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PUC MINAS VIRTUAL

PÓS-GRADUAÇÃO
DISCIPLINA: DIREITO CONSTITUCIONAL
SÍNTESE DA UNIDADE I
Autora: Profa. Dra. Luciana Costa

I- A compreensão de Constituição na modernidade

A modernidade, especialmente a partir da instituição do Estado de Direito, estruturou


uma forma de constituição até então não conhecida no ocidente. Tais constituições ditas
“modernas” apresentavam-se, como regra, na forma escrita, apresentando conteúdos afetos à
garantia da autonomia privada e a limitação do poder político dos Estados.

Nesse sentido, passamos a ter uma organização do sistema político por regras jurídicas,
o que pretensamente levaria à proteção do indivíduo, agora visto como um cidadão (e não mais
um súdito, submetido apenas à vontade do governante), em face do governante. É nesse
contexto que alguns constitucionalistas ressaltarão a importância de desvincularmos tal
conceito de constituição com a existência de outras formas de constituição que surgiram ao
longo do tempo.

Nesse sentido, podemos observar que na Antiguidade e na Idade Média já existiam


regras, escritas ou costumeiras, que buscavam ordenar a sociedade. Nesse contexto, Maurizio
Fioravanti (2001) vai abordar questões afetas à um constitucionalismo antigo, sobretudo em
Roma e na Grécia. Nessa direção, cita-se o conceito de constituição mista e a forma de organizar
as funções de deliberação legislativa e execução existentes na obra de Aristóteles; da mesma
forma, é possível apresentarmos reflexões sobre a Magna Carta, documento inglês de 1215, que
também traçou direitos afetos à nobreza. Entretanto, embora todos esses documentos
buscassem instituir regras de organização político-social, nenhum deles apresentava o design
constitucional que passou a ser conhecido a partir do constitucionalismo moderno: a existência
de constituições jurídicas que, através de fundamentos jurídico-políticos, conseguiam regrar
o poder político e assegurar direitos fundamentais.

Portanto, só devemos chamar de constituições modernas aqueles que conseguem


apresentar tal estruturação. Lembramos que os fundamentos jurídico-políticos que permitiram
tal feito foram, geralmente, traduzidos na positivação do princípio da separação de poderes, na
declaração dos direitos de primeira geração e na observância do princípio da legalidade. No
vídeo em que apresentamos os diversos critérios sobre a classificação da Constituição, é possível
vocês associarem tal conceito com a compreensão das constituições sintéticas.

Ao longo da evolução do constitucionalismo, observa-se que essa compreensão foi


alterada. Nesse sentido, a ideologia do constitucionalismo social levou à estruturação de
constituições detalhistas, que claramente apregoavam técnicas de intervenção jurídica e estatal
no domínio econômico e social. É nesse contexto que observaremos uma expansão dos
domínios jurídicos sobre outros sistemas sociais, antes auto-regulados e auto-regulamentados.
É visível que as Constituições-modelo, representativas deste contexto, modificam a sua
estrutura: de constituições sintéticas passamos a ter constituições que apresentam mais de 400
artigos, denotando uma maior expansão do direito constitucional sobre os diversos domínios da
política, da economia e do sistema social em geral.
No constitucionalismo democrático, observaremos que as constituições também sofrem
alterações, tornando-se abertas tanto em relação ao sentido (existência de princípios) ,quanto
em função dos seus intérpretes. Para os amantes do direito constitucional, sugiro a leitura de
Peter Haberle, Hermenêutica Constitucional, obra em que vai discutir a compreensão da
abertura aplicada aos intérpretes da Constituição. Há alguns teóricos contemporâneos que
enxergam, nos institutos do amicus curiae e nas audiências públicas realizadas pelo STF, uma
forma de concretização da denominada constituição aberta sob este ângulo.

Assim, à luz de uma teoria clássica do Estado e da Constituição, é possível afirmar que a
compreensão ampla de Constituição, como elemento que organiza o político e o social, já existia
no âmbito da Antiguidade. Porém, falar em constituição a partir da modernidade implica,
necessariamente, observarmos uma estruturação que só é possível a partir da assunção do
Estado de Direito, após os movimentos liberais do século XVIII. Dessa forma, constituições
modernas estão associadas a um instrumento político-jurídico de organização do subsistema
social e do subsistema político, permitindo, inicialmente, uma disciplina do poder político pelo
direito e a proteção da autonomia privada através da positivação dos direitos fundamentais. Tal
estruturação, conforme já observamos, sofrerá os impactos da alteração da ideologia oriunda
do Estado de Bem-Estar Social e do constitucionalismo democrático.

Ressaltam-se, entretanto, algumas reflexões críticas que são necessárias à luz dos
fundamentos lançados pela respectiva teoria clássica da constituição: a) É possível falarmos em
um conceito estático de constituição, de uma pretensa forma hegemônica de se caracterizar as
constituições, muitas vezes sem distinção do constitucionalismo europeu e latino-americano,
ignorando a historicidade ínsita à sua existência? Em caso negativo, quais são os limites impostos
aos ensinamentos oriundos de uma teoria da constituição com claro predomínio do pensamento
europeu? b) Paradoxamelmente à primeira reflexão é possível atrelarmos o conceito de
constituição aos limites espaciais rígidos do território de um determinado Estado? Se é verdade
que a Constituição materializa a soberania de um Estado, como justificar as reais trocas entre
sistemas constitucionais de diferentes níveis (transconstitucionalismo e a busca de uma razão
transversal)?

Observa-se, portanto, que existem claros limites postos ao constitucionalismo


contemporâneo a partir dos fundamentos de uma teoria da constituição tradicional. Não há, na
perspectiva semântica, como definir, de forma uníssona, a compreensão da “Constituição”. Não
há uma constituição, mas uma pluralidade de significações que revelam as conquistas e os
desafios de um determinado tempo histórico. Não há como negar a existência de diversidades
que precisam ser reconhecidas e garantidas; da mesma forma, é necessário refletirmos sobre o
diálogo constitucional que, objetivamente, transcende as fronteiras territoriais dos Estados.

Sugiro, neste momento, que você assista ao primeiro vídeo da Unidade. Sobre a
questão do transconstitucionalismo, há uma entrevista interessante do professor Marcelo
Neves, publicada no site conjur, cujo link é: http://www.conjur.com.br/2009-jul-12/fimde-
entrevista-marcelo-neves-professor-conselheiro-cnj (Links para um site externo)
II- Classificação das normas constitucionais:

Há diversos critérios tradicionais para a classificação das normas constitucionais.

No âmbito da doutrina norte-americana, trazida ao Brasil pelo jurista Rui Barbosa, as


normas constitucionais classificavam-se em dois grandes grupos: normas executáveis e normas
não auto-executáveis. As primeiras teriam todo o seu conteúdo determinado pelo enunciado
constitucional, prescindindo da atuação do legislador; já as normas não auto-executáveis
instituíram princípios que precisariam de ser desenvolvidos, ulteriormente, pelo legislador.
Nessa direção, cita-se brilhante passagem de Sarlet (2016):
Importa ressaltar, neste contexto, que Ruy Barbosa, entusiasta do modelo
norte-americano, inspirou-se, preponderantemente nas obras dos grandes
clássicos do direito constitucional estadunidense, bem como nas decisões da
Suprema Corte e outros importantes tribunais daquele país, acolhendo a
distinção entre normas autoaplicáveis (ou autoexecutáveis) e normas não
autoaplicáveis (ou não autoexecutáveis), denominadas pela doutrina
americana, respectivamente, de normas self-executing, ou self-enforcing, por
um lado, e normas not self-executing, not self-acting, ou not self-enforcing
por outro. No que diz com o primeiro grupo, o das normas autoaplicáveis (ou
autoexecutáveis), Ruy Barbosa firmou posição no sentido de que normas
autoaplicáveis seriam aquelas que estariam aptas a gerar seus efeitos
independentemente de qualquer atuação do legislador, já que seu
conteúdo se encontra devidamente determinado. Nas palavras do próprio
Ruy, baseado em lição de George Tucker, executáveis por sim mesmas “são,
portanto, as determinações para executar as quaes, não se haja mister de
constituir ou designar uma autoridade, nem criar ou indicar um processo
especial, e aquellas onde o direito instituído se ache armado, por si mesmo,
pela sua própria natureza, dos meios de execução e preservação.” Em outra
passagem, citando posição da Suprema Corte norte-americana, Ruy Barbosa
sustenta que “uma disposição constitucional é executável por si mesma,
quando, completa no que determina, lhe é supérfluo o auxílio suppletivo da
lei, para exprimir tudo o que intenta e realizar tudo o que exprime”. Já no que
concerne as normas não autoaplicáveis (ou não autoexecutáveis), Ruy
Barbosa, aqui também, valendo-se das lições do mesmo George Tucker,
salienta que muitas normas constitucionais requerem uma ação do
legislador para tornar efetivo os seus preceitos, visto que “não revestem
dos meios de acção essenciaes ao seu exercício os direitos, que outorgam,
ou os encargos que impõem: estabelecem competências, atribuições,
poderes, cujo uso tem de aguardar que a Legislatura, segundo o seu critério,
os habilite a se exercerem.” Com base nessas distinções, Ruy Barbosa conclui
citando passagem extraída da obra de Thomas Cooley, para quem “pode-se
dizer que uma disposição constitucional é autoexecutável (self-executing)
quando nos fornece uma regra, mediante a qual se possa fruir e resguardar o
direito outorgado, ou executar o dever imposto, e que não é autoaplicável,
quando meramente indica princípios, sem estabelecer normas, por cujo meio
se logre dar a esses princípios vigor de lei. (MARINOINI, MITIDIERO, SARLET.
Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2016. P. 171-172. Grifo
nosso).
Já sob a égide da Constituição de 1934, Pontes de Miranda buscará aperfeiçoar a
classificação acima destacada, apresentando dois tipos de normas constitucionais: a)normas
bastantes em si mesmas, que não dependem da concretização legislativa para alcançarem sua
plena eficácia; b) normas não bastante em si mesmas, incompletas, que reclamariam atuação
do legislador infraconstitucional.
Tais classificações tendem, a partir da década de 60 do século passado, a serem
substituídas pela proposição de José Afonso da Silva, publicada na obra “Aplicabilidade das
normas constitucionais”. O livro, com clara influência da doutrina de Crisafulli, apresentará três
tipos de normas constitucionais: a) as normas de eficácia plena, que apresentariam
aplicabilidade direta, imediata e integral, não dependendo da atuação do legislador para
alcançarem plena operatividade; b) as normas de eficácia contida, dotadas de aplicabilidade
direta e não integral, permitindo uma atuação futura do legislador que poderia restringir os seus
efeitos; c) normas de eficácia limitada, distribuídas em dois subgrupos (normas de princípio
institutivo e programáticas), as quais teriam aplicabilidade mediata e não integral, pois não
teriam recebido do Constituinte a normatividade suficiente para, por si, produzir todos os
efeitos esperados. Sobre essa classificação, recomenda-se a leitura do texto “ Classificação das
Normas Constitucionais”, presente no link
https://arquivos.integrawebsites.com.br/66582/bc2c06fb00ef651400fb18045b1797b3.p
df
Outra classificação bastante conhecida é apresentada por Luís Roberto Barroso, no livro
“O direito constitucional e a efetividade das suas normas”. Para o autor, as normas
constitucionais poderiam ser classificadas em três grupos, segundo o critério da sua função
constitucional e da posição dos indivíduos: a) Normas constitucionais de organização, também
denominadas de estrutura ou de competência, as quais visam disciplinar o poder político no
âmbito de uma sociedade, seja prescrevendo regras de processo ou procedimento; veiculando
decisões políticas fundamentais e regras de competência; criando órgãos públicos; b) Normas
constitucionais definidoras de direitos fundamentais, as quais podem exigir do Estado uma
abstenção, uma prestação positiva ou uma atuação integradora, via atividade legislativa; c)
Normas constitucionais programáticas.

No direito constitucional contemporâneo, a classificação mais relevante é aquela que


aparta as normas constitucionais em regras e princípios. Sugiro que você assista a uma
importante palestra, proferida por Alexy, recentemente, no Brasil. A palestra está disponível no
link I Seminário Internacional Robert Alexy - Fundamental Rights- Parte1. Discutiremos tal
distinção no tópico 4.

Ao final deste tópico, gostaria de propor alguns apontamentos para reflexão: a) Quais
são os pontos críticos da classificação apresentada por José Afonso da Silva? Será que os direitos
fundamentais, ainda que os de primeira geração, considerados normas de eficácia plena não
podem, na atualidade, sofrerem restrições? Seriam direitos fundamentais absolutos?
b) Como o constitucionalismo social e o constitucionalismo brasileiro pós-88 compreendem
as normas de natureza programática? c) O que distingue as regras dos princípios na
atualidade?

Assista ao vídeo 2 da presente unidade, bem como leia os textos acima recomendados.
III- Constituição e Tempo

Quando abordamos a aplicação do tempo no direito constitucional, torna-se relevante


apreendermos a compreensão de três institutos: a) recepção constitucional; b)
desconstitucionalização; c) aplicação da tese do direito adquirido à luz do exercício do Poder
Constituinte Originário. Sobre tais conteúdos, gostaria de sugerir que você lesse as páginas 67-
71 do Curso de Direito Constitucional do Prof. Gilmar Mendes. A obra, em formato online, está
disponível no site da biblioteca da PUC Minas. Além disso, sugiro que você também assista ao
vídeo 3 da presente Unidade.

A recepção constitucional é o instituto jurídico destinado a regular, no âmbito do direito


constitucional intertemporal, as relações entre o ordenamento infraconstitucional anterior e a
nova Constituição. Nesse sentido, como instrumento de preservação da segurança jurídica,
considera-se possível a continuidade da ordem infraconstitucional anterior após a promulgação
de uma nova Constituição, desde que aquela não colida, em conteúdo, com o novo texto
constitucional. Observa-se que tal fenômeno pode ocorrer por mandamento expresso ou de
forma tácita. Destaque-se que, ao dar continuidade ao ordenamento infraconstitucional
anterior, a nova Constituição acaba por lhe atribuir novo fundamento de validade. A recepção
opera, apenas, com o sentido material, já que o aspecto formal da norma recepcionada será
informado pela nova constituição. Assim, as normas que, materialmente, violam o novo texto,
são revogadas. Há uma ressalva relevante feita por Sarlet no trecho abaixo:
Pressuposto de manutenção em vigor e da geração de efeitos das normas
infraconstitucionais anteriores é a sua compatibilidade com a nova
constituição, o que significa a existência de vício anterior, ou seja, eventual
inconformidade em sentido material e formal com a constituição anterior,
não é relevante para a recepção, pela nova ordem constitucional, do direito
anterior, mas apenas a conformidade com a nova constituição. Com efeito,
o controle de constitucionalidade se verifica apenas e sempre em relação aos
parâmetros materiais e formais postos pela constituição em vigor, de tal sorte
que o que importa, ao fim e ao cabo, é que a norma anterior guarde sintonia
com a constituição vigente, não com a revogada. (SARLET: 2016, 199)

E continua:
...irretocável a lição de Jorge Miranda, para quem tal fenômeno, mais do que
uma mera recepção, representa uma novação do direito ordinário anterior,
visto que as normas infraconstitucionais recebidas sob a égide da nova
constituição sujeitam-se aos princípios materiais da ordem constitucional
superveniente. (SARLET: 2016, 199)

Outro ponto importante do direito constitucional no tempo é a denominada


desconstitucionalização. Sob a égide deste instituto, as normas constitucionais pretéritas que
não colidissem com a nova constituição poderiam ser recepcionadas, perdendo, no entanto, o
status constitucional que até então detinham. Destaque-se que, na doutrina jurídico-
constitucional brasileira atual, a tese da desconstitucionalização, em sua maioria, não é aceita.
Assim, a nova constituição revoga, salvo disposição contrária e expressa, a constituição anterior
em bloco. Por fim, deve-se destacar que não há direito adquirido que possa ser alegado contra
o exercício do Poder Constituinte Originário. No Brasil, entretanto, adota-se a tese da eficácia
mínima, instituindo-se as mudanças para o momento ulterior à promulgação do novo texto
constitucional.
Finalmente, devemos recordar que o STF não admite a oposição da tese de direitos
adquiridos contra o exercício do Poder Constituinte Originário. Assim, direitos adquiridos estão
protegidos contra a atuação do legislador e não do Poder Constituinte Originário quando da
promulgação de uma nova Constituição. Em síntese, o novo texto constitucional pode gerar
rupturas em face de direitos adquiridos; nesse caso, a mudança aplica-se dali em diante e não
retroage, pois compreende-se que o direito brasileiro adota, em regra, a teoria da retroatividade
mínima das normas constitucionais, atingindo apenas os fatos ocorridos após a sua
promulgação.
IV- Classificação da Constituição

A literatura jurídico-constitucional apresenta, sob diversos critérios, e considerando a


dimensão histórico-cultural as formas de classificação da Constituição.

Ressalta-se a necessidade de uma análise crítica destes critérios, já que algumas


classificações não conseguem explicar a compreensão da constituição na atualidade. Passemos
a analisar os critérios mais conhecidos. Sugerimos a leitura do Curso de Direito Constitucional,
em formato e-book, do Prof. Dr. Gilmar Mendes, Disponível na biblioteca da PUC Minas, das
páginas 60-64. Sugerimos, ainda, que você assista ao vídeo 3 desta Unidade.

1- Quanto ao conteúdo:
A- Constituições Materiais- Tal critério trabalha com uma premissa: a existência
de um conteúdo específico para os textos constitucionais, geralmente identificado
com as normas de da organização do estado e disciplina dos direitos
fundamentais. Essas normas podem estar ou não escritas em um documento
político. Todas as demais normas que não apresentassem o respectivo conteúdo,
ainda que presentes em um texto codificado, seriam normas constitucionais
somente pelo aspecto formal. Por essa classificação chegaríamos a três tipos de
espécies constitucionais:a) normas formal e materialmente constitucionais; b)
normas apenas formalmente constitucionais; c) normas materialmente
constitucionais. Destaque-se que a compreensão de constituição, nesse sentido,
nos leva a compreensão das constituições em rede ou do chamado bloco de
constitucionalidade, ou seja, a percepção de uma Constituição composta de
diversas normas, cuja identidade é apresentada pelo conteúdo. O que torna
complexo e criticável tal classificação é observar um conteúdo invariável de
Constituição, passível de ser aplicado em qualquer tempo ou espaço.
B- Constituições Formais- Seria o peculiar modo de existir de um Estado
previsto sob a forma de documento (escrito), solenemente estabelecido pelo
Poder Competente. Aqui não importa o conteúdo. Dessa forma, todas as normas
inseridas, expressamente ou implicitamente, na CRFB/88 são consideradas
normas constitucionais. No mesmo sentido, conteúdos não previstos na CRFB/88
não são considerados constitucionais. Destaque-se que os tratados internacionais
aprovados em conformidade com o artigo 5º, §3º, são EQUIPARADOS às normas
constitucionais; os demais, ainda que tenham conteúdos constitucionais, não
seriam considerados NORMAS CONSTITUCIONAIS, pois não fazem parte do texto
formal da Constituição.

2- Quanto à forma:
A-Constituições Escritas- Seria a Constituição elaborada por um Poder
Competente que, de uma única vez, promulga um documento que disciplina a
organização do Estado, dos poderes constituídos, estabelece a forma de exercício
destes, os seus limites, bem como disciplinam direitos fundamentais. Canotilho,
lembrando o seu efeito estabilizador, as descreve como constituições
instrumentais. Essa Constituição nasce tanto de lutas políticas inglesas, quanto da
doutrina do contrato social de ROSSEAU, que acreditava ser mais relevante
concretizar em um pacto as normas de convivência entre governantes e
governados. Essas constituições ganham relevo face às constituições costumeiras
em face à crença na superioridade do direito escrito, ao menos sob a égide do
positivismo jurídico (considerado fonte mais racional do que o costume, gerador
de arbitrariedades) e, especialmente, face ao modelo de cidadania que ela poderia
promover em termos de educação. As constituições escritas apresentam-se da
forma codificada ou não. As constituições codificadas apresentam-se, geralmente,
através de um preâmbulo, parte introdutória (Opções políticas e princípios
fundamentais do Estado), parte orgânica (organização dos poderes constituídos e
regras de competência), parte dogmática, disposições gerais e transitórias.
B-Não escrita- A Constituição não é representada por um documento único, mas
baseia-se em costumes, na jurisprudência, em textos esparsos. Esse seria o
exemplo da Constituição inglesa.

3- Quanto ao modo de elaboração:


A- Constituições dogmáticas- Esse conceito é sempre conexo com o de Constituição
Escrita. Assim, constituição dogmática seria aquela elaborada por um único órgão que
sistematiza os princípios dominantes na teoria política e jurídica, em um determinado
momento, condensando-os em um documento escrito.
B- Constituições históricas- Esse conceito é conexo com o de Constituição não
escrita. Trata-se de constituições que decorrem de um lento processo histórico,
formada pelo processo de conservação e alteração promovido pelas tradições.
Tais processos geram a cristalização das normas de organização política do
Estado. O exemplo seria a Constituição Inglesa.

4- Quanto à origem:

A- Populares (democráticas)- Constituições criadas com a participação dos


representantes do povo, eleitos para estabelecer uma Constituição. São Constituições
que traduzem o princípio político de que todo governo deve apoiar-se no
consentimento dos governados e traduzir a vontade soberana do povo.A Constituição
aparece como um documento aprovado por um órgão representante do povo- a
Assembléia Constituinte. Os canais de participação podem ser diversos: Plebiscitos,
referendos, emenda apresentadas pela sociedade, audiências com a coletividade, etc.
B- Outorgadas- Criadas pelo governante (monarca, imperador, Junta Governativa,
ditador) ou por interposta pessoa que, através de um ato, impõe a coletividade um
documento de organização da sociedade. Questão interessante é que as primeiras
Constituições outorgadas já são demonstrações de uma limitação estatal, já que o
monarca resolve, unilateralmente, consentir em respeitar um documento que ele
mesmo institui. Assim, ela seria fruto de duas vontades antagônicas: princípio
monárquico do absolutismo e o princípio democrático do consentimento.
C- Pactuadas- refletem o equilíbrio instável entre a vontade do soberano e de uma
determinada classe. Historicamente, tais constituições representaram o jogo de forças
entre a realeza decadente e a nobreza ou a burguesia em franco progresso. Certas
classes reclamam ao rei a participação no poder em nome da coletividade. A
precariedade decorre do fato de uma das partes sempre estar em posição de força. 5-

5- Quanto à estabilidade:
A- Rígidas- Constituições que apresentariam um procedimento mais solene para
serem alteradas; além disso, possuem um núcleo rígido representado pelas
cláusulas pétreas. A Constituição Brasileira de 1988 é rígida.
B- Flexíveis- A alterabilidade das constituições é feita da mesma forma que a legislação
infraconstitucional.
C- Semi-flexíveis- Constituições que mesclam as duas técnicas: uma parte, definida pelo
Constituinte, deve ser alterada de forma solene; as demais regras podem ser alteradas
da mesma forma que a legislação ordinária.
D- Super-rígidas- Alguns autores, tal como Alexandre de Moraes, separam o conceito de
constituição rígida da compreensão de constituição super-rígida. O conceito de
constituição super-rígida estaria atrelado à existência de cláusulas pétreas; as
constituições rígidas seriam assim identificadas apenas pela existência de um
procedimento solene para a sua alteração.
E- Imutáveis- Seriam constituições imodificáveis. Tal compreensão não se aplica nas
democracias ocidentais contemporâneas.

6- Quanto à extensão:
A- Analíticas: Constituições que emergem, sobretudo, no âmbito do
constitucionalismo social, demarcando o avanço do sistema jurídico em relação
aos demais subsistemas sociais. São constituições expansivas que demarcam a
intervenção do Estado no âmbito do domínio econômico e social.
B- Sintéticas: Constituições que não são detalhistas, apresentando, geralmente,
apenas as diretrizes de organização do sistema político e proteção dos direitos
fundamentais, sobretudo os de primeira geração. As Constituições liberais
apresentavam-se, sobretudo, na forma de constituições sintéticas.

7- Outras classificações:

Há outras classificações relevantes sobre a Constituição. Na teoria clássica da


Constituição, são relevantes as reflexões de Lassale e de Hesse sobre a compreensão da
Constituição (leia o texto de Hesse, indicado como bibliografia complementar). A
discussão se dava pela existência de uma constituição folha de papel e uma constituição
como fator real de poder ou a tese que, apostando na força normativa da constituição,
não observada uma dualidade entre essas duas formas.
Da mesma forma, é comum, à luz do constitucionalismo democrático, afirmar-
se que as Constituições são abertas. A abertura constitucional se dá tanto na perspectiva
da sua incompletude semântica quanto em relação à necessidade, à luz de uma teoria
democrática, de ressaltar a importância de que todos os destinatários da Constituição
também possam ser seus intérpretes, na composição de um círculo aberto daqueles que
interpretam a constituição.
Finalmente, não há como negar, especialmente como resquício do excesso
legislativo, a função simbólica normativa, especialmente dos textos constitucionais.
Nesse sentido, sugere-se que você assista, no link abaixo indicado, à palestra do
professor autor da expressão no direito constitucional brasileiro. - (vide vídeo do
professor Marcelo Neves em
https://www.youtube.com/watch?v=l5V5uTLfi2c&t=122s)

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