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Fortaleza-CE prioriza seu gastos?

Fortaleza, 02 de janeiro de 2017.

Imagine-se em uma situação onde suas despesas estão cada vez mais crescentes

frente às suas receitas. Em simples palavras, que as suas ​necessidades estão crescentes,
enquanto a ​capacidade de provê-las se mantém basicamente a mesma. Que tipo de contas
você deixaria para pagar depois? Ou ainda, que tipo de gastos você excluiria
definitivamente de seu orçamento pessoal?

Você certamente merece congratulações se pensou na alimentação, moradia, e na


saúde como prioridades inafastáveis, caso seja responsável e consciente financeiramente.
Outros diriam, obviamente, que acresceriam a educação, dependendo das possibilidades.
Alguns mais abastados talvez indicassem, também, a segurança.

O fato, entretanto, é que o dinheiro é um recurso limitado para a esmagadora


maioria das pessoas. Saber o que fazer com ele, então, é essencial para manter suas
contas particulares equilibradas. Ocorre que a máquina pública não tem tratado as contas
públicas da mesma maneira.

As mídias locais deram conta de que a Prefeitura de Fortaleza empreendeu R$2,4


milhões com o lazer de seus cidadãos em um único dia de festa. Neste sentido, consta do
Diário Oficial do Município de Fortaleza1 , publicado em 27 de Dezembro de 2016, nas
páginas 04/06, os extratos de 12 contratos, os de n. 22/2016 até o contrato n. 33/2016,
juntos totalizando uma quantia aproximada de R$2.4 milhões. Além destes 12 contratos,
ficaram de fora os valores empreendidos com outras participações artísticas de renome
nacional2, o que contribuiu para um aumento relevante do valor total gasto.

É claro que os gastos estão dentro do contexto imaginado: aumento de despesas e


receita que não acompanha o crescimento da despesa. Tais gastos são totalmente o
contrário do que as famílias, em economias pessoais, destinam ao lazer e diversão.

1
Disponível em:
<​http://apps.fortaleza.ce.gov.br/diariooficial/download-diario.php?objectId=workspace://SpacesStore/786
409db-867f-40af-8d4f-b2a6d3c02bb7;1.0&numero=15922​>. Acesso em 02 jan 2017.
2
Disponível em:
<http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/cidade/online/prefeitura-paga-pelo-menos-r-2-4-
milhoes-para-atracoes-do-reveillon-de-fortaleza-1.1679840>. Acesso em 02 jan 2017. O jornal local
informou que as atrações ainda não constavam daquela publicação.
​ conomia
O economista Henry Hazlitt, em sua obra mais notória, o livro intitulado E
numa única lição, leciona no capítulo 4 que obras públicas significam impostos.
Parafraseando o autor, gastos públicos significam impostos.

Em célebre pronunciamento datado de 1983, Margaret Thatcher ecoou ao longo dos


anos no sentido apontado pelo parágrafo anterior. É dela a célebre frase: não existe essa
coisa de dinheiro público, existe o dinheiro dos pagadores de impostos3:

Um dos grandes debates do nosso tempo é sobre quando do seu dinheiro


deve ser gasto pelo Estado e com quanto você deve ficar para gastar com
sua família. Não nos esqueçamos nunca desta verdade fundamental: o
Estado não tem outra fonte de recursos além do dinheiro que as pessoas
ganham por si próprias. Se o Estado deseja gastar mais, ele só pode fazê-lo
tomando emprestado sua poupança ou cobrando mais tributos, e não adianta
pensar que alguém irá pagar. Esse ‘alguém’ é você.
Não existe essa coisa de dinheiro público, existe apenas o dinheiro dos
pagadores de impostos. A prosperidade não virá por inventarmos mais e mais
programas generosos de gastos públicos. Você não enriquece por pedir outro
talão de cheques ao banco. E nenhuma nação jamais se tornou próspera por
tributar seus cidadãos além de sua capacidade de pagar. Nós temos o dever
de garantir que cada centavo que arrecadamos com a tributação seja gasto
bem e sabiamente.
Proteger a carteira do cidadão, proteger os serviços públicos, essas são
nossas duas maiores tarefas e ambas devem ser conciliadas. Como seria
prazeroso, como seria popular dizer: ‘Gaste mais nisso, gaste mais naquilo’. É
claro que todos nós temos causas favoritas. Eu, pelo menos, tenho, mas
alguém tem que fazer as contas. Toda empresa tem de fazê-lo, toda dona de
casa tem de fazê-lo, todo governo deve fazê-lo, e este irá fazê-lo”.

​ Em outras palavras, não são apenas as ​obras públicas referidas por Henry Hazlitt4
que significam impostos. Os gastos públicos, de qualquer natureza, significam impostos e
serão pagos por você, contribuinte.

É claro que os contribuintes aceitam gastos públicos quando condizentes com a


realidade e o contexto social. Neste sentido, gastos com segurança, educação e saúde
seriam facilmente encarados pela sociedade como um todo, e caso fossem revertidos para
a finalidade propagandeada. Entretanto, parece que a prioridade pública não tem seguido a
mesma tendência do comportamento individual, quando empreende imensos esforços para
realização de festas com altos custos.

3
Discurso apresentado em Conferência do Partido Conservador em 1983. Disponível em:
<​https://www.youtube.com/watch?v=WPrIGhyPSsE​>. Acesso em 02 jan 2017.
4
HAZLITT, Henry. ​Economia numa única lição​. Tradução de Leônidas Gontijo de Carvalho. São
Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010.
Enquanto as próprias instituições têm impulsionado um crescente aumento do
tamanho do estado, curiosamente as prioridades dos gastos públicos enfrentam
inexplicáveis situações como a exposta. Por seu turno, o cidadão individual enfrenta, cada
vez mais com o agravamento de crises econômicas, a mesma dificuldade de ter despesas
que superam as suas receitas. Com uma única diferença: o cidadão não pode criar
impostos e, por tal motivo, enfrenta cada vez mais as conseqüências nefastas de uma
política de gastos sem controle.

A aprovação da PEC do limite de gastos públicos não é a salvação dos problemas


econômicos do país. É necessário acordar para retirar os privilégios - dispendiosos e
imorais - que a classe política ao longo dos anos conseguiu conquistar para si mesma e
seus apadrinhados.

Um certo montante de despesas públicas é necessário para que o governo


desempenhe suas funções essenciais. uma certa quantidade de obras
públicas — ruas, estradas, pontes, túneis, arsenais, estaleiros, edifícios para
as assembléias legislativas, departamentos de polícia e bombeiros — é
necessária para atender aos serviços públicos essenciais.
Interessa-me apenas assinalar o erro de dois dos argumentos mais
frequentemente apresentados a favor desse tipo de construção. Um, é o de
que ela "cria empregos"; o outro, que ela cria riquezas, que, sem isso, não
teriam sido produzidas. Ambos os argumentos são falsos, uma vez que não
levam em consideração o que se perde pela tributação. A tributação para a
construção de moradias, com fundos públicos, destrói tantos empregos em
outras atividades, quanto cria na de construção. Resulta em não se
construírem casas particulares, em não se fabricarem máquinas de lavar
roupa e refrigeradores e na falta de inumeráveis outras mercadorias e
serviços.

É necessário dizer que a citação acima, do autor Henry Hazlitt (2010, p. 38) se
aplica plenamente à falta de prioridade na utilização de recursos públicos, destinando
vultuosas quantias para o ​reveillon, ao mesmo tempo que contradita os principais
argumentos sustentados por quem se diz a favor das grandes despesas com festas
bancadas pelo dinheiro dos contribuintes e pagadores de impostos. No caso do ​reveillon, o
argumento é similar: “cria empregos na rede hoteleira” e o investimento se reverte na forma
de tributos arrecadados.
O primeiro argumento já foi devidamente enfrentado na citação das lições de Henry
Hazlitt. O segundo, de que o investimento se reverte na forma de tributos é bastante ilógico,
mas mereceu mesmo enfrentamento por parte do autor.

O argumento segundo o qual o gasto público com festas de ​reveillon é um


investimento que retorna em forma de tributos não prospera. Isto porque se alardeia que o
valor investido retorna através de impostos deixados por turistas sem, no entanto fazer
distinção entre turistas estrangeiros ou nacionais.

Nenhum órgão ou instituição pública presta contas com o cidadão de Fortaleza a


respeito dos “valores investidos que retornam na forma de tributos”, nem esclarece se há
um déficit ou superávit nesta operação. Entretanto, a justificativa é ​plausível a qualquer
desavisado que não tenha se apercebido de pequenos detalhes, como bem observou Henry
Hazlitt (2010, p. 38):

Quando oferecer emprego constitui um fim [das obras públicas], a


necessidade torna-se uma consideração subordinada. Tem-se que ​inventar
“projetos”. Em vez de pensarem apenas nos locais em que devem ser
construídas as pontes, os responsáveis pelo dinheiro público começam a
indagar a si mesmos onde podem construí-las. Podem inventar razões
plausíveis pelas quais deve uma nova ponte ligar Easton a Weston? Breve
isso se torna absolutamente essencial. Os que duvidam dessa necessidade
são tachados de obstrucionistas e reacionários.

Novamente a lição tem aplicação no contexto aqui apresentado, já que a justificativa


da realização de uma grande festa parece, à priori, bastante plausível. Bastaria, no entanto,
uma rápida visita aos postos e hospitais de saúde da rede municipal para a imediata
reversão desta plausibilidade e o questionamento inicialmente proposto teria uma sonora
negativa de qualquer um que o respondesse.

Gel Sui.

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