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José Roberto Marques

Lições Preliminares
de Direito Ambiental

editora
VERBATIM
Editoe: Antorüo Carlos APSerrano Sumário

5
Prefacio

S:.ícS°oífvS;=rSií:^;S^^ Noções iniciais: aproblemática ambiental epropostas de


melhoria do ambiente
^
17
Bases do estudo
Ao Catalogação na Publicação (CIP) 2 1 A relação do homem com a natureza
2.2. Direito Ambiental: conceito, finalidade, autonomia eprincípios zu
2.2.1. O conceito de Direito Ambiental
Marques, Je direito ambiental / José 2.2.2. A finalidade do Direito Ambiental
Ko.'.'rirH.?Ser-"S<. «"IO E v„bati., 2.2.3. A autonomia do Direito Ambiental ••
2010.
2.2.4. Os princípios que regem oDireito Ambiental
2.2.4.1. O conceito ò&princtpio...-
2.2.4.2. Os princípios estruturais ^
1. Direito arnbiental 2. Direito ambiental - 2.2.4.2.1. O princípio da globalidade ^
Brasil I. Titulo.
2.2.4.2.2. Oprincípio da horizontalidade 39
2.2.4.2.3. Oprincípio da sustentabilidade 41
2.2.4.2.4. Oprincípio da solidariedade 44
2.2.4.3. Os princípios funcionais
2.2.4.3.1. Oprincípio da prevenção 4/.
2.2.4.3.2. Oprincípio da precaução 56
2.2.4.3.3. Oprincípio do poluidor-pagador 1 63
2.2.4.3.4. Oprincípio do poluidor-pagador 11:
areparação do dano ambiental 67
CDU-348502.7(61)
10-05507
2.3. O meio ambiente; conceito e aspectos
2.3.1. O conceito de meio ambiente —
índices para catálogo sistemáticos 2 32ambiente:
Os aspectos constitucionalmente consagrados do meio
1. Brasil s Direito ambiental 34:502.7(81) natural, urbano, cultural e do trabalho
2.3.2.1. O meio ambiente natural
2.3.2.2. Omeio ambiente urbano ^
2.3.2.3. O meio ambiente cultural
Capa ediagramação: Manuel Rebdato Miramontes 2.3.2.4. Omeio ambiente do trabalho ^
2.4.0S aspectos do meio ambiente nas Constituições anteriores
Direitos reservados desti edição por
EDITORA VERBATIM LTDA
esua proteção jurídica na Constituição Federal de 1988
2.4.1. O art. 5\, da Constituição Federal f
Rui Zacarias deGóis, 2O06 2 4.2. O art. 170, da Constituição Federal
CEP 04610-000-Sáo Paulo - SP 2 4 3. Os arts. 182 e186, da Constituição Federal
Tel. (OxkU) 5533.0692
www.eciitoraverbatLm.com.br 2.4.4. Os arts. 215 e216, da Constituição Federal 1^6
2 4 5. O are. 225, da Constituição Federal
c-mail: editotaverbaüm@cditoiaverbatÍin.com.br 2.4.5.1. "Todos"
2.4.5.2. "têm direito"
2.4.5.3. "ao meio ambiente ecologicamente equilibrado," 116
2.4.5.4. "bem de uso comuni do povo" Prefácio
2.4.5.5. "eessencial à sadia qualidade de vida," 126
2.4.5.6. "impondo-se ao Poder Público" 12,8
2.4.5.7. "e à coletividade" l^'^
2.4.5.8."o dever dedefendê-lo e preservá-lo" l^^ É sempre gratificante prefaciar uma obra como esta, que certa
2.4.5.9. "para as presentes e futuras gerações." 137
2.5.A visão antropocêntrica na Constituição Federal 138 mente tem um papel fundamental na disseminação da consciência
2.6.0 direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado 146 ambiental, dentro de uma avançada e bem concebida proposta de re
2.7. Adignidade da pessoa humana l'^® flexão multi, inter e transdisciplinar em torno do desenvolvimento
2.8.Os marcadores constitucionais da sustentabilidade 152 sustentável, apresentando minuciosa e detalhada interpretação dos
preceitos constitucionais e dos princípios ambientais em nosso sistema
Referências bibliográficas
jurídico, em sintonia com a Ecologia e a Economia.
Esta é uma das importantes contribuições do estudo ora publica
do, pois revela que a integração destas três áreas do conhecimento
científico, Direito, Ecologia e Economia, deve existir desde sempre
quando se trata de delinear a proteção ambiental na ordem econômica
capitalista.
Desde os legisladores e a ampla gama de detentores do poder nor
mativo em nossa realidade jurídica até os intérpretes e aplicadores dos
comandos dessas mesmas normas, todos devem estar conscientes de
que não podem ser ignorados os saberes científicos e tecnológicos ex
perimentados pelas ciências físicas, químicas e biológicas na tentativa
desafiadora da reconstrução do equilíbrio ecológico, base do direito
fundamental reconhecido a todos no art. 225 da Constituição.
Os subsídios científico-tecnológicos oriundos dessas ciências ser
vem para balizar a adoção das medidas que sejam necessárias, sufi
cientes e efetivas para, por ordem de prioridade, se prevenir, reparar,
mitigar e compensar adequadamente os impactos e danos ambientais
resultantes dos processos de produção de bens e serviços.
A construção da sustentabilidade em âmbitos global, nacional, re
gional, local e setorial depende desta complementaridade, que rejeita
a idéia ultrapassada de antagonismo entre desenvolvimento econômi-
co-social e proteção do meio anibieTite.
A Política Nacional do Meio Ambiente, a Constituição Federal e
a Política Nacional de Educação Ambientai são exemplos dessa visão
conciliatória a ser incorporada por todos na interpretação e imple
mentação dos respectivos objetivos, diretrizes e instrumentos.
Este trabalho é, sem dúvida, inovador em muitos aspectos, e incor
pora as tendências do pensamento contemporâneo de abordagem dos
LlÇÔUS PRELIMINARES DE PlRElTO AMBIENTAI
José Roberto Marques

geração de resíduos). Omesmo se diga com relaçao afunção de


conceitos que envolvem grande complexidade sob aperspectiva e julgãr, então esvuziàdã.
(...)

• Pode-se chamar aharmonização dos ensinamentos eprática^


„c l DM<0,;" "'Zl:ZZ..'Z.'»-

«Tiíiis—í:írs= •-ZZTz':i.
esquecer de que, quando se paga^ p adoção de práticas
i
tentativa de reparar adegra açao possibilidade de ajuste
'"Ítt.st7úe aalternativa viável para abusca desse obj^^! para evHá-lal sem prev^o (conseqüências
aconscientização para alguns eaimplementação de açao
'"tx,.o.»».;«tsitss.!'-
comendada aos ^'advogados, pesquisadores,
dores públicos eprivados a, sustentabilidade
estudantes, comprometidos com a construção
em escalas global e intergeracional.
•Ti: Lrrrí i í " - São Paulo, maio de 2010.
Consuelo Yatsuda Uoromizato Yoshida
Mestre e Doutora pela
Pomifícia Universidade Católica de S. Paulo
Professora de Direito Ambiental

j^bbbebSbíb (PUC/SP eUNISAL/Lorena/SP)


Coordenadora da Especialização em
Direito Ambiental eGestão Estratégica da
Sustentabilidade (PUC/COGEAE/SP)

^'771%7conhecendo as lets ,ue regem anatureza éprcdj^


1.

Noções iniciais: a problemática


ambiental e propostas de
melhoria do ambiente

A natureza gera impactos em si mesma, promovendo desarmonia


e desequilíbrio (os biológicos dizem que essa desarmonia é aparente
e chamam-na de equilíbrio dinâmico). Como exemplo, citam-se as
poeiras, os corpos dos animais mortos depositados no solo ou nas
águas, os incêndios provocados por raios, etc.
Ela também promove degradação significativa por meio de catás
trofes, como as chuvas excessivas, secas, terremotos, erupções vulcâni
cas, tempestades marítimas, furações e ciclones, entre outros eventos.
Assim, jamais se poderá pensar em um ambiente isento de degra
dação, ainda que, a princípio, se desconsidere a inevitável intervenção
humana (impacto humano é natural), que também produz os mesmos
efeitos. Se a poluição fosse somente essa, a natureza estaria preparada
para enfrentá-la, deforma que seria diluída, minimizando suasconse
qüências maléficas. Esses fatos - pode-se dizer - fazem parte da pro
gramação da natureza. Ela tem anticorpos que anulam os efeitos dos
impactos queproduz, ou seja, a natureza, por meio de mecanismos de
S
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•^
autorregulação, consegue responder às variações ambientais pormeio
de adaptação quase infinita, mantendo o ecossistema dentro dos limi
tes uc cquilíuriu dinâmico e de seu sistema Homeostáticó^, garantindo
um fluxo contínuo de energia ematéria. Éum processo de autogestão.

Deacordo com o Dictonário deecolopa e ciências ambientais, homeostase é a "habilidade de umacélula


ou o^anismo de manter um ambiente interno constante, um equilíbrio de condições como atemperatura
interna ou oconteúdo de um fluido, através daregulação de processos fisiológicos (retroalimentação negativa)
e ajustamentos àsmudançasno ambienteexterno".
Lições preliminares de Direito Mibiental 11
10 José Roberto Marques

Ocorre que o homem, desde tempos remotos, vem acrescentan época muito distante da nossa, ainda que as providências necessá
do mais degradação, contribuindo, aos poucos, para a deteriora rias para se reverter a atual situação não sejam adotadas de ime
ção dos recursos ambientais. Ele age dessa maneira porque precisa diato. Mas é possível prever - e pensa-se assim - um futuro que,
alimentar-se e proteger-se. Inicialmente, caçava, pescava e colhia em muito, se assemelhará ao cenário do filme Mad Max, que re
frutos; depois, iniciou práticas agrícolas, visando à ampliação da trata uma visão pessimista (ou realista) do futuro do homem, caso
produção. Com o fogo, protegia-se e preparava seus alimentos. perdurem os equívocos que hoje são cometidos.
Numa fase mais avançada, usou-o para limpar áreas que seriam Não se pode, contudo, tomar apenas uma variante para tentar
destinadas ao plantio intensivo e para fabricar utensílios e armas. fazer uma previsão do que será o amanhã da humanidade. Não é
Com o transcorrer dos séculos e o avanço de seu conhecimento, tão simples assim. Existem vários fatores que concorrem para um
o homem não se limitou mais às suas necessidades diárias, inician nível satisfatório, ou não, de vida. Entre eles, estão, justamente, a
do produção com vista às trocas eao comércio, este com o fim de defesa do meio e a aplicação do Direito, este como mecanismo de
acumulação de riquezas. Ele descobriu os combustíveis e passou a ordenação e controle dos interesses maiores da sociedade. O nível
fazer uso intenso deles, com finalidades variadas, até mesmo no de proteção que ele proporciona é o ponto de partida: o que foi
culto doméstico e nos templos. escolhido para se proteger e qual a dimensão dessa escolha. A sua
Toda essa evolução foi acompanhada de outras formas de de efetividade é aspecto que deve ser considerado, e isso - sabe-se - é
gradação da natureza. Mas, até então, a Terra estava preparada tão complexo quanto a própria proteção do ambiente. Desses dois
para absorver a poluição gerada, sem repercussão grave para a ingredientes depende o desenvolvimento sustentável.
vida das comunidades, porque o volume ainda era relativamente Referindo-se às perspectivas da humanidade em crise, Eugene
pequeno, dadas as reduzidas população e atividades. Pleasants Odum^ escreveu:
Os conflitos bélicos tambémproduzirame produzem grave de "Existemsimplesmente demasiadasincógnitas, demasiados
gradação ambiental. A devastação provocada pelos explosivos e novos eventos, inovações tecnológicas e outros fatores que não
engenhos químicos e biológicos, bem como pelos incêndios, deixa podem ser previstos. [...] Conforme nos aproximamos do ano
marcas profundas na paisagem, na fauna e na flora, muitas vezes 2000, quase que a única certeza ê que os seres humanos conti
contaminando, por longo período, águas superficiais e profundas, nuarão a aumentar a sua população, pelo menos durante mais
e o solo. Produzem danos gravíssimos ao ambiente e ao homem, um século, e as sociedades industrializadas estarão passando
constituindo-se em inegável ofensa aos direitos da humanidade. por uma transição importante e muito dolorosa na utilização
A tolerância da natureza, antes, estava dentro de um nívelcom de energia, à medida que os combustíveis fósseis diminuem em
patível com os mecanismos de que ela dispunha, pois não havia quantidade, declinam em qualidade e aumentam no custo.[...]
comprometimento dos recursos ambientais. A maioria dos futurólogos acredita que teremos que reduzir os
Hoje, o aumento da população, em ritmo acelerado, e o cres enormes desperdícios atuais e nos tornarmos mais eficientes e
cimento econômico, que não tem levado em consideração o custo conscientes da conservação, a fim de fazermos mais com menos
ambiental da produção, determinam um desgaste na quantidade energia de alta qualidade".
e qualidade dos recursos ambientais, comprometendo a saúde e o
bem-estar das comunidades e colocando em risco, até mesmo, a
possibilidade de vida das futuras gerações.
É certo que o comprometimento da existência de futuras ge
rações é um processo lento e gradativo, que atingirá seu auge em ' Ecologia, p. 341.
12 José Roberto Marques Lições preuminares de Direito Ambiental 13

Fazendo uma avaliação ecológica^, conclui: "O crescimento gresso, do qual nada resultou de positivo para ela. Por mais que
futuro da população humana é uma grande incerteza que afeta o homem queira preservar a natureza, o desenvolvimento e o au
qualquer modelo de previsões". mento da população irão exigir, constante e crescentemente, sacri
Já se foi a época em que o homem podia ter a sensação de que fícios de recursos ambientais. Cabe-lhe, portanto, administrá-los
controlava a natureza. Sua agressão a ela, em busca de crescimen com o fim de sempre deles poder dispor. E assim o faz pela ação
to econômico (de riqueza, propriamente), atingiu nível tão elevado consciente - que tem se mostrado insuficiente - ou pelo Direito,
que, hoje, a natureza responde, vagarosamente, pelo que lhe foi que impõe restrições e limitações à sua conduta, de forma que
causado há séculos. O Direito não pôde prever tudo isso e, dessa todos os membros da coletividade possam também realizar suas
forma, deixou de regulamentar aquelas condutas que avançavam atividades e, no final, todos estarão reservando igual direito para
sobre os interesses da humanidade, mesmo porque o meio ambien as gerações seguintes.
te - que ora interessa - não tinha esse reconhecimento. A natureza não pode ser considerada apenas fornecedora de
De qualquer forma, o homem gerou um problema para si pró matéria-prima. Toda indústria necessita de manutenção para que
prio: a natureza, revoltando-se de tal forma que ele não pode rea possa continuar crescendo e produzindo. E, como tal a natureza
gir a curto prazo, não pode consertar o estrago já realizado e não deve ser tratada. Uma vez que o homem não pode fazê-la crescer
poderá viver nas condições em que ele está vivendo. - inversamente, apenas a faz decrescer qualitativamente^ deve
É necessário, portanto, administrar bem os recursos ambien mantê-la em situação que permita que continue produzindo e,
tais hoje disponíveis, permitindo que isso possa resultar no desen assim, possibilitando a vida sobre a Terra. Em outras palavras,
volvimento sustentável. Sem este, a sobrevivência do homem esta pode-se dizer que a naturezatambém necessita de manutenção.
rá comprometida. Fiódor Dostoiévski"^ não o considerou quando O homem sesente o centro de tudo. Mas, inserido na natureza,
escreveu: "A raça humana é forte. O homem é a criatura que pode dela depende para todas as suas atividades, para viver. Ele tenta
se acostumar a tudo, e creio que essa é talvez a melhor definição controlá-la e já deu sinais de que pode, na grande maioria dos ca
para ele". Na verdade, atingidos os limites de tolerância do orga sos, enfrentá-la e ajustá-la aos padrões de que necessita. Mas ela
nismo humano, não há mais com que se acostumar. reage lentamente, e sua resposta, muitas vezes, é dada por meio
O honíem se adapta ao meio, adapta o meio às suas necessida de fenômenos não previstos ou não esperados. Por fim, ela acaba
des, mas não pode se libertar das conseqüências da degradação submetendo o homem por meio de suas leis, que não comportam
ambiental, sofrendo, de forma lenta, um processo de erosão da alterações, ao contrário daquelas porele produzidas, que ele pode
qualidade de vida de que resultará, bem mais tarde, um problema respeitar, por consciência ou por dever, neste caso temendo uma
de saúde. Este, muitas vezes, não será com ela relacionado, dada a sanção.
dificuldade de estabelecimento do nexo causai, pois não se poderá A grande questão apresentada às presentes gerações é a solu
associá-lo com episódio identificável^. ção do problema relativo à degradação ambiental: como contê-la;
O homem faz parte da natureza, mas é a parte descartável e como minimizá-la; como administrá-la; como compatibilizá-la
desnecessária para ela. Ele nao lhe faz faltaj ao contrario, degrada com o desenvolvimento, que também é gerador de bem-estar.
e desequilibra-a. Sempre a usou como instrumento para seu pro- Pensa-se - e isso é necessário que fique bem esclarecido - que,
não obstante o homem execute uma infinidade de boas ações.
Cp. cit., p. 346.
Recordações da casadosmortos, p. 19.
De acordo com aleidaconservação damassa, que rege a Física, a matéria ésempre transformada, de
Nosentido, Granville Hardwick Sewell, Administração e controle da qualidadeambiental, p. 165. uma forma em outra, demaneira que anaturezanáo sofea perda quantitativa.
14 José Roberto Marques Lições preuminabes de Direito Ambiental 15

está reservado para os seres vivos um futuro repleto de incertezas operadores do Direito, uma vez que a força que eles têm em suas
quanto à saúde e à sadia qualidade de vida. Ousa-se dizer, inclu atividades não pode ultrapassar a força da natureza, impondo-se
sive, que esse futuro - espera-se que não próximo se não for que respeitem as suas leis, notadamente as relativas à Biologia, à
respeitado o ritmo da natureza, será desastroso. Física e à Química.
Reparar a degradação ambiental causada até este momento é Legislar desconhecendo as leis que regem a natureza é produzir
impossível. Seriam necessários milhares de anos, não disponíveis textos que não vão alcançar efetividade, pois lhes será subtraído
para as atuais e próximas gerações. Cessá-la é, também, impos o resultado social positivo (exemplo: ignorar a produção de polui
sível, pois toda atividade do homem implica degradação, seja ela ção, pois a lei da conservação da massa aponta para a geração de
dirigida para a produção de alimentos ou voltada para atividades resíduos). O mesmo se diga com relação à função de julgar, então
que gerem crescimento econômico ou mesmo para as que sejam esvaziada.
meramente recreativas (exemplo: passeio de lancha ou automóvel; Assim, o Direito, no campo ambiental, deve refletir aqueles
realização de um churrasco ou construção de um clube). ensinamentos, especialmente os da Ecologia, ramo da Biologia
Resta, então, administrar o que existe e as formas de inter que cuida do estude das relações entre os seres vivos e o meio
venção humana, de maneira que se desacelere a degradação do ambiente. Busca-se, por força da norma contida no art. 225, ca-
ambiente, possibilitando durabilidade maior da fase em que os re put, da Constituição Federal, o meio ambiente ecologicamente
cursos ambientais proporcionam melhores condições de vida ao equilibrado. A Economia deve observar as lições ecológicas e os
homem e às demais formas de vida que lhe são úteis. mandamentos legais. Com relação a ela, serão feitas referências
O papel do homem, pois, é conter o avanço prejudicial ao meio à produção e ao crescimento econômico, de maneira superficial,
que lhe proporciona subsistência e pode proporcionar-lhe sadia sem a pretensão de ingressar nas suas raízes e nos conhecimentos
qualidade de vida. científicos que lhes são relativos.
Pensa-se que a alternativa viável para a busca desse objetivo é a A interpretação dos mandamentos legais constituirá o objeto
conscientização para alguns e a implementação de ação consciente deste trabalho, analisada sempre de forma harmônica com a Eco
para outros. logia e a Economia.
As cada vez mais freqüentes agressões ao meio ambiente, ao Pode-se chamar a harmonização dos ensinamentos e práticas
mesmo tempo em que revelam a falta de consciência do homem ecológicas e econômicas de desenvolvimento sustentável. E a fun
ou a falta de ação consciente a respeito da necessidade de sua pre ção do Direito, nesse processo, é a mediação, impedindo que uns
servação e conservação, exigem que o legislador intervenha para se sobreponham sempre aos outros, tendo o homem, representado
contê-las dentro de um limite de razoabilidade. pelas atuais e futuras gerações, como o grande beneficiário do
E é justamente esse limite de razoabilidade que demanda ava equilíbrio entre elas.
liações e construções do legislador e, principalmente, dos intér Acima de tudo, os legisladores e os intérpretes não podem se
pretes. Dentre estes, reputam-se como mais importantes - com esquecer de que, quando se paga depois (o que se tem no caso de
o devido respeito pelos operadores das demais ciências e demais tentativa de reparar a degradação em vez de adoção de práticas
profissionais do Direito - os membros do Poder Judiciário. Isso para evitá-la), sem prévio contrato (não há possibilidade de ajus
porque é a interpretação deles, fundada na lei, que acabará preva te com a natureza), não se sabe quanto será pago (conseqüências
lecendo, por força do sistema jurídico que vigora no País. da degradação) e nem quem vai pagar (as atuais ou qual futura
Em matéria ambiental, entretanto, o conhecimento jurídico geração).
não é bastante para bem orientar os legisladores, juizes e demais
16 José Roberto Marques

Rogério Cezar de Cerqueira Leite, físico da UNICAMP, em


matéria publicada na Folha de S.Paulo', afirmando que as emis
sões de gás carbônico comprometerão a sobrevivência do homem
e denominando de cataclisma {evitável, a princípio, segundo ele) o
futuro que se aproxima, alerta para a necessidade de mudança no
entendimento jurídico da matéria. Concluiu:
"Consideremos um exemplo. O carbono contido em toda
Bases do estudo
a fitomassa {aérea e subterrânea) da Amazônia é equivalente
a todo o petróleo já queimado e ainda por extrair. A continui
dade, ao ritmo deste último decênio, da prática de queimadas
para expansão da cultura da soja ou criação de gado e a atua
ção de madeireiras deverão suprimir a floresta amazônica em
pouco mais de 50 anos. A correspondente quantidade de C02
2.1. A relação do homem com a natureza
acumulada na atmosfera eqüivaleria a cerca de 1 bilhão de hu
Pode-se considerar que se está numa relação de parasitismo
manos exterminados. Se eu enveneno hoje um indivíduo que
para com a natureza, aqui entendida como o meio ambiente na
vai morrer daqui a dez anos como conseqüência inequívoca do
envenenamento, serei condenado por homicídio (ou, pelo me
tural. O homem vive num corpo maior, a Terra, seu hospedeiro,
nos, por tentativa). Pois bem, com a crescente convicção da
dela retirando alimentos è produtos que lhe possam proporcionar
ameaça que o aquecimento global significa para a sobrevivên?
sobrevivência, bem-estar e segurança, após simples extração, ma
cia da humanidade, talvez seja inevitável inaugurar um novo nuseio ou processo de industrialização.
capítulo da jurisprudência, a saber, 'homicídio a crédito', pois, Trata-se de uma relação desarmônica, em que o homem a de
para cada kml de mata arrasada na Amazônia, 200 de nossos preda, sempre a consumindo e destruindo, e nada útil lhe acres
descendentes serão exterminados até o fim do próximo século". centando. Ele desequilibra os ecossistemas, provocando impactos
desastrosos, muitas vezes de efeitos irreversíveis. Ao interferir no
O problema, então, não é individual: é de toda comunidade, meio, sem planejamento e sem estudos específicos, expulsa popu
porque ela sofrerá as conseqüências da degradação, ainda que ge ••
lações de seres vivos de uma região para outra. As conseqüências
rada por uma única pessoa. para as duas regiões - a que recebe e a que perde esses seres - são
Assim, no exemplo citado por Cerqueira Leite, exige-se que imprevisíveis e provocam transformações que afetam o próprio
providências, relativamente à Amazônia, sejam adotadas hoje, vi homem, ainda que ele não possa percebê-las, porque a natureza
sando ao crescente declínio do desmatamento. reage lenta e gradativamente, em verdadeiras doses homeopáticas.
Pode-se exemplificar com a eliminação de determinada mata.
Os ^nimíiís miP r>pnr>ain tronciaram-ca -n^c
quais já existe uma cadeia alimentar, a qual será desequilibrada,
•'t: com repercussão na flora, na fauna e na vida do ser humano. Os
elementos da fauna, que da mata dependiam para alimentar-se e
abrigar-se, buscarão alimentos e abrigo em outras regiões, mo
Ediçãode l°-l-2007, Tendêndas/Debates,p. A-3.
dificando seu equilíbrio ecológico e criando, assim, dois novos
18 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 19

ecossistemas (os mesmos que já existiam, mas com as alterações Muitas vezes, o meio natural reage, sinalizando a existência de
provocadas pela ação humana). A capacidade de resistência do interferência negativa, mas o homem não percebe ou, percebendo
ambiente a essas transformações muitas vezes é pequena e, quan o sinal, não dá a ele a importância devida, ignorando a necessida
do consegue operá-la, age lentamente, mas caso cessem as inter de de cessação das causas e de correção dos impactos já produzi
venções negativas. dos. A natureza consegue absorver a degradação provocada, mas
Outro caso característico é o do abate de algumas populações, a grande proporção do impacto ou a reiteração deles (cumulativi-
predadoras de outras, fazendo com que estas se proliferem e atin dade), muitas vezes, impede que a reabilitação seja eficaz a curto
jam outros elementos da fauna, a vegetação e o homem. prazo, demandando muito tempo para isso, o que representaria
A Convenção sobre a Diversidade Biológica, subscrita pelo Bra o tempo destinado a várias gerações. E dele não dispomos. Nesse
sil e que passou a integrar o conjunto legislativo nacional com a período, essas gerações vão suportar os ônus da negligência do ser
edição do Decreto n° 2.519, de 16-3-1998, traz, inclusive, era seu humano para com o meio ambiente.
art. 8, h, como dever dos signatários, na medida do possível, "im Roxana Cardoso Brasileiro Borges® lembra: "O futuro da hu
pedir que se introduzam, controlar ou erradicar espécies exóticas manidade começa a ser excluído quando as condições que propi
que ameacem os ecossistemas, hábitats ou espécies". ciam a vida humana na Terra se modificam com intensidade e ve
Ao agir inconseqüentemente com relação à natureza, o ser hu locidade tais que a espécie humana não as consegue acompanhar
mano parece não perceber que ela reagirá no futuro, caso a capa nem a elas se adaptar".
cidade de resistência que ela aplica no momento não seja eficaz. O homem tem condições de se ajustar às novas situações, mas
Fazendómma analogia, lembra-se do corpo humano, atingido por essa não é uma regra geral porque nem todas as comunidades têm
uma lesão e infeccionado por bactérias.Há uma reação, resultante condições materiais e tecnológicas para tanto, de maneira que
da ação de leucócitos, os quais procuram evitar que as bactérias grande parte da população mundial sofrerá com os efeitos da de
se propaguem e criem um quadro de degeneração. Se o resultado gradação ambiental. Também, algumas situações mostram-se in-
é positivo, há formação de pus (resistência eficaz) e, mesmo com contornáveis, como, por exemplo, o desaparecimento de pequenas
inicial debilitação da saúde, ela é restaurada. Se esse processo na ilhas em virtude do aumento do nível das águas do mar.
tural não alcança êxito em extirpar as bactérias invasoras, será O tratamento dado pelo homem à natureza é resultado, tam
necessária a intervenção por meio da aplicação de medicamentos. bém, do nível cultural do povo e da instrução que ele recebeu. São
Se o processo não puder ser revertido, poderá ocorrer a morte. necessários esses dois elementos para que se possa obter consciên
Na natureza, observadas as devidas proporções, ocorre a mes cia ambiental e ação consciente adequada às atuais necessidades.
ma coisa. Seela, nos seus processos de autorregulação, não conse Não se descarta, contudo, a hipótese de que, sem esses atributos,
gue reagir a uma interferência negativa, fruto da ação humana, o uma pessoa possa relacionar-se com a natureza, de forma a prote
homem deve intervir novamente, na tentativa de evitar o completo gê-la; mas isso é exceção e, portanto, não pode ser cientificamente
processo de degradação, sempre com o risco de ocorrer perda de considerada.
finitiva de integridade do ecossistema. As conseqüências maiores, Escreve Vitor BelHa^:
nessa hipótese, serão previsíveis, mas o custo final e imprevisí
vel. Não se pode prever como a natureza, com o passar o tempo,
vai processar o evento e quais serão as seqüelas a médio e longo
prazos. Função ambiental dapropriedade rural, p. 17.
Introdução à economiado meioambiente, p. 20.
20 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 21

"Osseres humanos são parte integrante da natureza e, por natural; usa meios de transporte movidos a combustíveis poluen
tanto, não são capazes de criá-la. Podem, porém, efetuar ações tes; consome irracionalmente e gera lixo em excesso; usa formas
que a transformem ou alterem visando a satisfação de suas ne de energia que destroem recursos naturais; desmata, etc. Ao mor
cessidades como: a derrubada de florestas para o aproveita rer, gera nova forma de degradação (contaminação tóxica), decor
mento dos solos para a agricultura oua pecuária; a construção rente da decomposição de seu corpo, um processo lento que dura,
de estradas que facilitem os deslocamentos e o abastecimento; aproximadamente, dois anos (nesse período libera substâncias al
o barramento derios para a geração de energia, irrigação e for tamente tóxicas, como a putrescina e a cadaverina).
necimento d'água etc.".
Diante desse cenário, pode-se dizer que é impossível que o ho
O desenvolvimento, entretanto, com ênfase apenas no cresci mem viva e não degrade o meio ambiente. Aliás, a própria natu
mento econômico, tem agravado esse cenário, acelerando o pro reza se agride com seus vulcões (gases, cinzas, poeiras e lavas),
cesso de degradação ambiental e, consequentemente, da qualidade maremotos, tempestades, chuvas ácidas (alguns poluentes lança
de vida. dos na atmosfera reagem com os componentes dela, produzindo
Colocados esses elementos numa balança, fica evidente o pre novos produtos e fenômenos), decomposição de animais e vegetais
juízo que o meio ambiente vem sofrendo emnome da suposta sa mortos, etc., como antes se afirmou. Para isso, contudo, ela tem
tisfação de necessidades do homem, mais bení identificadas como mecanismos de absorção que reparam a degradação, até mesmo
busca incontrolada de ganhos financeiros. porque ela é insignificante diante da extensão da Terra. Não se
Entretanto, considerando a natureza jurídica do meio ambien pode deixar de atentar para o fato de que o homem tem agido de
te, qualificado peloequilíbrio ecológico, a tratar-se de um bem di forma a intensificar ou desregular esses fenômenos, proporcionan
fuso, pertencente à comunidade, esse cenário não pode prevalecer. do eventos de grandes dimensões, agravando a sustentabilidade,
como, por exemplo, com atividades que acarretam o derretimento
das geleiras.
2.2. Direito Ambiental; conceito, finalidade, Não adianta, assim, o conjunto legislativo que compõe o Direi
to Ambiental traçar normas proibindo degradar o meio. Sua fun
autonomia e princípios ção mais precisa é regular o que é permitido degradar, com vista
à garantia da sadia qualidade de vida e preservação de recursos
2.2.2. O conceito de Direito Ambiental ambientais para as gerações futuras, proibindo algumas condutas
que são totalmente evitáveis. Nesse sentido, as leis e regulamentos
Em face do que seexpôs no itemanterior, deve-se proporcionar respectivos indicam o quanto é permitido poluir, fixando limites
um esboço do conceito de Direito Ambiental, para permitir me máximos de emissão na água, na atmosfera e no solo. Da mesma
lhor compreensão do que adiante se escreverá. forma, proíbem desmatamentos em algumas regiões, permitindo
Normalmente, conceitua-se o Direito Ambiental, emlinhas ge- que eles sejam feitos em outras, ou que sejam efetuados mediante
raíç rOTiA cpnHn.o Ar\ ^
auLUiiiação c cuiitrulc uu órgão ambienral, reservando, corií isso,
homem, com vista à preservação do meio ambiente. proteção maior para aquelas hipóteses em que a supressão de ve
Entretanto, observando os comportamentos humanos, nota-se getação possa comprometer a sustentabilidade e a sadia qualidade
que, praticamente, tudo o que o homem faz degrada o ambiente, de vida, prejudicando as futuras gerações.
do momento em que nasce até a sua morte. Ele produz resíduos A proibição do desmatamento tem, normalmente, o objetivo de
orgânicos, poluindo as águas e o solo; constrói, destruindo o meio proteger a biodiversidade (reserva legal, prevista no art. 16, da Lei
•ty- Lições preliminares de Direito Ambiental 23
22 José Roberto Marques 'i-
<' ,

n°4.771, de 15-9-1965, que instituiu o novo Código Florestal) ou ses conceitos - e a legislação, consequentemente - para maior ou
de outro recurso ambiental (áreas de preservação permanente dos menor proteção ambiental, dependendo da opção que se faça para
cursos de água, que têm como finalidade principal a preservação o modelo de desenvolvimento. E certo que Constituição Federal
do recurso hídrico, e dos morros, que visam a evitar o deslizamen fornece os parâmetros para ele, determinando obediência a alguns
to de solo). •I- •"
princípios, como faz no art. 170, mas, mesmo assim, eles, em tese,
A Revista Época^^ cita, a propósito, uracaso relativo ao desma- Cr----' podem ser alterados.
•k.. A atividade econômica influencia o meio ambiente com o ritmo
taraento e suas conseqüências:
da produção e uso de recursos ambientais cujo custo normalmente
"O desmatamento ao longo do Rio Yang-tsé, na China, au não entra na composição do preço dos produtos.
mentou a erosão do solo, despejando na correnteza 2,4 bilhões O que não se pode fazer é delimitar demais os conceitos, sob
de toneladas de terra por ano. Entupido, o rio transbordou na pena de se engessá-los, impedindo sua aplicação diante de hipóte
estação das chuvas em 1998. O resultado foi devastador: 3.600 se em que se verifiquem novas constatações científicas, semcorres
mortos, 14 milhões de desabrigados e prejuízos da ordem de
pondente e oportuna alteração legislativa.
US$ 36 bilhões".
Diz-se, então, que Direito Ambiental é a disciplina que regula
O Direito Ambiental, então, tem por fim - menos do que proi a intervenção humana no ambiente (natural, urbano, cultural e do
bir toda forma de degradação - impor limites a ela. Ele se presta, trabalho), dispondo a respeito de condutas preventivas, reparató-
em última análise, a adequar as normas jurídicas às leis da natu rias e sancionatórias, e estabelecendo limites de degradação, com
reza, à Ecologia, com permissividade de degradação, mas no nível o fim de protegê-lo e, assim, permitir melhor qualidade de vida
suficiente para possibilitar o desenvolvimento sustentável. Estabe para as atuais e futuras gerações.
lece, portanto, um patamar mínimo de proteção. Esse processo de regulação da atividade do homem é feito por
Ele é uma disciplina embrionária do Direito. Os conceitos de meio de normas produzidas pelos órgãos legislativos competen
seus institutos não têm, muitas vezes, precisão adequada. Isso se tes, atentos às leis da natureza, das quais não podem se afastar; à
deve ao fato de que a legislação que lhe dá suporte, no Brasil, é Constituição Federal e aos princípios nela consagrados, explícita
bastante recente para os padrões de outras disciplinas jurídicas ou implicitamente.
e ainda não se consolidou, mostrando-se ora bastante dinâmica, Ramón Martín Mateo anota^^, referindo-se ao ambiente, que
porque evolui, e ora instável, porque não se define (como exemplo, "o Direito ambiental incide sobre condutas individuais e sociais
a vigente medida provisória n° 2.166-67, de 2001, que promoveu para prevenir e remediar as perturbações que alteram seu equilí
alterações no Código Florestal e que não foi apreciada pelo Con brio", acrescentando que deverá tratar de alterações de certa im
gresso Nacional até esta data"). portância, que não possam ser "reabsorvidas e eliminadas pelos
A amplitude de alguns conceitos, por outro lado, deve-se ao próprios sistemas". Ele entende que a determinação desse quadro
fato de que o Direito Ambiental depende, em parte, de conceitos é matéria difícil e problemática, "sobre a qual vai girar toda a
oriundos da Ecologia, os quais são influenciados e podem ser alte polêmica montada em torno da justificação das intervenções
rados na medida em que a pesquisa e a tecnologia permitem novos administrativas".
conhecimentos. As formulações econômicas podem pressionar es- Os níveis de contaminação devem ser previstos na regulamen
tação das leis, pelo Poder Executivo, pois se trata de prescrições
» RaioX do planeta, n»122.18-9-2000.
» Abril de 2010. rraífláodederecho ambiental, vol.I, p.89(tradução livre).
24 José Robeítto Mabques Lições preliminares de Direito Ambientai. 25

técnicas que estão sujeitas a ajustes mais rápidos, motivados por A eliminação de resíduos, de quaisquer espécies, nocivos ao
novos conhecimentos, tecnologia e peculiaridades do caso concre ambiente, à saúde e à qualidade de vida, e que não podem ser
to. Deve ser observado que é questão complexa, pois esses níveis absorvidos e reprocessados pelo ambiente sem conseqüência mais
podem e devem ser alterados na medida em que os conhecimentos grave, não pode gerar ônus para a coletividade, que não tem como
científicos permitam reenquadramento da situação. Ramón Mar- dever arcar com o custo da despoluição (considerando-se o amplo
tín Mateo, a respeito, consignou" que, dada a imprecisão quanto conceito legal de poluição, inscrito na Lei n" 6.938, de31-8-1981,
à nocividade e irreversibilidade da perturbação ambiental, os am que disciplina a Política Nacional do Meio Ambiente).' Oempreen
bientalistas propõem uma "margem de segurança que cubra riscos dedor é que tem, constitucionalmente, esse encargo.
previsíveis, mas ainda não detectados com precisão". Citem-se, como exemplo, três situações: 1) o lançamento isola
Essa proteção é dirigida, principalmente, para as futuras do do conteúdo de um vidro de agrotóxico num grande rio pode
gerações, que necessitarão do meio ecologicamente equilibrado configurar degradação ambiental, em reduzidíssima escala, e de
para usufruir de sadia qualidade de vida e, até mesmo, para sobre terminação de aplicação de normas administrativas que eventu
viver. Para as atuais, pensa-se que é mais dirigida à qualidade de almente existam para a hipótese, mas não justifica a incidência
vida, uma vez que, dificilmente, mesmo que se agrave o quadro de de normas ambientais de caráter civil e/ou penal, porque aquele
degradação, o ambiente vai comprometer a existência do homem. impacto negativo é absorvido pela natureza e não terá conseqü
As futuras gerações dependerão da quantidade e qualidade dos ências graves para a coletividade e para o meio ambiente^'^; 2) o
recursos ambientais existentes na Terra e, para que possam deles lançamento, por uma empresa, de resíduos líquidos e/ou sólidos,
dispor, em condições de consumo, é necessário que, desde já, se sem tratamento, em um curso de água, qualquer que seja sua di
jam mantidos sob controle os níveis de degradação, ajustados à mensão, não podeseraceito porquecausa dano de proporção con
capacidade de absorção pela natureza e à tecnologia disponível siderável (o caso concreto deve ser analisado tendo-se em vista
para eliminá-la. suas peculiaridades), exigindo-se aplicação de sanções civis (re
De qualquer forma, é importante acentuar que o Direito Am paratórias, se o caso, e indenizatórias, relativas aos interesses am
biental, ainda que possa gerar normas que coincidam com a pro bientais), administrativas e penais, desde que haja previsão legal
teção de'interesses privados, tem o fim de proteger o ambiente relativamente às duas últimas^ 3) a construção de uma usina hidre
como bem de uso coletivo, ou seja, como bem que, integrando o létrica, pelo Poder Público, gera degradação excessivamente gran
patrimônio público ou particular, tem seus benefícios revertidos de e grave para os recursos ambientais indicados na Lei n° 6.938,
também para a coletividade. Esta não pode suportar, mais do que de 31-8-1981, mas, diante da necessidade de produção de energia,
o razoável, o prejuízo ambiental gerado por ações que representam deve, de regra, ser aceita, observando-se a obrigação de que sejam
interesses particulares, empresariais ou mesmo governamentais. adotadas medidas com o fim de prevenir a ocorrência de mais efei
Estes últimos podem ser tolerados sempre que sejam previamente tos negativos do que os necessários, e reparatórias, tudo conforme
submetidos a estudos criteriosos e específicos (estudo prévio de a avaliação prévia do impacto ambiental. Adotadas as providên
impacto ambiental, por exemplo), considerando-sc incxistcncia dc cias licccssárias c cabíveis, negar realização de ato administrativo
alternativa técnica ou locacional; que sejam adotadas as medidas que autorize a construção é reconhecer o ambiente como absoluto
preventivas possíveis e reparatórias e, principalmente, que tenham e permitir que sua proteção prevaleça, sempre, sobre a geração
a finalidade de melhorar a qualidade de vida do homem.
Essa consideração não leva em conta acumulatividade de danos ambientais, que deverá seranalisada no
" Idem(tradução livre). caso concreto.
:• -.i •

26 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 27


•.vi
de insumos básicos para o homem. Esse entendimento se ajusta os aspectos do meio, previu-o como essencial à sadia qualidade de
à adoção da concepção antropocêntrica do meio ambiente, como vida, no caput do art. 225.
adiante se verá. A natureza fornece bens que são necessários para Ao indicar a sadia qualidade de vida, buscou não apenas a saúr
a vida humana; daí porque não pode permanecer intocada, exceto de - que é um de seus elementos - mas, também, condições favo
em casos em que a degradação comprometa o equilíbrio écológi- f: ráveis no trabalho, no meio urbano (o constituinte, ao dispor, no
co ou coloque em risco a existência de um ecossistema. O uso e ia art. 182, sobre a política urbana, refere-se à garantia do bem-estar
transformação dos recursos ambientais devem ser feitos, contudo, dos habitantes), assegurando, ao mesmo tempo, os direitos cultu
na medida do estritamente necessário, diante da inexistência de rais, tal como inscrito no art. 215, do mesmo texto: "O Estado
alternativa e com vista à reparação possível da degradação. f . garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso
Por fim, registra-se que Tércio Sampaio Ferraz Júnior^^ lembra i: às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização
que, para construir o sistema do Direito Ambiental, há que se es e a difusão das manifestações culturais".
tabelecerem alguns conceitos sobre estabilidade ecológica e polui
A Lei n° 8.080, de 19-9-1990, dispõe sobre as condições para
ção,entreoutros, considerando-se "normas referentes a atividades
a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o
e comportamentos múltiplos e distintos". Assim, esses conceitos
deverão ser interpretados levando-se em conta situações variadas, funcionamento dos serviços correspondentes, disciplinando a co
o que pode proporcionar decisões aparentemente contraditórias. laboração do sistema único de saúde na proteção do meio ambien
te (art. 200, VIII, da Constituição Federal), assim prevendo:
2.2.2. A finalidade do Direito Ambiental "Art. 2° A saúde é um direito fundamental do ser humano,
Foiiapossibilidadede comprometimento da vida do homem na devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu
Terra que despertou os mais variados setores da sociedade para pleno exercício. [...]
a produção legislativa, com o fim de proteger o meio ambiente.
Vislumbrou-se, num momento inicial, a sobrevivência. Mas se po Art. 3"^ A saúde tem como fatores determinantes e condicio-
dia verificar que ela não estava comprometida a curto ou médio nantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento
prazos, senão por meio da debilitação da saúde. Não ocorreria, básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o
portanto, a extinção da espécie, mas ela seria submetida a con transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais; os
dições ambientais desfavoráveis que lhe acarretariam sérios - e níveis de saúde da população expressam a organização social e
alguns irreversíveis - problemas de saúde. econômica do País", (grifo do autor deste trabalho)
O desenvolvimento da recente disciplina foi muito rápido e,
logo, avançou-se para a proteção da saúde. A esse respeito, regis A Lei n° 11.445, de 5-1-2007, que estabelece diretrizes nacio
tra José Celso de Mello Filho^'^ que a Constituição Federal de 1967 nais para o saneamento básico, reforça que a União deverá, entre
já tutelava o meio ambiente, embora por meio "da competência elas, observar a "melhoria da qualidade de vida e das condições
para legislar sobre defesa e proteção da saúde". ambientais e de saúde pública" (art. 48, V).
A Constituição Federal de 1988, contudo, evoluiu ainda mais Mas conceituar qualidade de vida é, indubitavelmente, recorrer
e, integrando no meio ambiente ecologicamente equilibrado todos a um critério subjetivo. Existem muitas variantes que concorrem
" Introdução ao estudo do direito, p. 96e 97.
para a formação do conceito, tais como a cultura do povo, suas
^ Constituição Federal anotada, p. 69. condições de vida, a expectativa de futuro, a economia do país e
Â
28 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiewal 29

a atual satisfação das necessidades que ele entende como básicas, Para ele^°, a qualidade de vida funciona "como uma determi
entre outras. nante para a instauração e manutenção de medidas adicionais ten
A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o dentes a evitar a maior incidência de condutas prejudiciais sobre
Desenvolvimento, de Estocolmo, de 1972, produziu uma declara o meio".
ção na qual - em seu Princípio 1 - procurou defini-la ao enunciar: De qualquer forma, o conceito está vinculado à idéia de satisfa
ção de necessidades do homem, nelas compreendidas o trabalho, a
"O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igual educação, a saúde, a vida social, a justiça, etc.
dade e ao desfrute de condições de vida adequadas em um meio Para José Eli da Veiga^^, "a qualidade de vida pode ser muito
ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna melhorada, a despeito dos baixos níveis de renda, mediante um
e gozar de bem-estar, tendo a solene obrigação de proteger e
programa adequado de serviços sociais".
melhorar o meio ambiente para as gerações presentes e futu
Colocado isso, resta analisar se a qualidade de vida é bem ju
ras". (grifo do autor deste trabalho)
ridicamente protegido. Para Ramón Martín Mateo^^ a resposta
Assim, indicou o contorno, sem, entretanto, apontar seu positiva supõe: a) condições mínimas do meio físico (que não se
conteúdo. confunde com o meio social, ainda que com ele esteja relacionado,
A Constituição Federal de 1988 ajustou, embora sem precisar pois este é produto de escolha pessoal); b) referência antropológica
expressamente o conceito de sadia qualidade de vida, o texto, do (existência de indivíduos ou grupos, também em relação às futuras
caput do art. 225 à Declaração de Estocolmo, documento me gerações); c) tutela do bem-estar (atendimento, pelo Estado, das
ramente programático que não integra o cenário legislativo. Im necessidades básicas); d) relevância da tutela ambiental (que não
plicitamente, deixou consignado que, para que ela se verifique, é seja uma opção, mas uma condição sine qua non para a quali
necessário que o meio ambiente esteja ecologicamente equilibrado. dade de vida): qualidade de vida e condições de vida não podem
Para Paulo de Bessa Antunes^', como a legislação não fornece confundir-se; e) conservação dos recursos renováveis (fauna, flora
seu conceito, "deverá ser preenchido casuisticamente, seja pela au e energia solar) e disponibilidade de acesso (a parques ecológicos,
toridade administrativa [.seja pela autoridade judiciária". Con por exemplo).
cluiu o aiitor que ambas deverão compreendê-la para orientar a A resposta positiva realmente se impõe e decorre do texto do
ação administrativa e a aplicação do direito. caput do art. 225, da Constituição Federal. Se a manutenção do
Ramón Martín Mateo^® assinala que "é inviável extrair das meio ambiente ecologicamente equilibrado é vista como essen
condições de tempo, lugar e cultura dominante o que se entende cial à sadia qualidade de vida, é indicativo de que o constituinte
por qualidade de vida, que exigirá juízos comparativos e a coinci entendeu-a como bem juridicamente protegido. Ou seja, busca-se
dência em determinadas bases", acentuando, ainda, que^' "é im alcançá-lo como forma de atendê-la: é seu fim último.
possível extrair conseqüências jurídicas concretas de compreen- Éinaceitável, dessa maneira, que a qualidade de vida possa re
sões da qualidade de vida excessivamente amplas". sultar, exclusivamente, do crescimento econômico. Ele, de forma
A A_Io
Avrv/-»
que, nesse pro-

" Danoambiental:uma abordagem conceituai, p. 167. " Op.dt.. p. 106(traduçãolivre).


" Tratado de derecho ambiental.voLI, p. 100(tiãduçáolivre) " Desenvolvimento sustentável ~odesafio doiécwloXXJ, Sandra AkemiShimadaKishirt aí(orgs.), p.41.
" Cp. cit,p. 101 (traduçãolivre). " Op. dt.. p. 102.
30 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 31

cesso, também seja protegido o meio ambiente em todos os seus Diante desse cenário, a harmonia do homem com a natureza é
aspectos e sejam atendidos os direitos individuais e sociais. imperativa. Não se exige que ele subjugue o ambiente para obter
Trata-se, como se vê, de conceito em evolução. Ele está voltado sempre melhor qualidade de vida, mas que ele o use e o preserve
para a satisfação de necessidades básicas (alimentação, habitação, para sempremanter a qualidade de vida em padrão que correspon
conforto, lazer, saúde, educação, etc.), longevidade, felicidade e da ao que foi constitucionalmente previsto e também para garan
realização pessoal. tir a existência da espécie.
A alimentação de hoje influenciará e pode indicar qual será a Más condições do meio, se não podem eliminar o homem da
qualidade de vida de uma pessoa no futuro. Aquela que é deficien face da Terra, hoje, podem, sim, comprometer sua qualidade de
te resultará em condições precárias de saúde, com irregularidades vida.
de natureza médica (cumulativas) e longevidade comprometida. Sônia Lopes^'*, adaptando texto de Jean Dorst, afirma que "a
Adverte, nesse ponto, o médico Paulo César Ribeiro^^: "As si natureza não deve ser salva para rechaçar o ser humano, mas sim
tuações são muito variadas e os exemplos numerosos, mas o im porque a salvação dela constitui a única probabilidade de sobrevi
portante é percebermos que o estado nutricional de um indivíduo vência material para a humanidade, devido à unidade fundamen
influencia muito a maneira pela qual ele supera ou não as doenças tal do mundo onde vivemos".
que a vida lhe impõe". A formulação, contudo, de qualquer ensaio referenteao concei
Então, fica fácil verificar como a alimentação influencia e po to de sadia qualidade de vida está vinculada, necessariamente, ao
derá influenciar na qualidade de vida de uma pessoa.Como todo conceito de dignidade da pessoa humana, fundamento da Repú
atleta deve ter um bom condicionamento físico para suportar as blica, nos termos do art. 1^, III, da Constituição Federal, o que,
competições, todos devem alimentar-se adequadamente para en em outro item, será analisado.
frentar as doenças que podem advir de vários fatores, entre eles o Não se pode descuidar de que a degradação ambiental está
genético, o ocupacional e o próprio ambiente físico. exigindo uma retomada do objeto inicial do Direito Ambiental,
A inoperância do Direito para garantir a sadia qualidade de que era a garantia, apenas, da sobrevivência do homem. É um
vida pode ser equiparada aosedentarismo que ocasiona problemas retrocesso motivado pela destruição de recursos básicos. Para
degenerativos nas pessoas, muitas vezes irreversíveis. É necessário que esse desfecho ocorra, ainda serão necessários alguns séculos,
que, durante a vida, o homem, além desealimentar corretamente, 1:- e isso, seguramente, não assusta a humanidade, que ainda não
submeta-se a atividades físicas. Estas correspondem, justamente, sente compromisso para com as gerações futuras. O homem tem
às características de dinamismo e evolução com que concorre o sido imediatista, esquecendo-se de que, sè as gerações anteriores
Direito. Sem elas, o Direito estaciona e deixa de sergarantidor dos tivessem degradado o ambiente com a mesma intensidade comque
direitos elementares do homem. se faz agora, a situação atual seria outra e ele estaria, certamente,
Qualidade de vida tem conceito de difícil mensuração, ainda lutando apenas pelo direito de viver.
mais porque é composto de outros cujos conteúdos evoluem (saú O objetivo do Direito Ambiental é, sem dúvida, a defesa do
de, transporte, educação, habitação, etc.). Mas todos estão rela meio ambiente voltada para a sadia qualidade de vida do homem
cionados com a sanidade do ambiente, que viabiliza que outros e para o equilíbrio ecológico. Não se trata de uma defesa intran
direitos sejam também usufruídos de maneira satisfatória. W- sigente, mas daquela que visa à proteção dos recursos naturais
necessários para a sua obtenção e do equilíbrio ecológico.
's
Saúde - entendendo asdoenças. Alfredo Salim Helito ePaulo Kauffman (orgs.), p.34. Bio, p. 536.
32 José Roberto Marques Liçõespreliminares de Direito Ambiewal
I 33

Pensa-se que não é possível delimitar mais especificamente seu • • normas administrativas para sua aplicação e, nem por isso, oDi
objetivo, porque isso depende do que a comunidade entende por í/
reito Tributário perde sua autonomia.
desenvolvimento em determinada época, de sua cultura, do seu Éforçoso reconhecer, contudo, que se trata de uma disciplina
padrão de produção e consumo, e do avanço tecnológico de que com uma multidisplinaridade incomum. Deve socorrer-se de todas
ela usufrui. as demais disciplinas do Direito (o que não éalheio ao sistema ju
Afirma-se, por fim, que o objeto do Direito Ambiental é o meio rídico), da Biologia, da Física, da Química, da Geografia, da Eco
ambiente; o objetivo, sua proteção, assegurando desenvolvimento nomia, da Engenharia Ambiental e da Florestal, da Sociologia e
sustentável e respeitando o equilíbrio ecológico. da Contabilidade (quantificação do dano ambiental), entre outras.
Ointer-relacionamento com outras disciplinas do Direito, tam
1.2.3. A autonomia do Direito Ambiental bém comum a elas, não retira sua autonomia porque esta não
existe em caráter absoluto. Nenhuma disciplina é tão autônoma
Discute-se a respeito do caráter autônomo do Direito Ambien
tal, não se uniformizando a doutrina quanto a esse entendimento.
a ponto de não necessitar de complementação de outra. Apene
A proposta, aqui, não.é apresentar uma solução para tão pro
tração do Direito Ambiental em todos os segmentos do Direito,
fundo tema. Mas entende-se, e desse pressuposto parte-se, que o
contaminando-os, justifica-se, também, pela necessidade de prote
ção dos interesses difusos, mesmo quando se depara com casos de
Direito Ambiental goza de autonomia, pois tem corpo legislativo interesses privados epúblicos. Éjustamente esse caráter que tem
próprio, embora não codificado, objeto e princípios que lhe são o princípio da horizontalidade, particular ao Direito Ambiental.
exclusivos.
Essa correlação do Direito Ambiental com outras disciplinas do
A Constituição Federal de 1988 disciplinou, de forma intensa e Direito não afasta asua autonomia. Aintercomunicação entre elas
específica, a proteção ao meio ambiente, contendo, até, norma de é decorrente do fato de que nenhuma delas pode existir isolada
direito material, o que reforça a idéia de autonomia: "Art. 225. § mente, necessitando, sempre, de informação, uma da outra.
3°. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambien Anatureza difusa dessa nova disciplina do Direito indica a sua
te sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções supremacia, pois cuida de bens, interesses e valores dos quais de
penais e administrativas, independentemente da obrigação de re pendem toda a coletividade enão apenas uma ou mais pessoas,
parar os danos causados" (grifo do autor deste trabalho). diferenciando-a daquelas que têm natureza privada ou pública.
O ambiente está amparado por um corpo legislativo amplo, Faz-se distinção dos interesses públicos em relação aos de natureza
que proporciona proteção de seus variados aspectos, contando, difusa porque ointeresse do Estado (administração pública) nem
inclusive, com um capítulo na Constituição Federal, o qual lhe deu sempre se coaduna com ointeresse da coletividade, aqui particu
particular contorno. larmente cuidando da questão ambiental. Assim se faz porque os
Pensa-se que o fato de o Direito Ambiental depender de normas administradores públicos, muitas vezes movidos por interesses po-
administrativas para sua aplicação (infrações e sanções adminisr lífiCO-í^lí^írrvro ucuLsucs, nao raras vezes,
trativas) não afasta a sua autonomia e nem o torna apêndice do sem considerar a exigência da proteção ambiental ou reduzindo-
Direito Administrativo. Isso ocorre, certamente, porque a admi -a. Apretensão de manterem-se no poder pode impeli-los a agir
nistração do meio ambiente cabe ao Poder Público; ele é seu ge contrariamente aos interesses e direitos difusos, lançando mão de
renciador. Ele se vale das normas administrativas na execução de expedientes que burlam, das mais variadas formas, aConstituição
seus atos. A propósito, as leis tributárias também dependem das e seus princípios, e as leis.
34 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 35

Bem porisso, a Lei ii° 6.938, de 31-8-1981, em seu art. 3°., IV, terística da grande pluralidade de titulares do mesmo bem. Esse
ao definir poluidor, possibilita que as pessoas jurídicas de Direito dispositivo reforça o entendimento de que o Direito Ambiental é
Público possam ser entendidas como tal. autônomo, pois expressa direitos e interesses que não se incluem
Por outro lado, o Estado-administração pode dispor, obedeci no âmbito das demais discipHnas do Direito (direitos e interesses
das as normas que regem a matéria, de um bem que lhe perten difusos relativos à proteção do ambiente).
ça, enquanto não pode agir dessa forma ao tratar dos recursos Trata-se - o Direito Ambiental -, então, de disciplina que goza
ambientais. Isso será amenizado com a aplicação do princípio da de autonomia.
sustentabilidade, da observância da dignidade da pessoa humana José Afonso da Silva^® prefere afirmar que ela tem acentuada
como fundamento da República e da constatação de que "a natu autonomia, "dada a natureza específica de seu objeto - ordenação
reza é a única fonte de matéria-prima para satisfação das neces da qualidade do meio ambiente com vista a uma boa qualidade
sidades materiais do Ser Humano"". O direito ao meio ambiente de vida -, que não se confunde, nem mesmo se assemelha, com o
não é absoluto: o caput do art. 225, da Constituição Federal, dis objeto de outros ramos do Direito".
põe sobre o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibra A discussão a respeito da autonomia, ou não, do Direito Am
do, norma de proteção que foi atenuada pelo art. 170, do mesmo biental não é questão que se restringe ao campo acadêmico, pois
texto. da conclusão pode resultar aplicação diversa. Isso porque, sendo
Para Juan-Cruz Alli Aranguren", "o direito ao meio ambiente autônomo, não está adstrito às normas básicas que orientam as
há de se exercer de forma compatível com os demais direitos huma disciplinas do Direito Público e o Direito Privado, fugindo dessa
nos, incluído o direito ao desenvolvimento". Lembra o autor" que dicotomia. Seu sistema não se confunde com o dò Direito Civil e,
portanto, as regras deste não se sobrepõem a ele.
"o Tribunal Europeu entendeu que a vida privada deve
Neste trabalho não se recorre a outras disciplinas do Direito -
desenvolver-se em um marco adequado de convivência e de re
exceto o Constitucional - para justificar e interpretar institutos do
lações que se vê perturbado pelas ações negativas para o meio
ambiente, quando afetam a pessoa e alteram sua vida privada,
Direito Ambiental, senão para elucidar algumas expressões jurídi
familiar e social, sua liberdade de escolha de domicílio, e pro cas cujo .dignificado ele não esclarece. Faz-se assim para reafirmar
sua autonomia.
duzem tratamentos desumanos e degradantes, de tal modo que
'a completa relação de direitos fundamentais se converte em
possívelvia de proteção ambiental'".
2.2.4. Os princípios que regem o Direito
Ambiental
O Código de Defesa do Consumidor conceitua como interesses
ou direitos difusos, "os transindividuais, de natureza indivisível, 2.2.4.1. O conceito de princípio
de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por cir
cunstâncias de fato" (art. 81, parágrafo único, I), diferenciando- Princípio, segundo registra Abbagnano^^, significa "ponto
-os, pois, completamente, dos interesses privados, com a carac- de partida e fundamento de um processo qualquer". Acrescenta
que Platão a ele recorria, com freqüência, no sentido de causa do
Eloy Fenker, AUatureza:fonte dematéria-pTÍma paraohomem?, disponível emhttp://www.ambiente- movimento.
brasiLcom.br/iioticias/index.php3?action=Ier&id=31911,25-6-2007.
DeidesarroUososteniblealasostenibilidad. Pensarglobalmenteyactuarlocalmente, Revista dederecho
urbanístico y médio ambiente, p.163 (tradução livre). " Direito ambiental constitucional, p.41.
Op. ciL, p.164 (tradução livre). " Dicionário de Filosofia.
36 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 37
-f
Os princípios, em Direito, não têm outro sentido. São propo tando que foi estruturado, principalmente, por meio da legislação,
sições, orientações que fundamentarão, informarão - no caso
o Direito Ambiental. São premissas das quais ele depende pará se
f! com estudos doutrinários ainda sem perquirição "dos princípios
desse Direito, que dominariam e informariam toda a disciplina".
estruturar. Deles devem derivar toda a legislação, pois a vinculam. Optou-se por acolher, neste estudo, os princípios gerais lem
Eles são enunciações que precedera a própria existência das brados pela doutrina espanhola, que estão ajustados ànossa legis
normas, cuja produção deve atendê-los; dão sustentação ao siste lação. Seguindo essa orientação, foram separados em duas cate
ma e permitem a determinação do sentido e alcance das expres gorias: os estruturais e os funcionais, adotando-se a classificação
sões utilizadas pelo legislador. Dessa forma, desrespeitá-los é mui empregada por Luis Ortega Álvarez^^
to mais que desrespeitar a própria norma. Estruturais são aqueles princípios que permitem a compreensão
Constituem a base, o alicerce do sistema jurídico, e tudo deverá das questões ecológicas e éticas, e ajustam-se bem à ideologia;
estar erigido segundo suas indicações. A verdadeira construção funcionais, aqueles que têm aplicação prática imediata, que são
jurídica é feita a partir deles, que a suportam. meios para melhorar a proteção ambiental e que têm previsão le
Os princípios de Direito Ambiental não podem se limitar a gal expressa.
sustentar o conjunto legislativo ambiental, mas, também, dada a Dentre os primeiros, apontam-se osdaglobalidade, da horizon-
capacidade de a degradação interferir em todos os aspectos da talidade, da sustentabilidade eda solidariedade. Dos últimos, sele
vida do homem, devem servir de orientação para o planejamento cionam-se os daprevenção, daprecaução edo poluidor- pagador.
e execução de políticas públicas, independentemente de previsão
legal expressa nesse sentido. 2.2.4.2. Os princípios estruturais
Eles regem o desenvolvimento, a evolução do Direito, e têm, 2.2.4.2.1. O princípio da globalidade
por suavez, origem nos anseios e necessidades de um povo, que os
elege para servir de base para as etapas seguintes do processo de O princípio da globalidade parte do pressuposto de que a de
produção legislativa. Assim, estão ajustados à sua cultura e refle gradação não se restringe ao local em que ela foi produzida, atin
tem, também, a situação econômico-social e cultural desse povo. gindo, muitas vezes, áreas muito distantes daquele sítio. A Terra é
Os princípios de Direito Ambiental tiveram suas origens nas corpo único, e a degradação atinge-a integralmente, embora não
conferências internacionais e acabaram incorporados pelos Esta se possa dimensionar a extensão dos efeitos, especialmente em
áreas mais distantes.
dos, que reconheceram a primazia do ambiente em relação aos
interesses públicos e privados. Muitos foram elaborados, e os dou- Daí emerge a necessidade de decisões globais, de um sistema
trinadores relacionam uma grande diversidade deles, indicando o jurídico que reconheça o direito ao meio ambiente ecologicamente
desenvolvimento da matéria. equilibrado como direito humano fundamental.
Alguns são, na verdade, especializações ou ramificações de ou Ramón Martín Mateo^^, a respeito dele, escreve:
tros. Ora estão expressos na Constituição Federal, e ora, implí "Uma reflexão elementar desde as ciências da natureza,
citos. Obrigam cm-qualquer dessas duas situações e constituem perfeitamente assimilável pelas ciências sociais, conduz inexo
regras que servirão para a elaboração e interpretação das leis. ravelmente a considerar a intrínseca inter-relação entre todos
Toshio MukaP" afirma que "o Direito Ambiental brasileiro
ressente-se de estudos que visem a sua sistematização", acrescen-
Leeciones dederecho dei médio ambiente, p.50.
" Díreifoambiental sistematizado, p. 34. Manual dederecho ambiental, p.44(tradução livre).
•fc:.',''

José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 39


38 r&r,.

os sistemas terrestres, traduzindo em termos científicos o an Nesse aspecto, podem-se citar as chuvas ácidas que são produzi
tigo adágio que recorda que todos os caminhos vão a Roma". das em centros urbanos altamente industrializados e atingem regi
ões vizinhas. Na Europa, é comum, dadas as pequenas dimensões
ADeclaração elaborada em 1992, quando da Conferência das territoriais dos países, um contaminar o outro com a chuva ácida.
Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, no Rio Juan-Cruz Alli Aranguren^^ acentua: "Evitar a degradação do
de Janeiro, que tinha por objetivo "estabelecer uma aliança mun meio ambiente desborda hoje o limite dos Estados para converter-
dial nova e equitativa mediante a criação de novos níveis de coo -se em uma necessidade universal, como o põem em relevo as de
peração entre os Estados", parte do reconhecimento da natureza rr I
clarações e tratados internacionais".
integral e interdependente da Terra (preâmbulo). Esse princípio é característico do Direito Ambiental, não ha
Luis Ortega Álvarez^^ explica: vendo, em qualquer outra disciplina do Direito, algum que a ele
"A globalidade nos indica que o fim ambiental de proteção, corresponda, ainda que com menos precisão.
conservação emelhora dos elementos que fazem possível a vida íf.' O princípio da globalidade adverte sobre a necessidade de cria
no planeta tem uma dimensão mundial, que os danos ao meio ção de mecanismos para evitar que nossa conduta possa atingir
ambiente afetam o conjunto dos seres humanos, tal como se toda a humanidade.
dizia com o símile dequeo baterdas asas de uma borboleta no 2.2.4.2.2. O princípio da horizontalidade
Japão pode desencadear um furacão na costa norte americana O princípio da horizontalidade, referido por Luis Ortega Alva-
- do Pacífico". rez^^, indica "que o meio ambiente pode afetar uma grande diver
O princípio da globalidade justifica a necessidade de coope sidade de políticas, da mesma forma que essas políticas devem ser
ração internacional para a proteção do meio ambiente justamen formuladas tendo-se em vista o marco ambiental"^L
te porque os efeitos da degradação avançam sobre os territórios Corresponde ao princípio da ubiqüidade, pelo qual a proteção
vizinhos, sem que se possa prever seus limites. "Reclama novas ambiental deve infiltrar-se em atividades de quaisquer naturezas,
formas de organização em escala mundial, o que põe em questão políticas públicas, e sua elaboração legislativa.
o dogma da soberania", segundo o referido autor. Para ele, "a Ubiqüidade, segundo registrara os dicionaristas, é a proprie
globalidade indica a existência de cadeias conexas de problemas dade do que está ao mesmo tempo em toda a parte. É justamente
ambientais, cuja solução somente pode ser abordada a partir de esse o cerne do princípio: a orientação de que, em tudo, deve ser
ações concretas, tal como reza o slogan 'pensar globalmente, atu considerada a proteção ambiental. Essa preocupação dei/e estar
ar localmente', mas ações concretas que estejam definitivamente em todas as partes.
conexas' !."34 Assim, ao elaborar uma norma, o Poder Legislativo deve estar
Esse princípio está justificado no caráter transfronteiriço da de atento à eventual repercussão da matéria (objeto da lei) no meio
gradação ambiental. ambiente e traçar normas que o protejam. Nesse sentido, o Código
O princípio da globalidade se ajusta à segunda lei física da ter de Defesa do Consumidor (Lei n° 8.078, de 11-9-1990), em seu
modinâmica, pela qual se tem como sua conseqüência a tendên art. 51, prevê que "são nulas de plenodireito, entre outras, as cláu-
cia da globalização da poluição, conforme Benedito Braga et aPK
Dd desaroUo sostenible aIasostenibilidad. Pensarglobalmentey actuarlocalmente, Revista dederecho
Lecciones de derecho deimédio ambiente, p. 51(tradução livre). urbanístico y médio ambiente, •p. 176 (tradução livre).
Op. cit., p.51 (tradução livre). Lecciones de derechodei médioambiente, p. 51.
Introdução à engenharia ambiental, p.8. Apud José Roberto Marques. Meio ambiente urbano, p.77.
40 José Roberto Marques Lições preumnares de Direito Ambiental 41

sulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços vida, medidas de proteção devem ser adotadas quando da execu
que: [...] XIV - infrinjam ou possibilitem a violação de normas ção de obras, projetos e atividades, pelo particular ou pelo Poder
ambientais", também conceituando como abusiva a publicidade Público, e da elaboração de quaisquer normas jurídicas. Não se
quedesrespeita valoresambientais (art. 37, § 2°.). pode admitir que estas, a qualquer pretexto, deixem de considerar
Outro exemplo está na Lei de Licitações {Lei n° 8.666, de 21-6- a obrigatoriedade de respeito ao direito ao meio ambiente ecologi
1993), que exige, para execução de obras, um processo licitatório camente equilibrado, pois a atividade legislativa está vinculada às
que se inicie com um projeto básico^^. Nele deverá ser considera normas constitucionais, especialmente àquela prevista no aludido
do, entre outros requisitos, o impacto ambiental (art. 12, VII). art. 225.
No mesmo sentido, a Lei n° 11.343, de 23.6.2006, que "institui Então, determinando a Constituição de 1988 que o direito ao
o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; meio ambiente ecologicamente equilibrado éessencial à sadia qua
prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e rein- lidade de vida e que todos têm direito a ele, implicitamente impõe
serção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece nor ("dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes efuturas ge
mas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito rações") à coletividade e ao Poder Público que, para a elaboração
de drogas; define crimes e dá outras providências". Em seu art. e execução de projetos, obras, atividades e normas jurídicas, res
32, trata da incineração de plantações ilícitas (§ 1°.), prevendo, peitem esse direito por meio de ações e vedações que protejam o
no § 3°., que "em caso de ser utilizada a queimada para destruir a ambiente.
plantação, observar-se-á, além das cautelas necessárias à proteção Esse princípio revela uma peculiar interdisciplinaridade, extra
ao meio ambiente, o disposto no Decreto n® 2.661, de 8 de julho vasando o campo jurídico e afetando políticas públicas, empreen
de 1998, no que couber, dispensada a autorização prévia do órgão dimentos, atividades profissionais eparticulares, efronteiras geo
próprio do Sistema Nacional do Meio Ambiente - Sisnama". gráficas. NoDireito, a aplicação se dápela consideração do caráter
Entende-se, hoje, que se trata do mesmo princípio - o da ho- difuso do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
rizontalidade e o da ubiqüidade -, de natureza estrutural e não Sobre o tema, Lylian ColtrinarP^, ao tratar das mudanças am
instrumental. bientais^ consigna: "...os problemas que ameaçam a sobrevivência
Canòtilho''^ refere-se a princípios jurídicos como "princípios da Terra não podem ser resolvidos de modo unilateral por qual
historicamente objectivados e progressivamente introduzidos na quer ramo isolado da ciência nem pór um só país ou conjunto de
consciência jurídica e que encontram recepção expressa ou im países".
plícita no texto constitucional". Essa orientação está evidenciada, Na Constituição Federal se constata o princípio da horizontali-
implicitamente, na Constituição de 1988, relativamente ao meio dade quando se verifica a comunicação entre a proteção ambiental
ambiente, quando, no art. 225, caput, ao prever o direito ao meio e a função social da propriedade (arts. 182, § T. e 186), a ordem
ambiente ecologicamente equilibrado, ressalva que eleé essencialà econômica (art. 170) e o sistema único de saúde (art. 200, VIII).
sadia qualidade de vida. Se ele é necessário à a sadia qualidade de 2.2.4.2.3. O princípio da sustentabilidade
O princípio da sustentabilidade consiste na necessidade de se
'Conjunto deelementos necessários e suficientes, com nivel de precisão adequado, paracaracterizar a limitar qualitativamente o crescimento econômico, com vista à
obraouserviço, oucomplexo deobras ouserviços objeto dalicitação, elaborado combasenasindicações qualidade de vida das atuais e futuras gerações, mantendo-se o
dos estudos técnicos preliminares, queassegurem a viabilidade técnica e o adequado tratamento do
impacto ambiental doempreendimento, eque possibilite aavaliação docusto daobraea definição dos
métodos e doprazo deexecução.-" (art 6'.,IX, daLein®,8.666, de21-6-1993). Ageografia física eas mudanças ambientais, Novos caminhos dageografia, Ana Fani Alessandri Carlos
Direitoconstitucional e teoria ia constituição, p. 1.090. (org.),p. 31.
• '

42 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 43


equilíbrio ecológico. A sustentabilidade ambientai é uma das ver de sustentabilidade adotada""^**. Como antes se disse, a sustentabi
tentes do desenvolvimento sustentável e deve ser conjugada com o lidade ambiental é uma vertente do desenvolvimento sustentável.
crescimento econômico e o progresso social. O desenvolvimento nacional (está implícito que é o sustentável)
Esse princípio complementa o da horizontalidade, mas tem um é objetivo fundamental da República Federativa do Brasil (art.
nítido marco ecológico. Ele se vale de conhecimentos das ciências 3°., II, da Constituição Federal) e objetivo último do Direito Am
naturais {Biologia,Física e Química, entre outras) para orientação biental como necessário para se proporcionar sadia qualidade de
geral. vida, motivo pelo qual se entende que não pode ser convertido em
-; "
Por ele, há uma purificação no processo produtivo (crescimento princípio.
econômico), impondo respeito ao direito de todos ao meio ambien Se o desenvolvimento sustentável é, assim, objetivo, não pode
te ecologicamente equilibrado. ser considerado princípio.
Não tem o vulto de interferir na economia, impedindo o de Sendo a sustentabilidade uma concausa do desenvolvimento
senvolvimento, mas nela intervém como fator limitante, buscando sustentável, dá-se ao princípio o nome de princípio da susten
impedir que o meio ambiente seja degradado mais que o neces tabilidade. A relação causa/efeito observada, embora não esgote
sário para o atendimento das necessidades humanas. Isso ocorre o tema das bases do desenvolvimento sustentável, permite-nos a
justamente porque os efeitosmaléficos da produção serão suporta distinção.
dos pelas atuais gerações, que usufruem do ambiente e dependem Referindo-se a Sachs, José Eli da Veiga^^ menciona: "No que
da qualidade ambiental, e pelas futuras, que necessitarão receber se refere às dimensões ecológicas e ambientais, os objetivos de
condições suficientes para efetivação do direito ao meio ambiente fís- sustentabilidade formam um verdadeiro tripé: 1) preservação do
ecologicamente equilibrado. potencial da natureza para a produção de recursos renováveis; 2)
A sustentabilidade, conforme registra Luis Ortega Álvarez'*^, limitação do uso de recursos não renováveis; 3) respeito e realce
"introduz no conceito de meio ambiente o caráter de direito limi para a capacidade de autodepuração dos ecossistemas naturais".
tado pelas necessidades básicas da economia e ao mesmo tempo O limite de autodepuração do sistema ambiental já foi vencido:
limitador de determinadas formas de crescimento econômico". não se recuperou o que estava degradado e continua-se poluindo
O princípio da sustentabilidade não corresponde a uma orienta o ambiente, em ritmo acelerado em alguns lugares. Resultado: a
ção de preservação, entendida como "proteção dos ambientes vivos consciência ambiental não funcionou; a existência de um siste
e de seus habitantes naturais evitando a interferência humana"''^, ma legislativo não foi suficiente para a contenção do processo de
mas de busca de equilíbrio entre ela e o desenvolvimento - produ degeneração da natureza. Faltou ação do Poder Público. Diante
zindo ura desenvolvimento sustentável -, de maneira a prolongar desse cenário, resta ao Poder Judiciário a intervenção, depois de
as condições para a sadia qualidade de vida. provocado.
Ele está consignado no caput do art. 225, da Constituição Fe A biodiversidade, por exemplo, tem sofrido um processo ace
deral, que busca assegurar sadia qualidade de vida, mediante um lerado de perda, motivado pela insustentabilidade de ações hu
meio ambiente ecologicamente equilibrado. manas, seja pela demanda ocasionada pelo aumento populacional
Prefere-se não o tratar como princípio do desenvolvimento sus ou pelo aumento de renda das pessoas. A devastação da flora.
tentável porque este "compõe-se das ações resultantes da política
IsabelSilvaDutrade Oliveira, iUtematívarpara a implementação da avaliação ambientalestratégica na
Leuionesde derecho deimédioambiente, p. 52(traduçãolivre). Brasil,p. 14.
« DavidBumie,Fiquepor dentroda ecologia, p. 9. *' Desenvolvimento sustentável - odesafio doséculo XXI, Sandra Akemi Shimada Kishi et al (orgs.), p. 171.
44 José Roberto Marques Lições pbeuminahes os Direito Ambispítal 45

que também atinge a fauna, tem sido provocada pelo aumento com que essa solidariedade tenha limite nos interesses nacionais,
de áreas com atividade agrícola (o que consome água em volume impedindo que deliberações, que não sejam nossas, tenham apli
muito grande e determina, com o tempo, perda de solo, em razão cação no território nacional. Entende-se que a soberania se im
de práticas insustentáveis) e pela extração de recursos naturais (tal põe, exigindo que o Estado, dentro de suas limitações e da política
como a madeira). Isso acaba produzindo efeitos negativos locais, que adotou, proceda aos ajustes necessários para a efetivação do
com repercussão em outros, em proporção que não se pode medir. direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, não se dis
Em países mais populosos, a busca de maior produção de ali tanciando, entretanto, do fato de que esse direito é considerado
mentos tem proporcionado significativa redução da biodiversida fundamental, de toda a humanidade.
de. Grandes áreas têm sido devastadas sob o pretexto de que de Não se pode admitir que um Estado tenha seu desenvolvimento
vera ser destinadas à produção de alimentos. comprometido pelo alto grau de preservaçãoambiental, exceto se,
Como observam Marcelo Dias Varella et al^^, a biodiversidade para isso, houver uma compensação adequada, desde que isso o
depende não apenas de fatores naturais, mas também da interfe permita sua constituição.
rência humana. A soberania constitui, pois, um fator limitante da solidariedade
De qualquer forma, esse exemplo e muitos outros são situações em relação a outros Estados, mas não impede ação coordenada
geradas pelo homem que afetara a sustentabilidade ambiental. com eles.
2.2.4.2.4. O princípio da solidariedade O princípio está inscrito como n° 7 na Declaração do Rio, com
o seguinte texto:
O princípio da solidariedade tem especial entrelaçamento com
os princípios da globalidade e da sustentabilidade, como acentua "Os Estados deverão cooperar com o espírito de solidarie
Luis Ortega Álvarez"^^, osquais somente poderão seralcançados se dade mundial para conservar, proteger e restabelecer a saúde
colocada em prática a solidariedade. e a integridade do ecossistema da Terra. Tendo em vista que
A necessidade de assegurar às gerações futuras a solução de tenham contribuído notadamente para a degradação do meio
seus problemas ambientais e desenvolvimento, como descreve o ambiente mundial, os Estados têm responsabilidades comuns,
autoras.só é possível a partir do prisma da solidariedade interge- mas diferenciadas. Os países desenvolvidos reconhecem a res
racional, que repercute nas condutas e impõe o dever de preservar ponsabilidade que lhes cabe na busca internacional do desen
os recursos ambientais; deve expressar-se, também, em termos de volvimentosustentável, em vista das pressões que suas socieda
compensação dos sacrifícios de desenvolvimento econômico que des exercem no meio ambiente mundial e das tecnologias e dos
fazem alguns grupos em benefício da proteção ambiental e de recursos financeiros de que dispõem".
ajuda naqueles casos em que não lhes seja possível a sustentação O princípio da solidariedade engloba o princípio da coopera
ambiental.
ção, queenuncia que nenhumpaís é autossuficiente, não consegue
Não tomado nesses termos, o princípio da globalidade - lembra se isolar e se manter ileso aos problemas ambientais que ocorrem
o autor ameaçado pelo.da soberania, deixaria de ter aplicação. cm outras partes uo muriuo, dc foiiiia que ha necessidade de tra
Contudo, a soberania é o primeiro dos fundamentos consagra balho conjunto, seja preventivo oureparatório. Também encampa
dos na Constituição Federal brasileira, em seu art. 1°., o que faz o princípio da notificação a respeito dos problemas ambientais
Biossegurança & biodiversidade, p. 21
ocorridos, pelo qual o país onde ocorreu o evento degradador
" Lecríonesde derecho dei médioambiente, p. 52
deve comunicar aosvizinhos e demais países quepoderão ser atin
" 0p.dt.,p.52. gidos pelo impacto negativo gerado.
46 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 47

O princípio da cooperação decorre, também, do disposto no para a proteção do meio, respectivamente, o estudo prévio de im
art. 4°., IX, da Constituição Federal, que prevê, como princípio pacto ambiental; a inversão do ônus da prova e a carga de respon
adotado pela República Federativa do Brasil, a "cooperação en sabilidade a que está sujeito o poluidor (na esfera criminal, por
tre os povos para o progresso da humanidade". Nesse progresso exemplo, com a prévia reparação do dano como requisito para a
pode-se incluir, sem esforço, o progresso referente à qualidade de extinção da punibilidade de delitos ambientais).
vida dos habitantes do planeta. Consuelo Yoshida Moromizato Yoshida^^ estabelece um crité
Referindo-se à solidariedade, Ramón Martín Mateo'^^ afirma rio para diferenciar os dois primeiros do último:
que sua importância "deriva-se das próprias exigências da justiça
distributiva". ''No caso da precauçãoiprevenção, parte-se de uma situ
A solidariedade se justifica pelo objetivo de não prejudicar a ação ambiental conhecida, sem degradação, residindo a difi
qualidade de vida das atuais e futuras gerações, o que lhe dá um culdade na previsão de toda a gama de impactos ambientais
caráter intergeracional. Mas também se refere às atuais gerações, positivos e negativos (diretos e indiretos; local/regional; ime
o que faz despertar o sentimento de cooperação entre os povos, diatos, de médio e longo prazos; reversweislirreverstveis). Na
reparaçãoirepressão, inverte-se o problema:parte-se de uma si
seja quanto à possibilidade de se evitar a degradação, seja quanto
tuação ambiental degradada conhecida, buscando, numa visão
à ajuda na reparação de eventos ocorridos.
retrospectiva, compará-la com a situação original, geralmente
desconhecida".
2.2.4.3..Os princípios funcionais
Chamá-se de princípios funcionais (ou instrumentais) aqueles 2.2.4.3.1. O princípio da prevenção
de cuja aplicação resulta, de maneira efetiva, proteção ambiental.
O princípio da prevenção é, segundo se entende, o mais impor
Diferentemente dos indicados como estruturais, que - pode-se di tante princípio do Direito Ambiental. Arelevância está situada no
zer - têm caráter ecológico, ideológico e ético, os instrumentais
fato de que, com sua aplicação, degradação maior pode ser evita
têm conteúdo suficiente para gerar, de forma direta, benefícios ao
da, admitindo-se tão-somente aquela que é inevitável, mas, mesmo
meio ambiente. Por eles - partindo-se de uma omissão ou ação
assim, dando-se a elatratamento adequado para minimizaçâo das
positiva (evitar ou minimizar o impacto negativo ou repará-lo/ conseqüências negativas.
indenizá-lo) - fica ampliado o campo de defesa, o que contribui, Embora sem indicação na Constituição Federal de 1967, já
finalmente, para a sadia qualidade de vida das atuais e futuras
estava consagrado, de forma genérica, na Lei n° 6.938, de 31-8-
gerações.
1981, que disciplina a Política Nacional do Meio Ambiente. Em
Luís Ortega Álvarez^® denomina esses princípios de funcionais seu art. 2°. estão enumerados os princípios em que ela se funda,
e define-os como aqueles "que orientam acerca de quais devem
de onde se pode extrair o caráter preventivo: racionalização, pla
ser os instrumentos mais idôneos para lograr o fim da proteção
nejamento e fiscalização do uso de recursos ambientais (incisos 11
ambiental".
e III), proteção dos ecossistemas (inciso IV), controle e zoneamen-
Dentre os princípios que têm essa função, destacam-se, para to das atividades potencial ou efetivamente poluidoras (inciso V),
aqui estudar, os princípios da prevenção, da precaução e do po- acompanhamento do estado da qualidade ambiental (inciso VII),
luidor-pagador. Eles indicam - por exemplo - como instrumentos

" Manual dederecho ambiental, p.48(tradução livre).


" Lecciones dederecho deimédio ambiente, p.53(tradução livre). " Tutela dosinteresses difusos e coletivos, p. 153.
48 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 49

proteção de áreas ameaçadas de degradação (inciso IX) e educa outro lado, que o administrador público possa dispor damaneira
ção ambiental (inciso X). que lhe convier, com desrespeito aos valores ambientais consagra
A atual Constituição, embora não o tenha definido - o que, dos nos textos legislativos de maneira explícita ou implícita.
diga-se, não é sua função -, forneceu seu contorno ao implici A proteção do meio ambiente pode resultar, também, da in
tamente consagrá-lo em alguns dispositivos. Assim, "o dever de terpretação a respeito de valores éticos previstos na Constituição
defendê-lo e preservá-lo [o meio ambiente ecologicamente equi Federal, tal como o fundamento da dignidade da pessoa huma
librado] para as presentes e futuras gerações" (art. 225, caput) é na^ que rege a República (art. 1®., III), e aqueles previstos no seu
indicativo suficiente da necessidade de aplicação do princípio da preâmbulo.
prevenção, o que se deve associar com o disposto no art. 225, § AAdministração Pública aplica - ou deveria fazê-lo - o princí
1°, IV^^. Com a adoção de medidas que objetivem evitar o dano, pio daprevenção quando licencia, permite, autoriza, concede, etc.
ou minimizar seus efeitos, quando inevitável, pode-se defender e e até mesmo quando, em fase posterior, fiscaliza o empreendimen
preservar o ambiente. Trata-se, então, da essência que orienta to to a que se referem as atividades e obras, evitando que, em caso
dos os demais dispositivos referentes ao tema. de desvio de execução do empreendedor, efeitos mais graves sejam
O § 1®., do art. 225, da Constituição Federal, aponta, expressa produzidos, hipótese em que pode embargá-las.
mente, instrumentos para a prevenção: o estudo prévio de impac O princípio da prevenção está impregnado em todo o texto
to ambiental (inciso IV) e a educação ambiental (VI). A utilização constitucional, notadamente quando, no art. 225, usa os verbos
desses meios também acarreta proteção ambiental, embora em defender e preservar. Ambos têm forte significado át prevenção.
dimensões diversas: o estudo prévio de impacto ambientai para No § 1°. desse dispositivo encontra-se indicação de outras ações
casos imediatos, que possivelmente (não se sabe se o Poder Público com mesmo sentido (preservar^^ controlar^^ e proteger"), além de
licenciará a atividade) ocorrerão num futuro próximo, e a educa dois instrumentos específicos: o estudo prévio de impacto ambien
ção ambiental, que gera benefícios a médio e longo prazos. tal" e a educação ambientaP^.
É inerente ao princípio da prevenção a constante revisão dos Costuma-se indicar os benefícios fiscais como instrumentos
conceitos científicos, ajustando-se-o aos novos conhecimentos. para se prevenir ou reduzir danos ambientais. Discorda-se desse
Uma atividade ou obra pode ser considerada passível de avalia posicionamento.
ção, tendo em vista o que se sabe hoje sobre suas conseqüências Valer-se do princípio da prevenção para pleitear ou conceder
para o meio ambiente. Contudo, advindo novos conhecimentos a benefícios fiscais em caso de desenvolvimento e aplicação de tec-
respeito do objeto da empreitada, caberá ao Poder Público exigir
adequação, impondo-se maiores restrições para futuros eventos,
sem prejuízo de adaptação daquele que no momento se explora I- preservar erestaurar os processos ecológicos essenciais eprover omanejo ecológico das espécies e
(prevenção quanto à maior degradação). ecossistemas; II- preservar adiversidade eaintegridade do patrimônio genético do Pais efiscalizar as
entidades dedicadas àpesquisa emanipulação de material genético".
Há sempre um mínimo de degradação na implantação de qual-
quci uuia uii auviuauc. X
j. T?: i J . r». j . _ •n.íi.i: . -
ü caigtj uu ruucj. x uuiicu uíscipiiiiâi
^produção, acom^erd^zaçâo eo emprego de técnicas, métodos esubstâncias que
.c...,.!. iC.uiiSuvyaifl 6 viua, d 4udlluailc de vida e o meio ambiente". '
Oque será permitido ou não. Dessa forma, a matéria transborda VII - proteger afauna eaflora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função
ecológica, provoquem aextinção de espécies ou submetam os animais acrueldade".
do campo jurídico para campo político, o que não significa, por exigir, na forma da Id, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de
significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará
Art. 225, § 1°., IV: "exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente publicidade".
causadora designificativa degradação do meioambiente, estudopréviode impactoambiental,a que se VI - promover aeducação ambiental em todos os níveis de ensino eaconscientização pública para a
darápublicidade". preservação do meio ambiente".
50 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 51

nologias limpas é fazer indevido raciocínio, com inversão do ônus Por ele são estimados os recursos ambientais existentes e sua
do empreendimento. if importância no ecossistema que será atingido, considerando-se as
A renúncia da receita de impostos, nessahipótese, corresponde variantes possíveis e os efeitos negativos para o ambiente. Tendo-
a destinar recursos públicos para beneficiar atividades privadas. t -se em vista que qualquer atividade ou empreendimento degrada o
Ao fazê-lo, a Administração Pública estará abrindo mão da ar meio, não se pode falar em impactos ambientais positivos, exceto
recadação que deveria ser aplicada em benefício da comunidade. se a intervenção se destina, exclusivamente, a corrigir um proble
Isso significa dizer, de outra forma, que o empreendedor utilizará ma ambiental já instalado por ação humana anterior.
o dinheiro proveniente da renúncia fiscal para custear sua ativida A doutrina não se definiu acerca do respeito, pelo Poder Pú
de, quando a lei - mais precisamente a Constituição Federal, no blico, ao resultado desse estudo, entendendo alguns autores que
caput do art. 225 - impõe a ele (empreendedor), também, o dever ele vincula a Administração Pública, de forma que ela não pode
de defender e preservar o meio ambiente. agir contrariando-o, devendo licenciar a atividade ou o empreen
O custo do desenvolvimento e aplicação de novas tecnologias, dimento para o qual foi exigido, no caso de ser favorável o estudo.
bem como o atendimento das normas que visam à defesa do meio Pensa-se que a opção contrária é a que mais se ajusta ao cenário
ambiente, cabe, em se tratando de atividade privada, ao empre jurídico vigente. Para tanto, é necessário que se recorra aos concei
endedor, e, indiretamente, ao consumidor, o qual, interessado no tos de atos administrativos vinculados e discricionários.
uso do produto ou no serviço, deverá pagar indiretamente pelo Os primeiros indicam que a Administração deva adotar um
custo ambiental. determinado procedimento frente a uma situação inteiramente
Reafirma-se: a redução de impostos, como incentivo à prote prevista no ordenamento jurídico. Assim, não deixa espaço de op
ção ambiental desenvolvida por pessoas físicas e jurídicas, não é ção ao administrador. Ele deverá, por força disso, adotar a única
constitucional. A sua implementação significa que toda a socieda solução prevista na lei ou nos seus regulamentos.
de acaba pagando pelo cumprimento de uma obrigação que é do Os segundos permitem que o administrador eleja a opção que
empreendedor. O caput do art. 225, da Constituição Federal, é lhe pareça mais ajustada à situação analisada, permitindo que es
claro ao afirmar que se impõe "ao Poder Público e à coletividade colha, entre as alternativas, aquela que melhor atenda aos interes
o dever de defendê-lo [meio ambiente ecologicamente equilibrado] ses da comunidade, frente aos recursos disponíveis e à necessidade
e preservá-lo para as presentes e futuras gerações". constatada. Daí, o gestor público pode escolher entre a construção
Dentre os instrumentos destinados à prevenção, reputa-se o es de uma escola e um posto de saúde, em um ou outro bairro, o
tudo de impacto ambiental, diante das circunstâncias preponde que fará segundo sua convicção quanto ao atendimento do inte
rantes hoje na comunidade (crescimento econômico e necessidade resse público maior. Adota, então, as regras da oportunidade e
de previsão de suas conseqüências, degradação inevitável e reali conveniência.
zação de atividades já conhecidas), o maisimportante instrumento Assim, se se entender que o administrador público está vincu
de proteção do meio. Por isso, dedicar-se-ão a ele, a seguir, algu lado ao resultado do estudo prévio de impacto ambiental, estar-
mas considerações. -se-á elevando-o à categoria de lei (genericamente considerada),
O estudo prévio de impacto ambiental é um levantamento de o que não é possível admitir, uma vez que a equipe multidiscipli-
dados com projeções a respeito dos efeitos potenciais da instalação nar que o elabora não tem competência para normatizar. Não se
de alguma atividade ou empreendimento e das alternativas possí pode se esquecer de que o estudo é contratado pelo autor da pro
veis para reduzir o trauma que será causado ao ambiente e tratar posta apresentada ao Poder Público para licenciamento (art. 8°,
das conseqüências negativas inevitáveis. da Resolução n° 1, de 23-1-1986, do Conselho Nacional do Meio
52 José Roberto Marques Lições preuminares de Direito Ambiental 53

Ambiente-CONAMA), ficando sujeito, dessa maneira, às pressões ta de procedimento com o fim de permitir uma degradação, mas
que essetipo de contratação pode ensejar. Se o estudo for realiza acercando-se do máximo de garantia para que ela não ultrapasse
do pelo Poder Público, também poderão ocorrer pressões de outra determinado nível considerado aceitável pela Administração. Pelo
ordem, visando à não execução do projeto, por motivos políticos estudo, o máximo de variantes possíveis de impactos negativos
ou particulares. Seria - admitindo-se a vinculação da Adminis deve ser previsto, assim como o tratamento que se lhes deve ser
tração ao resultado do estudo prévio de impacto ambiental -, em dado. É claro que, mesmo assim, não se tem a garantia de que
última análise, tornar privada a competência legislativa. outras conseqüências, não previsíveis diante da tecnologia hoje
Por outro lado, se se vinculasse o administrador, essa obrigação disponível e adotada, poderão ser observadas, com desfecho igual
adviria qualquer que fosse a conclusão do estudo referente à pro mente imprevisível. De qualquer forma, nesse caso, mesmo que
posta de atividade ou empreendimento, exigindo dele que, diante licenciada a atividade ou o empreendimento pelo Poder Público,
de resultado que comprometesse o ambiente, licenciasse o projeto, aquele que provoca a degradação fica obrigado a repará-la, admi
o que não se admite. tindo-se, somente, aquela antevista no estudo e, mesmo assim, se
O gestor público deve agir de acordo com o interesse maior ins for aceitável, observado o regulamento jurídico que rege a espécie.
crito no art. 225, caput^ da Constituição Federal, que deu a ele, no Essa tolerância justifica-se porque degradações ambientais sãoge
parágrafo único do mesmo dispositivo, os instrumentos necessá radas por praticamente todas as atividades que o homem exerce.
rios para a defesa e preservação do meio ambiente ecologicamente Não seimpede, dadaa natureza do bem em questão e da proteção
equilibrado. Assim, com o fim de proteger o meio ambiente, sendo ditada constitucionalmente, que se façam estudos complementares
o relatório de impacto ambiental desfavorável à pretensão, deve durante a execução do projeto ou se proceda a uma reavaliação,
ser acolhido pelo Poder Público. Diferentemente, sendo favorável, dadas as intercorrências.
deixa margem à Administração para a sua avaliação e comple- Por ele, busca-se evitar que sejam comprometidos os recursos
mentação, se for o caso. ambientais que devem estar disponíveis para as futuras gerações,
Tratando do estudo de impacto ambiental, Paulo Victor revelando-se, dessa forma, tentativa de prever as conseqüências
Fernandes^^afirma: negativas, quesurgirão no futuro, decorrentes de empreendimento
atual.
"O objetivo primordial desse instituto é possibilitar a esco Antes da Constituição Federal de 1988, jáhavia previsão para
lha da melhor alternativa para a implantação de um dado pro "a avaliação de impactos ambientais" como instrumento da Polí
jeto, com a compatibilização de todos os interesses envolvidos
tica Nacional do Meio Ambiente, no art. 9®, da Lei n° Ú.938, de
e que seja favorável ao meio ambiente. Aliás, o Estudo de Im
31-8-1981. A normatização relativa à matéria foi deferida ao Con
pacto Ambiental, embora tenha o objetivo de orientar decisão
administrativa, não tem o condão de afastar o dever da Admi
selho Nacional do Meio Ambiente-CONAMA, segundo o art. 8°.,
11, da referida lei.
nistração Pública de verificar a fundamentação desse estudo".
Dessa competência para normatizar, adveio a Resolução n° 1,
O estudo prévio"dc iiiípâCtO aiubicilLal, dc LúdoS OS iiiSLtUiiicú- dc 23-l-198o, qüc diSpOc Subrc "us critérios básicos e as diretri
tos colocados à disposição do administrador público para asse zes gerais para uso e implementação da avaliação de impacto am
gurar a efetividade do direito ao meio ambiente ecologicamente biental como um dos instrumentos da Política Nacional do Meio
equilibrado, é o que merece maior atenção, uma vez que se tra- Ambiente". Esse ato conceituou impacto ambiental, fixando,
exemplificativamente (ao consignar atividades modificadoras do
Impactoambiental- doutrina ejurisprudência, p. 124. meio ambiente, tais como...), as hipóteses em que o licenciamento
54 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 55

dependerá de elaboração de estudo prévio de impacto ambiental no caso de atividades e obras com significativo impacto ambiental,
e seu respectivo relatório, os quais devem ser submetidos à apro de âmbito nacional ou regionaF^".
vação de órgão estadual competente, e do IBAMA, em caráter Tendo-se em vista que devem ser compatibilizados o desenvol
supletivo. vimento nacional) como um dos objetivos fundamentais da Re
Pensa-se que aludido estudo, dentre os instrumentos entregues pública (art. 3°., II, da Constituição Federal), e a dignidade da
ao Poder Público para a efetividade do direito ao meio ambien pessoa humana, como um de seus fundamentos (art. 1°., III, da
te ecologicamente equilibrado, é justamente aquele que mais se Constituição Federal), o empreendimento não pode ser obstado,
amolda à necessidade de manutenção de um desenvolvimento competindo ao Poder Público a adoção de cuidados com o fim de
sustentável, em que sejam equilibradas as variantes econômica e que o ambiente seja mantido ecologicamente equilibrado para uso
ambiental. das presentes e futuras gerações, exceto se a sua execução com
Quando se exige o estudo é porque se está diante da seguinte prometer o equilíbrio ecológico e a sadia qualidade de vida delas.
situação:proposta de um empreendimento ou atividade que visará Ao prevenir a ocorrência de impactos negativos maiores do que os
ao crescimento econômico e causará impactos negativos, poten necessários para a implantação do projeto, ele estará cumprindo
cial ou efetivamente, ao meio ambiente, afetando "I - a saúde, a sua missão de garantir o desenvolvimento sustentável.
segurança e o bem-estar da população; II - as atividades sociais Ajustado a esses dispositivos encontra-se o art. 4°, da Lei n°
e econômicas; III - a biota; IV - as condições estéticas e sanitá 6.938, de 31-8-1981, recepcionado pela Constituição Federal, que
rias do meio ambiente; V - a qualidade dos recursos ambientais" determina que a Política Nacional do Meio Ambiente visará, entre
(art. 1°., da Resolução n° 1, de 23-1-1986, do Conselho Nacional outras hipóteses, "à compatibilizaçâo do desenvolvimento econô-
do Meio Ambiente-CONAMA). Assim, o estudo será necessário mico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e
para análise de alternativas e possíveis conseqüências ambientais do equilíbrio ecológico" (inciso I).
{possíveis porque não se sabe, exatamente, quantas e quais serão). A lei, ao assim dispor, esclareceu que o desenvolvimento sus
A degradação do meio é pressuposto de toda obra ou atividade tentável é a conciliação, a compatibilizaçâo das vertentes econômi
econômica e a Constituição Federal, em seu art. 225, parágrafo ca, ambiental e social. O crescimento econômico e a preservação
único, rv, exige o estudo prévio de impacto ambiental "para ins do ambiente têm como finalidade o atendimento das necessidades
talação de obra ou atividade potencialmente causadora de signifi sociais e a sadia qualidade de vida do homem.
cativa degradação do meio ambiente". Aqui, dois aspectos ainda O estudo prévio de impacto ambiental tem o significado am
devem ser considerados: o primeiro,que basta a potencialidade do plificado de diagnóstico. Por ele, tenta-se definir a situação atual
dano ambiental; o segundo, que elesejasignificativo. Ao fazer essa e, diante de evento certo no futuro (empreendimento, atividade,
previsão, o legislador admitiu, expressamente, que toda obra ou etc.), qual será o impacto para o ambiente, procurando meios de
atividade econômica gera impactos negativos ao meio, mas exige, evitar algumas conseqüências e reduzir outras.
de regra, apenas para aqueles de impacto significativo^ o estudo Na área médica, poder-se-ia compará-lo, mais precisamente,
prévio de impacto ambiental. com o acompanhamento pré-natal. Afirmam Mário Santoro Jú-
O § 4°., do art. 10, da Lein'^ 6.938, de 31-8-1981, com redação
dada pela Lei n® 7.804, de 18-7-1989, dispõe que "compete ao Lei n" 6.938/81, de 31-8-1981, art. 10, caputi "A construção, instalação, ampliação e funcionamento de
estabelecimentos eatividadesutUizadorasderecursosambientais, considerados efetivaepotencialmente
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Reno poluidores, bemcomo os capazes, sobqualquerforma,de causardegradação ambiental,dependerãode
váveis - IBAMA o licenciamento previsto no caput deste artigo. prévio licenciamento de órgão estadual competente,integrante do SistemaNacional do Meio Ambiente
' SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, em
caráter supletivo, semprejuízode outras licenças exigíveis".
56 Josi Roberto Marques
Lições preuminares de Direito Ambiental 57

nior e Mônica Vannucci Nunes Lipa/°; "Durante as consultas, razão para o adiamento de medidas economicamente viáveis para
será possível avaliar o histórico familial, identificar possíveis fa prevenir a degradação ambiental".
tores ambientais de risco, determinar o suporte nutricional e vita- Ensina Paulo Affonso Leme Machado" que "o princípio da
mínico e a necessidade de se realizarem exames complementares. precaução aconselha um posicionamento - ação ou omissão -
Algumas medidas devem ser tomadas mesmo antes de ocorrer a quando haja sinais de risco significativo para as pessoas, animais
gestação". e vegetais, mesmo que esses sinais não estejam perfeitamente de
O que faz o estudo prévio de impacto ambiental é tentarprever monstrados". O princípio, segundo o autor^^, "não se aplica sem
a extensão da degradação que ocorrerá, sugerindo execução de um procedimento prévio de identificação e avaliação dos riscos".
ações para evitar o que puder ser evitado e planejar a forma como Na avaliação de risco - segue —"incerteza científica nãoé justifica
será tratado o que for inevitável. É uma forma, então, deadminis tiva para esclarecer totalmente a questão, devendo ser investigado
trar parte das conseqüências que advirão do empreendimento ou o fato de haver pelo menos indicadores de risco, possibilidades
da atividade, diante do fato de quesão inevitáveis. Relativamente à de interpelação fornecidas por fatos conhecidos"". Os riscos, de
degradação inevitável, poder-se-ia compará-la com a pressão alta acordo com Ulrich Beck, referido por ele®% "que estão atualmente
ou o diabete do ser humano, que, de regra, bem administrados, no centro das preocupações, são mais freqüentemente riscos que
não acarretam mal maior. O problema não tem cura (degradação não são visíveis, nem tangíveis, para as pessoas que a eles são ex
inevitável), mas deve ter tratamento adequado (medidas para mi postos, riscos que, algumas vezes, não têm efeito sobre as pesso
nimizar o impacto negativo). as interessadas, mas sobre seus descendentes". Sobre a avaliação,
Para a sustentabiHdade e, consequentemente, para o desenvol insiste^^:
vimento sustentável, o planejamento é adequado para prever as
perdas e ganhos de determinada ação, seja para a produção, seja "Na avaliação de riscos, são analisados os riscos e os danos
para a proteção ambiental. A partir de então, poder-se-á falar em certos e incertos, previstos e não previstos no projeto. Essas
ganhos e perdas sociais e ocorrerá, afinal, a avaliação do desen análises hão de levar em conta os valores constitucionais de
volvimento (partindo-se do fato de que ele implica crescimento cada país, onde, na maioria das vezes, já está inserido o direito
econômico, planejar é permitir a harmonização entre a proteção a um meio ambiente ecologicamente equilibrado e um direito
ambiental e o crescimento econômico). ao meio ambiente sadio, daí decorrendo a aceitação ou não
De tudo, pode-se vislumbrar a importância do estudo prévio aceitação dos riscos e dos danos".
de impacto ambiental para a efetivação do princípio da prevenção. As decisões das autoridades - aponta o autor" -, tomadas em
2.2.4.3.2. O princípio da precaução razão da possibilidade deriscos, sãoprovisórias, pois aguardam o
O princípio da precaução foi destacado pelo art. 15 da Decla surgimento da certeza. Afirma:
ração do Rio sobre meio ambiente e desenvolvimento: "Com o fim
de proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deverá ser
amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capa Oprincipio daprecaução e a avaliação de riscos. Revista dos JYibunais (separata), v. 856. fevereiro de
2007, p. 36.
cidades. Quando houver ameaça de danos graves ou irreversíveis, Op. dt.. p. 43.
a ausência de certeza científica absoluta não será utilizada como Op. cit., p. 43.
Op. dt.. p. 45.
Genética-doenças hereditárias, Saúde - entendendo asdoenças, Alfredo Salim Helito ePauloKaufiman Op. dt.. p. 46.
(coords.), p. 9. Op.dt..p.48.
58 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambienial 59

"Sob o ângulo da busca da segurança jurídica, há de ser mas não temos certeza científica de referida ligação, então é
ponderado que essas decisões não sejam definitivas, pois bus de aplicação o princípio da precaução, do qualse pode esperar,
cam sanar problemas advindos da incompletude de dados cien em termos gerais, uma moratória que permita realizar mais es
tíficos. Quando esses dados forem adequadamente conhecidos, tudos e assim descartar a ameaça ou avaliá-la quantificando o
as medidas advindas da aplicação do princípio da precaução risco para tomar medidas de prevenção frente ao mesmo".
serão adaptadas às novas informações, isto é, poderão ser man
tidas ou modificadas". O princípio da precauçãocontém uma noção de incerteza quan
to ao conhecimento científico a respeito de determinada atividade.
Alfredo Marcos^^, sobre o princípio da precaução, adverte: "A E essa incerteza poderia ser interpretada como insegurançajurídi
deliberação prudencial, entretanto, apresenta alguns 'problemas'. ca, o que exige uma reforçada compreensão a respeito da matéria.
Basicamente, trata-se de que é falível, não garante nada e às vezes Para essetrabalho, é necessário considerar que, em matéria am
nossas ações, por mais que sejam o resultado da prudência, podem biental, não se pode tomar o fato degradador isoladamente, pois
produzir efeitos distintos dos buscados". ele repercute em outros tempos e lugares, dada a natureza trans-
A avaliação que se faz, então, para a aplicação desse princípio, fronteiriça da degradação e, muitas vezes, da lenta evolução dos
é baseadana incerteza que as ciências proporcionam com relação seus efeitos.
aos conhecimentos necessários para implantação de nova ativi Deve ser considerada, ainda, a baixa precisão das normas am
dade, obra ou tecnologia, diante da possibilidade de ocorrência bientais, o que se ajusta à necessidade de adaptação célere (por
de graves ou irreversíveis danos ambientais. A certeza de que se meio da regulamentação das leis e da interpretação), diante de
desfruta atualmente é resultado dos conhecimentos que até agora novos conhecimentos científicos, dispensando, dessa forma, novas
se tem,^os quais estão sempre sujeitos a ajustes, na medida em elaborações legislativas.
que novas tecnologias surjam e novas pesquisas sejam realizadas Tudo isso, em última análise, leva a uma idéia inicial de que
(muitas vezes com resultados opostos àqueles que se adotam como o princípio não tem precisão suficiente. Marcelo Balicki^®, con
corretos). Ela representa um momento e está sujeita a correções. tudo, elucida a questão: "O princípio da precaução não tem por
Sua interpretação exige que eventuais atividades impactantes objetivo garantir o impedimento último de todo e qualquer dano,
- para as quais se exigirá a aplicação do princípio da precaução mas contribuir para o estabelecimento ex ante de um alto nível de
- sejam consideradas não apenas frente às necessidades das atuais proteção".
gerações, mas, também, das futuras. Assim agindo, está-se prepa Sobre o princípio apontam-se três correntes, que divergem so
rando o ambiente para que elas possam usufruir de sadia qualida bre as conseqüências da sua aplicação: (1) maximalista, que con
de de vida. siste na inversão absoluta do ônus da prova; (2) minimalista, que
Alfredo Marcos^® indica qual é a decorrência da aplicação de não determina a inversão do ônus da prova, apontando que ele
mencionado princípio: deve servir como mera referência; (3) intermediária, que exige um
"É dizer, quando existem indícios de que alguma de nossas mínimo de razoabilidade científica para a determinação da inver
atuações pode desencadear um perigo ou dano considerável, são do ônus da prova.

" Precaución, ética ymédio ambiente. Responsabilidad política y médio ambiente, J.M» Garcia Góraez-
Herasy CarmenVelayos (eds.), p. 164(tradução livre).
" Op.ciL, p. 167. " Op.cit.,p.l62.

-B
60 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambieotal 61

Marcelo BalickF'' afirma, ainda, que o critério deve ser o da Essa a grande inovação do princípio da precaução. A dúvida
probabilidade, o que contribui para a efetividade do princípio da científica, expressa com argumentos razoáveis, não dispensa a
precaução. Esclarecedor prevenção".

"Uma vez constatada a necessidade de uma determinada Complementa o autor''^:


atividade que detenha um potencial poluidor, deve-se, então,
buscar soluções que possam eliminar ou minimizar os riscos
"A implementação do princípio da precaução não tem por
existentes. Verificadas todas as opções possíveis, a escolha da finalidade imobilizar as atividades humanas. Não se trata de
melhor alternativa deve pautar-sepelo que é mais adequado do precaução que tudo impede ou que em tudo vê catástrofes ou
ponto de vista político, técnico, econômico e ambiental".
males. O princípio da precaução visa ã durabilidade da sadia
qualidade de vida das gerações humanas e à continuidade da
Daí, conclui que surge a idéia de proporcionalidade. Escreve^^: natureza existente no planeta".

"A avaliação das medidas deveincluir um quadro completo O princípio da precaução está intimamente unido ao direito
sobre as vantagens e os custos de qualquer natureza das ações da comunidade à informação. Somente por meio da revelação de
geradoras dós riscos e medidas de precaução concebidas, reco informações a respeito de novas tecnologias que serão aplicadas
nhecendo também o caráter prioritário das exigências de pro é que se poderá analisar quais as providências a serem adotadas
teção de saúde pública". pélo Poder Público, inicialmente, e pela coletividade, em caráter
principal ou subsidiário, por meio do PoderJudiciário. O sigilo e
Jean-Marc Lavieille, citado por Paulo Affonso Leme Macha-
o segredo industriais devem se limitar ao campo em que não há
dod^; completa: "O princípio da precaução consiste em dizer que
prejuízo para comunidade, considerados o meio ambiente, a saúde
não somente somos responsáveis sobre o que nós sabemos, sobre o
e o bem-estar.
que nós deveríamos ter sabido, mas, também, sobre o de que nós
Ramón Martín Mateo'^, sobre o direito de acesso à informação
deveríamos duvidar".
ambiental, afirma:
Trata-se, lia verdade, do princípio da prevenção qualificado
pela falta de plena certeza científica, com possibilidade de ocor "O direito à informação constitui um prius para qualquer
rência de danos graves ou irreversíveis, com a nota de que a au outra ação reinvinàicativa ou controladora das intervenções
sência de certeza científica absoluta não pode impedir a adoção de da Administração, incluindo a utilização de distintivos que ga
medidas de proteção ao ambiente. rantam o bom comportamento ambiental das empresas e dos
Leciona Paulo Affonso Leme Machadod"*: produtos por elas fabricados, incorporando, assim, usuários e
consumidores ao controle dos agentes econômicos".
"Em caso de certeza do dano ambiental, este deve ser pre
venido, como preconiza o princípio da prevenção. Em caso Sobre o tema, em outra obra, escreve^:
de dúvida ou de incerteza, também se deve agir prevenindo.
O direito quã' sui/iúriãrnéfité enunciamos [o uiraiiu ^eral
Op.cit, p. 157. .
a obter informações da Administração], refere-se à habilitação
Op.cit.,p. 160.
Op.cit.,p. 161. " Op.cit., p. 56.
ApudPaulo Affonso Leme Machado. Direito ambientalbrasileiro, p. 65. Manual de derecho ambiental, p. 125(traduçãolivre).
Op.cit, p.65. " Nuevos instrumentos para Iatutelaambiental, p. 163 (tradução livre).
62 José Roberto Marques Lições preliminares de DiRErro Ambiental 63

legal cidadã para conseguir que a Administração comunique- Embora sem conceituá-lo, a Lei n° 11.105, de 24-3-2005, regu
-Ihes ou facilite as informações de que dispõem, em seus regis lamentando os incisos II, IV e V, do § 1°, do art. 225, da Consti
tros e arquivos, compartilhando com eles, com certas limita tuição Federal, e dispondo sobre a Política Nacional de Biossegu-
ções, suasdisponibilidades e dados.A institucionalização desse rança, inscreveu-o em seu art. 1°.:
direitosupõea préviaadoção do princípio de transparência no
trabalho administrativo, a paulatina eliminação dos segredos "Esta lei estabelece normas de segurança e mecanismos de
públicos até os limites em que isso seja possívele a abertura dos fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, a ma
controles indiretos da Administração pelos administrados". nipulação, o transporte, a transferência, a importação, a ex
portação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o
Para a Administração Pública, o princípio da precaução está re consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de orga
gulado pelo poder vinculado, ou seja, ela deve agir de acordo com nismos geneticamente modificados - OGM e seus derivados,
a previsão legal, não se tratando de mera discricionariedade, haja tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área
vista que a necessidade de proteção ambiental decorre da lei e da da biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saú
Constituição Federal. Diante do fato a ser concretizado, ela deve de humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da
exigir demonstração, com base nos conhecimentos disponíveis e precaução para a proteção do meio ambiente", (grifo do autor
deste trabalho)
estudos complementares possíveis, que dele não resultarão danos
graves ou irreversíveis. Ao fazer referência, simplesmente, à expressão princípio da
Esse princípio foi inserido no cenário legislativo brasileiro pelo precaução^ sem explicá-lo, entendeu o legislador que o seu conteú
Decretom® 2.652, de l°-7-1998 (Convenção-Quadro das Nações do já estava devidamente esclarecido no Direito positivo, de forma
Unidas sobre Mudança do Clima), em seu art. 3, princípio 3: que é de conhecimento de todos o que se entende por ele.
Comparando o princípio da precaução com o da prevenção,
"As partes devem adotar medidas de precauçãopara prever,
pode-se dizer que o primeiro, dada a incertezacientífica a respeito
evitar ou minimizar as causas da mudança do clima e mitigar
da matéria questionada, sugere um perigo abstrato (as pesquisas
seus efeitos negativos. Quando surgiremameaças de danos sé
poderão demonstrar que a dúvida a respeito da degradação era
rios ou irreversíveis, a falta de plena certeza científica não deve
infundada), enquanto que o segundo aponta um perigo concreto
ser usada como razão para postergar essas medidas, levando
(a degradação ocorrerá, devendo ser perquirido o que deve e o que
em conta que as políticas e medidas adotadas para enfrentar
pode ser evitado, ao mesmo tempo em que se deve indicar o trata
a mudança do clima devem ser eficazes em função dos cus
mento que será dado à degradação inevitável).
tos, de modo a assegurar benefícios mundiais ao menor custo
possível...". 2.2.4.3.3. O princípio do poluidor-pagador I
Este princípio consiste em atribuir ao poluidor'® a obrigação de
No preâmbulo - sem força de lei, portanto -, ele constou da reparar os danos ambientais causados. Não se trata de permitir
Convenção sobreDiversidade Biológica (promulgada peloDecreto poluição mediante prévio ou posterior pagamento. Por ele, todo
xf 2.519, de 16-3-1998), cora a seguinte redação: "As Partes Con aquele que poluir deve ser responsabilizado.
tratantes, [...] Observando também que quando exista ameaça de
sensível redução ou perda de diversidade biológica, a falta deplena
" Poluidor, deacordo com o art. 3'., IV, da Lei n® 6.938, de31-8-1981, é °apessoa física ouJurídica, de
certeza científica não deve ser usada como razão para postergar direito público ouprivado, responsável, diretaou indiretamente, poratividade causadora de degradação
medidas para evitar ou minimizar essa ameaça". ambientai". .. ..
64 José Roberto Marques
LiçOes prelimínares de Direito Ambiental 65

Antes de sua invocação - e bem por isso que não pode ser en visão legal nesse sentido) e demandará reparação em espécie e/ou
tendido como permissão mediante indenização aplicam-se os indenização.
princípios daprevenção e daprecaução, de forma a sempre se evi Acumulatividade decorre da utilização, no dispositivo, da con
tar a degradação ou minimizar os seus efeitos nocivos.
junção aditiva e entre penais e administrativas, e do uso do ad
Ele tem caráter repressivo, embora, por ameaçar de aplicação vérbio independentemente, que, no texto, tem a mesma função
de sanções, também tenha um aspecto preventivo-, se poluir, será '•i:
daquela.
responsabilizado. O§ 1 ., do art. 14, da Lei n° 6.938, de 31-8-1981, recepcionado
Ramón Martín Mateo^' afirma que o Direito Ambiental, ainda pela Constituição Federal de 1988, dispõe: "Sem obstar a aplica
que dotado de dispositivos sancionadores, tem objetivos funda ção das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado,
mentalmentepreventivos. Escreve: independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar
certo que a repressão leva implícita sempre uma voca os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por
ção de prevenção enquanto o que se pretende é precisamente, sua atividade...". Indicou, portanto, com relação ao aspecto civil,
por via de ameaça e admonição, evitar que se produzam as que vigora a responsabilidade objetiva.
hipóteses que dão lugar à sanção, mas no Direito ambiental a O pagamento a que se refere o princípio deve ser entendido,
coação 'a posteriori' resulta particularmente ineficaz, por um primeiramente, como a tentativa de reparação do dano. Diz-se
lado, enquanto que por terem produzido já as conseqüências, tentativa porque não se sabe se as ações a serem executadas se
biológica etambém socialmente nocivas, a repressão poderá ter rão suficientes para, efetivamente, restabelecer a situação anterior,
uma transcendência moral, mas dificilmente compensará gra comos mesmos benefícios ambientais antes gerados. Como exem
ves danos, talvez irreparáveis, o que ê válido também para as plo, pode-se citar o reflorestamento de uma área desmatada, na
compensações impostas imperativamente. Osefeitos psicológi qual, durante muito tempo, não será reproduzida a biodiversidade
cos da sanção ou da compensação-sanção encontram-se aqui existente anteriormente®".
muito debilitados, já que, como se observou, as sanções costu
mam ser de reduzido montante, sendo habitualmente preferí Aeliminação total ou parrial de uma floresta -rimitiva é um impacto negativo de diflcil edemorada
vel para os poluidores pagara multa que cessar suas condutas recuperação. Aperda de biodiversidade será sempre significativa, considerando-se otempo que ana
ilegítimas". tureza levou para deixá-la naquela situação. Ainda que se admita que isso seja possível, dois problemas
se acentuam: 1. otempo para tanto será tão dilatado que não será possível que as presentes gerações
eas mais próximas (considerados muitos séculos ou milhares de anos) não poderão usufruir de seus
O princípio do poluidor-pagador está vinculado à noção de benefícios! 2. durante operíodo de degradação houve um impacto negativo para o ecossistema, com
responsabilidade. A Constituição Federal, expressamente, con repercussão parao meio ambiente emgeral, quenão poderá seravaliado, ou melhor, nãohá conheci
mento científico suficiente para que se possa dimensionar aperda ambiental resultante dessa conduta,
sagrou-o no § 3". do art. 225, quando dispôs que "as condutas mas se sabe que ela ocorre edeita raízes em todos os aspectos. Dessa forma, arecuperação nunca será
e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os total, mesmo se admitindo atentativa de restauração dos processos ecológicos presentes na formação
florestal.
infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e admi As florestas podem ser comparadas ao corpo humano, sem qualquer dificuldade, para efeito de se enten
nistrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos deroefeito, para elas, de degradações. Ocorpo humano tem células que se sucedem, com vigor cadavez
menor, dando enseio ao processo de envelhecimento. A« flomstaQ taTBbém. Cada vez que uma cobertura
causados''. Deixou evidente, inclusive, que a responsabilização florestal eespécies as sucedem, elas terão um menor índice de biodiversidade enão produzirão, acurto
é cumulativa, ou seja, um fato que gerou degradação ambiental prazo, os benefícios que aanterior formação florestal proporcionava (o envelhecimento, ao contrário do
corpo humano, não leva àmorte, mas àobtenção de melhores resultados ambientais).
pode configurar infração penal e/ou administrativa {se houver pre- Elida Séguin (O direito ambiental: nossa casaplanetária, p. 74) cita dilema proposto por Octavio Mello
Alvarenga: 'uma floresta será melhor aproveitada com aretirada da madeira ou sua utilização mais
aconselhável será um manejo que assegure maior fornecimento de água para fins domésticos, comuni
Tratado dederecho ambiental, v. I,p.93(tradução livre). tários ou industriais? Amata deveria ser derrubada, para darlugar auma pastagem?".
Refenndo-se i floresta. Eugene Pleasants Odum {Ecolo^a, p. 4) escreve: "O antigo conhecimento
66 José Roberto Marques Lções preliminares de Direito Ambiental 67

Vencida a possibilidade de reparação do dano, recorre-se à in podem sersocializados, distribuídos para a sociedade, devendo ser
denização. Aqui surge um problema de difícil solução, mas que considerados, também, quando da composição dos custos depro
não a inviabiliza. Do tema, tratar-se-á adiante. dução, com a finalidade de financiar a recuperação do ambiente,
Tratar de reparação do meio ambiente é tratar de incerteza e restabelecendo o seu equilíbrio.
de impossibilidade de constatação integral do dano e da própria 2.2.4.3.4. O princípio do poluidor-pagador II: a reparação do
reparação. Quando ocorre um fato degradador, qualquer que seja dano ambiental
a sua natureza, pode-se afirmar que ele ocorreu. Porém, não se
A reparação do dano ambiental é problema que aflige os eco-
pode indicar exatamente quais foram suas conseqüências para o
ambiente, dado que a poluição tem caráter transfronteiriço e não
logistas e os estudiosos do Direito. Não se pode dimensionar a
se tem conhecimento científico para avaliar sua dimensão. Mas
extensão do dano e, consequentemente, não sepode assegurar que
isso não inviabiliza a reparação ou a indenização, haja vista que,
qualquer medida visando ao restabelecimento da situação anterior
quanto ao mínimo, pode-se estimar o prejuízo causado. produza os mesmos efeitos benéficos que antes o meio produzia.
Também deve ser considerado que, normalmente, há um perío Justamente por isso é que se prefere dizer tentativa de reparação
do dano.
do de latência, durante o qual a degradação continuará se proces
sando, vindo a se consumar de maneira muitas vezes imprevisível. O que se deve buscar, na verdade, é o máximo na minimização
A propósito, David Rall, então diretor do National Institute of dos danos apurados, porque alguns, que sepode chamar de efeitos
Environmental Health Sciences, citado por Vitor Bellia", tratan colaterais, não são constatados pericialmente. A repercussão do
do do período de latência relativamente aos efeitos da degradação dano no ecossistema local e mesmo em outros distantes - dado
gerada'ao meio ambiente, observa: "O período de latência (tempo o caráter transfronteiriço da poluição - é de difícil verificação e
que decorre entre a exposição inicial e o efeito) de doenças como o dimensionamento.
câncer e distúrbios genéticos comuraente varia de 10 anos a uma Assim, deve-se buscar a reparação imediata do que está evi
ou mais gerações". denciado, se for possível essa operação. Não se podendo fazê-lo,
No que se refere à responsabilidade quanto ao patrimônio cul deve ser estabelecido umrazoável cronograma derecuperação que
tural, o § 4°., do art. 21ú, da Constituição Federal, prevê, expres prestigie o meio ambiente, pois ele, ecologicamente equilibrado,
samente, que "os danos e ameaças ao patrimônio cultural serão é bem de uso comum do povo. Nesse caso, o interesse econô
punidos, na forma da lei". Assim, a ação popular e a ação civil pú mico não pode constituir-se em barreira para o restabelecimento
blica, sem prejuízo das medidas de caráter administrativo e penal da situação anterior. Não se pode esquecer que, normalmente, o
que devam ser adotadas pelo Poder Público, prestam-se à recupe poluidor, quando o provocou, não atentou para o fato de que o
ração dos danos e, também, para evitar que eles possam ocorrer. ambiente ecologicamente equilibrado é de uso comum, e o direito
O fundamento para o princípio do poluidor-pagador é o fato a ele, irrenunciável para todos. E, normalmente, ele causa o dano
de que a recuperação dos danos causados pela degradação não para obter alguma vantagem pessoal, o quepermite, então, que se
exija seu sacrifício financeiro para poder ser restaurada a situação
anterior.
popular de que a floresta é mais do que uma mera coleção de árvores é realmente um prindpio
operacional básico da ecologia". Consigna-se que eventual formalização de compromisso de re
José Eli da Veiga {Desenvolvimento sustentável - o desafio do século XXI, Sandra Akemi Shimada
Kishi et al (orgs.), p. 71} lembra que*o declínio demuitas sociedades esteve ligado a processos erosivos
paração do dano (compromisso de ajustamento de conduta, se
decorrentesde devastação florestal". gundo o § 6°. do art. 5°., da Lei n° 7.347, de 24-7-1985) não ex
Introdução à economia do meio ambiente, p. 35. tingue a obrigação se, durante sua execução, for constatado que
68 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 69

as providências previstas e adotadas não foram suficientes para se A reparação do dano ao meio ambiente, quanto ao seu dimen-
atingir o objetivo de repará-lo integralmente. Isso porque a repara sionamento, admite comparação com um acidente de veículo.
ção não se esgota na formalização e no cumprimento do compro Ocorrendo um evento dessa natureza, vários aspectos patrimo
misso, mas na efetiva reparação do dano (parte final do § 3°., do niais são observados: 1) o dano material; 2) a desvalorização do
art. 225, da Constituição Federal), ainda que, com relação a este, bem, e 3) o lucro cessante, aqui considerado o período em que
não se possa assegurar sua dimensão. Mas, em todas as situações, ele esteve impossibilitado de ser útil ao proprietário como instru
medidas devem ser adotadas com essa finalidade. mento de trabalho, ao que se pode incluir, para desenvolvimento
Existe uma variante que normalmente não é considerada: entre do tema, a impossibilidade de ser útil como meio de transporte.
a data do fato e a data da tentativa de reparação do dano houve, Poderá, também, ser cabível o reconhecimento de danos morais.
efetivamente, um prejuízo para o meio ambiente. Pode-se chamar Para que se possa desenvolver o raciocínio, compara-se o ve
esse dano de intercorrente, fazendo analogia com a prescrição pe ículo ao meio ambiente, entendendo-os, para esse efeito, como
nal com mesmo nome. equivalentes.
Por exemplo: uma área de um quilômetro de mata ciliar (área Se uma pessoa tem seu automóvel vitimado em um abalroa-
de preservação permanente, de acordo com o art. 2°, a, da Lei n° mento, tem direito a ter reparados os danos sofridos. Assim, quem
4.771, de 15-9-1965, que instituiu o novo Código Florestal), des- os causou deve repará-los e, na impossibilidade de fazê-lo, por
matada há dez anos e que foi utilizada, durante esse tempo, para completa descaracterização do objeto (perda total), deve indenizar
a agricultura ou outra forma de exploração econômica, ou mesmo o proprietário do veículo.
recreativa. Transportando essa situação para o meio ambiente, verifica-
O proprietário, nesse caso, por meio desupressão da vegetação, -se idêntica responsabilidade. Quem causou o dano deve repará-lo
bem "de interesse comum a todos oshabitantes do País" (art. 1°, (recomposição de área depreservação permanente, por exemplo) e
do Código Florestal), ocasionou umprejuízo para o meio ambien indenizar a comunidade, titular do meio ambiente ecologicamente
te e, assim, para a comunidade. Disso não há qualquer dúvida. equilibrado (art. 225, caput, da Constituição Federal), somente
Mas falta a determinação do quantum. A dificuldade de se me quando for totalmente impossível a recomposição. Nesse último
dir o dano intercorrente não pode servir de argumento para se caso, encontra-se a situação em que há derrubada de uma árvore
abandonar a indenização referente ao período que decorreu da sua declarada imune de corte pelo Poder Público, em virtude de sua
efetivação (dano) até o término da recuperação. E nem por isso se condição de porta-sementes, nos termos do art. 7°, do Código
pode falar que ele é presumido. Ele é real, de acordo com as Ciên Florestal®^. Essa hipótese retrata situação em que a recomposição
cias naturais, e não pode ser compensado, embora o restabeleci direta do dano será impossível.
mento da vegetação possa ser feito. No caso concreto, deve o juiz O segundo aspecto a ser analisado é o da desvalorização do
valer-se da opinião de um perito, o qual sugerirá um critério - ain bem. O veículo que foi atingido, ainda que tenha sido recupera
da que não seja suficiente, dada a imprecisão dos dados - para se do fisicamente, sofreu uma desvalorização que será considerada
estabelecer um valor que corresponda àquele dano intercorrente. flnondr* Af Ctto ^ y±v»^riCLaj.iO oierece-io
1„
No caso proposto, durante o período de exploração irregular, à venda, encontrará uma avaliação desfavorável diante de outra
a vegetação deixou de ser útil à terra querevestia (reconhecimento
dado pela Lei n° 4.771, de 15-9-1965), permitindo lenta e grada
tiva degradação do recurso hídrico que ela protegia, além da não Art. 7», da Lei n" 4.771. de 15-9-1965, queinstítuiu onovo Código Florestal: 'Qualquer árvorepoderi
manutenção das formas de vida que abrigava (biodiversidade). ser declarada imune de corte, mediante ato do Poder Público, por motivo de sua localização, raridade,
belezaou condição de porta-sementes°.
70 José RoBeBio Marques Lições preliminares de DiRErroAmbiental 71

que se faça frente a um veículo na mesma situação, mas que não autores com vantagem econômico-financeira à custa do ambiente
tenha sido vitimado por colisão. ecologicamente equilibrado, que é bem de uso comum do povo.
Essa desvalorização, interpretada em termos ambientais, exige Essa indenização refere-se, em síntese, ao período em que o de
que o causador do dano reponha financeiramente essa deprecia gradador usou irregularmente o meio ambiente. É, justamente, o
ção. E o pagamento, em dinheiro, que, somado ao valor da repa tempo em que os serviços prestados pelo bem ambiental não pôde
ração do dano, fará a recomposição completa do bem danificado. ser usufruído pela comunidade {todos), sua titular, tendo em vis
Acrescenta-se um valor em moeda corrente, ou mesmo outra situ ta o fim a que ele se destina: proporcionar, essencialmente, sadia
ação adicional de proteção ao ambiente, de forma que, juntando- qualidade de vida. E, por essencialmente, entenda-se a contribui
-se as duas situações, poder-se-á afirmar que, em tese, houve a
ção mais importante, o que não indica, portanto, exclusividade
efetiva reparação do dano. No caso do desmatamento, há perda (porque, para esse caso, concorrem outros fatores que extravasam
de biodiversidade, o que justifica a indenização pelo dano supor
o campo ambiental).
tado ou o ônus de situação equivalente que aumente a proteção do
Assim, ocorrendo um dano ambiental, o seu causador estará
meio ambiente. O bem ambiental, em relação ao qual o dano foi
sujeito:
recomposto, no caso, não prestará, de imediato, os mesmos ser
a. à reparação específica (restabelecimento da situação anterior),
viços que a vegetação antes ali instalada prestava. É, na verdade, ou à indenização, no caso de impossibilidade de reparação;
uma redução da qualidade ambiental, ainda que temporária (não
sepode dizer quanto tempo, entretanto). b. à indenização correspondente ao valor que, acrescido à repa
Mas ainda persiste outro aspecto, no caso do acidente de veícu ração, restabeleça o valor originário do recurso ambiental;
lo, que pesa sobre o proprietário do bem lesado: a sua inutilidade
pará as ocupações habituais (atividades sociais e domésticas) ou c. ao pagamento pelo serviço ambiental que deixou de ser pres
para o desenvolvimento de seu trabalho profissional (taxista, por tado (dano intercorrente), referente ao período em que, antes
da reparação, persistiu o dano e, assim, causou diminuição
exemplo), durante os dias em que ele esteve no conserto. Quem
da qualidade ambiental.
causou o dano deve pagar as despesas adicionais que o proprie
tário teve para a execução de suas normais atividades (aluguel de Poderá, ainda, o causador, ser responsabilizado por dano
outro automóvel, por exemplo), ou mesmo pela ausência de recei moral eventualmente caracterizado (art. 1°., caput, da Lei n° 7.347,
ta, diante da possibilidade de exercício profissional. de 24.7.1985).
No campo ecológico, impõe-se o reconhecimento do ônus que É certo, contudo, que converter as reparações emindenizações
sofreu a sociedade, pois ela deixou de desfrutar, ainda que não se não é coisa fácil e nem há fórmula para tanto. E, ainda que se
possa quantificar, de um ambiente em condições mais favoráveis, tentasse criar uma, as variantes seriam tantas que a conversão se
de tal forma que o causador do dano deva indenizar pelo decrés ria impossível. Há necessidade de que sejam consideradas as pe
cimo qualitativo do meio, observado da data do fato até a data da culiaridades de cada caso, quando se terá em conta a extensão
recomposição (da tentativa de recomposição, melhor dizendo). Isso do território atingido, eventual imprestabilidade de algum recurso
impedirá que o degradador obtenha ganho com a não descoberta ambiental, reflexos para a fauna e flora, conseqüências para a saú
de sua conduta ou com a demora em se apurá-la, administrativa e de humana, etc. É uma atividade demasiadamente complexa e que
judicialmente. Nada exigir pelo correspondente ao lucro cessante implica contribuição de profissionais de várias áreas do conheci
é estimular ações dissimuladas ou bem escondidas, premiando os mento. Tratando-se, por outro lado, de pequenas degradações, a
72 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 73

situação pode ser resolvida com o estabelecimento de regras mais propriedade, ainda que estejam isoladas, a situação impõe análise
simples. mais criteriosa.
No que se refere às indenizações referidas nos itens b t c, não Também pode ser citado o exemplo daquele que desmata 0,1
precisam, necessariamente, ser representadas por dinheiro. É ad hectare de mata ciliar, por exemplo, para construir um rancho.
missível, tendo em vista a busca pela melhoria da qualidade am Embora a área seja diminuta, trata-se - para argumentar - de re
biental, que sejam representadas por ações adicionais que contri gião em que a prática é rotineira. Assim, se se admitisse que todos
buam para sua efetivação. os proprietários pudessem fazê-lo, dada a reduzida repercussão,
Um importante detalhe deve ser também observado: naqueles surgiria um resultado com grande impacto negativo, pois se es
casos em que há impossibilidade de restabelecimento da situação taria admitindo a supressão daquele tipo de área de preservação
anterior, além do pagamento pelo dano, que deverá ser canalizado permanente.
a um fundo estatal de reparação de interesses difusos lesados, a Analisa Vitor Bellia®'^:
área degradada deve ter seu uso inviabilizado, mediante ação be
néfica ao meio ambiente, sob pena de se admitir que o seu autor "Certamente, as modificações ambientais e acidentes, em
acabe premiado^ obtendo a área que pretendia utilizar economi escala regional, são bem mais fáceis de visualizar e sentir (ou
camente e transportando, para outra região, o ônus que recaía seja, de calibrar) do que aqueles deduzidos a partir de modelos
sobre aquele território, o que pode, até mesmo, comprometer o matemáticos em escala planetária. Deve-se, entretanto, dedi
equilíbrio ecológico da região. Assim, quando de eventual tran car atenção aos somatórios das modificações (solos agrícolas
sação ou de compromisso de ajustamento de conduta, devem ser levados pela erosão, reduções de estoques pesqueiros, conta
estabelecidas a indenização e a ocupação do espaço degradado minações de águas, de solos, do ar, de alimentos), que podem
com atividade ambientalmente recomendável. levar comunidades e até países inteiros ao rápido empobreci
mento, ou à eliminação de oportunidades de enriquecimento".
Quanto às dimensões do dano ambiental, não se pode interpre
tá-lo isoladamente quando pareça reduzido. Devem ser considera Na avaliação dos danos, deverá ser considerada, também, a
das as múltiplas infrações da espécie que ocorreram e ocorrem, o vulnerabilidade das espécies.
que pode indicar dano muito extenso. A natureza sempre sofreu impactos, causados por ela mesma e
Acumulatividade de pequenos danos gera um dano de grandes pelo homem. Contudo, ela é dotada de mecanismos de absorção,
proporções que, muitas vezes, compromete o meio ambiente e a desde que os danos não sejam significativos.
sadia qualidade de vida do homem. Por esse motivo, não se pode Ocorre que não basta mais que os impactos sejam significativos
ignorar, de regra, pequenas infrações ambientais. A afirmativa in para impedir que a natureza não os reprocesse. A cumulatividade
versa depende das características particulares do caso concreto. de pequenos danos acaba inviabilizando que a natureza desempe
Se uma pessoa elimina um exemplar de árvore, num contexto nhe sua função de autossanear-se, pois esgota a sua capacidade de
em que esse comportamento é isolado, e o espécimenão conta com regeneração. A capacidade de assimilá-los é limitada, embora se
uma.nrotecão esnecial®^, a devrada'"ã'^ "5
vãmente. Entretanto, se o agricultor corta várias árvores em sua o que não impede, contudo, a prevenção.
Com população bem reduzida, relativamente aos dias atuais,
havia demanda muito menor de recursos ambientais, em sua for-
« Como, porexemplo, as árvores declaradas imunes de corte, por ato do PoderPúblico, nos termos do art.
7»., daLei n*' 4.771/65, "pormotivo de sua localização, raridade, beleza ou condição de porta-sementes". Introduçãoà economia do meio ambiente, p. 38.
74 José Roberto Marques
Lições preliminares de Direito Ambiental 75

ma bruta ou processada. O crescimento populacional em ritmo Não tem aquele verbo, dessa forma, o limite restrito de mero
acelerado exigiu que essa demanda fosse ampliada, gerando maior restabelecimento da situação anterior, pois, se o fosse, estaria con
produção agrícola e industrial, e, consequentemente, maiores da sagrada a expressão popular de que o crime compensa. No exem
nos ao meio ambiente, em todos os seus aspectos. Aumentou a plo citado antes, de desmatamento mantido durante dez anos, a
pressão por recursos ambientais. Não bastasse o ingrediente da infração à lei ambiental teria compensado para o agente degra-
multiplicação populacional, o homem, com seu desenvolvimento dador porque ele explorou economicamente área de vegetação de
e diante de novas tecnologias, criou novas necessidades, impondo preservação permanente que não podia explorar, obtendo ganho
devastação ainda maior.
financeiro em benefício próprio e causando prejuízo ao meio am
Observa Vladimir Passos de Freitas®^ que, "na verdade, a re biente ecologicamente equilibrado.
paração busca colocar o bem ambiental ofendido no seu estado Nessa hipótese, ressalta-se que todas as propriedades têm fun
anterior, o que nem sempre é fácil ou mesmo possível". ção social, nos termos do art. 5°., XXIII, da Constituição Federal,
José Rubens Morato Leite®^ lembra:
o que permite que os proprietários as usem, mas desde que não o
H.â, assim, que seavaliar quando sefaz surgir a quebra de façam em prejuízo dos interesses maiores (difusos) da comunidade.
equilíbrio da qualidade ambiental, quer na capacidade atinente A Lei n° 6.938, de 31-8-1981, que dispôs sobre a Política Na
ao ecossistema, quer na sua capacidade de aproveitamento ao cional do Meio Ambiente, prevê (art. 4°., VII, parte inicial) que
homem easua qualidade de vida, isto é, oexame da gravidade esta visa, entre outras hipóteses, "à imposição, ao poluidor e ao
do dano ambiental éelemento necessário para a reparação". predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos cau
sados". Esse texto refere-se à possibilidade de cumulação entre
Écerto que o§1°., do art. 14, da Lei n° 6.938, de 31-8-1981, recuperação e indenização, quando a situação o comportar (dife
prevê que é o poluidor obrigado, independentemente da existên rentemente, caberá apenas indenização quando a recuperação for
cia de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio impossível).
ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade". Esse texto •v'"' Esse objetivo da Política Nacional do Meio ambiente deve ser
pode sugerir, à primeira vista, que cabe indenização - ou - repa considerado na análise de todos os demais dispositivos da lei. Ele
ração (restabelecimento da situação anterior) do dano. j: orienta toda a atuação do Poder Público no que se refere à questão
Contudo, deve ser feita uma interpretação sistemática arespei ambiental.
to desse tema, o que afasta, a nosso ver, a alegação de que o Poder Não se pode pensar que a reparação do dano à flora possa
Público (Executivo eJudiciário) deve optar por uma das alternati restringir-se à mera tentativa de restabelecimento da situação an
vas: indenização ou reparação. terior. Basta imaginar-se que a sucessão de exemplares da flora
Primeiramente, a parte final do § 3°., do art. 225, da Constitui segue o mesmo processo que as células humanas. Estas são substi
ção Federal, refere-se a reparar os danos causados. Muito embora tuídas durante toda a vida, mas as novas não nascem com a mes
o legislador constituinte tenha utilizado o verbo reparar^ assim o ma vitalidade das anteriores. Com a flora, pode-se afirmar que os
fez para se referir à responsabilidade civil^ em paralelo com a res novos exemplares não têm o mesmo vigor e não geram os mesmos
ponsabilidadepenal e administrativa. benefícios que aqueles suprimidos, promovendo, dessa forma, me
nos serviços ao homem. A equiparação com a situação anterior
poderá demandar séculos de espera. A recuperação, ainda que
AConstituição Federal eaefetividade das normas ambientais, p. 179. pareça integral, não produzirá no ambiente o mesmo efeito que
Dano ambiental: do individual ao coletivo exírapatrimonial, p. 108. produzia a geração anterior.
76 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 77

Não é possível dimensionar o dano ambiental, dado o caráter que se poderá chamar - em verdadeiro contrassenso - de direitos
transfronteiriço da degradação e, também, em razão das inúmeras de poluir.
variantes que podem ocorrer e do caráter dinâmico do meio am A falta de oportuna atuação pode ocasionar mais danos que
biente. As Ciências não têm condições de oferecer critérios para não podem ser eliminados pelos sistemas naturais, com repercus
uma precisa avaliação. O que ocorre, normalmente, é que a quan são de elevado ônus, principalmente para as futuras gerações. É
tificação acaba restringindo-se ao que é visto, constatado de ime como se, para se beneficiar em casos atuais, se fizesse um emprés
diato, ficando sem materialização a repercussão para o ambiente, timo e deixasse para os herdeiros pagarem-no.
no que se refere às conseqüências em outras regiões e em épocas Nas hipóteses em que a intervenção negativa já tenha ocorrido,
futuras. Alguns danos podem manifestar-se muito tempo depois deve ser considerada, sempre, para efeito de medidas reparatórias,
do fato gerador, o que impossibilita a medição atual do impacto a completa reversibilidade à situação anterior.
causado. Depois, verificar-se-á, nesse caso, a incapacidade de se A reparação do dano também está no centro das discussões relati
demonstrar o nexo causai entre algum impacto negativo e o fato vas ao desenvolvimento sustentável. As degradações podem ocorrer
gerador. por causas naturais, mas o homem tem contribuído decisivamente
Nesse aspecto, referindo-se às mudanças ambientais, Lylian para que elas seintensifiquem. Dequalquer forma, a reparação deve
Coltrinari®^ observou: "As mudanças de menor amplitude e efei ocorrer, seja por conta do particular ou pelo Estado (as situações
tos espaciais mais restritos são difíceis de perceber e pesquisar. A deverão ser particularmente analisadas), também destinatário do
maior dificuldade deriva, em alguns casos, da impossibilidade de dever de manter o meio ambiente ecologicamente equilibrado, em
distinguir entre as mudanças naturais, em escala secular ou dece- bora normalmente o último ó seja em caráter subsidiário.
nal, e os efeitos derivados da interferência humana na paisagem". A regra deve ser sempre a prevenção, com aplicação dos princí
Leciona Ramón Martín Mateo^®: pios que têm essa finalidade. Concretizado o dano, a inserção do
"As dificuldades se acentuam logo que os conhecimentos princípio do poluidor-pagador, pelo qual deve ser ele reparado e
científicos atuais não permitem estabelecer com precisão quan indenizado (como que se poderá promover benefício ambiental em
do uma perturbação ambiental já é nociva e inclusive irreversí termos de equivalência), deve ser imposta, como forma de se obter
vel, o quejustamente deu lugar a que, pelos ambientalistas, se sustentabilidade (equilíbrio do sistema ecológico), uma das verten
proponha uma margem de segurança que cubra riscos previsí tes do desenvolvimento sustentável. Não há como se falar neste sem
veis, mas ainda não detectados com precisão". reparação do dano ambiental e sempre no momento mais próximo
de sua produção, com o que serão obtidos melhores resultados.
Éimpossível obter-se um ambiente sem degradação, intocável.
Tudo gera degradação, em maior ou menor escala, com resulta
dos mediatos ou imediatos. A solução mais plausível no momento
parece sero estabelecimento de cotas de naturezas diversas (aliás,
com fixaçao de padrões, esse procedimento ja é adotado iio Sra-
sil), com possibilidade de negociação em algumas situações, ao

" Ageografia física eas mudanças ambientais, Novos caminhos da geografia, Ana Fani Alessandrí Carlos
(org.).p.33.
" Tratado dederecho ambiental, voL I,p.89 (tradução livre).
78 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 79

2.3. O meio ambiente: conceito e aspectos preço que poderemos ser chamados a pagar, por exemplo, pela
perda da biodiversidade. Por conseguinte, tendo dificuldade de
entender o ecossistema, somos impedidos de apreender o im
2.3.1. O conceito de meio ambiente pacto real de nossas ações, muito embora estejamos certos de
que a segunda lei da termodinâmica seja um princípio supremo
Destaca Manoel Gonçalves Ferreira Filho®' que "detodos os di da vida, uma regra fundamental da natureza..."^^.
reitos da terceira geração, sem dúvida o mais elaborado é o direito
ao meio ambiente". Adelimitação do que se entende pormeio am A Lei n° 6.938, de 31-8-1981, que disciplina a Política Nacio
biente, contudo, é tarefa que exige interpretação mais cuidadosa. %'i' nal do Meio Ambiente, pioneira na formulação de conceitos na
Os conceitos jurídicos relativos ao Direito Ambiental são am área, traçou-os de acordo com os conhecimentos e necessidades
plos e refletem um grau de imprecisão. E sempre deverão ser as da época. Não havia previsão constitucional a respeito da matéria,
sim. Isso ocorre porque dependem especialmente'® dos conceitos e o que foi feito na Constituição Federal de 1988, com amplitude
conhecimentos da Biologia, da Química e da Física, os quais têm característica de lei ordinária. Foi, na verdade, o reconhecimento
certo dinamismo, na medida em que novas pesquisas e tecnolo de que a proteção ambiental se impunha para resguardai a vida e
gias permitem constantes correções e evoluções. O que dificulta a sua sadia qualidade. Também reconheceu que esta não decorria,
sobremaneira uma delimitação mais precisa dos conceitos é o fato apenas, da preservação dos recursos ambientais {natureza), mas
de que q Direito Ambiental está voltado para o amanhã, para o também de proteção dos valores culturais, do ambiente de traba
.futuro, para o desconhecido e deve atuar considerando os médio lho e da organização e funcionamento das cidades.
e longo prazos, ignorando-se, em razão da inexistência de tecno O conceito legal de meio ambiente está traçado em seu art. 3°.,
logia suficiente e impossibilidade de antever, as conseqüências fu I'h Foi concebido - reafirma-se - quando vigente a Constituição
turas de determinada ação no presente ou, mesmo, determinando Federal de 1967, que não tratava, senão indiretamente, da prote
todos os efeitos da degradação no passado, ainda que analisado ção ambiental.
um único fato gerador. Embora pareça completo, não tem a mesma extensão que lhe
Clóvis Cavalcanti'^ questiona: deu a Constituição Federal de 1988. Ela não definiu meio ambien
te, mas, acompanhando a doutrina, consagrou quatro aspectos
"Lamentavelmente, uma larga proporção da degradação dele: o natural, o urbano, o cultural e o do trabalho, os quais es-
entrópica é invisível, quase abstrata. Como sepode notar, com
efeito, que se tem menos energia disponível devido àaceleração
das tendências de crescimento^ Oprejuízo que se causa àsfutu
ras gerações em virtude da rápida exaustão de certos recursos
não-renováveis não pode ser visto com nitidez, como o fog da •f"'. •
poluição. Por outra parte, nosso conhecimento do meio am
biente e muito imperfeito. Pião se pode avaliar com precisão o

Op. ciL,p. 62.


BeaeditoBxogz etal, Introdução à engenharia ambientahp.8,indicam quetuna conseqüência ambiental
Não podem ser ignorados, também, os conceitos fornecidos pela Bioquímica. Geografia. Oceanografia, dasegunda leida termodinâmica "é atendência daglobalização da poluição".
Meteorologia (efeito dodesmatamento sobre o clima), etc.
Art.3®. Paraosfins previstos nestaLei. entende-se por:I - meioambiente, o conjunto decondições, leis,
Sustentabilidade daeconomia: paradigmas alternativos de realização econômica. Desenvolvimento e influências e interaçõesde ordemfísica, químicae biológica, quepermite, abrigae regea vidaem todas
notureza: estudospara uma sociedade sustentável, Qóvis Cavalcanti (org.), p. 167. as suas formas.
•VÍ"!'' '
80 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 81

tão representados, em especial, nos arts.115^\ 182'^, 216^^ e 200, respectivamente. Além desses dispositivos, há referências e
abordagens em outros.
Art 225. Todos tém direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo Não há como deixar de considerar a adoção desses aspectos
eessentíal à sadia qualidade devida. impondo-se aoPoderPúblico e à coletividade o dever dedefendê- quando da elaboração do conceito de meio ambiente^ porque eles
-lo epreservá-lo paraaspresentes efuturas gerações.
51°- Para assegurara efetividade dessedireito,incumbe ao Poder Público: são essenciais à sadia qualidade de vida (art. 225, caput). A con
I-preservar erestaurar os processos ecológicos essenciais eprover omanejo ecológico das espécies e jugação deles contribui para a efetivação da dignidade da pessoa
ecossistemas;
II- preservar a diversidade ea integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades humana, fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1°.,
dedicadas àpesquisa emanipulação dematerial genético; III, da Constituição Federal).
III -definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais eseus componentes aserem espe
cialmente protegidos, sendo aalteração easupressão permitidas somente através de lei, vedada qual A garantia do bem-estar dos habitantes das cidades é objetivo
quer utilização que comprometa aintegridade dos atributos que justifiquem sua proteção; da política de desenvolvimento urbano, segundo enuncia o caput
IV -exigir, naforma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significa
tiva degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, aque se dará publicidade; do art. 182.
V-controlar aprodução, acomercialização eoemprego de técnicas, métodos esubstâncias que com Não se pode esquecer de que a lembrança constitucional ao
portem risco para avida. a qualidadede vida e o meio ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino ea conscientização pública para a meio ambiente do trabalho foi inserida no art. 200, VIII, quetrata"
preservação do meio ambiente; do sistema único de saúde.
VII -proteger afauna eaflora, vedadas, naforma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função
ecológica, provoquem a extinção deespécies ousubmetam osanimais a crueldade. Os conceitos indicados no art. 3°., da referida lei, foram recep
§2° -Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado arecuperar omeio ambiente degradado, de cionados pela Constituição Federal, pois não a contrariam. Con
acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, naforma dalei.
53° -As condutas eatividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas tudo, o demeio ambiente merece especial atenção, uma vez que a
fisicas ou jurídicas, asanções penais eadministrativas, independentemente da obrigação de reparar os vigente Constituição deu a ele maior amplitude. "
danos causados.
§4« - AFloresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, aSerra doMar, oPantanal Mato-Grossense e Estabelecida a premissa de que a Constituição Federal consi
aZona Costeira são patrimônio nacional, esua utilização far-se-á. na forma da lei, dentro de condições derou quatro aspectos na indicação de meio ambiente (natural ou
qué assegurem a preservação domeio ambiente, inclusive quanto aouso dos recursos naturais.
§5" - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, físico, urbano, cultural e do trabalho), recorre-se, inicialmente,
necessárias à proteçãodos ecossistemas naturais.
§6" - As usinas que operem com reator nuclear deverão tersua localização definida em leifederal, sem
ao conceito inserido no art. 3°, I, da Lei n° 6.938, de 31-8-1981:
oquenãopoderão serinstaladas. ' "o conjunto de condições, leis. influências e interações de ordem
Art. 182. Apolítica de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público munidpal. conforme física, química e biológica, que permite, abriga- e rege a vida em
diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar opleno desenvolvimento das funções sociais todas as suas formas".
daddade e garantiro bem-estardeseushabitantes.
§1° -Oplano diretor, aprovado pela CâmaraMunicipal, obrigatório para ddades com mais devinte mil As condições, leis, influênciase interações a que se refere o dis
habitantes, éoinstrumento básico da política de desenvolvimento ede expansão urbana. positivo devem ter uma característica que ele próprio menciona:
52® • Apropriedade urbana cumpre sua função social quando atende àsexigêndas fundamentais de
ordenação daddadeexpressas noplano diretor. [...] natureza física, química ou biológica, assim se referindo aos adje
Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens denatureza material eimaterial, tomados tivos afetos à Física, à Química e à Biologia. Partindo-se daí, não
individualmente ouem conjunto, portadores de referência àidentidade, àação, àmemória dos diferen
tes grupos formadores dasodedade brasileira, nosquais seinrliii»tn- bá como se afirmar que o conceito contempla os aspectos urbano,
I- as formas de expressão;
n - os modos de criar,fazereviver;
in • ascriações científicas, artísticas etecnológicas; §2° - Cabem àadministração pública, naforma dalei. a gestão dadocumentação governamental eas
IV -as obras, objetos, documentos, edificações edemais espaços destinados às manifestações artístico- providências parafranquear suaconsulta a quantos dela necessitem.
-culturais; § 3® - Aleiestabelecerá incentivos paraaprodução e oconhecimento debens evalores culturais.
V- os conjuntos urbanos esítios de valorhistórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico. § 4® - Osdanos e ameaças aopatrimônio cultural serão punidos, naforma dalei.
ecológico e dentifico. § 5® - Ficamtombados todos osdocumentosc os sítiosdetentoresde reminiscênciashistóricasdos anti
§1» -OPoder Público, com acolaboração da comunidade, promoverá eprotegerá opatrimônio cultural gos quilombos. [._]
brasileiro, por meio de inventários, r^istros, vigilânda, tombamento edesapropriação, ede outras Art.200. Ao sistema único desaúde compete, além deoutras atribuições, nostermos dalei: (...]
formas deacautelamento epreservação. VIII - colaborar naproteção domeio ambiente, nele compreendido odotrabalho.
82 José Roberto Marques Lições preliminares de Direo-o Ambiental 83

cultural (que também agrega bens de natureza imaterial: art. 216, ticas ou sanitárias do meio ambiente" (alínea d), da degradação
da Constituição Federal) e do trabalho. da qualidade ambiental, assentou o reconhecimento dos aspectos
Essas ciências têm leis próprias, cuja incidência independe da cultural, urbano e do trabalho.
intervenção humana. A natureza tem um processo de ação e rea Contudo, ao conjugar os dispositivos legais mencionados, de
ção baseado nessas leis, promovendo compensações espontâneas. para-se com um conceito amplo e que, sob pena de não ser aplica
Mas adverte Martin Rock^®: do, deve ser mais bem analisado, mas sempre se observando a pro
"Danos aos ciclos naturais e exploração desmesurada de re
teção que interessa ao homem, pois essa foi a opção escolhida pelo
cursos naturais rebatem sobre o ser humano, provocando con legislador constitucional ao firmar a dignidade da pessoa humana
tra-ataques extremamente severos, com fúria redobrada. Sem como fundamento da República. Idêntica orientação é encontrada
futuro para a natureza não há futuro para o ser humano! Não no próprio caput do art. 225, quando se refere à sadia qualidade
há como evitarmos este destino conjunto. É, pois, necessário de vida de todos, e no caput do art. 170, quando aponta a existên
que o ser humano trabalhe junto com a natureza. Ambos têm cia digna de todos como objetivo da ordem econômica.
que conviver de forma coerente, ao invés de viverem um contra O limite a ser estabelecido é o de que a defesa do meio ambien
o outro". te tem por fim a proteção do homem, sua sobrevivência, saúde e
bem-estar (sadia qualidade de vida). Ele deve ser imposto porque,
O conceito legal está vinculado - como decorre de seu enuncia do contrário, tudo, sendo meio ambiente, deve ser preservado,
do - à vida em todas as suas formas. Ao se referir às formas de comprometendo o direito ao desenvolvimento, também um dos
' vida, está referindo-se à vida animal evegetal, emicroorganismos, direitos de terceira dimensão ou também chamados de direitos de
que também têm função ecológica. solidariedade.
Dessa maneira, não se encontra no conceito a inclusão dos as Há necessidade de que esses direitos sejam conciliados, optan-
pectos urbano, cultural e do trabalho, mesmo porque foram con do-se, no caso de que não o possam ser, pela situação que mais
sagrados na legislação a partirda Constituição de1988, posterior interesse ao homem (comunidade) e lhe assegure sadia qualidade
à instituição da Política Nacional do Meio Ambiente. de vida.
Vladimir Passos de Freitas^^ também registra o mesmo posicio Mesmo assim, o conceito permanece amplo, parecendo vago.
namento no que toca ao de meio ambiente: "cuida-se de conceito Nesse passo é que surge o trabalho de interpretação e aplicação da
restritivo, ou seja, que se limita aos recursos naturais. É fato que lei ao caso concreto, feito pelo Poder Judiciário. Por isso é que o
se explica pela época em que a lei foi editada". juiz deve ser um homem ajustado ao seu tempo, atento às questões
Mas o legislador, ao conceituar poluição, no art. 3°., III, da Lei que influenciam toda a comunidade e que, em última análise, po
n° 6.938, de 31-8-1981, deixou implícito que reconhecia os demais dem comprometer a própria existência do ser humano.
aspectos do meio ambiente, dedicando-lhes amparo. Ao proteger Por outro lado, o conceito de meio ambiente não pode ficar en
"a saúde, a segurança e o bem-estar da população" (alínea a), as gessado, sob pena de se admiti-lo como mera fórmula matemática,
"atividades sociais e econômicas" (alínea b) e "as condições esté- em que apenas uma solução possa ser possível. Essa situação se
explica pela necessidade, em alguns casos, de sacrifício de bens e
Atemática ecológica do ponto de vista antropológico e ético {conferência apresentada no Simpósio valores ambientais para evitar que outros, que mais interessem ao
Internacional 'O meio ambiente como desafio para a política: um intercâmbio de experiências
européias elatino-americanas" organizado pela Fundação Konrad Adenauer, noRio deJaneiro, em homem (comunidade), possam ficar comprometidos. Há casos em
maio de 19S7), Traduções, p.3. que, para garantir a sadia qualidade de vida, impõe-se a aceitação
AConstituição Federal eaefetividade das normas ambientais, p.18. de degradação ao ambiente - e isso é evidente , mas não antes de
84 José Roberto Marques
ff Lições preuminares de Direito Ambiental 85

serem prévia e seriamente avaliados, e sua reparação ou minimiza- 225, quando determinou que: (1) "a propriedade atenderá a sua
ção consideradas e depois de verificadas as alternativas locacionais função social" (art. 5°., XXIII), nela incluindo, no que se refere à
(a construção de uma usina hidrelétrica, por exemplo).
Foi por esse motivo que a Emenda Constitucional n® 42, de
i propriedade rural, como requisito para ser atendida, a "utilização
adequada dos recursos naturais disponíveis epreservação domeio
19-12-2003, alterou a redação do inciso VI, do art. 170, da Cons ambiente" (art. 186, II), e dispondo que "a propriedade urbana
tituição da República, para acrescentar à defesa do meio ambien cumpre sua função social quando atende às exigências fundamen
te^ como princípio orientador da atividade econômica, o seguinte tais de ordenação da cidade expressas no plano diretor" (art. 182,
texto: "inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o § 2°), este disciplinado nos arts. 39 a 42, do Estatuto da Cidade
impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de (Lein° 10.257, de 10-7-2001), com remissão ao art. 2°., da mesma
elaboração e prestação". lei, que fixa as diretrizes gerais para a política urbana; (2) a ordem
Também não se pode esquecer que a tecnologia é fator impor econômica está sujeita à observação da defesa do meio ambiente
tante a ser considerado e que poderá influir, no futuro, no con (art. 170, VI). Impõe, portanto, necessária conciliação dos interes
ceito, de forma a permitir a sua ampliação ou restrição, porém ses particulares com os interesses ambientais, de natureza difusa,
sempre atrelado à necessidade de preservação da sadia qualidade de forma que a coletividade não seja prejudicada relativamente ao
de vida do ser humano. Novas tecnologias poderão causar degra direito constitucionalmente lhe assegurado.
dação ou poderão contribuir para a reparação de danos ocorridos. O reconhecimento do aspecto do meio ambiente do trabalho
A prudência deve ser o elemento determinante, nessa hipótese, nas veio inserido no rol da competência do sistema único de saúde
decisões administrativas e judiciais. (art. 200, VIII).
Conceituar qualquer coisa em Direito Ambiental exige, neces Diante desse quadro constitucional, deve ser feita uma adapta
sariamente, transposição entre as ciências. Dentre as disciplinas ção no conceito demeio ambiente fornecido, ao qual seintegrarão
do Direito, nenhuma outra tem o caráter mais multidisciplinar, os aspectos nele ainda nele não previstos. Essa operação é possível
exigindo que se recorra, com freqüência, às Ciências naturais, mediante análise do texto constitucional e interpretação conjunta
uma vez que elas fornecem conhecimentos básicos para o entendi dos conceitos de meio ambiente e poluição.
mento da natureza. Analisando-se as hipóteses de configuração de poluição, no
O conceito legal, portanto, refere-se exclusivamente a um as conceito traçado pelo art. 3°., III, daquela lei, verifica-se que, en
pecto do meio ambiente, o natural, não contendo nenhuma indi tre elas, há referência, embora ampla, a todos os aspectos do meio
cação dos demàis consagrados pela Constituição Federal, onde há ambiente, antes mencionados'™. E esse dispositivo deve ser anali
menção expressa dos aspectos urbano, cultural e do trabalho, que sado juntamente com o de meio ambiente porque parece que foi
devem ser considerados na sua formulação. propósito do legislador, ao conceituar poluição, também proteger
A Constituição Federal de 1988 disciplinou, de forma ampla, os aspectos que não estão incluídos no conceito legal daquele. Ao
o meio ambiente, dedicando-lhe um capítulo próprio, constituído prever que a ofensa a eles também configura poluição, evidenciou
pâiO cXienso aii. aism Ge rcicrcj.iwão cm outros ^eiik.rc c^cs, que iiãu lhes foi negada proteção. A isso se deve ajustar o racio-
aqueles que dizem respeito à propriedade dos recursos ambientais
e à competênciapara legislar sobre questões relativas ao ambiente).
"Poluição: adegradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:
Além dessas inserções, o constituinte se utilizou de fórmulas a)^ prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b) criem condições adversas às
garantidoras para a efetivação do direito ao meio ambiente ecolo atividades sociais eeconômicas; c) afetem desfevoravelmente abiota; d) afetem as condições estéticas
ou sanitáriasdo meio ambiente; e) lancemmatérias ou energiaem desacordo com os padrões ambientais
gicamente equilibrado, extravasando as hipóteses do § 1°, do art. estabelecidos".
86 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 87

cínio de que a lei pune as condutas que entende como poluição retamente voltada para o Meio Ambiente atingirá direta ou indi
e, se assim o faz, é porque deu proteção aos bens e valores que retamente o ser humano e suas diversas relações".
menciona nas alíneas do inciso III, do art. 3°., da Lei n° 6.938, de A noção de meio ambiente exige conhecimentos multidiscipli-
31-8-1981, como também integrantes do meio ambiente. De outra nares, e essa construção é muito complexa. Mas, para os operado
forma, assim não considerando o legislador, não lhes daria prote res do Direito, é necessário que haja, no mínimo, uma indicação
ção, embora o tenha feito por via transversa. do que o compõe, de maneira a atender às necessidades iniciais de
Resta inequívoca, portanto, a conclusão de que o conceito de interpretação. Deve ser considerado, para tanto, que o ambiente
meio ambiente não se restringe ao contorno fornecido pelo art. é dinâmico, sofrendo influências das alterações que ele próprio
3®, I, da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, limitado ao opera, mas também da intervenção do homem, principal agente de
aspecto natural. transformação e degradação.
Paulo de Bessa Antunes^®^ afirma que os conceitos de Ecologia Esse conjunto de conhecimentos, oriundos de várias ciências,
e ecossistema já se encontram estabelecidos de forma bastante se conduz à construção de um conceito que pode ajustar-se ao di
gura, o que não ocorre com o de meio ambiente t ambiente^ "que namismo exigido pela situação, evitando que, demasiadamente
são palavras do linguajar diário e que, cada vez mais, vêm obtendo restrito e limitado, possa inviabilizar a sua proteção. Por outro
novos sentidos e dimensões, fazendo com que percamos o referen lado, exige-se do operador do Direito que adapte essa construção
cial adequado para a sua compreensão". às necessidades da sociedade e aos valores consagrados na Consti
Não se pode confundir meio ambiente com o seu aspecto físi tuição Federal, realizando verdadeira interpretação sistemática e,
co, como normalmente se faz. Popularmente, chama-se de meio assim, atendendo aos interesses de todos, especialmente aqueles de
ambiente aos recursos ambientais. natureza difusa.
Meio ambiente é mais que recursos ambientais, pois estes - ofe É necessário que o conceito permita alguma flexibilização, per
recidos pela natureza - não são importantes se se considerar a sua mitindo que novas tecnologias sejam consideradas no conceito,
simples existência. É necessário verificar qual a função que eles por via da configuração de poluição.
exercemno ecossistema e qual sua influência para a sadia qualida O meio ambiente deve ser tido como um sistema vivo. De fato,
de de vida humana. Todos os seus elementos são relevantes, desde ele é um conjunto de recursos bióticos e abióticos, aos quais se
que sejam úteis para o homem e para o próprio ecossistema. deve associar o homem, que nele vive e que é o principal benefici
Em todas as situações, deve ser considerado o homem como ário de sua manutenção em equilíbrio. Ironicamente, também é o
elemento modificador do meio natural. Sua intervenção ora tem a seu principal degradador.
finalidade de buscar melhoria das condições de vida em geral, ora Mesmo assim, o conceito de meio ambiente está muito amplo.
para o bem-estar individual. Em qualquer hipótese, a humanidade A limitação encontra-se no art. 225, caput^ da Constituição Fede
sofrerá os efeitos dessa interferência e, considerando-se o princípio ral, quando aponta que o direito ao meio ambiente refere-se àquele
da globalidade, não se pode afirmar o que, de fato, será atingido. que é essencial à sadia qualidade de vida. E essa é uma finali
Francisco Carrera^®^ adverte que o homem deve ser visto como dade que deve ser analisada no caso concreto, não podendo ser
integrante do meio ambiente: "Qualquer influência direta ou indi- padronizada, quantificada. Em algum caso, a proteção aplicada
deve ser maior que em outra situação semelhante, dadas as suas
peculiaridades.
Dano ambiental: umaabordagem conceituai, p. 154.
Cidade sustentável - utopiaou realidade? p. 6.
José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 89

O meio ambiente que se busca garantir é aquele ecologicamen com o urbano, entendendo-se que este é uma face do primeiro,
te equilibrado, o que demanda recurso às Ciências naturais, que pois se encontra o artificialismo também na zona rural. O subas-
fornecerão os elementos necessários à correta interpretação. pecto urbano é adequado para o estudo das cidades.
Com mais clareza, a Organização Mundial da Saúde aponta O meio ambiente cultural é formado pelos bens materiais e
quemeio ambiente é "o conjunto dos elementos físicos, químicos, imateriais que, de uma maneira geral, refletem a cultura, a histó
biológicos e sociais que exercem uma influência apreciávelsobre a ria, as tradições, os usos e costumes de um povo.
saúde e o bem-estar dos indivíduos e das coletividades". Como se O meio ambiente do trabalho é aquele em que o homem desen
observa, está formulado em termos que permitem o acolhimento volve suas atividades econômicas, no qual ele produz. Alguns au
de todos os aspectos do ambiente, ao incluir os elementos sociais tores não admitem o estudo isolado desse aspecto, entendendo-o
e ressalvar que eles, assim como aqueles de natureza física, devem como parte do meio ambiente urbano. Entretanto, pensa-se que,
exercer influência apreciável sobre a saúde e o bem-estar dos in se ele o integrasse, estaria sendo negada a existência do meio am
divíduos e das coletividades. biente correspondente ao local de trabalho desenvolvido na zona
Dessa forma, analisado o cenário legislativo brasileiro, ainda rural, em áreas não construídas, como o lugar onde se desenvol
se conclui que o conceito de meio ambiente não está determinado, vem a agricultura e a pecuária, ou até mesmo uma indústria.
senão delineado. Caberá ao operador do Direito, no caso posto à Os aspectos do meio ambiente reconhecidos pela doutrina es
apreciação, fugir das formulações objetivas da lei, interpretando-o tão consagrados na Constituição Federal: natural (ou físico), ur
de acordo com as suas peculiaridades. bano, cultural e do trabalho. A aceitação dessa repartição do meio
ambiente é meramente para fins didáticos, pois - repita-se - ele é
2.3.2. Os aspectos constitucionalmente uno, não podendo ser dividido, exceto para efeito de estudo. Esses
consagrados do meio ambiente: natural, aspectos se entrelaçam e, muitas vezes,podem ser identificados em
urbano, cultural e do trabalho um único cenário.
O meio ambiente é uno, indivisível, mas para que seja mais bem
2.3.2.1. O meio ambiente natural
estudado; foi dividido em aspectos. Entretanto, com a convicção
de que eles são partes interdependentes da mesma coisa. São eles: O meio ambiente natural, também chamado de físico, refere-se
natural, urbano, cultural e do trabalho. aos elementos existentes na natureza, para cuja criação o homem
O meio ambiente natural ou físico é formado pelos elementos não contribuiu. São enumerados, a título de recursos ambientais,
que integram a natureza, indicados como recursos ambientais no no art. 3°., V, da Lei n° 6.938, de 31-8-1981, com redação deter
art. 3°., V, da Lei n° 6.938, de 31-8-1981. minada pela Lei n° 7.804, de 18-7-1989: "a atmosfera, as águas
O meio ambiente urbano é, de uma forma simplista, aquele interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territo
composto por tudo aquilo que o homem acrescentou à natureza rial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora".
e produz-lhe bem-esta*" m'^s qu^ se r>'
S C' ^ ...=r.r:r= legislâdoi' OpLuU pOi" não deixat dÚvidas,
aspecto, estão as construções realizadas visando à melhoria das preferindo a especificação detalhada, o que resulta maior garantia
condições de vida, as obras e os equipamentos públicos, etc. O ho de proteção.
mem usou o meio natural e deu-lhe formatação diversa, desfazen Esses recursos ambientais também podem ser chamados, com
do suas características originais. Contudo, o ambiente natural está o mesmo significado, de recursos naturais, pois presentes na
inserido nesse aspecto. Não se identifica o meio ambiente artificial natureza.
90 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 91

Em sede constitucional, o art. 225 é o mais importante disposi Outra ressalva poderá ser feita se a parte artificial integrar o
tivo de defesa do meio ambiente natural. Ele faz referência expres ambiente do trabalho, quando, então, a esse título, poderá ter pro
sa à fauna e à flora (§ 1®, I, II e VII), mas, implicitamente, ao indi teção de leis ambientais, mas somente daquelas relativas a ele.
car, no caput, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, trata Exemplos do artificialismo podem ser encontrados nas cidades
detodos osrecursos ambientais, pois se exige harmonia entreeles. e fora delas. A diferença, para efeito de estudo, é que, relativamen
A indicação de bens que pertencem às unidades federadas e te às construções nas cidades há uma regulamentação própria: a
a previsão de competência legislativa não significam, por si só, Lei 10.257, de 10-7-2001, chamada Estatuto da Cidade. Fora
proteção ao ambiente, apenas delimitando a ação da União, dos delas, as situações terão que se submeter ao regramento geral, in
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. serindo a proteção, quando houver, no meio ambiente cultural ou
do trabalho.
•;-â-
2.3.2.2. O meio ambiente urbano A proteção do meio ambiente urbano (relativo ou pertencente à
cidade), então, está prevista no art. 182, da Constituição Federal,
Chama-se de meio ambiente artificial, contrapondo-se ao na
regulamentado pelo Estatuto da Cidade, que estabeleceu diretrizes
tural, aquele construído pelo homem, acrescentado à natureza. É
gerais da política urbana.
curioso observar que, na verdade, o homem nada está acrescendo
O que dá consistência a esse aspecto do ambiente é o fato de
à natureza; ao contrário, está utilizando recursos naturais, trans
que as instalações criadas pelo homem tomam proporções que as
formando-os de acordo com os seus objetivos e instalando-os no fazem caracterizar-se como uma cidade. É o acúmulo de constru
local dé sua conveniência. Oportuna, aqui, a lição de Lavoisier, ções que segue uma organização mínima e deve ser planejado, de
no sentido de que na natureza nada se cria, nada se perde; tudo forma a permitir sadia qualidade de vida (saúde e bem-estar) aos
se transforma. Assim, o correto seria chamá-lo de meio ambiente
seus habitantes. Associa-se às construções uma administração e o
transformado e não demeio ambiente artificial. É certo, contudo, provimento de equipamentos e serviços públicos.
que ele assim é chamado para se diferenciar do ambiente em que a Não se pode confundir meio ambiente artificial com urbano.
natureza não sofreu alterações significativas. O primeiro, mais amplo, é integrado pelo segundo. A cidade é o
Não parece, contudo, que a legislação ambiental deu proteção exemplo clássico de meio ambiente artificial, embora ela reúna
a todo o meio ambiente artificial, detectável também nas zonas todos os aspectos do meio ambiente.
não urbanas. Nessa situação, poder-se-ão citarconjuntos decons A área não urbana - repita-se - que se pode chamar de rural,
truções em áreas distantes das cidades, com finalidades diversas também reúne elementos que podem se chamados de artificiais,
(usinas para produção de energia, casas em propriedades rurais, ou, como antes se disse, transformados pelo homem, mas não são
estradas, indústrias, etc.), que não recebem proteção como meio regidos por lei ambiental.
ambiente urbano. Dessa forma, identificam-se como distintos o meio ambiente
Eventualmente, uma construção em área não urbana pode re artificial e o meio urbano, sendo que o último tem proteção cons
ceber proteção legal a título de integrar o meio ambiente, se a ela titucional e legal específica.
houver um valor agregado que possa indicar ser um bem de valor É necessário, contudo, que a Administração Pública e o Po
cultural, histórico, artístico, arquitetônico, etc. e, nessas condi der Judiciário vejam o meio ambiente urbano como elemento
ções, evidenciará características do aspecto cultural. ,í;:- essencial à sadia qualidade de vida, deferindo-lhe o tratamento
Essa conclusão é extraída do art. 182, da Constituição Federal, que, a esse título, lhe dá a Constituição Federal e demais normas
que se refere, exclusivamente, à política urbana. infraconstitucionais.
92 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 93

Francisco Capuano Scarlato e Joel Arnaldo Pontin^®^^ comen dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos
tando o relacionamento entre o ambiente urbano, a sociedade e a quais se incluem: l - as formas de expressão; II - os modos de
natureza, escrevem: criar, fazer e viver; III ~ as criações científicas, artísticas e tec
nológicas; IV-as obras, objetos, documentos, edificações e de
"A cidade sempre foi vista pela maioria dos planejadores mais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; V
simplesmente como uma área antinatural. Poucos procuraram - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico,
encará-la como célula integrante de um ecossistema heterotró-
artístico, arqueológico, pàleontológico, ecológico e científico".
fico (incompleto), já que depende de fatores e áreas externas
para a obtenção de energia. [...] Afalta de uma concepção mais Cabe, segundo a Constituição Federal, ao Poder Público e à
orgânica desses ecossistemas cria cada vez mais, no imaginário comunidade o dever de proteger o patrimônio cultural brasileiro
social, a idéia de que a cidade representa a antinatureza. Con (art. 215, § 1°), incluindo-se, nesse dever, a proteção das "mani
seqüentemente, só aumenta o grau de desconforto e insatisfa festações dasculturaspopulares,indígenas e afro-brasileiras, e das
ção das populações urbanas". de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional".
O meio urbano merece especial atenção quanto à qualidade de A proteção do meio ambiente cultural também considera a pai
vida, uma vez que reúne, hoje, grande parte da população, em sagem, a partir da qual se estabelecem lembranças de vivência do
condições precárias e desprovida de serviços e equipamentos pú povo. Este agrega a ela uma experiência pessoal, uma recordação
blicos essenciais.
e, por isso, atribui-lhe valor afetivo, o qual, se for representativo
para a comunidade, deve ser protegido.
2.3.2.3. O meio ambiente cultural Francisco Capuano Scarlato e Joel Arnaldo Pontin^'^, abordan
do a matéria, registrara:
A Constituição Federal garante a todos "o pleno exercício dos
direitos culturais eacesso às fontes da cultura nacional", devendo "...Disso tudo se conclui que as imagens dos lugares que
o Estado, para tanto, incentivar "a valorização e a difusão das guardamos na memória são em grande parte resultado das
manifestações culturais" (art. 215, caput). nossas experiências nesses lugares. As percepções que teremos
O meio ambiente cultural é o conjunto de bens, materiais ou deles serão alegres ou tristes, prazerosas ou não, de acordo com
imateriais, de natureza histórica, cultural, paisagística, arqueoló as situações que ali vivemos. Qualquer intervenção na pai
gica, paleontológica, sentimental, regionalista, ecológica, artística sagem que não leve isso em consideração poderá causar um
ou científica que expressam a cultura ea identidade de um povo e grave impacto nos indivíduos para os quais essa paisagem seja
as fases de sua evolução, nos variados setores, e que inspiram sen significativa".
timento de orgulho, nostalgia e bem-estar à comunidade.
Pode-se, então, afirmar que o meio ambiente cultural está vin
A Constituição Federal indicou, no art. 216, o que constitui o
culado ao bem-estar das pessoas. Protegê-lo é proporcionar satis
patrimônio cultural brasileiro:
fação, uma situação agradável.
"Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natu No cnranro, o meio ambiente cultural tende a desvalorizar-se
reza material e imaterial, tomados individualmente ou em con com a globalização. As pessoas, no processo de desenvolvimento
junto, portadores dereferência à identidade, ã ação,à memória atual, estão perdendo suas referências históricas, estéticas, cultu-

o ambiente urbano, 12. 0 ambiente urbano, p. 54.


94 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 95

rais, emocionais, etc. O passado, para elas, parece não ter signifi 2.4. Os aspectos do meio ambiente nas
cado que ultrapasse o mero decurso detempo.
Constituições anteriores e sua proteção
2.3.2.4. O meio ambiente do trabalho jurídica na Constituição Federal de 1988
Chama-sede meio ambiente do trabalho o local onde o homem Os quatro aspectos do meio ambiente, enumerados no item
desenvolve suas atividades produtivas, podendo ocorrer em uma anterior, foram consagrados na vigente Constituição Federal. A
instalação, prédio ou mesmo ao ar livre. A Constituição apenas importância da referência na lei mais importante do País está no
o reconhece como um dos aspectos do meio ambiente quando, ao fato de que ela traça princípios que devem ser obedecidos e indica
tratar do sistema único de saúde, prevê, entre suas atribuições, os direitos básicos do povo.
colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o As Constituições anteriores não dispunham de menções ex
do trabalho" {art. 200, VIII). Não o trata, contudo, com o mesmo pressas à proteção do meio ambiente. Elas se limitavam, de regra,
grau de especificação com que cuidou dos demais aspectos. a indicar a competência legislativa referente aos recursos ambien
José Afonso da Silva anota^"^ que tais, apontando qual o ente federativo que podia legislar sobre
determinada matéria. Isso, por si só, não implicava proteção ao
"...éum meio ambiente que se insere no artificial, mas digno
de tratamento especial, tanto que a Constituição o menciona meio ambiente em nível constitucional. Remetia à legislação ordi
explicitamente no art. 200, VIU, ao estabelecer que uma das nária o disciplinamento do que deveria ser protegido e qual a sua
atribuições do Sistema Único de Saúde consiste em colaborar extensão.

na proteção do ambiente, nele compreendido o do trabalho". A Constituição de 1824 continha um dispositivo que indicava,
de maneira bastante ampla, proteção do ambiente do trabalho,
Pensa-se que esses aspectos não se sobrepõem porque o tra tendo em vista a necessidade de preservação da saúde do traba
balho pode ser exercido no meio natural, aberto, deslocando, as lhador. Dispunha, em seu art. 179, XXIV: "Nenhum genero de
sim, o ambiente de trabalho do meio urbano, tanto que existem trabalho, de cultura, industria, ou commercio pôde ser prohibido,
normas regulamentadoras, de natureza trabalhista, que preveem uma vez que não se opponha aos costumes públicos, á segurança,
fornecimento de equipamento de proteção individual àqueles que e saúde dos Cidadãos". Ao fazê-lo, disciplinava "a inviolabilidade
exercem o seu trabalho na agricultura, por exemplo. Nesse caso, dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros", conforme
a lavoura é o ambiente de trabalho ao qual não se alia qualquer dispunha o caput do mencionado artigo.
referência ao meio construído. A Constituição Federal de 1946, em seu art. 147, previa que "o
Oreconhecimento desse aspecto decorre, portanto, da previsão uso da propriedade será condicionado ao bem-estar social". Em
constitucional da matéria e das suas peculiaridades, que não se bora seja também muito amplo o dispositivo, ele deveria ser consi
confundem com as de outro aspecto do meio ambiente. derado quando da elaboração das leis e da tarefa de interpretação.
A Constituição Federal de 1967, em seu art. 157 (convertido no
art. 160 pela Emenda Constitucional n° 1, de 17-10-1969), assina
lou que a ordem econômica assentava-se, entre outros princípios,
na função social da propriedade (inciso III). Em seu novo texto,
a Constituição deu outra redação ao caput do art. 160, fazendo
referência à ordem econômica e social. Mas não esclareceu em que
Direito ambiental constitucional, p.23.
consistia essa função social.
96 José Roberto Marques Lições preuminares de Direito Ambieotal 97

José Celso de Mello Filho^'^^, como antes se apontou, comentan degradação não assumia a proporção com que hoje se apresenta)
do o art. 8°., XVII (com redação determinada pela Emenda Cons por parte da comunidade e do Poder Público, a respeito dos im
titucional n° 1, de 17-10-1969), da Constituição de 1967, queversa pactos negativos gerados ao meio e ao homem, pelas ações que
sobre a competência da União, recorrendo aos ensinamentos de este praticava em descompasso com a necessidade de preservação
Paulo Affonso Leme Machado e Hely Lopes Meirelles, consignou e conservação dos recursos ambientais.
que "a tutela jurídica do meio ambiente decorre da competência Entretanto, hoje não se necessita mais desenvolver raciocínio
para legislar sobre defesa e proteção da saúde". O autor entendia-a no sentido de que a busca da proteção jurídica do ambiente de
como concorrente e, assim, repartia-se entre a União, os Estados corre da proteção jurídica da saúde, diante da existência de tex
e os Municípios, cabendo ao primeiro editar as normas e os prin to expresso da Constituição Federal, que amplamente regulou a
cípios gerais^"^. matéria. Mas os.temas estão inter-relacionados, não podendo ser
Verifica-se, portanto, que o cenário legislativo constitucional considerados isoladamente.
não consagrava, diretamente, proteção jurídica ao meio ambiente, Das Constituições brasileiras, a de 1988 foi a única a cui
transferindo essa função à legislação ordinária. É bom lembrar, dar, especificamente, da proteção ambiental, dedicando ao tema
como exemplo daproteção proporcionada por essa categoria legis o Capítulo VI (Do meio ambiente), inserido no Título VIII (Da
lativa, que o Código Florestal (Decreto n° 23.793, de 23-1-1934, Ordem Social), além de outras referências importantes que o
depois substituído pela Lei n° 4.771, de 15-9-1965, que instituiu complementam.
o novo Código Florestal) foi editado sob a égide da Constitui A importância que ela deu ao meio ambiente é indiscutível.
ção de 1891 (a Constituição Federal de 1934 entrou em vigor em Considerou-o, ecologicamente equilibrado, como suporte para a
16-7-1934). sadia qualidade de vida do homem, em consonância com as leis
As Constituições anteriores referiam-se apenas aos recursos da natureza. Valorizou-o quando dispôs sobre a atuação do Poder
ambientais, mas o faziam quando tratavam da competência legis Público, da sociedade (art. 225) e das empresas (art.170), exigin
lativa daUnião, Estados, Distrito Federal eMunicípios. Não havia do, de todos, respeito à integridade de seus fins.
um dispositivo que regulamentasse, diretamente, a proteção do Contudo, esse cenário não decorreu meramente da intenção do
ambiente, o que era feito pela legislação infraconstitucional. constituinte, indicado pelo povo para materializar suas preten
Não há dúvida de que cuidar do meio ambiente necessariamen sões. Não se trata de uma escolha exclusiva dos membros do Le
te implica cuidar da saúde, pois esta decorre, também, da sanida gislativo Constituinte, à revelia dos interesses da sociedade. Esse
de do primeiro. Prevalecendo situação em que o meio se apresenta reconhecimento é indicativo das necessidades eleitas por elacomo
degradado, ascondições de saúde serão desfavoráveis, propiciando valores supremos.
sua degeneração, muitas vezes lenta e gradativa, quase impercep Se, por outro lado, optasse por uma proteção inferior, ele es
tível às vezes. taria relegando a plano secundário as leis da natureza, que se im
Mas, de qualquer forma, é notório que não houve preocupação põem por si próprias, independentemente de terem sido reiteradas
com a questão ecológica, mesmo porque, na época em quefoi pro r — impondo num primeiro
mulgada a Constituição Federal de 1967, não havia consciência (a momento, reagirá de tal forma queimpactos negativos, com o de
correr do tempo, serão suportados pelo homem, em prejuízo de
Constituição Federalanotada,p. 69. sua sadia qualidade de vida, de sua saúde e, até mesmo, compro
Não havia umdispositivo expresso a respeita dacompetência legislativa emmatéria ambiental, àexce
ção das alíneas hei, do inciso XVII, do art 8®.. que sereferiam aos recursos minerais, florestas, caça, metendo sua existência na Terra. Pior seria a situação se o legisla
peça,águas e energia. dor simplesmente negasse proteção aos recursos ambientais, o que
98 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 99.

desencadearia um processo de degradação que faria do homem tretanto, por outro lado, dependem dos recursos ambientais e são
uma vítima imediata desse descuido. atingidas fortemente quando eles são escassos (reflexo na produ
José Afonso da Silva"®escreve: "O problema da tutela jurídica ção e no consumo - e, consequentemente, na arrecadação de tribu
do meio ambiente manifesta-se a partir do momento em que sua tos -, nas suas atividades e na qualidade de vida da comunidade).
degradação passa a ameaçar não só o bem-estar, mas a qualidade O setor econômico tem interesse no uso racional dos recursos
da vida humana, se não a própria sobrevivência do ser humano". ambientais, de forma a evitar a escassez ou, mesmo, o seu total es
Considere-se, aproveitando a demonstração de Ferdinand Las- coamento (falta de matéria-prima), mas oferece resistência quanto
sale^"^, que se partisse de um ponto zero para elaborar uma consti à implantação de tecnologias que reduzem a degradação, muitas
tuição, ignorando o nível de proteção que a nossa hoje proporcio vezes em razão do custo financeiro que essa operação acarreta.
na ao ambiente. Para tanto, admita-se que se tem classes diferentes A degradação do ambiente não compromete apenas a sobrevi
de interesses: o do Poder Público, das empresas e da sociedade vência do homem, seu bem-estar e a qualidade de vida. Avança e
{pessoas físicas isoladas ou reunidas em uma entidade). Esses seg atinge o próprio sistema econômico, que exige, para o seu desen
mentos, por sua vez, têm graus diferentes de interesse com relação •rir:'- volvimento, recursos ambientais, em quantidade e qualidade. O
ao meio. sistema produtivo deve, então, alcançar mais eficiência, respeitar
O Poder Público busca a satisfação dos interesses dos membros as normas ambientais e reduzir o desgaste de bens oferecidos pela
da sociedade. Para tanto, interessa a ela que a economia se fortale natureza, para que possa desenvolver-se mais e sempre, cora incre
ça e proporcione maior arrecadação de tributos, com cujo produto mento da produção e fornecimento de melhores condições de vida
poderá desenvolver seus objetivos. De outro lado, tem interesse na ao homem.
manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, pois A alternativa parece estar na busca de melhor aproveitamento
ele, independentemente de reconhecimento jurídico, proporciona, dos recursos naturais, como solução para evitar seu esgotamento.
juntamente com outros fatores (fornecimento de serviços públicos A sociedade busca, incessantemente, viver melhor, adotando
essenciais e adequados), sadia qualidade de vida, sem se descui uma cláusula genérica para apontar seu ideal: sadia qualidade de
dar do fato de que a produção econômica também depende da vida. Para isso, concorrem a manutenção do meio ambiente ecolo
preservação dos recursos ambientais. A Administração Pública, gicamente equilibrado e a existência de recursos do Poder Público
inclusive, obtém receita da exploração direta dos recursos naturais para atender às condições satisfatórias de vida, com um mínimo
(extração). de bem-estar.
É justamente esse setor, o do Poder Público, que deve conviver Essas condições satisfatórias estão, hoje, reconhecidas, em par
com esse dualismo de interesses: a preservação do ambiente e sua te, no art. 6°, da Constituição Federal, que enumera os direitos
degradação, esta como fonte de recursos, como já se argumentou. sociais, entre eles a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o
Aqui coexistem situações antagônicas. lazer e a segurança, os quais convergem para a qualidade ambien
As empresas, abstraindo a responsabilidade social que hoje se tal e de vida.
lhes impõee que deve orientar suas atividades, têm comofim pre- Contudo, se se isolarem essas três classes de interesses (não se
cípuo o lucro: geramrenda que remunera os empregados e satisfaz afirmou, diga-se, que são isoladas), podem ser reconhecidas três
os sócios. Pagam tributos, dos quais sobrevive o Poder Público. En- forças distintas que não se sustentam, senão com a harmonização,
umas com as outras: o poder do Estado, o poder da sociedade e o
"" Direito ambiental constitucional, p. 28. poder da economia (aqui considerada como o sistema econômico e
Oqueé uma constituição? passim as empresas). E a harmonia entre elas que nos conduz à paz social.
100 José Roberto Marques Lições preliminares de Direto Ambiental 101

A coexistência é possível, mas todos cedem: a economia racio De tudo, emerge que o meio ambiente ecologicamente equili
naliza o uso de recursos naturais e atende às normas de proteção brado tornou-se um valor básico da sociedade, sobre o qual se
ao meio ambiente; a sociedadepermite um mínimo de degradação assenta a sobrevivência do homem, sua saúde e bem-estar, sem
para proporcionar o desenvolvimento (não somente o crescimen se descuidar de que, na cláusula bem-estar, está incluída a sua
to econômico); o Estado estabelece normas como mediador dos própria degradação, ainda que mínima, para produção de bens
dois lados da balança, originalmente de preponderantes interes de consumo, o que deve ser feito, então, com responsabilidade e
ses opostos. Cabe a ele, então, estabelecer o limite de tolerância solidariedade (com relação às atuais e futuras gerações).
de degradação, considerados os interesses das duas partes, mas Relativizar esse valor eqüivale a desprezar a própria vida e a
atentando para o fato de que, estando eles equiparados, devem sua sadia qualidade. Cabe ao homem a busca de melhores con
prevalecer os da sociedade (hoje, essa opção vem registrada pela dições de sobrevivência, com o menor impacto possível no meio,
Constituição Federal em seu art. 1°., III, ao estabelecer que a dig atento para a velocidade com que o degrada e tendo em vista os
nidade da pessoa humana é fundamento da República Federativa seus limites físicos.
do Brasil; no caput do art. 170, que afirma que a ordem econômi- - Adiante, serão abordados os arts. 5°., 170,182 e 186, fazendo-
ca tem por fim assegurar a todos existência digna, e, no caput do -seestudo do caput do art. 225, inserido no Capítulo VI, do Títu
art. 225, que estabelece a sadia qualidade de vida como meta da lo VIII, da Constituição Federal, reitor do tema.
manutenção do meio ecologicamente equilibrado). A previsão de que os incisos do aludido § 1°, do art. 225, são
A Constituição, dessa forma, deve atender ao interesse de to meios dos quais dispõe o Poder Público para a efetivação daquele
dos, sob pena de mostrar-se sem perspectiva e sem percepção das direito é, também, um indicativo de que a preservação e a conser
forças reais. vação ambiental são exigências para que o homem usufrua de sa
A conclusão de Ferdinand Lassale serveperfeitamente ao caso dia qualidade devida. Assim, coloca-se o meio ambiente a serviço
aqui tratado: "os problemas constitucionais não são problemas de do homem.
direito, mas do poder""®. A Constituição será respeitada e dura A Constituição, como estatuto fundamental de um Estado,
doura, desde que sejam considerados, em sua elaboração, os inte prevalece em relação a todo o conjunto legislativo. Irradia seus
resses dos três grupos distintos que antes foram mencionados, mas princípios sobre todas as disciplinas do Direito, influindo decisi
que devem conviver harmonicamente. vamente na interpretação e determinando a orientação que deverá
Esse poder tripartido é anterior aos Poderes constituídos do ser seguida pelos operadores do Direito na releitura das normas
Estado (Legislativo, Executivo e Judiciário). Estes, para efeito do que lhe são anteriores. Nesse caso, reconhece-se que novos valo
desenvolvimento do tema, estão incluídos no que se chama de Po res foram consagrados: o que, em momento anterior, não parecia
der Público. relevante, agora se torna exigível por força dela, dado o reconheci
Essa situação se transporta com precisão para o campo do de mento de circunstâncias que se alteraramno tempo.
senvolvimento sustentável, para o qual devem concorrer "os três O que outrora parecianão ter importância, passa a ser funda
mental, cal como ocorreu com a preservação do ambiente, pois
verno e o setor empresarial", como observam Gisele Ferreira de passou a ser um valor prevalente sobre quase todos os direitos
Araújo e Célia Regina Macedo'". individuais (exceção ao direito à vida e à liberdade).
As leis elaboradas devem se ajustar à defesa do meio. O seu
Op.dL.p.79. controle é feito pelo Judiciário em ação própria (provocação es
Manualempresarial deresponsabilidade social esustentabilidade, p.53. pecífica: ação direta de inconstitucionalidade) ou incidentalmente
J02 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 103

(questão preliminar em ações), obstando a eficácia daquelas que Serão, então, analisados referidos dispositivos, adotando-se a
ofenderem os princípios ou o texto expresso da Constituição. ordem deles na Constituição Federal, deixando de lado o Título
Mais que as outras leis, a Constituição contribui decisivamente •te'-. I, arts. 1®. a 4°, que será utilizado para a interpretação gerai, pois
para a manutenção da estabilidade das relações entre os membros todo o sistema deve estar fundado nos princípios fundamentais
da comunidade. Ela é produto de seu tempo, revelando a cultura que ele contém.
e necessidades do povo, as quais refletem na qualidade de vida 'lic
escolhida. Sendo as necessidades alteradas, devem as leis ser refor 2.4.L O art. 5°, da Constituição Federal
madas (nesse sentido, a edição de leis ambientais mais rigorosas
Este dispositivo, que trata "dos direitos e deveres individuais e
assume a posição imperativa, pois não se conhece situação em que
coletivos", logo em seu caput, assegura a inviolabilidade do direi
o ambiente obtenha benefício com as atividades humanas, exceto
to à vida.
no caso de específica reparação de dano).
Inviolabilidade é a qualidade ou caráter do que é inviolável, e
A alteração dela, em nosso sistema, exige procedimento mais
inviolável, aquilo que não pode ser ofendido, violado, maltratado,
apurado, que a dificulta. Isso é necessário para que haja um mí
estragado, danificado, etc.
nimo de estabilidade e para impedir que o legislador, com a velo
Tomado o vocábulo nessa acepção, o direito à vida não pode
cidade com que elabora leis ordinárias, mude os fundamentos e
ser suprimido ou, de qualquer forma, ofendido. Assim, ele implica
princípios que orientaram a confecção da norma básica.
não somente a manutenção da vida, mas também o respeito à sua
A Constituição Federal de 1988, inovando no tratamento das
integridade. Na expressão constitucional, sadia qualidade de vida
matérias relativas ao meio ambiente, reservou-lhe um capítulo,
(saúde e bem-estar).
além de inserir instrumentos de proteção em outros dispositivos,
Ao se referir à inviolabilidade ao direito à vida, deixou claro
de forma que se encontram dispersas por todo o texto, revelando
que ela deve ser respeitada, seja quanto à sua manutenção, seja
a aplicação do princípio da horizontalidade. Ela também ampliou
quanto à sua qualidade. Não se trata, simplesmente, de assegurá-
a competência dos entes federados para legislar sobre a matéria,
-la, mas fazê-lo com a complementaçâo indicada no caput do art.
revelando grande avanço relativamente às anteriores.
225, do mesmo texto.
Diante do novo cenário, impõe-se determinar o contorno do
que se chama desenvolvimento sustentável, resultado da interpre Édis Milaré"^ escreve a respeito: '
tação, em especial, dos arts. 1°., III (a dignidade humana como "O reconhecimento do direito a um meio ambiente sadio
fundamento da República); 3°., II (garantia do desenvolvimen configura-se, na verdade, como extensão do direito à vida, quer
to nacional como seu objetivo); 170, VI, e 225, da Constituição sob o enfoque da própria existência física e saúde dos seres hu
Federal. manos, quer quanto ao aspecto da dignidade desta existência
A Constituição, por não ser sua tarefa, não define sustentabili- - a qualidade de vida -, que faz com que valha a pena viver".
dade ou desenvolvimento sustentável.
Ela, entretanto, aponta algumas características do desenvolvi Os dois dispositivos se complementam e indicam que o cons
mento sustentável, permitindo, senão defini-lo, identificar alguns tituinte garantiu o direito a uma vida sadia, para a qual concorre
de seus requisitos. Caberá ao legislador, quando da elaboração de o meio ambiente ecologicamente equilibrado. Eles foram comple-
quaisquer normas, por força do princípio da horizontalidade, apli
car osprincípios constitucionais que orientam o tema, dirigindo o
desenvolvimento para o nível de sustentabilidade. Direitodoambiente, p. 96.
104 José Roberto jMarques Lições preuminares de DiRErro Ambiental 105

mentados, ainda, no disposto nos arts. 170e 182, da Constituição embora isso não represente um problema concreto. Tanto a Cons
Federal, como se verá nos itens seguintes. tituição Federal quanto o Estatuto da Cidade isentam alguns mu
nicípios da obrigatoriedade de elaborar um plano diretor.
2.4.2. O art. 170, da Constituição Federal De acordo com o art. 182, § 1°., da Constituição Federal, "o
O art. 170, da Constituição Federal, embora não verse sobre plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para
direitos e garantias individuais, deles não se distanciou ao dispor cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico
em seu caput: "A ordem econômica, fundada na valorização do da política de desenvolvimento e de expansão urbana".
trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a O Estatuto da Cidade, em seu art. 41, obriga à formulação do
todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, ob plano diretor para cidades:
servados os seguintes princípios;...", (grifo do autor deste trabalho) "I ~ com mais de 20.000 {vinte mil) habitantes; II —inte
Quanto à existência digna, apontou o homem como titular des grantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas; III
se direito, pois se referiu a todos, utilizando-se da mesma técnica - onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instru
de redação empregada no início do art. 5°. Embora com outras mentos previstos no § 4°. do art. 182 da Constituição Federal;
palavras, o sentido é o mesmo daquela expressão referidano caput IV- integrantes de áreas de especial interesse turístico; V-in
do art. 225, da Constituição Federal: sadia qualidade de vida. As seridas na área de influência de empreendimentos ou ativida
expressões são equivalentes. des com significativo impacto ambiental deâmbito regional ou
A defesa do meio ambiente (inciso VI) foi eleitacomo princípio nacional".
regente da existência digna assegurada no caput do art. 170.
Cuidou-se, no mesmo artigo, de assegurar - demonstrando, As cidades que não se incluem nas hipóteses acima mencio
mais uma vez, harmonia com o texto do art. 225 - que a defesa nadas não estão obrigadas à edição de um plano diretor, mas,
do meio ambiente e a economia estão entrelaçadas, visando a be nem por isso, deixam as propriedades nelas localizadas de ter sua
nefícios para o homem. função social, devendo ser aplicadas, nesse caso, as normas gerais
vigentes, considerada a natureza difusa do meio ambiente e, as
2.4.3. Os arts. 182 e 186, da Constituição Federal j sim, a reversão, também para a comunidade, dos serviços que elas
propiciam. A analogia é regra a ser adotada na hipótese.
O inciso XXIII, do art. 5°., foi complementado pelos arts. O plano diretor é pressuposto para aplicação das penalidades
182, § 2°., e 186, tratando das propriedades urbana e rural, previstas no § 4°. do art. 182, da Constituição FederaFl^ Dessa
respectivamente. forma, as sanções constitucionais somente se viabilizarão se hou
O primeiro dispositivo prevê que "a propriedade urbana cum ver plano diretor, qualquer que seja o número de habitantes da
pre sua função social quando atende às exigências fundamentais cidade.
de ordenação da cidade expressas no plano diretor". Assim, reme
teu a clc a missão dc indicar'cs requisitos para atendimento dessa
Constituição Federal: Art. 182. §4®. Éfacultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica
função. No entanto, o legislador parece ter se descuidado do fato para área incluida noplano diretor, exigir, nos termos dalei federal, do proprietário do solo urbano
de quenemtodas as cidades têm ou devem ter um plano diretori". não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena,
sucessivamente de: I —parcelamento ou edificação compulsórios; II —imposto sobre a propriedade
predial eterritorial urbana progressivo no tempo; III- desapropriação compagamento mediante títulos
da divida pública de eimssão previamente apro^da pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até
José Roberto Marques, Código Civil-análise áoufnnóría ejurisprudencial, José Geraldo Brito Filomeao dez anos, em parcelas anuais, iguais esucessivas, assegurados ovalor real da indenização eos Juros
efflí(coord.). p.351. legais".
José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 107
106

O art. 186, inserido no Capítulo III (DaPolítica agrícola e fun No conceito, demonstra o quanto abrangente é o meio ambien
diária e da reforma agrária), do Título VII (Da ordem econômica M J'
te cultural, variando entre bens materiais e imateriais, mas todos
e financeira), esclarece que indicativos de referência, de qualidade, ou seja, características pe
las quais a comunidade pode ser identificada.
"a função social é cumprida quando a propriedade rural Pode-se dizer que meio ambiente cultural e patrimônio cultu
atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigên ral, assim, são expressões que também se eqüivalem.
cia estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: [...] II - uti Alguns cultos aos antepassados também podem ser citados
lização adequada dos recursos naturais disponíveis e preserva como manifestações do meio ambiente cultural, pois revelam ca
ção do meio ambiente". racterísticas próprias, já enraizadas nos costumes da comunidade,
A utilização adequada dos recursos naturais disponíveis é uma que deles não mais se dissociam. Como exemplo, pode-se citar o
fórmula bastante vaga, que deixa margem à discricionariedade. costume oriental de depositar alimentos junto aos túmulos.
Não há um indicativo legal das circunstâncias que a configurem,
mas os excessos, no caso concreto, poderão facilmente ser apura
2.4.5. O art. 225, da Constituição Federal
dos por meio de perícia. O mais importante dispositivo é o art. 225, que integra o Ca
A preservação do meio ambiente é uma expressão que submete pítulo VI (Do meio ambiente), do Título VIII (Da ordem social).
a propriedade rural a toda legislação vigente, especialmente àque Ele orienta todos os demais dispositivos e traça as regras básicas
la relativa ao meio natural e ao do trabalho. Este tem abordagem, relativas à matéria.
também, nos incisos III (observância das disposições que regulam O caput dele está assim redigido: "Todos têm direito ao meio
as relações de trabalho) e IV (exploração que favoreça o bem-estar ambiente ecologicamente equilibrad.o, bem de uso comum do povo
dos.proprietários e dos trabalhadores), do mencionado art. 186. e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público
Excepcionalmente, poder-se-á deparar com algumas peculiarida e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presen
des que sugiram proteção do meio ambiente cultural (uma cons tes e futuras gerações".
trução de valor histórico, por exemplo). Consagra os princípios da sustentabilidade e da solidariedade
O art. 184, do texto constitucional, prevê a desapropriação (das atuais gerações em relação àquelas vindouras).
como sançãoao não cumprimentoda função socialda propriedade. Trata-se de dispositivo semelhante ao que consta da Constitui
Verifica-se que o constituinte considerou essas matérias de tão ção Portuguesa, de 1976, que tem a seguinte redação no item 1
grande importância que, no mesmo texto, previu quais seriam as do art. 66°.: "Todos têm direito a um ambiente de vida humano,
penalidades correspondentes. E, em legislação dessa natureza, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender". Com
uma grande inovação. parando os textos, não nos resta dúvida de que a Constituição da
República Portuguesa inspirou o legislador constituinte brasileiro.
2AA. Os arts. 215 e 216, da Constituição Federal Embora a redação do art. 225, da Constituição Federal, pare
No Título VIII (Da ordem social). Capítulo III (Da educação, ça-nos, à primeira vista, simples e de fácil entendimento, contém
da cultura e do desporto), Seção II (Da cultura), da Constituição uma estrutura complexa, encerrando muitos conceitos e indicati
Federal, o legislador cuidou do meio ambiente cultural no art. 216 vos, motivo pelo qual será analisado por vocábulos e expressões
(vide item 2.3.2.3). apontados nos itens seguintes.
•>

108 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 109

2.4.5.1. «Todos" 1998), que orientam o direito ao meio ambiente saudável, admitir-
Sobre a quem se refere a Constituição Federal quando afirma
-se-á que qualquer pessoa, ainda que não esteja no território bra
sileiro, diante da verificação de dano ambiental ou na iminência
que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibra
de que ele ocorra, possa acionar os órgãos competentes, a quem
do, existem duas correntes: para uma, todas as pessoas, sem qual
quer distinção; para a outra, defendida por Celso Antonio Pache
caberá investigar, avaliar e decidir quanto às providências que de
verão ser adotadas.
co Fiorillo"^, apenas aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
Se governos estrangeiros podem trocar ou transmitir infor
no País, tal como disposto no caput do art. 5°., da Constituição.
José Afonso da Silva"^ lembra que "o direito ao meio ambien
mações relativas a danos ambientais que estão ocorrendo ou que
te ecologicamente equilibrado pertence a todos, incluindo aí as
poderão ocorrer no território brasileiro, um estrangeiro em trân
sito no território nacional também pode fazê-lo. Trata-se, pois, de
gerações presentes e futuras, sejam brasileiros ou estrangeiros".
cooperação indispensável, com vista à proteção dos recursos am
Ou seja, é um direito intergeracional, que ultrapassa o limite das
bientais aqui existentes, considerando-se que reflexos dos danos
gerações atuais para alcançar aquelas que ainda virão.
poderão atingir regiões de outros Estados.
Entende-se que o direito ao meio ambiente ecologicamente
O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado tam
equilibrado não tem a restrição a que se refere o caput do art.
bémé garantido ao estrangeiro, emtrânsito no território nacional,
5°., da Constituição Federal. Mas a atuação do estrangeiro que
ainda que não residente no Brasil.
não se enquadre nesse dispositivo dependeria do direito de ação
Gilmar Ferreira Mendes et invocando Pontes de Miranda,
que, nesse caso, não existe. Não está legitimado à ação popular
dão a justificativa:
ambiental (art. 5°, LXXIII, da Constituição Federal), por força
do contorno estabelecido no CíJpwí (brasileiros e estrangeiros re "A declaração de direitos fundamentais da Constituição
sidentes no País), muito menos à ação civil pública (Lei n° 7.347, abrange diversos direitos que radicam diretamente no princí
de 24-7-1985"^). Restaria, então, ao estrangeiro não residente no pio da dignidade do homem - princípio que o art. 1°., III, da
Brasil, que quisesse empreender a defesa do meio ambiente, acio Constituição Federal toma como estruturante do Estado de
nar órgãos administrativos competentes ou o Ministério Público. mocrático brasileiro. O respeito devido à dignidade de todos os
De qualquer forma, o estrangeiro aqui não residente, em pas homens não se excepciona pelo fator meramente circunstancial
sagem pelo território nacional, que queira proteger, de alguma da nacionalidade" .
forma, o meio de que usufruirá durante sua permanência, estará
Concluindo: tratando da questão ambiental, o ambiente do
protegendo o mesmo ambiente de que todos os nacionais e es •j ^

estrangeiro não residente no Brasil, que aqui se encontre, de um


trangeiros residentes no País usufruem. Esse comportamento não i lado, e o do residente e dos brasileiros, de outro, é o mesmo, de
configura violação à soberania nacional.
maneira que a proteção do primeiro implica, necessariamente,
Considerando-se o princípio da globalidade, o princípio da
sustentabilidade e o princípio da solidariedade (neste incluído o
proteção do último. Ao se proteger o ambiente do estrangeiro que
nao resida no Brasil, líias que por aqui esteja de passagem, estar-
da cooperação, lembrado no art. 78, da Lei n° 9.605"% de 12-2-
-se-á protegendo o ambiente de todos, indistintamente. Esse todos
Curso de direitoambientalbrastleiTo,p. 11.
Direitoambientalconstitucional, p. 53. internacional, deve ser mantido sistema decomunicações apto afacilitar ointercâmbio rápido eseguro
Há o projeto delein"5.139/2009, da Presidência da República, emtrâmite no Congresso Nacional. deinformações comórgãos deoutros países".
"Art78.Paiaa consecução dosfinsTisadosnestaLeieespedalmenteparaareciprocidade da cooperação Curso de direitoconstitucional, p. 272.
110 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 111

tem, então, um caráter territorial, ou seja, todos aqueles que se Manoel Gonçalves Ferreira Filho"® lembra que todas as Cons
encontrem no território nacional. tituições brasileiras utilizaram rol exemplificativo para indicar di
reitos fundamentais. A atual ainda ressalva no § 2°, do art. 5®.:
2.4.5.2. "têm direito" "Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem
Um dos estudos mais significativos do Direito Ambiental é de outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados,
terminar qual a natureza do direito ao meio ambiente ecologica ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do
mente equilibrado. Brasil seja parte".
Surgiu, com a formatação atual, na Constituição Federal de Então, o reconhecimento formal desse novo direito fundamen
tal ocorreu num cenário em que se envolveram causas histórias
1988, embora os intérpretes também apontem a sua defesa em
(necessidade de mudanças motivadas por lutas internas sociais e
textos anteriores, mas sob o manto da proteção à saúde.
políticas) e surgimento de uma nova ideologia internacional base
A consciência internacional a respeito da necessidade de se pre ada na constatação da importância da defesa do ambiente.
servar o meio ambiente produziu maiores efeitos nas décadas de Álvaro Luiz Valery Mirra"' anota que, num primeiro momen
60 e 70, culminando com a Conferência da Organização das Na to, "reconhecer um determinado valor como um direito funda
ções Unidas sobre Ambiente Humano, em Estocolmo, em 1972. mental significa considerar a sua proteção como indispensável
E isso se deu porque a degradação do meio começava a atingir à vida e à dignidade das pessoas - núcleo essencial dos direitos
um liível de gravidade que apontava para o comprometimento da fundamentais".
qualidade de vida e da própria vida do homem. A Constituição Federal consagrou o direito ao ambiente ecolo
.Nesse contexto, em 1987, foi instalada uma assembléia para gicamente equilibrado e não o direito do ambiente ou meramente
forniular uma nova Constituição para o Brasil, a qual, promul direito ao ambiente. A proteção do meio decorre do primeiro, na
gada, mostrou-se reconhecedora dos valores reclamados pela so medida em que sua preservação for de utilidade (ainda que poten
ciedade da época. Dentre eles, o meio ambiente ecologicamente cialmente) ou necessária ao homem (presentes e futuras gerações),
equilibrado como base para a sadia qualidade de vida. visando à satisfação da exigência de sadia qualidade de vida.
O texto correspondente foi instalado no art. 225, fora do Título O texto constitucional, embora não seja explícito, não deixa
II, que trata dos direitos e garantias fundamentais, mas nem por margem a dúvida quanto a isso. Não se questiona - do ponto de
isso deixou de ter a mesma consideração. Primeiramente, porque a vista das leis da natureza - que o meio ambiente ecologicamente
equilibrado é que dá suporte a essa nova dimensão do direito à
proteção ambiental é um valor que contaminou toda a Constitui
vida. Assim, condição essencial para a vida, deve ser reconhecido
ção, como é de sua natureza, dado o princípio da horizontalidade.
como direito fundamental, com as repercussões jurídicas que esse
Partiu-se da conciliação entre os diversos valores com a defesa do
status gera.
ambiente como instrumento essencial à efetivação de alguns direi Maria Helena Diniz"^ ensina que os direitos fundamentais das
tos, notadamente o direito à vida e o direito ao desenvolvimento. pessoas, isoladas ou em comunidade, reconhecidos e garantidos
Depois porque o § 2°., do art. 5°., deixa evidente que o rol contido pela Constituição, "limitam a ação do poder normativo" na me-
nesse dispositivo não é exaustivo, comportando, portanto, a am
pliação que se deu no caput do art. 225.
Direitoshumanosfundamentais, p. 98.
Por outro lado, ele é uma nova dimensão do direito à vida, Açãocivilpública e a reparação dodano ao metoambiente,p. 53.
integrando-o. Normaconstitucional eseusefeitos, p. 8.
112 José Roberto Marques Lições preuminares de Direito AmbieíVtal 113

dida em que restringem a ação do legislador, que não pode con (particulares) de agressões ao ambiente e à qualidade de vida
trariá-la. Assim, reconhecido o direito ao meio ambiente ecologi perpetradas por outros cidadãos (particulares)".
camente equilibrado como direito fundamental, está o legislador
infraconstitucional a ele submetido, devendo-lhe obediência.
Ao questionar eventual arcaísmo dogmático do direito ao am
É um direito de natureza pública subjetiva que pertence à ter biente como direito subjetivo, ele observa^^^ estar a preocupação
ceira dimensão dos direitos fundamentais, chamada de direitos
relacionada "com o facto de se assistir, hoje, a uma deslocação do
de solidariedade, conforme anota Manoel Gonçalves Ferreira Fi problema do campo dos direitos para o terreno dos deveres fwt-
damentais". Segue o constitucionalista:
lho"^. O autor, comentando o surgimento dessa nova categoria de
direitos, "ainda não plenamente reconhecida", observa^^'*: "O enquadramento jurídico-cultural para esta deslocação
também é conhecido. Pretende-se sublinhar a necessidade de
"São estes chamados, na falta de melhor expressão, de direi
se ultrapassar a euforia do individualismo de direitos funda
tos de solidariedade, ou fraternidade. A primeira geração seria a
mentais e de se radicar uma comunidade de responsabilidade
dos direitos de liberdade, a segunda, dos direitos de igualdade,
de cidadãos e entes públicos perante os problemas ecológicos e
a terceira, assim, completaria o lema da Revolução Francesa:
ambientais".
liberdade, igualdade, fraternidade".
A questão relativa ao deslocamento do campo dos direitos indi
O direito ao meio ambiente sadio é um direito fundamental do
viduais para o dos deveres fundamentais também se encontra de
homem. A defesa do meio faz-se tendo em vista obtenção de ins
vidamente acentuada na Constituição Federal brasileira, no caput
trumento para alcançar a sadia qualidade de vida do ser humano:
do art. 225, que os coloca num mesmo contexto, demonstrando a
o equilíbrio ecológico.
Martin Rock^" acentua: "O direito fundamental à vida se tor
sua correlação (o direito ao meio ambiente ecologicamente equili
brado e o dever de defendê-lo e preservá-lo).
na oco e vira frase irônica, uma vez que o direito à qualidade da
O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, por
natureza, essencial para a vida, não está garantido".
força da redação do caput do art. 225, da Constituição Federal,
José Joaquim Gomes Canotilho^^^ propõe que
e do disposto no art. 60, § 4°., do mesmo texto, é cláusula pétrea
"ao lado, ou em vez de, direito ao ambiente, alude-se a um e, dessa forma, não pode ser alterado (suprimido ou desvirtuado)
direito à protecção do ambiente. A idéia de protecção especi por meio de emenda, sendo essa possibilidade deferida, apenas, ao
ficamente referenciada ao ambiente significa, desde logo, que Poder Constituinte originário.
o Estado tem o dever: (1) de combater os perigos (concretos) A maioria das normas de Direito Ambiental inseridas na Cons
incidentes sobre o ambiente, a fim de garantir e proteger outros tituição Federal é de eficácia plena, ou seja, são aplicadas de ime
direitos fundamentais imbricados com o ambiente (direito à diato, pelo simples fato de que são normas jurídicas. Elas pro
vida, à integridade física, à saúde); (2) de proteger os cidadãos duzem, ou podem produzir, efeitos, dependendo, tão-somente da
ocorrência de uma .<;itnação nçlas previstas ou de sua invocação
Estudos sobre direitos humanosfundamentais, p. 6. em juízo.
Qp. dt., p. 57. Outras são - ou eram - de eficácia contida, porque o consti
A temática ecológica do ponto de vista antiopológico e ético (conferência apresentada no Simpósio
Intemadonal "0 meio ambiente como desafio para a política: um intercâmbio de experiências
tuinte deixou a cargo do legislador ordinário a fixação de limites.
européias e latino-amencanas", organizado pela Fundação Konrad Adenauer, no lUo de Janeiro, em
maiode 1987), Traduçder, p. 14.
0p.dt,p.l88. Op. dt, p. 178.
114 José Roberto Marques Lições preunhnares de Direito Ambiental 115

Dado o tempo decorrido da promulgaçãoda Constituição Federal, ele dirá em sua famosa definição do Direito, este consiste 'na
a regulamentação das matérias já foi efetuada, de forma que são, forma da proteção dada pelo poder de coação do Estado às
hoje, integralmente aplicáveis. condições da vida social'".
Das normas ambientais de caráter constitucional não se pode
A Constituição Federal admitiu o meio ambiente como inte
tratar como programáticas ou meramente definidoras de princí
resse difuso ao dispor, em seu art. 129, III, que, entre as funções
pios e programas de atividades, porque revelam conteúdo concreto
institucionais do Ministério Público, está a de "promover o in
e já regulamentado.
quérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio
Dentre os direitos fundamentais destacados pela Constituição
público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos
Federal existem alguns que interessam especificamente a uma pes
•t coletivos". Em que pese poder-se alegar, diante desse texto, que
soa (indenização por erro judiciário^^®, por exemplo), enquanto ou
o interesse seja coletivo, o art. 81, parágrafo único, I, da Lei n°
tros se referem a um grupo de pessoas (necessitados,relativamente
8.078, de 11-9-1990, esclarece-o.
à assistência jurídica^^^; presos"°, etc.). Alguns são considerados
Assim descrevendo, deixou também assentado, tal como dispôs
individuais; outros, coletivos, e outros, difusos.
no art. 5°., LXXIIL^^, que o meio ambiente não integra 6 patrimô
Interessam-nos aqui os últimos, que, pela definição contida no
art. 81, parágrafo único, I, da Lei if 8.078, de 11-9-1990, são os
••l'- nio público. Essa conciliação permite que se conclua estar reverti
do o posicionamento adotado pela Lei n° 6.938/81, de 31-8-1981,
"transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares em seu art. 2°., I, que, previu os princípios da Política Nacional
pessoasTndeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato", ou
do Meio Ambiente, a saber: "ação governamental na manutenção
seja, são' os que pertencem, de uma forma geral, à comunidade.
do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como um
A questão ambiental é algo que não pode ser pensado individu-
'••h'
patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido,
almente^pois, como observou Vitor Bellia^^\ a "...demanda pelos
tendo em vista o uso coletivo", (grifo do autor deste trabalho)
bens e serviços prestados pela água e pelo ar limpos não pode ser O que não se pode é confundir a questão relativa à propriedade
atendida individualmente^ ou seja, depende das decisões da cole >1'';
dos recursos ambientais. Alguns não têm propriedade determina
tividade, pois, em qualquer região geográfica: ou todos respiramos da, são difusos por natureza, como a atmosfera (o ar que respi
ar puro, ou ninguém o faz".
ramos). O solo pode ser do Estado ou do particular. Contudo,
Trata-se de um direito que está localizado acima do direito in
tratando-se de recursos ambientais que se insiram entre os bens
dividual, pois pertence à coletividade.
particulares, o que é de uso comum é o serviço ambiental que eles
Ángel Latorre"^ lembra que prestam, os quais, associados aos demais recursos ambientais em
"Ihering insiste no fato de que a vida socialsupõe a existên condições favoráveis, propiciam sadia qualidade de vida.
cia de um interesse coletivo acima dos interesses individuais, e De acordo com o disposto no caput do art. 225, da Consti
que esse interesse coletivo é o que protege o Direito, ou como tuição Federal, bem de uso comum do povo é o meio ambiente
ecologicamente equilibrado, ou seja, as condições que resultam
"Art. 5°. LXXV - o Estado indenizará o condenado porerro judiciário, assim como o que ficar preso do uso adequado dos recursos ambientais, um dos requisitos para
além do tempo fixadona sentença".
"Art. 5». LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem
insuficiência de recursos".
"Art. 5®., LXXin - qualquer cidadão é parte legitimapara propor ação popular que vise a anular ato
'Art.5®. XLIX - éassegurado aospresos o respeito àintegridade física emoral".
lesivo ao patrimôniopúblicooude entidadede que o Estadoparticipe, àmoralidade administrativa,ao
Introdução à economia domeio ambiente, p.173. meioambiente e ao patrimôniohistóricoe cultural,ficandoo autor,salvocomprovada má-fé,isentode
Introducción al derecho, p. 139 (tradução livre). custas judiciais e do ônus da sucumbênda".
H6 José Roberto Marques Liçôes preliminares de Direito Ambiental 117

a configuração dafunção social da propriedade^ relativamente ao te abiótico; cada um destes fatores influencia as propriedades do
meio ambiente natural. outro e cada um é necessário para a manutenção da vida, como a
No que se refere ao meio urbano, a propriedade deve estar dis conhecemos, na Terra".
posta de acordo com as normas de ordenação da cidade, previstas Zysman Neiman, transcrito por Sônia Lopes^'^^, explica;
no plano diretor, porque, assim, ela gera bem-estar à comunidade "Os componentes dos ecossistemas mantêm entre si intrin
e, consequentemente, possibilita a sadia qualidade de vida. cadas relações. Os produtores, no caso as plantas, absorvem
Nesse sentido, o § 2°. do art. 182, e o inciso II do art. 186, a energia solar e, utilizando substâncias inorgânicas, produ
ambos da Constituição Federal. zem matéria orgânica. Os consumidores, ao se alimentarem
Por outro lado, é princípio da República a prevalência dos di das plantas, adquirem parte dessa energia que foi incorporada
reitos humanos (art. 4°, II, da Constituição Federal), que, embora ao corpo do organismo produtor e, com isso, também podem
tratada no âmbito das relações internacionais, não tem seu reco sobreviver. Ao morrerem, tanto as plantas (produtores) quan
nhecimento interno inviabilizado. to os animais (consumidores) fornecem alimento para os de-
compositores. Estes, por fim, eliminam, assim como o fazem os
2.4.5.3. "ao meio ambiente ecologicamente consumidores, matéria inorgânica que pode ser utilizada no
equilibrado," vamente pelas plantas. Damos o nome teia alimentar a todas
O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, mes essas, relações entre os seres vivos. [...] Os ecossistemas, como
mo não estando arrolado entre os direitos e deveres individuais e nós os conhecemos atualmente, são produto de uma história
coletivos previstos no art. 5°., da Constituição Federal, é também evolutiva única e cuja estabilidade está garantida pelo equilí
um direito de mesma categoria, uma vez que essa indicação tem brio entre seus diversos componentes. As alterações naturais
caráter exemplificativo, por força de seu §2°., como jáse disse. Ele que os ecossistemas vêm sofrendo são sempre muito lentas,
uma vez que mudanças bruscas em qualquer elo de seu sistema
éuma nova dimensão do direito à vida. A vida e sua sadia qualida
podem conduzi-los ao colapso total. A extinção de uma espécie
de resultam das condições favoráveis do meio ambiente.
de predador, por exemplo, é capaz de levar à superpopulação
Embora o art, 225 esteja situado em capítulo diverso, sua reda
determinadas espécies que lhes serviam de presa e, com isso,
ção não deixa dúvida de que odireito ao meio ambiente ecologica desequilibrar toda a teia alimentar"'^^^.
mente equilibrado écláusula inarredável. Édireito da coletividade,
que atinge todos os indivíduos e não pode ser objeto de renúncia Benedito Braga et registram:
(mesmo porque, se uma pessoa ofizesse, não surtiria efeito diante
do direito das demais). "Uma das características fundamentais dos ecossistemas é
Além de direito individual, tem caráter difuso, o que faz com a homeostase. Todo ecossistema procura um estado de equilí
o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado tenha um brio dinâmico ou homeostase por meio de mecanismos de auto-
significado peculiar. controle e auto-regulação, os quais entram em ação assim que
T\ ti rxOf"0 O onoll- ocorre aualquer mudança. Entre a mudança e o acionamento
JL/caa<i ja icxciiua iicScv.
dos mecanismos de auto-regulação existe um tempo de respos-
se do aspecto ecológico.
Odum""* ensina que "o ecossistema é a unidade funcional basi- Bio,p.23.
ca na ecologia, pois inclui tanto os organismos quanto o ambien- Deacordo comS6iiiaIopes,Bi0,p. 539, a teia alimentar difere dacadeia alimentar, que éa seqüência de
seres vivos 'em queumserve dealimento parao outro".
Introduç&o à engenhariaambiental, p. 10.
Cp. dt, p. 9.
118 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 119

ta. [...j Geralmente, esse mecanismo homeostático só é efetivo O site Agronline^'^° noticiou a existência, no Pantanal, de uma
para modificações naturais que, porventura, ocorram - se não superpopulação de jacarés, que fragiliza a cadeia alimentar. Daí,
forem muito profundas nem demoradas. No caso de modifica alguns propõem sua exploração extensiva, com autorização e con
ções artificiais impostas pelo homem, por serem relativamente trole dos órgãos ambientais.
violentas e continuadas, o mecanismo não consegue absorver
Ressalva-se, contudo, que são situações que devem ser prévia e
essas mudanças e ocorre o impacto ecológico no meio".
seriamente avaliadas. Mas, além da fauna e da flora, o ar, a água
Paulo de Bessa Aiitunes"^ relativamente à presença do homem e o solo devem estar em condições de servir aos seres vivos, espe
no ecossistema, observa que cialmente o homem.
Pode-se inferir, do uso da expressão, que o legislador adotou
"O componente cultural da definição de ecossistema [...] é a corrente antropocêntrica, a partir do momento em que admi
um elemento que somente foi agregado ao termo recentemen te, implicitamente, sacrifício de parte de elementos da fauna ou
te e não faz parte da concepção tradicional que os biólogos da flora para manutenção do equilíbrio ecológico. Não podia ser
têm sobre os ecossistemas. Daí ele se transforma em sistema diferente! O desequilíbrio em uma região acaba refletindo em ou
ambiental, pois é a culturalização do meio natural, a presença tras, em uma reação em cadeia, com resultado negativo para o
definitiva do Homem no meio natural, modificando-o".
homem.
E acrescenta^^': Todos os seres vivos têm uma função no ambiente. Eles geram
um benefício direto ao homem e, por vezes, indireto, mantendo
"Os ecossistemas culturais, isto é, os sistemas ambientais, o equilíbrio ecológico. Ocorre que, normalmente, não se percebe
são aqueles constituídos por fatores bióticos, abióticos e cultu- quais são as funções de algumas formas de vida. A propósito, o
rais, ou seja, são aqueles que contam com a participação hu- fato de que as abelhas não fornecem apenas produtos de interesse
mana. Daí decorre que nem todas as alterações, pelas quais econômico imediato, como o mel e a cera, mas também polinizam
passa um ecossistema natural, sejam produto de influências plantas, possibilitando a produção de alimentos^'*h
puramente encontráveis na natureza, mas, ao contrário, sejam Registrou-se, nas últimas décadas, declínio nas populações de
produto da combinação da ação da própria natureza com a
anfíbios, que "desempenham importante papel ecológico nos ecos
intervenção consciente ou inconsciente do Ser Humano".
sistemas naturais", como anotou Sônia Lopes^*^^. Eles contribuem
A expressão consagrada pela Constituição Federal é, portanto, para o "controle da abundância das populações de artrópodes"^"^^,
indicativa da necessidade de que haja avaliação permanente das assim como servem "como fonte de energia para predadores de
espécies e suas populações, relativamente ao meio em que elas vi níveis mais altos na cadeia alimentar". Foram apontadas como
vem, de forma a evitar que o aumento ou diminuição de uma ou causas prováveis desse declínio: doenças decorrentes de infesta-
outra possa afetar a harmonia do ambiente, determinando rea
ções dos seres vivos, as quais atingirão o homem. Muitas vezes, o http://www.agronline.coin.br/agronoticias/noticia.php?idí=282,12-10-2007.
próprio meio é capaz de corrigir o desajuste, mas, não o fazendo, Yasmine Antonini e Rogério Parentoni, Asabelhas e a riqueza nacioaal, Revista Ciência Hoje, vol.28,
p. 63: "Só naUnião Européia calcula-se que84% das264espécies de culturas dependem dapolinização
exigirá intervenção humana. por insetos".
»^Bio.p.353.
Dicionário Houaiss da língua portuguesa-. Artrópode - zoologia - "filode animais invertebrados, que
Danoambientah umaabordagem conceituai, p. 150. se caracteriza pelapresença decorposegmentado, membros locomotores articulados em númeropar
e exoesqueleto quitinoso; os crustáceos, insetos, diplópodes, quilépodes e aricnidos são as principais
Op. cit.,p. 152. classescomponentes".
120 José Roberto Marques Lições preuminares de Direito Ambiental 121

ções por fungos específicos, alterações climáticas, introduções de Toufic Daher Deebeis"^, analisando conceitos ecológicos, re
espécies exóticas vegetais e animais e uso de agrotóxicos. Embora gistrou que equilíbrio ecológico "consiste na relação e interação
algumas dessas causas possam ser naturais, é certo que também desigual, porém harmoniosa, dos seres vivos, no ambiente emque
podem ter origem nas ações humanas. vivem".
Pode-se adotar, como exemplo paralelo, a diminuição dos A propósito do equilíbrio ambiental, explicou Sônia Lopes"':
glóbulos vermelhos no corpo humano, os quais têm a função de
transportar oxigênio para os tecidos. A redução do número deles "Em qualquer ecossistema, todos os componentes vivos ou
pode converter-se em anemias ou leucemias. não-vivos, mantêm total equilíbrio entre si, podendo-se falar
em sinergia ambiental. O termo sinergia pode ser aplicado ao
A manutenção da vida de espécies, por si só, não indica sus-
processo coordenado e integrado de vários fatores na realiza
tentabilidade. É necessário que elas sejam niantidas em seu habi
ção de uma função. Alterações no meio podem implicar dese
tai, ou, fora dele, em condições de segurança, e com população
quilíbrio no ecossistema e determinar modificações, ocorrendo
adequada ao meio em que estejam situadas. O descontrole no au
quebra da sinergia ambiental. Tanto um organismo como um
mento da população e a localização dessa população em ambiente ecossistemaem seu todo têm o poder de se adaptar a pequenas
inadequado podem gerar grande desequilíbrio ambiental, exigin alterações, restabelecendo o equilíbrio. No entanto, modifica
do do homem uma intervenção eficaz, com a finalidade de situar ções bruscas ou violentas normalmente não são compensadas
melhor essa população ou, mesmo, exterminá-la. Pode-se citar, em prazos razoáveis, impondo quebra duradoura do equilíbrio,
ainda,.o caso dos caracóis, oriundos de outros continentes, que com reflexos danosos para a saúde do organismo e de todo o
chegam a ser classificados como pragas e ocasionam consideráveis ecossistema".
prejuízos, devastando lavouras, hortas e plantas ornamentais"'^.
O raciocínio referente à transferência de espécies autóctones"^ Ela cita"® o conceito de equilíbrio ecológico fornecido por Zys-
da fauna aplica-se, também, às plantas exóticas, pois ambos mo man Neiman, o qual nos parece de mais fácil compreensão ao
dificam o ambiente natural para onde são transportados. Muitas operador do Direito, não acostumado comas questões biológicas:
vezes elas ocupam o espaço destinado às espécies locais, provo
"Equilíbrio ecológico é justamente a situação em que as po
cando desequilíbrio ecológico e, também, prejudicando atividades pulações de produtores, consumidores e decompositores man
econômicas, além de comprometerem a biodiversidade. têm-se em proporções ideais para que todos possam sobreviver.
Da mesma forma que os colonizadores trouxeram para a Amé Esse equilíbrio também implica uma relação ótima com o meio
rica algumas doenças aqui desconhecidas e, com isso, acabaram abiótico, do qual apenas os produtos essenciais são extraídos, e
produzindo efeitos desastrosos a partir de então, a inserção de as condições naturais não são alteradas".
espécies de outras regiões também pode gerar efeitos negativos
incalculáveis para o equilíbrio ecológico. Assim, o operador do Direito, seja o que atua na fase de pro
A não manutenção do meio ambiente em condições de equilí- dução, seja aquele queo aplica, deve compreender que o problema
A1 ««014 da Hegradarân ambiental está situado no tempo. A recuperação
tucionais (art. 7°.) é lenta e gradual e, assim, compromete muitas gerações, redu-

Referència deSôniaLopes,Bio,p. 319. Elementos dedireito ambiental brasileiro, p.52


Dicionário Homissda lingua portuguesa-, autóctone - 'que ou quemé natuial do país ou da regiãoem 5fo,p.573.
quehabitae descende dasraçasquealisempreviveram". Op.cit.,p.24.
122 José Roberto Marques Lições prelimiinares ue Direito Ambiental 123

zindo a qualidade de vida, ainda que isso não possa ser medido, 2.4.5.4. "bem de uso comum do povo"
quantificado.
A expressão bem de uso comum do povo proporciona grande
Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida^"' critica o uso expres
trabalho de interpretação.
são equilíbrio ecológico no caput do art. 225, da Constituição Cyrilo Luciano Gomes Júnior^-^^ observou a respeito que
Federal ("meio ambiente ecologicamente equilibrado"), afirmando
que ela tem significado limitado na medida em que indica o meio "a expressão é equívoca, a ponto de ter gerado perplexidade
ambiente natural^^°. Preferível, então, segundo ela, a expressão so dos estudiosos. [...] E corriqueiro, em nossa tradição legislati
ciedade ambientalmente equilibrada^ reproduzida no art. 5°., V, va, que os diplomas sejam salpicados de expressões equívocas,
da Lei n° 9.795, de 27-4-1999, que tem a seguinte redação: de conteúdo incerto, a desencadear árduo trabalho de exegese e
hermenêutica, destinado a conhecer-lhe o sentido e o alcance".
"São objetivos fundamentais da educação ambiental: [...]
V-o estímulo à cooperação entre as diversas regiões do País, A interpretação literal certamente não é a que mais se ajusta
em níveis micro e macrorregionais, com vistas à construção ao sentido da expressão. Se assim fosse, poder-se-ia afirmar que o
de uma sociedade ambientalmente equilibrada, fundada nos meio ambiente ecologicamente equilibrado é uma espécie de bem
princípios da liberdade, igualdade, solidariedade, democracia, público, tal como indicava o art. 66,1, do Código Civil de 1916, e
justiça social, responsabilidade e sustentabilidade". o indica o art. 99,1, do Código Civil de 2002. Este último, apenas
com o acréscimo do artigo masculino plural os em relação ao pri
A autora afirma que é mais amplo e engloba todos os aspectos
meiro, tem a seguinte redação: "São bens públicos: I- os de uso
do meio.
comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças".
Embora a insuficiência da expressão equilíbrio ecológico pos
Se esse bem de uso comum do povo, indicado no caput do art.
sa ser utilizada para desvio de interpretação, no caso da análise
225, da Constituição Federal, correspondesse a uma espécie de
quanto à complexidade de uma sociedade urbana ambientalmente bem público, estaria incorporado ao patrimônio do Estado, que
equilibrada, com limitação do sentido (restringir-se ao ambiente
dele poderia dispor com menos rigor.
natural), écerto quea interpretação sistemática afasta essa tentati
A conclusão de que o meio ambiente não integra o patrimônio
va, pois a Constituição Federal reconheceu a existência dos quatro
público pode ser extraída do art. 5°., LXXIII, da Constituição Fe
aspectos distintos - porém interdependentes - do meio ambiente.
deral. O texto, sem dúvida, não se refere aos recursos ambientais,
pois, dentre estes, pode haver alguns que pertençam ao Estado e,
nesse caso, assim como naqueles em que ele é controlador da qua
lidade dos serviços prestados pelos bens que estão no patrimônio
particular, o que reverte em favor da comunidade são as condições
Aefetividade daproteção do meio ambiente eaparticipação do Judiciário, Desafios do direito ambiental favoráveis para a sadia qualidade de vida. O equilíbrio ecológico
noséculo XXI,Sandra AkemiShimadaKishl et al (orgs.), p-439. resultante do uso adequado dos recursos ambientais é que é bem
Em artigo intitulado "A proteção do meio ambiente edos direitos fundamentais correlatos nosistema de uso comum do povo.
constitucional brasileiro", ín "0 Direiro Ambiental na América Latina e a atuação do Ministério
Público", Annelise Monteiro Steigleder e Luciano Furtado Loubet (orgs.), a autora escreveu: "Ao
valorizar o equilíbrio ecológico, a Constituição consequentemente valoriza as funções ecológicas dos
ecossistemas (os serviços ambientais por eles prestados), a sustentabilidade ecológica, a eficiência
ecológica ou ecoeficiência dos instrumentos ambientais. Oequilibrio ecológico éofiel da balança, regido
pelos princípios científicos epelas inexoráveis leis físicas, químicas ebiológicas (mundo do ser), que não
podem ser ignoradas oudesrespeitadas pelas normas ambientais (mundo do dever ser)". Natureza das relaçõesjurídicas envolvendoo meio ambiente. Revistade Direito imobiliário, p. 246.
José Roberto Marques Lições preuminares de Direito AjMbiental 125
124

Marcelo Pereira de Souza^", a propósito, afirma que, no que dendo este ser entendido comoação ou omissão que contrariem as
se refere às questões ambientais, "elas encontram no Estado seu leis, em desrespeito aos direitos da comunidade. A isso se associa
vetor maiorde execução". Ele é quem traça as normas de proteção, o fato de que, sendo o direito ao meio ambiente ecologicamente
fiscaliza e executa ações visando à prevenção da degradação ou equilibrado um direito fundamental, todas as propriedades devem
sua reparação, pois não se imagina hipótese em que a comunida colaborar para que, do seu uso, sejam proporcionadas condições
de, diretamente, pudesse fazê-lo. O Estado é seu órgão de admi que permitam sadia qualidade de vida a todos.
nistração, incumbido de cuidar dos interesses dela. A Lei n°4.771, de 15-9-1965, que instituiu o novo Código Flo
Paulo de Bessa Antunes^^^ adverte que a interpretação da ex restal, em seu art. 1°., dispõe que
pressão bem de uso comum do povo não pode ser tomada a partir "as florestas existentes no território nacional e as demais
da legislação ordinária, senão interpretando-a à luz da Constitui formas de vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que
ção Federal. Assim, conclui: "Meio ambiente, é indiscutivelmente, revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes
um bem jurídico e, em talcondição, deve ser usufruído por todo o do País, exercendo-se os direitos de propriedade, com as limi
povo, derivando daí o sentido de 'uso comum' adotado pelo texto tações que a legislação em geral e especificadamente esta Lei
constitucional". estabelecem", (grifo do autor deste trabalho)
Aexpressão utilizada no caput do art.225, da Constituição Fe
deral, que ora se comenta, não se refere aos recursos ambientais e O seu atual § 1°., acrescentado pela Medida Provisória n®
sua propriedade. Émais que isso. Meio ambiente ecologicamente 2.166-67, de 24-8-2001, originalmente parágrafo único do art.
equilibrado é conjunto formado por eles, mas um conjunto har 1°., prevê que "as ações ou omissões contrárias às disposições
monioso e que possibilita obtenção de sadia qualidade de vida. E deste Código na utilização e exploração das florestas e demais
justamente esse cenário que inspirou o constituinte a indicar que formas de vegetação são consideradas uso nocivo da proprieda
ele é bem de uso comum do povo, o que não se confunde, portan de". Verifica-se, portanto, que, desde a edição do novo Código
to, com a propriedade daqueles bens. Ao final, é o cumprimento Florestal, já se entendia que os recursos ambientais estavam num
da função social da propriedade que permite obtenção do meio patamar superior aos interesses públicos e privados, e a lembrança
ambiente ecologicamente qualificado. referente ao uso nocivo da propriedade sugeria o desatendimento
Então, não se trata de converter a propriedade pública ou pri de sua função social.
vada em bem de uso comum do povo, embora elas integrem um Entende-se, pois, que bem de uso comum do povo - tal qual é
contexto que permite a geração do meio ambiente ecologicamente citado no caput do art. 225, da Constituição Federal - é o bene
equilibrado. fício que deve resultar da harmonização no uso dos recursos am
Deve-se frisar que não é o meio ambiente, composto de recur bientais, revertendo serviços, mediante equilíbrio ecológico, que
sos ambientais, que é bem de uso comum do povo, mas o meio propiciam sadia qualidade de vida a todos. Irrelevante, nesse pon
ambiente qualificado pelo equilíbrio ecológico. É o resultado da to, se aqueles integram o patrimônio privado ou público. Embora
utilização harmônica dos recursos ambicnLaiS que é bem" de uso /«,
jurídicas, dc direito público ou pri
comum do povo. Essa harmonia équebrada quando se desrespeita vado) detenham a propriedade, os bens devem proporcionar bene
a função social da propriedade, fazendo-se uso nocivo dela, po- fícios à comunidade. O proprietário deve gerenciá-los, atendendo
os requisitos que permitam reconhecimento da função social da
propriedade, pois o resultado útil gerado por essa situação é que
Instrumentos de gestão ambiental:fundamentos eprática, p.91.
... Danoambiental - umaabordagem conceituai, p. 163.
integrará o meio ambiente ecologicamente equilibrado, sob pena
Lições preuminares de Direito Ambiental 127
126 José Roberto Marques

de, não o fazendo, ser submetido à sanções legais previstas (arts. Assim, não se deve ter, no ambiente, atividades que, de qual
183, § 4°., e 184, caput, ambos da Constituição Federai). quer forma (direta ou indiretamente), prejudiquem a saúde, a se
Os bens que compõem o meio ambiente são, dessa forma, de gurança e o bem-estar da população; criem condições adversas às
interesse comum.
atividades sociais e econômicas; afetem desfavoravelmente a biota;
afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente e
2.4.5.5. "e essencial à sadia qualidade de vida/^ lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambien
tais estabelecidos.
Tercio Sampaio Ferraz Junior^^"* afirma que "o jurista da era Esse cenário permite —embora era situação também não menos
moderna, ao construir os sistemas normativos, passa a servir aos
ampla - a proteção dos quatro aspectos do meio ambiente.
seguintes propósitos, que são também seus princípios: a teoria ins A negativa de poluição (entendida era sentido jurídico, mais
taura-se para o estabelecimento da paz, a paz do bem-estar social, amplo que o ecológico) corresponde à sadia qualidade de vida.
a qual consiste não apenas na manutenção da vida, mas da vida Esta é objetivada eliminando-se a poluição, ou seja, as condições
mais agradável possível".
que propiciam a degradação do ambiente de forma mais grave.
O texto constitucional, com relação à sadia qualidade de
A verificação material de ocorrência de sadia qualidade de
vida, é expresso. Ela é objetivo buscado pelo caput do art. 225,
vida, dessa forma, somente poderá ser feita mediante constatação
da Constituição Federal, confirmado pelo caput do art. 170, do de inexistência das situações indicativas de poluição. Ela não está
mesmo texto. Isso se complementa com a dignidade da pessoa hu
vinculada ao luxo ou à disponibilidade de maior quantidade de
mana, inscrita como fundamento da República, no art. 1°., III, da
bens, podendo, então, estar presente em qualquer lugar, indepen
mesma norma-base. '
dentemente da maior ou menor riqueza da população.
À efetivação desse direito é de difícil constatação, seja pela am Esse é o critério que se propõe para entendimento do que é a
plitude de seu conteúdo, seja pela ineficiência de sua verificação
sadia qualidade de vida, com a ressalva de que o conceito é dinâ
material. Não há uma definição legal do que é sadia qualidade
mico, podendo evoluir de acordo com o grau de desenvolvimento
de vida, embora se possa afirmar que se trate da vida saudável,
da sociedade, e guarda certo grau de flexibilidade, na medida em
orientada por condições de bem-estar ("estado de satisfação plena que pode variar a cultura do povo.
das exigências do corpo e/ou do espírito; sensação de segurança,
A vida moderna tem gerado poluição, das mais variadas for
conforto, tranqüilidade"^^^).
mas, que acarreta estresse, além de fenômenos, como o consumis-
O graude indefinição é, defato, grande. O contorno ora ofere
mo, que contribuem, de uma forma ou outra, para a degradação
cido é, também, demasiadamente extenso, merecendo especifica da qualidade de vida.
ção dos requisitos mínimos, os quais podem ser encontrados com
O estresse é entendido como o "esforço de adaptação do orga
a análise da Lein° 6.938, de 31-8-1981, que dispõe sobre a Política
nismo para enfrentar situações que considere ameaçadoras a sua
Nacional do Meio Ambiente, justamente quando conceitua polui
vida e a seu equilíbrio interno"^^'^. O vocábulo era antes usado
ção no art. 3°., III. Nelase encontram as condições que não devem
para indicar desgaste de um material quando submetido a esforço.
ocorrer para que setenha uma situação que permita concluir pela
Ele pode decorrer, além de fatores biológicos próprios da pes
existência de sadia qualidade de vida.
soa, das condições ambientais, mostrando-se como conseqüência

Introdução aoestudo dodireito, p. 69. Marcelo Pinheiro e Márcia Estarque,Sfrejí, disponível em http://www.geocities.com/HotSprings/
Oasis/8478/stress.html, 3-6-2000.
Dicionário Houaiss da línguaportuguesa.
128 José Roberto Marques Lições preuminares de Direito Ambiental 129

da poluição, da falta de serviços e equipamentos públicos adequa direta eindireta (Poder Executivo), eaos Poderes Legislativo eJu
dos, resultando, não raras vezes, em comportamentos violentos diciário, que também têm funções públicas.
que comprometem a segurança da comunidade. Os Poderes Públicos, de acordo com De Plácido e
Francisco Capuano Scarlato e Joel Arnaldo Pontin^^^ também
apontam o consumismo como fator estressante: "agrupam-se, consoante a natureza defunções que lhes são
atribuídas, sob uma tríplice manifestação. É assim que se di
"...exacerbado pela mídia, leva as pessoas a comportamen zem: executivo, judiciário e legislativo. Embora praticamente
tos compulsivos (como fazer compras por impulso, sem neces autônomos, estes três poderes agem harmonicamente, procu
sidade, porexemplo). As pessoas de baixa renda, pressionadas rando, cada um dentro daesfera de ação que lhe é traçada por
tanto pela manipulação da propaganda quanto pela impossi lei, cumprir os desígnios, que constituem sua missão, eque são
bilidade de consumo, já que sua precária condição socioeco- os próprios desígnios do Estado".
nômica não lhes permite fazer muitas compras, sentem-se fre
qüentemente impotentes e frustradas". Demetrio Loperena Rota^^" observa:
Os Poderes públicos são os garantes do exercício dos di
Por fim, reafirma-se que, na interpretação que ora se propõe,
reitos dos cidadãos para com o meio ambiente. Este caráter
relativamente à sadia qualidade de vida, estão presentes os quatro
ê geralpara todos os direitos que giram em torno do cidadão.
aspectos do meio ambiente, cuja proteção é necessária para a sua A saúde pública, as liberdades cidadãs não as dão os Poderes
efetividade.
públicos, mas devem tutelá-las para garantir seu exercício. A
2.4.5.6. "impondo-se ao Poder Público" presença das Administrações públicas é, pois, constante nas re
lações jurídico-ambientais..Esta é a razão pela qual as normas
Ao se referir a Poder Público, o legisladornão fez distinção, de administrativas supõem o maior contingente quantitativo do
forma que resulta compreensível que estão incluídos os níveis fe conjunto ordenamental ambiental".
deral, estadual, distrital e municipal. Caso o constituinte quisesse
se restringir a um deles, ressalvaria como o fez no art. 52, VII, O Poder Executivo se refere ao segmento que administra os
quando afirma que compete privativamente ao Senado Federal bens e interesses do Estado e da comunidade, fornecendo a esta os
"dispor sobre limites globais e condições para as operações de cré serviços e equipamentos de que ela necessita. Também é o execu
dito externo e interno da União, dos Estados, do Distrito Federal tor das políticas públicas desenvolvidas com fundamento nas leis
e dos Municípios, de suas autarquias e demais entidades contro do Estado, elaboradas pelo Legislativo, e das determinações do
ladas pelo Poder Público federal", e no caputdo art. 182, quando Poder Judiciário, proferidas emprocessos.
dispôs que "a política de desenvolvimento urbano, executada pelo Ele representa a força para aplicar e proteger os direitos, pois,
Poder Público municipal...". sem ela, de nada adiantaria o reconhecimento deles pelos Poderes
Por Poder Público entende-se, segundo a Enciclopédia Saraiva Legislativo e Judiciário.
AC ^ ntio Nao ha como se pensar na efetividade desse direito huma
a administração e as funções públicas". Em última análise, pode- no fundamental, sem o Poder Executivo, detentor da verdadeira
-se afirmar que Poder Público se refere à administração pública força, capaz de impor a todos o respeito. Além dessa força que

o ambienteurbano,p. 68. Vocabulário jurídico.


Vol.59,p. 160. Losprincípios dei derecko ambiental, p.32 (tradução livre).
130 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 131

ele tem para executar os comandos legais e os originários do Po Exige-se, daí, que o juiz, para possibilitar melhor decisão, te
der Judiciário, não se pode esquecer que a ele cabe o desenvol nha conhecimentos mínimos a respeito das leis que regem a na
vimento de projetos ambientais, por força da lei ou de decisão tureza, consciência da finalidade de proteção do meio ambiente e
político-administrativa. seja homem do seu tempo. Sem isso, sua decisão apresentar-se-á
Cabe ao Poder Legislativo a tarefa de elaborar as leis que pos como mera redução da defesa traçada constitucionalmente, dis
sibilitarão a defesa do meio ambiente. Assim, os legisladores, re tante da realidade.
presentando o povo, retratarão nas leis, a partir da proteção já Considerando que a conservação da natureza vincula-se, em
estabelecida na Constituição Federal, o nível de conservação e pre última instância, à sobrevivência do homem, as decisões judiciais
servação ambiental, estabelecendo as condutas proibidas e aquelas devem partir do conhecimento da estrutura e funcionamento dos
que deverão ser executadas pelos membros da comunidade. Proi ecossistemas. Não há como^ dessa forma, analisar-se um fato
bir, de tudo, a degradação, nao poderá fazê-lo, sob pena de não isolado.
haver opção para seu cumprimento. Contudo, pode estabelecer O primeiro fator a ser considerado pelo magistrado deve ser o
áreas que devam ser preservadas integralmente e que não possam referente aos princípios que regem o Direito Ambiental, consagra
ser objeto de qualquer forma de exploração humana, bem como dos pela legislação nacional. E a aplicação deles pode garantir, de
autorizar a intervenção eraoutras,além deestabelecer limites para início, a proteção do meio ambiente. Assim, analisado um pedido
todas as formas de degradação. de liminar que visa a evitar um dano ambiental, se o juiz a conce
A" função legislativa é determinante na proteção ambiental. É de, estará aplicando o princípio da prevenção ou o da precaução,
importante, para isso, que o legislador tenha conhecimentos es conforme o caso, garantindo, num primeiro momento, diante da
pecíficos a respeito da matéria, sob pena de que, apresentando razoabilidade do pedido, que a proteção se efetive. Depois, com
projetos a respeito dela, incida em equívocos que terão efeitos di vagar e diante da prova pericial, poderá confirmá-la na decisão
versos daqueles pretendidos pela comunidade e já consagrados no de mérito ou mesmo revogá-la diante do fato de que a degradação
texto constitucional. O conhecimento a respeito das leis da natu prevista não merece punição jurídica, ao menos sob o ângulo civil.
reza é de grandeimportância,pois esclarece temas que, a pretexto A lentidão no andamento dos processos judiciais, motivada por
de possibilitar o desenvolvimento sustentável, determinam maior causas de várias espécies, inclusive pelos mecanismos de protela
degradação. ção existentes na lei, é fator que contribuiu para a insustentabi-
Dos poderes da República, o Judiciário é o último a se pronun lidade. Também concorre para isso o sistema recursal, pois, não
ciar quando há conflito. E, especialmente por isso, exige-se que concedida liminar em benefício do meio ambiente, ou sendo ela
seus integrantes tenham formação adequada para apreciar as li revogada, ainda que o mérito seja de conteúdo protetivo, o tempo
des ambientais, quesão aquelas quese estabelecem entremembros transcorrido poderá apontar para um dano de grande dimensão.
da comunidade que praticam um ato considerado degradador e a O mesmo se diga para o caso de, ainda que concedida a medida
própria comunidade, detentora do direito ao meio ambiente ecolo liminar, ela não ser cumprida. Essas situações correspondem a to
gicamenteequilibrado. mar o medicamento prescrito pelo médico muito tempo depois de
Daniel Roberto Fink^^^, nessa situação, indica confusão entre os emitido o receituário.
que têm direito e os que devem ajustar-se, pois o poluidor também
é titular do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Relação jurídica ambiental e sustentabilidade, Sustentabilidade e temas fundamentais de direito ambiental, JoséRobertoMarques(org.).p.108.
132 José Roberto Marques Lições preliminares oe Direito Ambiental 133

Nesse sentido, Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida^", para consegue entender, normalmente, cora mais facilidade, o que se
quem os princípios da prevenção e da precaução podem ser apli sucede após uma agressão ao ambiente. Para aqueles que têm con
cados pelos magistrados mediante "presteza e celeridade na pres tato mais distante, não é possível, muitas vezes, compreender que
tação das tutelas preventivas que requerem urgência e evitando a a supressão de alguma forma de vegetação possa acarretar efeitos
adoção, desde logo, de medidas mitigadoras e compensatórias", nocivos à fauna e aos recursos hídricos, por exemplo. E o agri
tudo com o intuito de se evitar o dano. cultor, que trata diretamente a terra (todos os recursos ambien
Na difícil tarefa de decidir, o juiz, levando em conta que os tais estão associados ao solo), pode compreender isso mais que os
direitos difusos estão em um plano superior, deve considerá-los na estudiosos do Direito, ainda que estes tenham estabelecido bom
sentença, ainda que não alegados pelas partes e ainda que não se contato físico com os recursos ambientais.
jamobjeto da demanda. A questão ambiental se sobrepõe a quase Quanto mais distante o operador do Direito estiver do meio
tudo (exceto aopróprio direito à vida e ao direito à liberdade), exi natural, menos poderá entender o impacto negativo no ambiente
gindo uma análise precedente nas decisões judiciais, mesmo que que a conduta do homem pode causar. É compreensível: entende-
os litígios versem sobre direitos privados ou públicos. Nenhum -se melhor aquilo que nos cerca, ainda que se possa ter maior co
interesse, de um ou de outro, pode prejudicar os interesses da nhecimento teórico a respeito do assunto.
sociedade.
Nascendo e sempre morando nos grandescentros, muitas vezes
Em questões de natureza ambiental, esses fatores de ordem ma fica difícil imaginar o que é, de fato, por exemplo, uma extensa
terial estão limitados, num primeiro momento, à constatação do queimada, um desmatamento de áreas de preservação permanen
fato; a conclusão de ocorrência de degradação decorre do próprio te, o assoreamento de um curso de água, etc. e sua repercussão, ao
fato, ficando, contudo, a extensão dele sujeita à demonstração,
menos a imediata.
ainda que não exata, dadas as características da situação, confor
ma já se analisou. A reparação, contudo, é que oferece problemas
Não basta a existência de textos legais. Não se pode depender
parasua correção, pois é dependente, sim, defatores de ordem ma da consciência de cada um, ajustada à vida em sociedade e à neces
terial. Num segundo momento, respondem pelos danos ambien sidade de proteção ambiental. Énecessário que, acessando aJusti
tais quern os causou e, não raras vezes, subsidiariamente, o Poder. ça, ela possa responder nos termos da lei, interpretada segundo os
interesses da comunidade.
Público, comumente omisso na origem e evolução do problema.
Em se tratando de matéria ambiental, uma questão primeira A magistratura deve adotar nova visão com referência ao meio
que deve ser analisada é a vivência do operador do Direito e seu ambiente. Isso porque, ocorrendo uma conduta que atinja os re
meio particulary ou seja, a experiência de vida e local em que vi cursos ambientais, a degradação é certa, nunca presumida. O que
veu e vive o profissional. Não que esse aspecto não se aplique às se deve ter mente é que cabe, então, determinar-se a sua extensão,
demais disciplinas do estudo jurídico, mas essa circunstância so- tarefa nada fácil. Mas se pode chegar a uma conclusão dentro do
bressai-se especialmente no Direito Ambiental. que puder ser constatado de imediato, mas - aí sim - presumindo-
isso o influencia de forma a alrerar, eventualmente, a sua per -Sc sciiipic u mínimo da degradação, depois sé verificando os seus
cepção a respeito do fato e de suas conseqüências danosas. Ex reflexos diferidos, quando possível. Deve ser considerado, tam
plica-se: o profissional que foi criado mais próximo da natureza bém, que perícia alguma, dada a natureza do fato, pode apurar
sua real dimensão. Cite-se um exemplo muito conhecido: o das
queimadas de palha de cana-de-açúcar. Quem as defendia, costu
'® Aefetividadedaproteçãodomeioambienteeaparticipaçãodo Judiciário, Dwo/ioí do ííireíto ambiental
.•••vr. --Í-.- , I.
noséculo XXI,SandraAkemiShimadaKishiet al (orgs.), p-445. mava utilizar um argumento recorrente: não havia provas cientí-
Lições preliminares de DiREno Ambiental 135
134 JoséRobertoMarques

cional de veículos, a reciclagem de lixo, a economia de energia, etc.


ficas de que as queimadas traziam prejuízo para omeio ambiente são medidas demasiadamente significativas quando se considera o
e para a saúde.
conjunto de ações das pessoas. Assim, por exemplo, não tem re
OPoder Judiciário, embora já tenha sido seduzido por essa ar levante repercussão ambiental a economia de energia elétrica fei
gumentação, nas primeira esegunda instâncias, parece pender, no ta por uma pessoa, mas tem grande relevância a economia feita
momento, para outra direção.
por milhões de usuários, ainda que em escala individual pequena.
Indicava-se o fato de que não havia demonstração inequívoca No mesmo sentido, todas as ações que podem ser chamadas de
de que omaterial particulado eos gases lançados na atmosfera por ambientalmente corretas, consistentes em hábitos que protejam os
aquela atividade eram nocivos para oambiente epara ohomem. recursos ambientais e que permitam que eles retornem à natureza
Contudo, pode-se afirmar, com base nas Ciências Naturais, de maneira tecnicamente sustentável (reciclagem).
que as queimadas - quaisquer que sejam —poluem o ambiente. A coletividade pode agir de forma eficiente, ainda, de outra
Esse dano não é presumido. O que se presume é a extensão dele forma: elegendo, para membros do Poder Executivo e do Poder
para efeito de reparação eindenização. Daí ser possível, sempre, a Legislativo, pessoas comprometidas com o trabalho em prol do
reparação de um mínimo. meio ambiente ecologicamente equilibrado, revelado por traba
Essa correção de interpretação deve, pois, ser aplicada nas deci lhos efetivos e sérios e não por discursos de fácil elaboração.
sões, como forma de, adotando-se regras impostas pelas Ciências Ao escolher seus representantes, a coletividade faz opção por
naturais, se buscar a efetividade do direito ao meio ambiente eco um programa ou por um projeto previamente divulgado. Essa es
logicamente equilibrado, entendido como essencial à sadia quali colha deve estar vinculada ao interesse comum e não a interesses
dade de vida. particulares, violadores da proteção ambiental, pois estes redun
Nesse contexto, a importância daBiologia, daQuímica eda Fí darão em prejuízo do ambiente e, consequentemente, do próprio
sica seavoluma e elas seimpõem como auxiliares na interpretação beneficiado.
realizada pelos operadores do Direito Mas a tarefa da comunidade não pode se restringir a essa op
ção, devendo se estender ao acompanhamento do trabalho do elei
2.4.5.7. "e à coletividade" to, cobrando-lhe ações ajustadas aos os posicionamentos assumi
Porcoletividade se entende a sociedade ou, mais especificamen dos antes do mandato. A falta dessa fiscalização eqüivale a eleger
te, as presentes gerações. Mas não quis olegislador restringir-se às representantes que não têm compromisso com a causa ambiental.
pessoas, incluindo, no conceito de coletividade, em contraposição O homem deve avaliar e decidir qual o ambiente em que quer
a Poder Público, tudo o que não está incluído neste. Dessa forma, que seus descendentes vivam. Esse indicativo de caráter é determi
compõe-se das pessoas físicas e das jurídicas de direito privado, nante para que o meio seja preservado de maneira mais efetiva. É
tenham ou não finalidade lucrativa. uma escolha atual, cuja repercussão ocorrerá em futuro distante,
No que se refere às empresas - sociedades constituídas com o no qual pessoas de hoje não estarão presentes para comprovar o
fim de se obter lucro -, a obrigação delas tem sido chamada de resultado da opção por elas feita.
responsabilidade social Esta, éaexigência de conformidade legal;
é a adequação da atividade à lei. |v::'
Os membros da comunidade, pelos meios ao seu alcance, no- 'ÍL' •

tadamente com adoção de ações conscientes, devem providenciar i


para que a degradação produzida seja cada vez menor. O uso ra-
136 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 137

2.4.5.8. "o dever de defendê-lo e preservá-lo" 1®., 170 e 225. Eles se completam no esforço de atendimento dos
Tratando-se de gestão ambiental, conservar e preservar não objetivos fundamentais consagrados no seu art. 3°. e na efetivação
tem o mesmo sentido. Registrou Vitor Bellia'^^ que "'o conceito dos direitos e garantias individuais consagrados no art. 5°., ou em
de conservação aplica-se à utilização racional de um recurso qual outros dispositivos que não contrariem os princípios adotados por
quer, de modo a obter um rendimento considerado bom, garantin- ela (art. 5°., § 2°.).
do-se, entretanto, sua renovação e autossustentação' (o que exclui Pensa-se quea preservação ("preservá-lo"), inscritano caput do
os recursos não renováveis)", enquanto preservar "tem sentido art. 225, refere-se ao equilíbrio ecológico identificado na expres
bem mais restritivo, significando 'a ação de proteger contra a des são "meio ambiente ecologicamente equilibrado", e não à simples
truição e qualquer forma de dano ou degradação, um ecossistema, manutenção dos recursos ambientais, tal qual se encontram na
uma área geográfica definida ou espécies animais e vegetais ame natureza.

açadas de extinção'". Entende-se, contudo,quQa.preservação não está excluída. Está,


Gilberto Passos de Freitas^^"^ aponta, para preservação ambien sim, limitada às hipóteses em que o legislador, fundado em infor
tal^ o seguinte significado: "ações que garantem a manutenção das mações técnicas, entende que a manutenção integral dos atributos
características próprias de um ambiente e as interações entre os de uma determinada região deva ser feita (como, por exemplo, a
seus componentes". preservação dos processos ecológicos essenciais, prevista no art.
Paulo de Bessa Antunes^" registra que "o preservacionismo 225, § 1°., I, da Constituição Federal).
é uma atitude que, na prática, serve para congelar os importan
tes lisos de nossos recursos naturais e não serve aos interesses 2.4.5.9. "para as presentes e futuras gerações."
do necessário desenvolvimento econômico e social de que o país
necessita".
Geração é o período correspondente ao intervalo que separa
A questão ambiental não pode ser vista apenas do ponto de
cada um dos graus de uma filiação. O Dicionário de Ecologia e
vista da conservação e preservação dos recursos naturais. Há ou
Ciências Ambientais conceitua-a como "extensão de tempo médio
tro valor consagrado na Constituição Federal, que deve ser inter entre o nascimento de um pai e o nascimento de seu descendente".
pretado conjuntamente: o direito ao desenvolvimento. São dois E, nesse sentido, deve ser tornado também em Direito.
valores que não se excluem, mas se complementam para atender o Assim, as atuais gerações são compostas pelos que hoje vivem
fundamento da dignidade da pessoa humana e o objetivo da sadia e por seus descendentes. Entretanto, as gerações futuras não se
qualidade de vida. A dignidade não está em se assegurar a sadia referem à descendência viva, mas àqueles que ainda não nasceram.
qualidade de vida com a manutenção dos recursos ambientais, se A Constituição assegura aos que virão, ainda que em futuro dis
não com a garantia - também - de efetividade dos direitos sociais, tante, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Eles
o que implica busca do desenvolvimento. Entretanto, este deverá devem usufruir dos mesmos recursos ambientais hoje disponíveis,
ser sustentável, ou seja, compatibilizando-se proteção ambiental e os quais são usados a fim de que as necessidades - ao menos as
desenvolvimento econômico. básicas - sejam supridas. £ o que sechama de direito intergeracio-
A Constituição Federal não faz menção expressa ao desenvol nai, ou seja, clireiro quê ultrapassa as atuais gerações, atingindo as
vimento sustentável. Este decorre da interpretação dos seus arts. seguintes, sem limitação temporal, porém interpretada esta com
razoabilidade.
Introduçãoà economia do meio ambiente, p. 18. Busca-se, com ele, assegurar que os recursos ambientais não
Ilícitopenal ambientale reparaçãodo dano, p. 28. sejam esgotados, permitindoque as futuras gerações possam deles
Danoambiental uma abordagem conceituai, p. 171. também se servir.
138 José Roberto Marques L[çOes preliminares de Direito Ambiental 139

Francisco Carrera^^^ pondera: Roberto GiansantF^^ indica antropocentrismo como "atitude


ou doutrina que considera o homem o centro ou a medida do uni
"Como então responsabilizar-nos perante nossas gerações verso, ou concebe o universo em termos de experiências ou valores
futuras^ Ou seja, com a globalização do patrimônio e da cons humanos". Complementa: "Diz-se principalmente das doutrinas
ciência ambiental, todos somos responsáveis pela manutenção finalísticas, que admitem que todas as coisas foram criadas por
das futuras gerações. Se atentarmos para a impossibilidade de Deus para atender à vida humana".
individualização, isto nos obriga a atribuir características di Ramón Martín Mateo^^® lembra que o Tribunal Constitucional
fusas ao tema. Ou seja, o desenvolvimento sustentável, por
da Espanha, em decisão de 4-11-1987,
ser um fator global, capaz de envolver não só o homem como
também todo o futuro do Planeta, adquire características que "detectou, com acerto, que não se pode considerar como
o incluem no próprio direito ambiental e também no direito objetivo primordial e excludente a proteção ao máximo dos
urbanístico, ou seja, transindividual e indivisível. A própria recursos naturais, concluindo depois que há de se harmonizar
globalização já denota características difusas. A impossibili a utilização racional dos recursos naturais 'com a proteção da
dade de individualização, o caráter global e ainda a própria natureza, tudo isso para o melhor desenvolvimento da pessoa e
descrição do vocábulo 'todos' no art. 225 da C.F. denotam
para assegurar uma melhor qualidade de vida"'.
a abrangência generalizada e universal do Desenvolvimento.
Assim como a expressão 'todos', contida no Art. 2®. da Lei n° Trata-se, portanto, de uma tendência internacional, não se
10.257101, o embasamento legal encontra-se expressamente no pretendendo, com a citação do julgado, justificar-se a posição
"art. 225 de Nossa Constituição Federal". brasileira.
O termo biocentrismo, criado para se contrapor a antropocen
A preservação e a conservação da natureza não têm outro
trismo, tem o conceito segundo o qual as espécies vivas têm o
sentido-senão voltar as preocupações para o futuro, porque di
mesmo valor.
ficilmente as atuais gerações sentirão a degradação ambiental já
São dois conceitos que se conflitam, aparentemente, protegen
provocada e em curso, ainda que ela possa afetar, imperceptivel-
do interesses distintos. Mas não o são.
mente, a sua qualidade de vida.
É uma tarefa de interpretação e, para nós, ela tem de ser feita
frente à Constituição. Será ela, com os valores que consagrou, que
norteará esse estudo.
2.5. A visão antropocêntrica na Constituição A Constituição Federal não afirma expressamente qual foi a
Federal opção feita pela sociedade, mas permite que essa conclusão seja
extraída de alguns dispositivos.
Uma das questões primordiais que deveser resolvida quando se Sabe-se que não houve uma opção, como se uma teoria afastasse a
estuda o Direito Ambientalé definir qual foi a opção do legislador outra. Houve, sim, opção pela prevalência de alguns interesses frente
relativamente à primazia, considerados o homem e os demais seres a outros, quando eles se mostram colidentes em uma mesma situação.
vivos. Em outras palavras, é definir se houve opção pelo antropo- Parece um dilema, colocado como desenvolvimento ou preser
centrismo ou pelo biocentrismo. vação ambiental. Mas ele não existe diante da Constituição, como
adiante se verá.

o desafio dodesenvolvimento sustentável, p. 103.


Cidade sustentável - utopiaou realidade? p. 10. Tratado de derechoambiental,vol. I, p. 106(tradução livre).
140 José Roberto Marques Lições preumínares de Direito Ambiental 141

Inicialmente, ressalta-se que a proteção ambiental é regra bá Observam José Rubens Morato Leite e Patryck de Araújo Aya-
sica da legislação constitucional. Apenas em alguns casos - e isso la^^° que "de fato, a aceitação de um antropocentrismo alargado
deve decorrer do seu texto - admitir-se-á que ela seja relegada a I se encontra amparada legalmente no Direito brasileiro (art. 225,
um plano secundário. E esses casos são exatamente aqueles em caput, da Constituição Federal de 1988 e Lei n. 6.938)".
que há um interesse da coletividade, de natureza difusa, que não Contrapondo-se a esse posicionamento, Gregório Assagra de
pode ser atendido sem uma mínima interferência negativa do ho -Q-', Almeida^^^ entende que o antropocentrismo "não mais se compa
mem no meio ambiente. Mas, nesse caso, sempre se atentará para tibiliza com as necessidades que impõem um código moral e ético
a mínima degradação e para a aplicação concomitante e posterior de comportamento condizente com o respeito ao ambiente". Para
de técnicas corretivas. ele, essa orientação decorre do mesmo art. 225, caput, da Consti
Essa situação é admissível até mesmo por conta de lógica, pois tuição Federal.
não há como o homem sobreviver sem agredir a natureza (a me Deve-se pensar que, conservando e preservando o meio am
dida dessa agressão é que deve ser objeto de estudos e leis). Não biente, garantem-se mínimas condições de sobrevivência e sadia
há interferência positiva do homem em relação ao meio ambiente, qualidade de vida para as gerações futuras, mas também para as
exceto se, em momento anterior, ele interveio negativamente e, as presentes, pois o comprometimento de um recurso ambiental, hoje
sim, pretende minimizar ou corrigir o impacto. Tudo o que o ho disponível e utilizado, pode inviabilizar essa garantia (extensa
mem faz causa algurri dano ao ambiente, ainda que ele não possa contaminação, por exemplo, por energia nuclear).
ser dimensionado, dada a sua pequenez ou dada a falta de recursos Faz-se, aqui, um parêntese a fim de se citar um caso de con
tecnológicos que possam ser usados para tanto. taminação que comprometeu a sadia qualidade de vida de futu
Fábio Nusdeo'^' enfatiza: "viver é poluir". E assim o é: polui-se rais gerações: o acidente na usina nuclear de Chernobyl. A Revista
do nascimento à morte, em quase todas as atividades desenvolvidas. Scientific American^'^^, no artigo Chernobyl, 20 anos depois, assi
Toda interferência negativa configura degradação^ nos termos nado por Giovanni Spataro, trata do caso do relatório médico que
do art. 3°., II, da Lei n® 6.938, de 31-8-1981, mas a lei prevê apenas avalia o impacto do acidente que ocorreu, em 1986, na Ucrânia,
a punição para a poluição^ ou seja, a degradação da qual resulte na usina de Chernobyl. Embora qualquer levantamento, por mais
uma das conseqüências previstas no inciso III, do mesmo disposi minucioso e técnico que seja, não possa indicar os reais impactos
tivo, ao mesmo tempo em que, diante da possibilidade de que ela da explosão, nem estabelecer, com precisão, o nexo causai entre
seja produzida, admite adoção de medidas que busquem evitá-la. ela e tumores cancerígenos, aponta que ocorre um período de la-
O caput do art. 225, da Constituição Federal, deve ser o ponto tência estimado de dez a quinze anos e que, decorrido esse tem
de partida para a interpretação pretendida. Surge, a partir desse po, talvez possam ser diagnosticados os primeiros casos. Embora
dispositivo, obrigação para o Poder Público e também para a co do nexo causai não haja prova específica, pode-se afirmar que o
letividade, no sentido de defender e preservar o meio ambiente, número de casos de câncer em pessoas que tiveram contato com
com a finalidade de garantir que as presentes e futuras gerações resíduos ou com o local da explosão reforça a conclusão de que
possam usufruir do meio ambiente ecologicamente equilibrado, foram contaminadas em razão do evento.
dele extraindo o que for.necessário para sua sobrevivência e para É imnortantp. snofar nnp c\ acidente "rovocou em milhares de
obtenção de sadia qualidade de vida. pessoas a síndrome de radiação aguda. Consigna o artigo:
Novastendências epossibilidades dodireito ambientalno Brasil,Os"novos" direitos noBrasil-natureza
eperspectivas, Antonio Carlos Wolkmer eJosé Rubens Morato Leite {orgs.), p.212.
Direito material coletivo, p. 603.
Desenvolvimento e ecologia, p. 26. in N» 49, junho de2006, p.85.
142 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Akíbiental 143

"A doença agride o organismo destruindo as células-tronco Demetrio Loperena Rota^^^ afirma que o Direito, por ser pro
da medula e as células do aparelho gastrintestinal, mas pode duto cultural humano
atingir também o sistema nervoso central e o cardiovascular. O
sistema imunológico é fortemente debilitado, deixando campo "não pode reconhecer subjetividade jurídica fora dos mem
aberto para infecções, que são a principal causa de morte nesses bros de sua comunidade e espécie, [...] Qualquer objetivo de
casos; mas hemorragias ou edemas também chegam a ser fa proteção dos seres não humanos pode conseguir-se sem reco
tais". {grifo do autor deste trabalho) nhecer-lhes subjetividade jurídica, salvo se isso consistir em
uma declaração formal sem conteúdo".
Retornando ao art. 225, da Constituição Federal, não parece
haver dúvida, tão-somente estudando esse dispositivo, de que o Carlos Maximiliano^^'^ registra que a aplicação do Direito "tem
legislador constitucional criou uma regra de sobreposição dos in por objeto descobrir o modo e os meios de amparar juridicamente
teresses do homem aos dos demais seres vivos. um interesse humano".
Não há como estabelecer existência autônoma dos seres vivos, A lei é obra do homem e tem a função de disciplinar direitos e
de forma que o homem não interfira (negativamente) na preserva obrigações, não admitindo que os primeiros existam sem as últimas,
ção e conservação das espécies animais e vegetais, até mesmo por correspondentes a eles. A Constituição Federal criou uma exceção
que sua sobrevivência é impossível sem que faça uso dos recursos que parece, como se viu, ser de difícil interpretação, mas não o é.
naturais. Não se pode esquecer, por exemplo, que os povos primi A segunda hipótese contida no dispositivo - proibição de sub
tivos viviam exclusivamente da caça e da pesca e, nem por isso, meter os animais a crueldade - é uma regra em que os interesses
hotive comprometimento da fauna. É certo, contudo, que, hoje, referentes à integridade da fauna se sobrepõem aos do homem.
a pppulação é muito superior e que alguns recursos tecnológicos Não parece que, com isso, o legislador pretendeu deferir direito
possibilitam rápida deterioração da natureza, embora, em alguns subjetivo à fauna. É que não parece lógico que submeter animais
casÒs, possam contribuir para a sua recuperação (tratamento de à crueldade possa contribuir para a sadia qualidade de vida do
resíduos, por exemplo). Por outro lado, o homem tem comprometi homem, ainda que se alegue, com isso, manutenção do ambiente
do, com suas inúmeras atividades, a sobrevivência de muitos seres cultural. Entre dois valores - proteção da fauna e mantê-la me
vivos, deteriorando seu habitat. diante práticas de crueldade -, o constituinte fez uma opção que,
O legislador, é certo, criou apenas uma situação em que isso de maneira alguma, prejudica o homem.
pode parecer contrariado: aquela prevista no art. 225, § 1°., VII, Essa hipótese excepcional já foi objeto de análise pelo Supre
da Constituição Federal, que veda práticas, com referência à fauna mo Tribunal FederaF''^, quando esteve sob julgamentoa prática da
e à flora, "que coloquem em risco sua função ecológica, provo farra do boi, integrada aos costumes da população do Estado de
quem a extinção de espécies ou submetam os animais a cruelda Santa Catarina. Ficou assim redigida a ementa:
de". Aqui ocorre uma convivência de interesses que sugere que
"Costume - Manifestação cultural - Estímulo - Razoabilida-
o homem se submete aos interesses da fauna e da flora. É com
de - Preservação da fauna e da flora - Animais - Crueldade. A
preensível que tenha feito assim: é que, comprometendo a função
obrigação de o Estado garantir a todos o pleno exercício de di
ecológica das espécies e a sua extinção, poder-se-á comprometer
reitos culturais, incentivando a valorização e a difusão das mani-
gravemente a sadia qualidade de vida do homem, dada a repercus
são que essa degradação gerará no meio ambiente (muitas vezes de
difícilconstatação ou, em outros casos, por meio de processolento Los princípios deiderecho ambiental, p.30(tradução livre).
que poderá gerar efeitos dezenas de anos depois). Hermenêutica e aplicação dodireito,p. 6.
RE 153.531-8-SC, relatorMinistroMarcoAurélio,j. 3-6-1997.
144 José Roberto Marques Liçoes preliminares de Direito Ambiental 145

festações, não prescinde da observância da norma do inciso Vil pelo uso dos recursos ambientais, em cuja conservação interfere
do artigo 22S da Constituição Federal, no que veda prática que constantemente.
acabe por submeter os animais à crueldade. Procedimento dis- Álvaro Luiz Valery Mirra^'^ consigna:
crepante da norma constitucional denominado 'farra do boi'".
"Como já observou Alexandre Kiss, mesmo considerando
Com relação à fauna e à flora, são as duas únicas vedações que que os sistemas jurídicos têm de fato se aproximado da admis
impõe o texto constitucional. No mais, admite que o direito do são do valor intrínsico do meio ambiente e dos bens ambien
homem se sobreponha aos interesses delas, quando absolutamente tais, a realidade é que a proteção a eles acordada pelo direito
necessário o sacrifício do recurso ambiental, observado o critério nunca aparece totalmente desvinculada da necessidade de pro
da razoabilidade no que se refere à extensão. Assim, o art. 225, § moção da qualidade de vida dos seres humanos".
1°.,I, atribui ao Poder Público o dever de "preservar e restaurar os
processos ecológicos essenciaise prover o manejo ecológico das es De tudo, parece que a Constituição Federal optou por uma po
pécies e ecossistemas" (tendo em vista o equilíbrio ecológico). Para sição intermediária, com preservação e conservação, mas também
tanto, muitas vezes, será necessária a eliminação de elementos da reconhecimento de que o homem vive no e do meio ambiente e de
fauna que comprometam, pela excessiva população, o equilíbrio que os recursos ambientais são colocados à disposição dele para
ecológico, quando não for possívela remoção para áreas que com que tenha sadia qualidade de vida, sem que, com isso, possa usá-
portem sua presença, sem comprometer o ambiente receptor. -los abusadamente. Porisso, exige-se a imposição de limites, tarefa
Não se pode dizer que o § 1°., do art. 225, da Constituição do legislador e dos operadores do Direito responsáveis pela inter
Federal, consagrou o hiocentrismo, pois ele enumera os instru pretação e aplicação das leis. -r
mentos que são deferidos ao Poder Público para assegurar a efe A Constituição Federal, portanto, não excluiu uma ou outra posi
tividade do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado ção: conciliou-as de forma a preservar a dignidade do homem. limi
[caput). tou-se ao posicionamento intermediário, aproveitando o que de bom
Reitera-se que preservação e conservação, embora usualmen existe nas duas teorias, com prevalência dos interesses do homem.
te tomem o mesmo sentido, ecologicamente têm significados dis Vale acrescentar, por fim, que a Declaração do Rio, produto da
tintos. Conservação é a "administração dos recursos naturais de Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvol
forma a minimizar o impacto humano" e preservação, "proteção vimento^^®, enuncia, no Princípio 1, revelando tendência mundial
dos ambientes vivos e de seus habitantes naturais evitando a inter sobre o tema:
ferência humana"^^^.
"Os sereshumanos estão no centro despreocupações com o
No dia-a-dia, as relações entre o homem e o meio ambiente po
desenvolvimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável
dem se desequilibrar, provocando distorções na preservação e na
e produtiva, em harmonia com a natureza".
conservação dos recursos naturais, na medida em que a pobreza
e o desemprego estimulam a sua exploração descontrolada e in E o Princípio 3 tem o seguinte teor:
discriminada (para alimentação, moradia, etc.), muitas vezes com
conseqüências irreversíveis. "O direito ao desenvolvimento deve ser exercido de modo a
O homem, portanto, não é um ser igual aos demais que existem permitir que sejam atendidas equitativamente as necessidades
no ecossistema global. É beneficiário do bem-estar que pode ser
gerado pela proteção da fauna e da flora. A vida dele é mantida
Ação civilpública ea reparação dodanoao meio ambiente, p. 60.
DavidBurnie,Fíguepor dentroda ecologia, p. 9. 3 a 14de junho de 1992.
146 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambieiítal 147

de desenvolvimento e de meio ambiente das gerações presentes exercitarem os demais direitos humanos, nestes compreendidos
e futuras". os direitos sociais, da personalidade e políticos do ser humano".

Não resta dúvida, portanto, de que o constituinte - expressan Ao direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado cor
do uma escolha da comunidade - optou pelo antropocentrismo •1- responde uma obrigação do Estado, que deverá implementar me
{marcado pelo desenvolvimento), mas balanceado com o biocen- didas com vista à sua obtenção. Se ele não o fizer, ninguém mais
trismo moderado. poderá fazê-lo, pois ações individuais não são suficientes para
atingir grande repercussão, especialmente quando se trata do ex
tenso território do Brasil. Mas não se pode descuidar do fato de
que, sendo também obrigação de todos, conforme dispõe o caput
2.6. O direito ao meio ambiente ecologicamente do art. 225, da Constituição Federal, obriga a comunidade a au
equilibrado xiliar o Estado nas providências por ele adotadas, sem prejuízo da
adoção de outras, individuais, a cargo deles.
Entre os direitos de terceira dimensão está o direito ao meio
Tratando do direito ao ambiente como direito subjectivo fun
ambiente sadio. Assegurá-lo é tão vital para as futuras quanto
damental, José Joaquim Gomes Canotilho"^ afirma que "a natu
para as presentes gerações.
reza jurídica dos direitos fundamentais como direitos subjectivos
Sua difusão deu-se a partir da Declaração deEstocolmo (1972),
é, hoje, geralmente reconhecida". Complementa: "...um direito
pela qual se reconheceu esse direito do homem, como base para
subjectivo fundamental é a posição jurídica pertencente ou garan
condições de vida adequadas, o que lhe permite vida digna e
bem-estar.
tida a qualquer pessoa com base numa norma de direitos funda
mentais consagrada na Constituição".
Renovou-o a Declaração do Rio (1992), no princípio I: "Os f

Esse direito, entretanto, não é absoluto e deve ser balanceado


seres humanos estão no centro das preocupações com o desenvol 7^;
com o direito ao desenvolvimento. Ambos são direitos de mes
vimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva, •>17
ma dimensão, e um não exclui o outro. Devem, ao contrário, ser
em harmonia com a natureza". Em texto tão sintético reconheceu:
exercidos conjuntamente, de forma que o direito ao desenvolvi
direito ao meio ambiente sadio, direito ao desenvolvimento susten
mento não se sobreponha, de forma comprometedora, à proteção
tável, equilíbrio ecológico e antropocentrismo.
ambiental.
Manoel Gonçalves Ferreira Filho^^' chama-o dedireito desitua
O item 1 do art. 1 da Declaração sobre o Direito ao Desenvolvi
ção, pois os direitos dessa natureza "sãopoderes de exigir um sta-
tus. Seu objeto é uma situação a ser preservada ou restabelecida". mento, da Organização das Nações Unidas, de 198ú, conceitua-o:
Celso Antonio Pacheco Fiorillo e Marcelo Abelha Rodrigues"®
situam o direito ao meio ambiente como ;í: "O direito ao desenvolvimento é um direito humano inalie
nável em virtude do qual toda pessoa humana e todos os povos
"t-. estão habilitados a participar do desenvolvimento econômico,
"pressuposto de exercício lógico dos demais direitos do ho
mem, uma vez que, em sendo o direito à vida 'o objeto do di social, cultural e político, a ele contribuir e dele desfrutar, no
qual todos os direitos humanos e liberdades fundamentais pos
reito ambiental', somente aqueles que possuírem vida, e, mais
ainda, vida com qualidade e saúde, é que terão condições de •1 sam ser plenamente realizados".

2stuào$sohTtd\Teitoshutfiünosfundamentais,-p. 101.
Manualdedireito ambiental ele^slaçãoaplicável, p.28. Estudossobredireitosfundamentais,p. 184.
148 José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 149

o direito ao desenvolvimento é, segundo Manoel Gonçalves Constituição Federal


Ferreira Filho^®^, "por um lado, um direito individual, inerente a
todas as pessoas, por outro, um direito dos povos". Título I - Dos princípios fundamentais
Distinguindo direitos de garantias individuais, pode-se afir Art. V., m - Fundamentos Art. 3°., rv - Objetivos
mar que os primeiros, de natureza declaratória, estão previstos na fundamentais
Constituição Federal, enquanto, no que se refere ao meio ambien
te, as garantias, de caráter assecuratório, estão previstas de modo Dignidade da pessoa humana Promoção do bem de
demasiadamente amplo no mesmo texto, com contorno pouco todos
definido. As garantias acabaram mais bem esclarecidas nas leis Título II Título vn Título vin
ordinárias que regulamentaram o texto constitucional. Dos direitos e garantias Da ordem econômica e Da ordem
individuais financeira social

2.7. A dignidade da pessoa humana Capítulo I Capítulo n Capítulo I Capítulo n Capítulo VI


Dos direitos Dos direitos Dos princí Da política Do meio
Conceituar dignidade da pessoa humana é tratar de um ob e deveres sociais pios gerais urbana ambiente
jeto muito amplo, o que a lei não faz. Caberá aos operadores do individuais e da atividade
direito, no caso concreto, identificar os requisitos mínimos para coletivos econômica
verificação de atendimento dessa condição.
A Constituição Federal, ao citar, no art. 1°., entre os funda Art. 5°., Art. 6°., Art. 170, Art. 182, Art. 225,
mentos da República Federativa do Brasil {inciso III), a dignidade caput caput caput caput caput
dapessoa humana, traz uma difícil tarefa de interpretação. Saber Inviolabi Educação,
o seu conteúdo, sua extensão, é de grande importância para se Existên Objetivo: Direito ao
lidade do saúde, cia digna,
poder interpretar outros dispositivos, especialmente os de natu ordenar o meio am
direito à trabalho, conforme pleno desen biente eco
reza ambiental, sejam eles da própria Constituição, da legislação
vida. moradia e os ditames volvimento logicamente
ordinária ou mesmo das normas administrativas.
O texto não faz qualquer indicação quanto ao seu significado, lazer. da justiça das funções
I equilibrado:
mas a Constituição, no seu todo, permite que se façam algumas social. sociais da essencial à
reflexões e se chegue a algumas conclusões. cidade e sadia qua
Para José Afonso da Silva"^ dignidade da pessoa humana "é garantir o lidade de
um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fun bem-estar vida.
damentais do homem, desde o direito à vida". de seus
Por ser fundamento {razão de ser) da República, é pressuposto habitantes.
dos demais dispositivos coiisLituCiOiiais, estando neles contzdc com
expressões variadas, embora com a mesma significação. Pode-se
constatar isso no quadro abaixo. O art. 5°., do Capítulo I {Dos direitos e deveres individuais e
coletivos), no Título II (Dos direitos e garantias fundamentais),
DireitoshumanosfundamentcUs,p. 60. assegura, em seu caput, a inviolabilidade do direito à vida. Con-
Curso de direitoconstituríonalpositivo, p. 105.
•v-vrV-^
150 José Roberto Marques Lições preliminares de DiRErro Ambiental 151

tudo, essa inviolabilidade não se refere apenas à manutenção da indicativo melhor na legislação que possa indicar o conteúdo da
vida, mas também à sua qualidade. dignidade da pessoa humana.
A vida é um processo complexo. Tudo que nela interferir des- Verifica-se, então, vida com dignidade quando seu titular é
favoravelmente estará tornando-a debilitada e desagradável, es atendido relativamente ao seu direito à educação e à saúde; tem
tará contribuindo para sua deterioração e, inclusive, para sua trabalho que possibilite a melhoria de sua condição social (art.
durabilidade. 7°., da Constituição Federal); tem moradia saudável, ou seja, que
Então, condições adversas são afrontas à inviolabilidade do di .4 permita um mínimo de decência e que seja atendida por serviços
reito à vida, na medida em que a deterioram.
.

(entre eles, a segurança) e equipamentos públicos, e permita que


Também compondo o Título II (Dos direitos e garantias funda f usufrua de lazer, bem-estar gerado por atividades culturais, es
mentais), está o Capítulo II, que versa sobre os direitos sociais, as
portivas ou recreativas; tem proteção à maternidade e à infância,
sim entendidos, de acordo com o disposto no art. 6°., "a educação,
c tem assistência previdenciária e emgeral. Tudo tendo como pres
a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência
í" suposto o meio ambiente ecologicamente equilibrado, pois não se
social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
imagina o integral exercício de todos esses direitos em ambiente
desamparados". Ir degradado.
Os arts. 225 e 170, VI, da Constituição Federal, devem ser
interpretados conjuntamente com o art. 1°., III, do mesmo texto. i- A dignidade da pessoa humana deve ser entendida como carac
Analisando o Título VII (Da ordem econômica e financeira), terística do tratamento dispensado aos membros-da comunidade
depara-se, no seu Capítulo I (Dos princípios gerais da atividade para que, atendidos por serviços e equipamentos públicos essen
I:.
econômica), logo em seu artigo iniciante, de n° 170, com a previ ciais, bem como respeitados seus direitos fundamentais, possam
são no sentido de que a ordem econômica "tem por fim assegurar ter uma vida sadia.
a todos existência digna" (grifo do autor deste trabalho), decor Trata-se de conceito de difícil delimitação, que os operadores
rência da previsão maiorde respeito à dignidade da pessoa huma do Direito não conseguem precisar. Não é fácil conceituar digni
na, como fundamento da República. dade da pessoa humana, cujo conteúdo tem indicações que variam
O art. 225 já foi analisado no item 2.4.5. Pode-se, com base no tempo e no espaço e é carregado de extensa subjetividade.
nele, afirmar que a sadia qualidade de vida é elemento da digni Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida"'* leciona ser um con
dade da pessoa humana. Não sepode imaginar o reconhecimento ceito de conteúdo indeterminado, que deve ser avaliado caso a
desta sem que a primeira esteja atendida. caso pelos operadores do Direito, inclusive pelos peritos.
Adotando essa idéia para efeito do desenvolvimento deste tra Mas, para que não se possa ignorá-lo, a pretexto de imprecisão
balho, considera-se que o direito à vida, garantido pela Constitui conceituai, é necessário que sejam apontados os direitos mínimos
ção Federal, não se refere apenas à manutenção dos sinais vitais,
que devemser atendidos para que o reconhecimento possa ocorrer.
mas também à qualidade do ambiente em que ela se desenvolve. ' f.:-
Na verdade, esse fundamento constitucional deve ser conside
Assim, qualquer condição desfavorável, que elimine a vida ou a
rado não para verificação de atendimento, mas como critério de
degrade, estará ofendendo o direito constitucional consagrado no
caput do art. 5°., da Constituição Federal. E para se aferir vida interpretação dos demais dispositivos. Havendo conflitos entre di
com dignidade (art. 1°., III, combinado com o art. 5°., caput, am reitos, a dignidade da pessoa humana será o critério que determi-
bos da Con^stituição Federal) recorre-se ao art. 6°. que enuncia, Aefetividade daproteção domeio ambiente eaparticipação doJudiciário, Desafios dodireito ambiental
segundo se entende, os seus requisitos: os direitos sociais. Não há noséculo XXI, SandraAkemiShimadaKishí etal (orgs.), p. 439.
José Roberto Marques Lições preliminares de Direito Ambiental 153
152

nará a prevalência de um sobre o outro, ou seja, estabelecerá uma Fundamento é a raiz, o que dá firmeza ao sistepia. Sem ele, o
hierarquia entre eles no caso concreto. sistema rui, porque é a base detudo. Aqui selocaliza, justamente,
Avaliar a dignidade da pessoa humana no plano abstrato é a dignidade da pessoa humana, que foi alçada a pressuposto da
tarefa muito difícil e que permite longas divagações. Concreta- existência da República Federativa do Brasil. Constituída essa, al
mente, a missão parece mais confortável e o tema flui com maior guns objetivos foram apontados pelo legislador constitucional, ou
naturalidade. seja, foram escolhidas metas para servir de norte para o Estado.
É bomfrisar, contudo, que, dentre osrequisitos mínimos, serão Indicam o que deve buscar a sociedade brasileira.
tratados o meio ambiente e a sadia qualidade de vida, havendo Pode-se, à primeira vista, pensar que há incompatibilidade en
outras faces, correspondentes a outros direitos, que não serão aqui tre a dignidade da pessoa humana e o desenvolvimento nacional^
abordadas.
uma vez que este implica sempre degradação ambiental, ainda que
O princípio - da.dignidade da pessoa humana - é invocado, em grau reduzido.
normalmente, no Supremo Tribunal Federal, em processos crimi A conciliação entre as vertentes é o que se pode chamar de de
nais, sem maior projeção na área cível. senvolvimento sustentável. É a busca do equilíbrio entre a degra
dação inevitável e a máxima proteção possível, considerando-se
que esses dois elementos devem coexistir, mas com atendimento
2.8. Os marcadores constitucionais da do aspecto social, ou seja, dos beneficiários de toda essa operação.
sustentabilidade Ultrapassada a fase de análise dos princípios fundamentais^
identificam-se outros dispositivos que se constituem marcos da
A Constituição Federal, em seu art. 1°., enumera a dignidade sustentabilidade ambiental.
da pessoa humana (inciso III) como um dos fundamentos da Re O art. 5°., inserido no Título II (Dos direitos e garantias fun
pública Federativa do Brasil. damentais), da Constituição Federal, ao tratar, no Capítulo I, dos
O seu art. 3°. indica que um dos objetivos fundamentais da direitos e deveres individuais e coletivos, em seu inciso XXIII as
República égarantir o desenvolvimento nacional senta que "a propriedade atenderá a sua função social".
O desenvolvimento nacional, por sua vez, não implica exclu Ao tratar da propriedade, sem remissão a uma de suasformas,
sivamente crescimento econômico. Embora as expressões sejam englobou as propriedades rural eurbana, que têm, paraesse efeito,
usadas, no dia-a-dia, como sinônimas, não têm o mesmo alcance, características diversas quanto à caracterização da função social.
sendo o último um elemento constitutivo do primeiro. O desen •íp' O disposto no inciso XXIII, do art. 5°, remete ao art. 186,
volvimento tem três vertentes: uma social, uma ecológica e outra que firma a "utilização adequada dos recursos naturais disponí
econômica, sendo que esta última é a que se identifica como cres veis e preservação do meio ambiente" como um dos requisitos que
cimento econômico. devem ser observados, necessariamente, para que a propriedade
Essas três vertentes já estavam consagradas na Lei n° 6.938, de rural tenha suafunção social cumprida. Remete, também, ao art.
31-8-1981, em seu art. 4°., ao prever a necessidade de compatibiii- 182, § 2-., do mesmo texto, o qual enuncia que "a propriedade
zação do desenvolvimento econômico-social com apreservação da urbana cumpre sua função social quando atende às exigências
qualidade do meio ambiente edo equilíbrio ecológico. fundamentais de ordenação dacidade expressas no plano diretor".
Ocorre que a Constituição Federal identifica a dignidade da O Título VII, da Constituição Federal, trata, em seu Capítulo
pessoa humana como fundamento ea garantia do desenvolvimen I, "dos princípios gerais da atividade econômica" e prevê, era seu
to nacional como um dos objetivos fundamentais da RepúbUca. art. 170, caput, que ela "tem por fim assegurar a todos existência
154 José Roberto Marques

digna, conforme os ditames da justiça social", observados, entre


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