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DOS ARGUMENTOS SOFÍSTICOS - ARISTÓTELES (384-322 A. C.)

O presente estudo apresentará um fichamento da obra denominada "Dos argumentos


sofísticos", de autoria de Aristóteles (384-322 A. C.).
A presente obra compõe a seleção de textos de José Américo Motta Pessanha,
tradução de Leonel Vallandro e Gerd Bornheim, da versão inglesa de W. A. Pickard.
Ademais, foi elaborada em São Paulo, pela Editora Nova Cultura, no ano de 1987.
Na referida obra, Aristóteles busca discorrer acerca dos argumentos "sofísticos", que
segundo ele, são os que parecem ser argumentos ou refutações, mas na realidade não passam
de ilogismos.
Percebe-se que alguns raciocínios são genuínos, bem como outros apenas aparecem
ser, mas não é fato que se repete em outros campos.
Nesta ótica, tanto o raciocínio como a refutação às vezes são genuínos e outras vezes
falsos, conquanto a inexperiência possa fazer com que pareçam autênticos, pois as pessoas
bisonhas só avistam essas coisas à distância, por assim dizer.
Os raciocínios, por sua vez, repousam sobre juízos tais que implicam
necessariamente a asserção de outra coisa que não as afirmadas inicialmente, e em
conseqüência destas.
Quanto a refutação, trata-se de um raciocínio que conduz à contraditória da
conclusão prévia.
Não há como inserir numa discussão as próprias coisas discutidas. No lugar disso, se
usam os nomes como símbolos e, supondo que as consequências que decorrem dos nomes
também decorram das próprias coisas, bem como aqueles que fazem cálculos, supõem o
mesmo em relação às pedrinhas que usam para esse fim.
Quanto aos argumentos que se usam na discussão, distingui-se quatro classes:
argumentos didáticos, dialéticos, críticos e erísticos.
Os argumentos didáticos aqueles que raciocinam a partir dos princípios apropriados a
cada assunto e não das opiniões sustentadas pelo que responde. Já os argumentos dialéticos
são aqueles que raciocinam com base em premissas geralmente aceitas para chegar à
contraditória de uma dada tese. Por sua vez, os argumentos críticos são os que partem de
premissas aceitas pelo respondente e que não podem ser ignoradas por todo aquele que aspire
ao conhecimento do assunto em discussão, de que maneira devem ser conhecidas. Por fim, os
argumentos contenciosos ou erísticos são os que raciocinam ou parecem raciocinar a partir de
opiniões que parecem ser geralmente aceitas, mas em realidade não o são.
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Em relação aos fins, deve se conhecer vários, visados por aqueles que argumentam
como competidores e rivais encarniçados, sendo cinco: a refutação, o vício de raciocínio, o
paradoxo, o solecismo, e em quinto lugar reduzir o adversário à impotência, isto é, forçá-lo a
tartamudear ou repetirse uma porção de vezes; ou, então, produzir a aparência de uma destas
coisas sem a realidade.
Dois são os tipos de refutação, onde algumas dependem da linguagem usada e outras
são independentes da linguagem.
Das ambiguidades e anfibologias existem três variedades: a primeira quando o nome
ou a expressão significam propriamente mais de uma coisa, como a "águia" ou o "cão";
segunda quando, por hábito, os chamam assim; e o terceiro, que é quando palavras que em si
mesmas têm um só sentido e assumem um duplo significado ao combinar-se.
Em relação aos argumentos viciosos que são independentes da linguagem, há sete
espécies: os que relacionam com o acidente; o uso de uma expressão em sentido absoluto ou
não-absoluto, mas com alguma qualificação que diga respeito à modalidade, ao lugar, ao
tempo ou à relação; os que dependem da ignorância do que seja "refutação"; os que dependem
do consequente; os que dependem de pressupor o ponto originário que deve ser demonstrado;
apontar como causa o que não é a causa; e unir várias questões numa só.
Os argumentos viciosos vinculados ao acidente ocorrem sempre que se afirma que
um atributo qualquer pertence de igual modo à coisa em questão e aos seus acidentes. Os que
estão vinculados ao uso de uma expressão em sentido absoluto, ou a certo respeito e não de
maneira estrita, ocorrem sempre que se toma uma expressão usada num sentido particular
como se fora usada absolutamente.
Em relação à refutação, as que depende de tomar como causa o que não é uma causa
ocorre sempre que se insere no argumento algo que não é uma causa, como se a refutação
dependesse dele.
Percebe-se que os vícios de raciocínio vinculados ao acidente são casos evidentes de
"ignoratio elenchi" depois que se define a "prova".
A mesma definição deve valer também para a "refutação", só que aqui se menciona,
em acréscimo, a "contraditória", pois a refutação é uma prova da contraditória.
Aristóteles nota que o método correto é dividir as provas e refutações aparentes ou,
então, atribuí-las todas à ignorância do que seja uma "refutação" e tomar este fato como nosso
ponto de partida. Ele entende que é possível reduzir todos os vícios de silogismo apontados
acima a violações da própria definição do que é uma refutação ou argumento.
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Os vícios de raciocínio que dependem de unir várias questões numa só consistem em


não termos sabido dissecar a definição de "proposição", pois uma proposição é uma
predicação singular acerca de um sujeito único.
No que tange os argumentos que dependem da ambiguidade de palavras e frases, o
ilogismo se deve a não termos sabido dividir o termo ambíguo (pois não é fácil dividir certos
termos, como "unidade", "ser" e "identidade"), ao passo que nos que dependem da
combinação e divisão, é porque supõe ser indiferente que a frase seja combinada ou dividida,
como realmente acontece com a maioria das frases.
E de maneira análoga nos que dependem da acentuação, pois se pensa que a elevação
ou o abaixa-mento da voz numa frase não lhe altera o significado — em nenhuma frase, ou,
pelo menos, não em muitas.
Para o ilogismos que dependem do acidente, dá-se a equivocação por não poder
distinguir a identidade e a alteridade dos termos, ou, por outra, a sua unidade e multiplicidade,
ou que espécies de predicados têm todas como sujeitos os mesmos acidentes.
Quanto aos que dependem de uma definição ou de uma refutação imperfeitas, bem
como nos que estão vinculados à diferença entre um juízo qualificado e um juízo absoluto, a
equivocação se deve a pequena diferença entre os dois.
Por sofisma ou silogismo sofistico e refutação sofistica, Aristóteles entendeu não
apenas um silogismo ou refutação que parece ser válido mas não o é, como também aqueles
que, embora sendo válidos, só em aparência são apropriados à coisa em questão.
Para o Autor, são esses os que não logram o intento de refutar e provam a ignorância
do argumentador com respeito à natureza da coisa em questão, o que é tarefa própria da arte
do exame.
As refutações sofísticas, embora possam demonstrar a contraditória da sua tese, não
atestam a sua ignorância, pois os sofistas conseguem enredar os próprios homens de ciência
com tais argumentos.
Se as provas sofísticas da contraditória de uma tese consistem numa refutação
aparente, é claro que as considerações de que dependem tanto a prova de uma conclusão falsa
como uma refutação aparente devem ser iguais em número.
A refutação aparente depende dos elementos implicados numa refutação genuína,
mas a falha de qualquer desses elementos fará com que a refutação o seja apenas em
aparência.
Uma refutação sofistica não é uma refutação absoluta, mas somente em relação a
uma pessoa determinada; e da mesma forma no que diz respeito à prova sofistica.
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Aristóteles classifica como completamente absurdo discutir a refutação sem ter


primeiro discutido a prova. Porquanto a refutação é uma prova, e assim deve discutir esta
última antes de descrever a falsa refutação, já que uma refutação dessa espécie nada mais é do
que a prova aparente da contraditória de uma tese.
No que tange as respostas, muitas vezes exigir um "sim" ou um "não" é tarefa de
quem procede à crítica, e não do que expõe alguma coisa. A arte da crítica é um ramo da
dialética e se dirige não ao homem que conhece, mas ao ignorante que presume conhecer.
Trata-se de um dialético aquele que considera os princípios comuns em sua aplicação ao
assunto particular em debate, enquanto o que só faz isso em aparência é um sofista.
Aristóteles analisa ainda o raciocínio erístico ou sofistico, que para ele é um
raciocínio apenas aparente, sobre temas em que o raciocínio dialético é o método adequado de
crítica mesmo quando a conclusão do primeiro é verdadeira, pois o outro nos ilude no tocante
à causa, além de ser também os paralogismos que não se conformam à linha de investigação
própria do tema particular, embora se pense geralmente que estão de acordo com a arte em
questão.
O argumento dialético não se ocupa com nenhuma espécie definida de ser, não
demonstra coisa alguma em particular, e nem sequer é um argumento da espécie daqueles que
encontra-se na filosofia geral do ser. Todos os seres não estão contidos numa só espécie, nem,
se estivessem, poderiam estar submetidos aos mesmos princípios. Ele não permite que o outro
escolha a que mais lhe agradar das duas alternativas propostas numa pergunta, visto não ser
possível que ambas forneçam uma prova. A dialética, ao contrário, procede por meio de
perguntas, ao passo que, se tivesse por fim demonstrar coisas, se absteria de fazê-las, senão a
respeito de tudo, pelo menos a respeito dos primeiros princípios e dos princípios especiais que
regem o tema particular em debate. Porque, se o oponente se recusa a conceder estes, já não
haverá bases para argumentar contra a objeção.
A dialética também é, ao mesmo tempo, uma modalidade de crítica, pois tampouco a
arte da crítica é da mesma natureza que a geometria, mas algo que um homem pode possuir
mesmo sem ter nenhum conhecimento científico.
Aristóteles aponta como um método especialmente apropriado de expor um erro de
raciocínio, a regra sofistica que consiste em induzir o oponente a fazer o tipo de afirmações
contra o qual se está bem provido de argumentos: isto se pode fazer de maneira tanto própria
como imprópria. Para provocar uma afirmação paradoxal, procure-se saber a que escola de
filósofos pertence o homem com quem se está discutindo para depois inquiri-lo sobre algum
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ponto em que a doutrina de tal escola é paradoxal aos olhos da maioria, visto que em toda
escola há algum ponto dessa espécie.
A partir da ideia de que a refutação é de prolongar a argumentação, é difícil atender
ao mesmo tempo a muitas coisas; e para esse fim devem ser empregadas as regras elementares
que se estabelece.
Muitas vezes, uma forte aparência de refutação é produzida pelo mais sofistico de
todos os truques desleais usados pelos inquiridores. Isso ocorre quando, sem ter provado coisa
alguma, em vez de dar à sua proposição final a forma de uma pergunta, apresentam-na como
uma conclusão, como se tivessem provado que "tal e tal coisa não é verdadeira".
A refutação deve ser examinada a partir das discrepâncias da posição do oponente
quer com suas próprias afirmações, quer com os pontos de vista daqueles cujos atos e palavras
ele admite como retos e justos, e também daquelas pessoas que se supõe geralmente tenham
esse tipo de caráter, ou se assemelham a estas, quer com os da maioria ou da totalidade dos
homens.
Para Aristóteles, as vezes é preferível provar as coisas com plausibilidade a fazê-lo
com verdade, também às vezes deve-se dar solução aos argumentos de acordo com a opinião
geral e não de acordo com a verdade, visto se tratar de uma regra a ser observada, sempre que
enfrenta-se pessoas amigas de sofismar, tratá-las não como se estivessem refutando mas como
se apenas parecessem refutar: pois dizer que elas não provam realmente a sua tese, de modo
que nosso objeto, ao corrigi-las, deve ser o de dissipar essa aparência.
O Autor afirma que se alguém supuser que um argumento que gira em torno de uma
ambiguidade é uma refutação, o respondente não poderá escapar de ser refutado em certo
sentido, já que se tratando de objetos visíveis, é-se obrigado a negar o termo que se afirmou e
a afirmar o que se negou.
Um homem não distingue os sentidos de uma anfibologia não fica claro se ele foi ou
não foi refutado, e, como nas argumentações se tem o direito de distinguir, é evidente que
conceder simplesmente a coisa perguntada sem fazer distinção alguma é um erro, de modo
que, senão o próprio homem, pelo menos o seu argumento parece ter sido refutado.
Uma vez que certas refutações são geralmente consideradas como tais, embora não o
sejam em realidade, do mesmo modo certas soluções serão consideradas como tais, sem que o
sejam realmente.
Sempre que, de duas coisas, se admite geralmente que se uma delas é verdadeira, a
outra também o é necessariamente, ao passo que, se a segunda é verdadeira, não é necessário
que a primeira também o seja, deve-se, se perguntados sobre qual das duas é verdadeira,
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conceder a menor: pois, quanto mais numerosas forem as premissas, mais difícil será deduzir
delas uma conclusão.
Ademais, das refutações que se originam da ambiguidade e da anfibologia, algumas
contêm uma pergunta com mais de um sentido, enquanto em outras é a conclusão que se pode
entender com diferentes significados. Sempre, pois, que os vários sentidos residem na
conclusão, não ocorre nenhuma refutação, a menos que o sofista assegure também a
contraditória da conclusão que pretende provar.
O Autor entende ser evidente de que maneira se devem solucionar aquelas refutações
que dependem da divisão e da combinação de palavras: porque, se a expressão significa coisas
diferentes quando dividida e quando combinada, assim que o oponente formula a sua
conclusão deve-se tomar a expressão no sentido contrário.
No que diz respeito aos argumentos, uma regra, geral, ao tratar com argumentos que
dependem da linguagem, é que a solução sempre segue o oposto do ponto em torno do qual
gira o argumento. Mas se o argumento depende de um acento agudo, a solução é um acento
grave; e se de um acento grave, é um acento agudo.
Se o argumento depende de uma ambiguidade, pode-se resolvê-lo usando o termo
oposto, por exemplo: se notar de repente que está se chamando alguma coisa de inanimada, a
despeito de nossa negação anterior de que ela o seja, deve-se mostrar em que sentido é viva;
se, pelo contrário, a declara inanimada e o sofista prova que é viva, deve dizer em que sentido
é inanimada.
No que tange o enfrentamento dos argumentos que giram em torno do acidente, uma
mesma e única solução é universalmente aplicável. Pois, como há incerteza sobre se um
atributo deve ser aplicado a uma coisa quando ele pertence ao acidente da mesma, e como em
alguns casos se admite geralmente e se afirma que ele pertence ao sujeito, enquanto em outros
casos se nega que lhe pertença necessariamente, deve, assim que se formulou a conclusão,
replicar a todas elas por igual que tal atributo não pertence necessariamente ao sujeito.
Não há impedimento para que o mesmo argumento contenha vários defeitos ou
falhas, mas não é a exposição de todas essas falhas uma por uma que constitui uma solução,
pois é possível demonstrar que se inferiu uma falsa conclusão sem, contudo, indicar de que
ela depende, como no caso do argumento com o qual pretende provar a impossibilidade do
movimento.
Imperioso dizer que os argumentos que dependem de uma expressão que é válida de
uma coisa particular ou sob um aspecto, num lugar, de uma maneira ou relação particulares,
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porém não absolutamente válida, podem ser resolvidos examinando-se a conclusão à luz da
sua contraditória para ver se é possível que tenha sido afetada de uma dessas maneiras.
Em relação às refutações que dependem de postular e pressupor o ponto originário a
ser provado, isso não se deve conceder ao que pergunta se sua maneira de proceder é
evidente, mesmo que se trate de uma opinião geralmente aceita, mas deve-se dizer-lhe a
verdade. Deve-se fazer ver que o ponto foi concedido sob a impressão de que ele não
tencionava usá-lo como premissa, mas para raciocinar contra ele, da maneira oposta àquela
que se adota na refutação de questões secundárias.
No que diz respeito às refutações em que o argumento depende de alguma adição,
deve-se ver se, mesmo quando retirada esta, a conclusão continua sendo absurda.
Em caso afirmativo, o que responde deve frisar esse fato e dizer que concedeu o
acréscimo, não porque acreditasse nele e sim no interesse do argumento, mas que seu
oponente não fez nenhum uso dele para o seu argumento.
Por fim, em relação aos solecismos, o que parece produzi-los; o método de lhes dar
solução se tornará manifesto no decurso dos próprios argumentos. Os argumentos desta
classe, pois, não provam o solecismo, mas apenas parecem fazê-lo, e pelo que acabamos de
dizer se vê com clareza não só por que parecem fazê-lo mas também de que maneira deve ser
enfrentados.

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