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Jerônimo

santo e doutor da igreja católica


São Jerônimo

São Jerônimo
Eremita; Confessor; Doutor da Igreja
Nascimento c. 347 em Estridão
(provavelmente Strido Dalmatiae),
fronteira entre a Dalmácia e a
Panônia
Morte 30 de setembro de
420 (73 anos) em Belém,
Palestina Prima
Veneração Igreja Católica, Igreja Ortodoxa,
por Comunhão Anglicana, Ortodoxia
Oriental
Principal Basílica de Santa Maria Maior,
templo Roma, Itália
Festa 30 de Setembro (cristianismo
litúrgica ocidental)
15 de Junho (cristianismo
oriental)
Atribuições Leão; hábito cardinalício; cruz;
caveira; trombeta; coruja; livros e
material de escrita
Padroeiro Arqueólogos, arquivistas,
estudiosos da Bíblia,
bibliotecários, crianças em idade
escolar, estudantes, tradutores
Portal dos Santos
Jerônimo (português brasileiro) ou Jerónimo
(português europeu), nascido Eusébio
Sofrônio Jerônimo (em latim: Eusebius
Sophronius Hieronymus; em grego:
Εὐσέβιος Σωφρόνιος Ἱερώνυμος) e
também conhecido como Jerônimo de
Estridão, foi um sacerdote católico
ilírio[1], destacado como teólogo,
historiador e confessor, e considerado
santo e Doutor da Igreja pela Igreja
Católica. Filho de Eusébio, da cidade de
Estridão, na fronteira entre a Dalmácia e
a Panônia, é mais conhecido por sua
tradução da Bíblia para o latim
(conhecida como Vulgata) e por seus
comentários sobre o Evangelho dos
Hebreus, mas sua lista de obras é
extensa[2].

Jerônimo é reconhecido como santo


pelos católicos, ortodoxos e
anglicanos.[3][4]

Biografia
Eusébio Sofrônio Jerônimo nasceu na
cidade de Estridão, na província romana
da Dalmácia, por volta de 347[5], mas só
foi batizado entre 360 e 366, quando
viajou para Roma com seu amigo
Bonoso – que pode ou não ser o mesmo
Bonoso que Jerônimo identifica como
sendo seu companheiro quando foi viver
como eremita numa ilha no Adriático –
para continuar seus estudos sobre
retórica e filosofia. Lá, Jerônimo estudou
gramática latina e um pouco de grego[6]
com o gramático Élio Donato, embora
não tenha adquirido a proficiência na
língua grega que, anos depois, alegaria
ter obtido como estudante[7]. Jerônimo,
tendo nascido em uma região do Império
com forte presença romana desde 165
a.C., quando da derrota do último rei da
Ilíria, Gêncio, e já completamente
latinizada no século IV d.C.[8], teria falado
latim como língua materna.

Ainda como estudante em Roma,


Jerônimo se envolveu no
comportamento errático dos colegas
mais despreocupados, o que lhe
provocava depois terríveis ataques de
arrependimento. Para apaziguar a
consciência, visitava aos domingos as
sepulturas dos mártires e dos apóstolos
nas catacumbas, uma experiência que
lhe lembrava dos terrores do inferno:
“ Frequentemente me encontrava ”
entrando naquelas profundas
criptas escavadas na terra, com
suas paredes de ambos os lados
preenchidas com os corpos dos
mortos, onde tudo era tão escuro
que parecia quase como se as
palavras do salmista tivessem se
realizado: «Desçam vivos ao Cheol»
(Salmos 55:15). Aqui e ali, a luz,
não vinda de janelas, mas
descendo através das valas,
aliviava o horror da escuridão. Mas
novamente, tão logo você se via
caminhando cuidadosamente
adiante, a noite escura se fechava
a sua volta e vinha-me à mente o
verso de Virgílio: "Horror ubique
animos, simul ipsa silentia terrent"
— Jerônimo, Commentarius in
 
Ezzechielem[9][10].

Jerônimo utilizou de uma passagem de


Virgílio — "Por todos os lados o horror se
espalhava; o profundo silêncio inspirava o
terror na minh'alma"[11] — para descrever
o horror do inferno. No início de sua
carreira, ele utilizava termos de autores
clássicos para descrever conceitos
cristãos (como "Cheol", um termo para o
inferno) , um indicativo de sua educação
clássica. Embora inicialmente cético em
relação ao cristianismo, no fim acabou
se convertendo[12]. Depois de muitos
anos na capital imperial, Jerônimo viajou
com Bonoso para a Gália e se assentou
em Augusta dos Tréveros (moderna
Tréveris, na Alemanha), onde é possível
que tenha primeiro se dedicado aos seus
estudos teológicos e, depois, a copiar
para seu amigo Tirânio Rufino o
comentário de Hilário sobre os "Salmos"
e o tratado "De Synodis". Depois disso,
Jerônimo viveu vários meses (pelo
menos) ou, possivelmente, anos, com
Rufino em Aquileia, onde fez muitos
amigos cristãos.

Alguns deles o acompanharam quando


ele partiu, por volta de 373, numa viagem
através da Trácia e da Ásia Menor até o
norte da Síria. Em Antioquia, onde ficou
por mais tempo, dois de seus
companheiros morreram e ele próprio
ficou seriamente doente mais de uma
vez. Durante uma destas enfermidades
(perto do inverno de 373-374), Jerônimo
teve uma visão que levou-a a abandonar
seus estudos seculares para dedicar-se
completamente a Deus. Ele parece ter
trocado uma grande quantidade de
tempo que dispendia no estudo dos
clássicos para estudar a Bíblia, dirigido
por Apolinário de Laodiceia, que na
época ensinava em Antioquia e ainda
não dava sinais de sua futura
condenação por heresia (vide
apolinarismo).
Tomando por um súbito desejo de viver
em penitência asceta, Jerônimo passou
um tempo no deserto de Cálcis, para o
sudoeste de Antioquia, uma região
conhecida como "Tebaida Síria", onde
moravam numerosos eremitas. Durante
este período, ele parece ter encontrado
tempo para estudar e escrever. Lá
também dedicou-se a aprender pela
primeira vez o hebraico, sob a tutela de
um judeu convertido e é possível que ele
tenha mantido correspondência com os
judeo-cristãos de Antioquia. Por volta
desta época, Jerônimo contratou uma
cópia de um "Evangelho Hebreu", do qual
fragmentos foram preservados em suas
notas e que é hoje conhecido como
"Evangelho dos Hebreus", considerado o
verdadeiro Evangelho de Mateus pelos
nazarenos[13]. Depois disso, ele próprio
traduziu partes da obra para o grego[14].

De volta em Antioquia em 378 ou 379, foi


ordenado pelo bispo Paulino de
Antioquia, aparentemente contra sua
vontade e sob a condição de poder
continuar sua vida asceta. Logo depois,
viajou para Constantinopla para
continuar seus estudos sobre as
Escrituras com Gregório Nazianzeno. Ele
passou por volta de uns dois anos por lá
e partiu novamente para Roma, onde
passou os três anos seguintes (382-385)
na corte do papa Dâmaso I e a liderança
cristã da cidade. O motivo da viagem foi
um convite para que participasse do
concílio de 382 realizado para acabar
com o cisma na Igreja de Antioquia, que
na época tinha mais de um patriarca
alegando ser o verdadeiro.
Acompanhando um deles, Paulino,
pretendia apoiá-lo nos trabalhos, acabou
se destacando junto ao papa e passou a
exercer um importante papel durante
seus concílios.

Jerônimo então recebeu diversos


encargos em Roma e realizou ali uma
revisão da Bíblia Latina (Vetus Latina)
baseando-se em manuscritos gregos do
Novo Testamento. Ele também atualizou
o saltério contendo o "Livro dos Salmos"
que era na época utilizado em Roma
baseando-se na Septuaginta grega.
Embora não tenha ficado claro para ele
na ocasião, a tradução de muito do que
depois se tornaria a Vulgata latina
demoraria ainda muitos anos e tornar-se-
ia seu mais importante legado (vide
abaixo).

Em Roma, Jerônimo estava rodeado por


um círculo de mulheres bem-nascidas e
bem-educadas, incluindo algumas
oriundas das mais nobres famílias
patrícias romanas, como as viúvas Leia,
Marcela e Paula, com suas filhas Blesila
e Eustóquia. Como resultado da
crescente inclinação destas mulheres
pela vida monástica, da indulgente
lascividade que imperava em Roma e
mais a crítica feroz de Jerônimo ao clero
secular, que não poupava ninguém, logo
irrompeu um conflito contra o clero
romano e seus aliados. Depois da morte
de Dâmaso, seu patrono (10 de
dezembro de 384), Jerônimo foi forçado
a abdicar de suas funções em Roma
quando um inquérito foi aberto pelos
seus inimigos para investigar uma
suposta relação inapropriada entre ele e
Paula.

Além disso, sua condenação ao estilo de


vida hedonista de Blesila levou-a a
adotar práticas ascetas que acabaram
afetando sua saúde e a tornaram tão
fraca fisicamente que ela morreu apenas
quatro meses depois de começar a
seguir suas instruções. A maior parte da
população romana ficou enfurecida com
Jerônimo, acusando-o de causar a morte
prematura de uma jovem tão altiva.Para
piorar, sua insistência de que Paula não
deveria lamentar a morte dela e suas
reclamações de que o luto por ela era
excessivo foram vistos como cruéis e
polarizaram ainda mais a opinião pública
contra ele[15].
Jerônimo com Santa Paula e sua filha Eustóquia,
duas de suas principais devotas. Uma rica viúva,
Paula deu condições para que Jerônimo pudesse
viver sem preocupações financeiras e se dedicasse
aos estudos. Ela seguiu-o depois para Belém e
morreu com ele na Terra Santa.
1638-1640. Por Francisco de Zurbarán, atualmente
na Galeria Nacional de Arte.

Em agosto de 385, Jerônimo abandonou


Roma definitivamente e voltou para
Antioquia com seu irmão Pauliniano e
diversos amigos; logo depois vieram
Paula e Eustóquia, decididas a terminar
suas vidas na Terra Santa. No inverno do
mesmo ano, Jerônimo viajou com elas
na função de conselheiro espiritual. O
grupo, acompanhado do bispo Paulino
de Antioquia, peregrinou por Jerusalém,
Belém e os lugares santos da Galileia
antes de seguir para o Egito, onde viviam
os heróis da vida asceta, os monges do
deserto.

Na Escola Catequética de Alexandria,


Jerônimo ouviu Dídimo, o Cego, ensinar
sobre o profeta Oseias e contar o que se
lembrava de Santo Antão, que morrera
trinta anos antes. Depois, passou algum
tempo na Nítria admirando a disciplinada
vida comunitária dos numerosos
habitantes da "cidade do Senhor",
percebendo que, mesmo ali, "serpentes
escondidas", ou seja, a influência do
polêmico teólogo alexandrino Orígenes.
No final do verão de 388, voltou para a
Terra Santa e passou o resto de sua vida
numa cela eremítica perto de Belém
rodeado por uns poucos amigos,
homens e mulheres (incluindo Santa
Paula e Eustóquia), a quem ele atendia
como sacerdote e professor.

Com recursos financeiros suficientes


providenciados pela rica Paula, que
investia também em aumentar sua
biblioteca, Jerônimo passou a levar uma
vida de incessante produção literária. A
estes últimos trinta e quatro anos de sua
carreira pertencem suas mais
importantes obras; sua versão do Antigo
Testamento traduzida do original
hebraico, o melhor de seus comentários
sobre as Escrituras, seu catálogo de
autores cristãos (De Viris Illustribus) e o
seu diálogo contra os pelagianos, de
perfeição reconhecida até pelos seus
adversários. A este período também
pertence a maior parte de suas
polêmicas, obras que o distinguem dos
demais Padres da Igreja da época,
incluindo tratados contra o origenismo
(crença que seria depois anatemizada)
do bispo João II de Jerusalém e de seu
antigo amigo Rufino.

Em 416, como consequência de suas


obras contra o pelagianismo, partidários
inflamados da crença invadiram os
edifícios monásticos perto de onde vivia,
atearam-lhes fogo, atacaram os
moradores e mataram um diácono,
forçando Jerônimo a se refugiar numa
fortaleza nas imediações.

Jerônimo morreu perto de Belém em 30


de setembro de 420, uma data que
aparece na "Crônica" de Próspero da
Aquitânia. Diz-se que seus restos,
originalmente enterrados em Belém,
foram trasladados para a Basílica de
Santa Maria Maior, em Roma, embora
outros locais no ocidente também
reivindiquem a posse de alguma relíquia
relacionada ao santo.

Traduções e comentários

Tradições artísticas sobre Jerônimo


 

Jerônimo e  o Leão, de
Hans Memling. Além
do hábito vermelho de
cardeal, Jerônimo
ainda aparece curando
a pata do leão, uma
história proveniente da
fusão de sua história
com a de São
Gerásimo.
São Jerónimo no
deserto, na famosa
representação de
Leonardo da Vinci.
Jerônimo aparece
como um eremita,
semi-nu e à mercê dos
elementos.
 

Jerônimo escrevendo
em seu estúdio de
Peter Paul Rubens.
Além do material de
escrita, aparecem
também o leão e a cor
vermelha, característica
do cardinalato.

Jerônimo foi um acadêmico numa época


que o título implicava fluência em grego,
mas ele sabia também alguma coisa de
hebraico quando começou seu projeto
de tradução. Para reforçar seus
conhecimentos, mudou-se para
Jerusalém estudando os comentários
judaicos sobre as Escrituras. Paula, a
rica aristocrata romana que era uma de
suas seguidoras, financiou sua estadia
num mosteiro em Belém onde ele pôde
concluir sua tradução. O trabalho
começou em 382, com a correção da
versão latina do Novo Testamento
utilizada na época, a Vetus Latina. Em
390, iniciou a tradução da Bíblia Hebraica
a partir do original, tendo já traduzido
algumas partes utilizando a Septuaginta
grega originária de Alexandria. Jerônimo
acreditava que o Concílio de Jâmnia - da
corrente principal do judaísmo rabínico -
havia rejeitado a Septuaginta como
versão válida das Escrituras judaicas por
conta do que ele aferiu serem erros de
tradução e elementos heréticos
helenísticos[16][17]. O trabalho terminou
em 405.

Antes da Vulgata de Jerônimo, todas as


traduções do Antigo Testamento eram
baseadas na Septuaginta e não na Bíblia
Hebraica. Porém, a decisão de utilizar
esta ao invés daquela, que era também
uma tradução do hebraico, como fonte
foi contrária às recomendações da
maioria dos cristãos de seu tempo,
incluindo Santo Agostinho, que
considerava a Septuaginta inspirada. O
consenso acadêmico moderno, porém,
tem lançado dúvidas sobre o quanto
Jerônimo de fato conhecia de hebraico e
muitos acreditam que, na realidade, a
"Hexapla" grega teria sido a principal
fonte para a tradução "iuxta Hebraeos" de
Jerônimo do Antigo Testamento[18].

Seus comentários patrísticos se alinham


de forma muito próxima à tradição
judaica e ele se entrega às sutilezas
alegóricas e místicas no estilo de Fílon e
da "Escola de Alexandria". Ao contrário
de seus contemporâneos, Jerônimo
enfatizava a diferença entre os apócrifos
da Bíblia Hebraica e os livros
protocanônicos da Hebraica veritas
("verdeira [Bíblia] Hebraica"). Evidências
disso aparecem em suas introduções
para os apócrifos salomônicos (como os
"Salmos de Salomão") e os livros de
Tobias e Judite. Mais notável, porém, é
sua afirmação na introdução de seu
comentário aos Livros de Samuel:
“ Este prefácio às Escrituras podem ”
servir como uma introdução
defensiva para todos os livros que
traduzimos do hebraico para o
latim, para que possamos estar
seguros que o que ficou de fora
deve ser deixado de lado como
obras apócrifas.
— Jerônimo, Comentários sobre
 
Samuel[19].

Os comentários de Jerônimo se dividem


em três grupos principais:

Suas traduções ou versões de textos


gregos de outros autores, incluindo
quatorze homilias sobre o Livro de
Jeremias e um mesmo número sobre
o Livro de Ezequiel de Orígenes
(traduzidas por volta de 380 em
Constantinopla); duas homílias de
Orígenes sobre os Salmos de Salomão
(em Roma, c. 383); e trinta e nove
sobre o Evangelho de Lucas (ca. 389
em Belém). As nove homilias de
Orígenes sobre o Livro de Isaías
incluídas entre suas obras não são de
sua autoria. Deve-se mencionar aqui
também, como uma importante
contribuição para o estudo da
topografia de Israel, sua obra "De situ
et nominibus locorum Hebraeorum",
uma tradução com algumas adições e
algumas infelizes omissões do
"Onomasticon" de Eusébio. Ao mesmo
período (ca. 390) pertence também a
"Liber interpretationis nominum
Hebraicorum", baseada numa obra que
supostamente remontaria à época de
Fílon e que foi expandida por Orígenes.
Comentários originais sobre o Antigo
Testamento. Ao período anterior de
sua mudança para Belém e aos cinco
anos depois disso pertencem uma
série de curtos estudos sobre o Antigo
Testamento: "De seraphim", "De voce
Osanna", "De tribus quaestionibus
veteris legis" (geralmente incluído entre
suas epístolas, as de número 18, 20 e
36); "Quaestiones hebraicae in
Genesim"; "Commentarius in
Ecclesiasten"; "Tractatus septem in
Psalmos 10-16" (perdida);
"Explanationes in Michaeam",
"Sophoniam", "Nahum", "Habacuc",
"Aggaeum". Depois de 395, ele compôs
uma série de comentários mais longos
e num tom mais derrogatório: primeiro
sobre Jonas e Obadias (396), depois
sobre Isaías (ca. 395 - ca. 400),
Zacarias, Malaquias, Oseias, Joel e
Amós (a partir de 406), sobre Daniel
(ca. 407), Ezequiel (entre 410 e 415) e
Jeremias (depois de 415 e não
terminado).
Comentários sobre o Novo
Testamento. Entre eles sobre as
epístolas a Filêmon, Gálatas, Efésios e
Tito (escrita apressadamente entre
387 e 388); sobre Mateus (ditada
numa quinzena em 398), Marcos,
passagens selecionadas de Lucas, do
Apocalipse e do prólogo do João.

Obras

Ordo seu regula

Obras históricas e hagiográficas


Jerônimo também é conhecido como
historiador. Uma de suas primeiras obras
sobre o tema foi sua Crônica (ou ainda
Temporum liber), escrita por volta de 380
quando ele estava em Constantinopla. É
uma tradução para o latim das tabelas
cronológicas da segunda parte da
Crônica de Eusébio de Cesareia com um
suplemento cobrindo o período entre 325
e 379. Apesar dos diversos erros, alguns
herdados de Eusébio e outros próprios,
trata-se de uma obra valiosa, menos pelo
conteúdo e mais pelo impulso que
proporcionou para cronistas posteriores
como Próspero, Cassiodoro e Vítor de
Tununa, que continuaram
complementando os anais.
Importante também foi sua "De Viris
Illustribus", escrita em Belém em 392,
com título e arranjo emprestados da
"Vida dos Doze Césares" de Suetônio. Ela
contém breves notas biográficas e lista
de obras de 135 autores cristãos, de São
Pedro até o próprio Jerônimo. Para os
primeiros setenta e oito, a "História
Eclesiástica" de Eusébio é a fonte
principal; no segundo grupo, começando
com Arnóbio e Lactâncio, Jerônimo
incluiu uma boa quantidade de
informações independentes,
especialmente para os autores
ocidentais.
Jerônimo escreveu ainda quatro obras
de natureza hagiográfica (biografias de
santos):

A "Vita Pauli monachi", escrita durante


sua primeira passagem por Antioquia
(ca. 376), na qual o material lendário
deriva da tradição monástica egípcia;
A "Vitae Patrum (Vita Pauli primi
eremitae)", uma hagiografia de São
Paulo de Tebas;
A "Vita Malchi monachi captivi" (ca.
391), provavelmente baseada num
trabalho anterior, apesar de se propor
derivar das conversas com o idoso
asceta Malco com o próprio Jerônimo
no deserto de Cálcis;
A "Vita Hilarionis" (ca. 391), contendo
informações históricas mais
confiáveis que as anteriores e baseada
parcialmente na biografia de Epifânio e
parcialmente na tradição oral.

O chamado "Martyrologium
Hieronymianum" ("Martirológio de
Jerônimo") é espúrio; ele foi
aparentemente composto por um monge
ocidental no final do século VI ou início
do VII e faz referência a uma expressão
de Jerônimo do primeiro capítulo da "Vita
Malchi", na qual ele fala de sua intenção
de escrever uma história dos santos e
mártires da era apostólica.
Epístolas

As epístolas de Jerônimo formam uma


importante porção do que restou de suas
obras literárias, tanto pela enorme
variedade de temas quanto pela
qualidade estilística. Independente de
estar discutindo os problemas do ensino
acadêmico ou argumentando em casos
de consciência, reconfortando os aflitos
ou apenas fazendo elogios aos amigos,
atacando os vícios e corrupções de sua
época ou a imoralidade sexual no
clero[20], exortando à vida asceta e a
renúncia do mundo ou se digladiando
com seus adversários, Jerônimo
apresenta uma imagem vívida não
apenas de sua mente, mas de sua época
com características peculiares. Como
não existia naquele tempo uma distinção
entre documentos pessoais e públicos,
frequentemente encontramos em suas
cartas tanto confidências pessoais
quanto tratados direcionados a terceiros
lado a lado[21].

As mais frequentemente republicadas ou


citadas são as exortativas, como "Ad
Heliodorum de laude vitae solitariae" (Ep.
14), "Ad Eustochium de custodia
virginitatis" (Ep. 22), "Ad Nepotianum de
vita clericorum et monachorum" (Ep. 52),
uma espécie de epítome de teologia
pastoral do ponto de vista ascético, "Ad
Paulinum de studio scripturarum" (Ep. 53),
de mesmo objetivo, De institutione
monachi (Ep. 57), "Ad Magnum de
scriptoribus ecclesiasticis" (Ep. 70) e "Ad
Laetam de institutione filiae" (Ep. 107).

Obras teológicas

Praticamente todas as obras de


Jerônimo no campo do dogma tem um
caráter polêmico de tom mais ou menos
veemente, direcionadas principalmente
contra os defensores de doutrinas
contrárias às ortodoxas. Até mesmo a
tradução de um tratado de Dídimo, o
Cego, sobre o Espírito Santo para o latim
(iniciada em Roma em 384 e completada
em Belém) revela uma tendência
apologética contra os arianos e os
pneumatomachoi. O mesmo vale para
sua versão para "De principiis", de
Orígenes (ca. 399), cujo objetivo era
sobrepujar a tradução incorreta de
Rufino. Obras mais polêmicas, stricto
sensu, foram escritas em todos os
períodos de sua vida, em diferentes
contextos. Durante suas passagens por
Constantinopla e Antioquia, por exemplo,
Jerônimo estava mais preocupado com
a controvérsia ariana e, especialmente,
com o cisma em Antioquia
protagonizado por Melécio de Antioquia
e Lúcifer Calaritano. Duas cartas ao papa
Dâmaso (Ep. 15 & 16) trazem
reclamações a ambos os partidos em
disputa, os melecianos e os paulinianos,
que tentavam atraí-lo para a controvérsia
sobre a relação entre Deus Pai e Deus
Filho na Trindade e, mais
especificamente, à aplicação de termos
como ousia (substância) e hipóstase a
esta relação. Na mesma época ou pouco
depois (373), ele compôs sua "Liber
Contra Luciferianos", na qual ele utiliza o
diálogo de forma bastante inteligente
para combater os princípios da facção
dos calaritanos, principalmente sua
rejeição ao batismo realizado por
heréticos (uma tese de cunho donatista,
já rejeitada antes).
Em Roma (por volta de 383), Jerônimo
escreveu uma apaixonada resposta aos
ensinamentos de Helvídio defendendo a
doutrina da virgindade perpétua de Maria
e da superioridade da castidade sobre o
matrimônio. Um adversário de natureza
similar foi Joviniano, com quem debateu
em 392 ("Adversus Jovinianum" e a
defesa desta obra endereçada ao seu
amigo Pamáquio - Ep. 48). Em 406, uma
vez mais Jerônimo defendeu as práticas
piedosas católicas e sua própria ética
asceta contra o presbítero gaulês
Vigilâncio, que era contrário à veneração
dos mártires e das relíquias, ao voto de
pobreza e ao celibato clerical. Em
paralelo, participou ainda da controvérsia
com João II de Jerusalém e Rufino sobre
a ortodoxia do origenismo. A este
período pertencem algumas de suas
mais apaixonadas e completas obras
polêmicas: a "Contra Joannem
Hierosolymitanum" (398 ou 399); duas
obras intimamente relacionadas,
"Apologiae contra Rufinum" (402) e sua
"última palavra", escrita poucos meses
depois, "Liber tertius seu ultima responsio
adversus scripta Rufini".

A última obra polêmica de Jerônimo foi


sua "Dialogus contra Pelagianos" (415),
contra a heresia do pelagianismo.

Legado
Jerônimo é o segundo autor mais
prolífico do cristianismo antigo tardio
(depois de Santo Agostinho). Na Igreja
Católica, ele é reconhecido como santo
padroeiro dos tradutores, bibliotecários e
enciclopedistas[22].

Arte

A Bíblia de Gutenberg da Biblioteca Pública de Nova


Iorque, uma das edições da Vulgata, a obra-prima de
Jerônimo.
Na arte, Jerônimo geralmente aparece
representado como um dos quatro
doutores latinos, juntamente com Santo
Agostinho, Santo Ambrósio e São
Gregório Magno. Como um membro
proeminente do clero romano, ele foi
muitas vezes representado -
anacronisticamente - com o hábito
vermelho de cardeal. Mesmo quando ele
aparece representado como um
anacoreta semi-nu, com a cruz, a caveira
(símbolo da mortalidade) e a Bíblia como
únicas mobílias de sua cela, o chapéu
cardinalício ou outro indicativo de sua
posição de cardeal aparece, via de regra,
em algum lugar da obra.
Jerônimo é também geralmente
representado na companhia de um leão,
uma referência a uma conhecida lenda
de como ele teria domado um leão ao
curar um ferimento em sua pata. A
origem da história, quase idêntica à
contada sobre São Gerásimo, foi
possivelmente uma confusão entre os
nomes em latim dos dois santos,
"Gerasimus" e "Geronimus"[a][b].
Hagiografias de Jerônimo contam que
ele passou muitos anos nos desertos da
Síria romana e diversos artistas
intitularam sua obras "São Jerônimo no
Deserto", entre eles Pietro Perugino e
Lambert Sustris[23].
Ele é por vezes também representado
com uma coruja, o símbolo da sabedoria
e da erudição[24]. Finalmente, a
iconografia de São Jerônimo inclui ainda
materiais de escrita (pena, tinteiro, papel
etc.) e a trombeta do Juízo Final.[24].

Ver também
Traduções da Bíblia
Ordem de São Jerônimo

Notas
[a] ^ Eugene Rice sugeriu que, com toda
certeza, a história do leão de Gerásimo se
ligou à Jerônimo em algum momento no
século VII, depois que as invasões militares
árabes forçaram muitos monges gregos
que viviam nos desertos do Oriente Médio
a buscarem refúgio em Roma. Rice
conjectura[25] que, "por causa da
similaridade entre os nomes 'Gerasimus' e
'Geronimus', este o nome latino de Jerônimo,
um sacerdote também latino tornou São
Jerônimo o herói da história que ele havia
ouvido sobre São Gerásimo; e que o autor da
'Plerosque nimirum', atraído por uma história
ao mesmo tempo tão pitoresca, tão
aparentemente apropriada e tão ressonante
em significado e sugestionamento; e sob a
impressão de que ela teria origem em
histórias que peregrinos teriam ouvido em
Belém, incluiu-a em sua 'vida' de um santo
favorito que, não fosse assim, não realizara
milagres"[26].
[b] ^ Uma reminiscência desta história pode
ser encontrada na "Legenda Áurea"
(século XIII), de Jacobus de Voragine[27]

Referências
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Ligações externas
"St. Jerome" na edição de 1913 da
 
Enciclopédia Católica (em inglês). Em
domínio público.
Este artigo incorpora texto da Enciclopédia
Judaica (Jewish Encyclopedia) (em inglês)
de 1901–1906 (artigo "Jerome" ), uma
publicação agora em domínio público.
«São Jerônimo» (em inglês). Catholic
Online
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