba Has Sent 2,000 Doctors and Nurses Overseas to Fight Covid-19”,
The Nation, 22 mai. 2020. Disponível em: https://www.thenation.com/article/
world/cuba-doctors-covid-19/.
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Unidos esses resultados, quando os testes estão disponíveis,
podem levar até dez dias.314
Esses indicadores aparecem durante o que os teóricos dos
sistemas mundiais descrevem como uma grande mudança nos
ciclos predominantes da acumulação do capital, que, em grande
parte, têm estruturado a ordem mundial nos últimos quinhen-
tos anos (Arrighi, 2010 [1994]). A pandemia atua, portanto,
como um marcador dessa inversão, ao mesmo tempo que se faz
presente de maneira abruptamente chocante.
Os Estados Unidos, no final de seu ciclo de acumulação,
transformando capital em dinheiro para os mais ricos — ou
seja, saqueando a população —, já não investem (com a exceção
do orçamento militar) na infraestrutura do império global. Nesse
sentido, o poder estadunidense, até a emergência deste surto,
encontrava-se em apuros para conseguir limpar as pandemias
promovidas pelo capital mundial.315
Os Estados Unidos se encarregaram de manter o sistema
global no mesmo caminho de desenvolvimento, apesar da
destruição completamente insustentável (e hedionda) da Terra
e dos povos imposta por esse caminho. Logo, a interrupção do
financiamento da Organização Mundial da Saúde anunciada
pelos Estados Unidos não se trata de um exercício de poder impe-
rial.316 É uma bandeira branca, uma capitulação.
317. “How Many People Have Actually Died from Coronavirus in New
York?”, New York Times, 10 abr. 2020. Disponível em: https://www.nytimes.
com/2020/04/10/nyregion/new-york-coronavirus-death-count.html.
318. “Covid-19’s Deadly New Surge is in Rural America as States Re-Open”,
Washington Post, 24 mai. 2020. Disponível em: https://www.washingtonpost.
com/nation/2020/05/24/coronavirus-rural-america-outbreaks/?arc404=true
319. “Louisa County Covid-19 Rate Now Worse than New York State”, Iowa Start-
ing Line, 13 abr. 2020. Disponível em: https://iowastartingline.com/2020/04/13/
louisa-county-covid-19-rate-now-worse-than-new-york-state/.
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A China, por outro lado, está na dianteira do seu ciclo de
acumulação (Arrighi, 2007). Investiu na construção da infraes-
trutura — e isso inclui a saúde pública universal — necessária
para transformar dinheiro em capital (e poder imperial). Essa
transição (dos Estados Unidos para a China) não justifica os
problemas de saúde pública da China nem a absolve deles —
como a produção das condições para o surgimento da covid-19,
conforme veremos adiante (Gulick, 2011). Mas devemos obser-
var que o estímulo estrutural na China é diferente. Em um
primeiro momento, o país foi capaz de erradicar a covid-19
de Hubei, província de origem, com o envio de quarenta mil
profissionais de saúde de outras províncias, testagens abran-
gentes e rastreamento de contatos.320 Além disso, a China doou
milhões de dólares aos seus parceiros comerciais na África para
o combate à covid-19.321
329. “South Korea Tops China for First Time”, South China Morning Post, 27
fev. 2020. Disponível em: https://www.scmp.com/news/china/society/arti-
cle/3052577/coronavirus-south-korea-infections-could-exceed-china-which.
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formalizado, e a produção industrial de animais em direção ao
interior do país, onde ambos os setores encontraram reserva-
tórios de morcegos (Field, 2009; Afelt, Frutos e Devaux., 2018;
Wallace et al., 2020; Wallace, R. G., 2020).330 Círculos periur-
banos de extensão e densidade populacional crescentes podem
aumentar a interface (e o transbordamento) entre populações
de animais selvagens e humanos das áreas rurais recentemente
urbanizadas. Essas novas geografias também reduzem o tipo de
complexidade ambiental com a qual as florestas podem interrom-
per a transmissão de vírus mortais — aquele papel que gostaría-
mos de ver as florestas desempenhando (Wallace, R. et al., 2018).
Esse circuito regional de produção — das florestas periurba-
nas para as cidades, provável origem da covid-19 — se reproduz
no mundo inteiro (Wallace, R. et al., 2020). Tal quadro nos dá
uma estrutura mais ampla para analisar surtos em quase todos
os lugares, não apenas na China. Sars-CoV-1 e Sars-CoV-2, ebola,
zika, febre amarela, peste suína africana, gripes aviária e suína,
vírus Nipah, febre Q, entre outros, assim como historicamente
o hiv, todos se originaram ou reemergiram em algum lugar
ao longo desses circuitos de produção em expansão. Seja na
floresta, seja ao redor do novo contínuo periurbano, seja em
fazendas industriais, seja em fábricas de processamento próxi-
mas das cidades ou dentro delas. Muitas dessas novas ecologias
são produtos da imposição imperialista ou neoliberal (Wallace,
R. G. & Wallace, R. 2016). Claramente, doenças infecciosas não
dizem respeito apenas ao próprio vírus, mas também ao contexto
do qual emergem (Wallace, R. G. 2016).
Olhando para o futuro, descobrimos que os coronavírus são
apenas alguns dos muitos patógenos que se desenvolveram em
tal contexto agroeconômico. O que sofremos hoje já está em
25 mai. 2020
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