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2017
http://rodriguesia.jbrj.gov.br
DOI: 10.1590/2175-7860201768208
Luís Alexandre Estevão da Silva1,2, Claudio Nicoletti de Fraga1, Thaís Moreira Hidalgo de Almeida1,
Marcos Gonzalez1, Rafael Oliveira Lima1, Mônica Sousa da Rocha1, Ernani Bellon1, Rafael da Silva Ribeiro1,
Felipe Alves de Oliveira1, Leonardo da Silva Clemente1, Ulises Rodrigo Magdalena1,
Erika von Sohsten Medeiros1 & Rafaela Campostrini Forzza1,2
Resumo
Sistemas de informação são fundamentais para o gerenciamento dos acervos biológicos das instituições de
pesquisas em biodiversidade, uma vez que elas vêm fazendo investimentos significativos nos processos
de informatização e digitalização de suas coleções. Os sistemas de bancos de dados de herbários e de
jardins botânicos têm evoluído no sentido de disponibilizar online os dados de exsicatas e das coleções
correlatas, além de suas imagens. Neste trabalho é apresentada a nova versão do Jabot, o sistema de
gerenciamento de coleções botânicas desenvolvido no Jardim Botânico do Rio de Janeiro. O sistema reflete
hoje o conhecimento adquirido por uma equipe multidisciplinar composta de botânicos e profissionais
da área de computação, em uma década de uso intensivo no gerenciamento do conteúdo digital e na
curadoria do herbário.
Palavras-chave: sistemas de gerenciamento de coleções científicas, herbário, coleções biológicas, banco
de dados de herbário.
Abstract
Information systems are critical to the management of biological collections of research institutions in
biodiversity, since they have been making significant investments in the computerization process and
digitization of their collections. Systems of herbarium and botanical gardens databases have evolved to
provide online data from herbarium specimens and related collections, in addition to your images. In this
paper is presented the new version of Jabot, the botanical collections management system developed at the
Botanical Garden of Rio de Janeiro. The system now reflects the knowledge acquired by a multidisciplinary
team of botanists and computer professionals, in a decade of intensive use in the management of digital
content and curator of the herbarium.
Key words: scientific collections management systems, herbarium, biological collections herbarium databases.
1
Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, R. Pacheco Leão 915, 22460-030, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
2
Autores para correspondência: estevao@jbrj.gov.br, rafaela@jbrj.gov.br
392 Silva, L.A.E. et al.
gerenciamento de acervos biológicos vêm sendo as opções não atendiam a todos os requisitos
desenvolvidos nos últimos anos (Neto et al. 2013). exigidos para as necessidades do instituto, como
Por meio desses sistemas, o conteúdo das coleções por exemplo, o acesso via internet ou então não
pode ser acessado por muitos pesquisadores, eram economicamente viáveis.
estudantes e público em geral de forma não O Jabot é utilizado pelo JBRJ para
presencial (Wen et al. 2015). armazenar e publicar dados e imagens das
Coleções botânicas são compostas por amostras online, ele auxilia na curadoria dos
amostras que certificam a riqueza da flora de acervos tanto desidratados quanto vivos e facilita
uma determinada região. Essas amostras vegetais o gerenciamento dos serviços tradicionalmente
são desidratadas, registradas e armazenadas prestados. O objetivo do presente trabalho
em condições especiais para sua conservação é descrever o sistema de gerenciamento de
através dos séculos (Forzza et al. 2008; Bridson coleções botânicas Jabot desenvolvido no Jardim
& Forman 1992; Peixoto & Morim 2002). O Botânico do Rio de Janeiro, após uma década
Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ) abriga de uso, de desenvolvimento e de conhecimento
um dos acervos biológicos mais antigos do Brasil acumulado. Além disso apresentamos um
e atualmente mantém a maior coleção de amostras comparativo entre as funcionalidades e recursos
de plantas do país (Forzza et al. 2015; Gasper & técnicos encontrados no Jabot e dois dos
Vieira 2015; Forzza et al. 2016). As amostras principais programas de gerenciamento de
do herbário possibilitam que sejam geradas coleções científicas, o Brahms e o Specify.
informações relevantes como: a identificação de
espécies, geração de floras, revisões taxonômicas, Características da nova versão
estudos populacionais e morfológicos dentro Sistemas de informação sobre a biodiversidade
do contexto temporal ou espacial, estudos de tem um extenso conjunto de requisitos funcionais
restauração de áreas degradadas, estudos de apoio e não-funcionais determinantes para a adoção
ao estabelecimento de áreas de proteção, entre e uso efetivo pelos pesquisadores. Entre os
outras inúmeras possibilidades. principais requisitos não-funcionais está o uso
Considerando a necessidade de tornar mais de padrões de metadados como por exemplo, o
acessíveis as informações associadas em suas padrão Darwin Core (<http://rs.tdwg.org/dwc/>).
coleções, em 2005 teve início no JBRJ uma Em relação aos requisitos funcionais, o fato de
iniciativa ambiciosa para a época, visando capturar ter sido desenvolvido com o acompanhamento
em uma base de dados todas as informações de um grupo de cerca de 50 pesquisadores e com
contidas nas amostras botânicas da instituição o envolvimento das curadorias, possibilitou um
(Gonzalez 2009; Forzza et al. 2016). Para que levantamento eficiente de requisitos, permitindo
isto fosse possível, dois anos antes a primeira o desenvolvimento de um sistema adequado à
versão do sistema Jabot (<http://jabot.jbrj.gov. diversas pesquisas realizadas pelos botânicos.
br>), acrônimo de Jardim Botânico, começou a ser Após o processo de especificação do sistema
desenvolvida pela equipe da própria instituição, foi lançada a primeira versão composta apenas
utilizando software livre, mais especificamente pelos módulos de coleta e taxonomia. Ela
na linguagem de programação PHP e o sistema permitia consultas aplicadas às seguintes coleções
gerenciador de banco de dados Postgresql. Esta científicas: exsicatas, arboreto, carpoteca, xiloteca
escolha foi baseada nas diretrizes governamentais e fototeca (Fig. 1).
vigentes à época (Santos 2005), com destaque nas Sugestões de incorporação de novas coleções
recomendações visando promover a independência botânicas, funcionalidades adicionais, em função
tecnológica, desenvolvimento de conhecimento dos avanços computacionais e do amadurecimento
local, independência de fornecedor único e dos usuários na ferramenta fomentaram o
eliminação de mudanças compulsórias em face da desenvolvimento de uma nova versão do sistema.
descontinuidade de versões de software. Antes do A Figura 2 apresenta a tela inicial de consulta da
desenvolvimento do sistema foi realizada a análise nova versão disponível para o público em geral.
de alguns dos principais softwares disponíveis na Para atender às novas demandas, foram
época: Brahms (<http://herbaria.plants.ox.ac.uk/ também criadas funcionalidades para o
bol/>), BG-Base (<http://www.bg-base.com/>) gerenciamento das coleções correlatas, do
e EMu (<https://emu.kesoftware.com/>), sendo herbário e da coleção viva. A nova versão é
o primeiro gratuito. A avaliação mostrou que composta por 8 módulos, apresentados de uma
Figura 6 – Digitalização de uma amostra utilizando o equipamento Canon EOS 5D lente compact-macro EF 50 mm.
Figure 6 – Digitalization of herbarium specimen using Canon EOS 5D with compact-macro lens EF 50 mm.
como poda, tratamento, adubação, etc. O módulo o gerenciamento espacial dos espécimes cultivados
disponibiliza também as imagens dos exemplares com o uso da extensão Postgis (<http://postgis.
em cultivo registradas e armazenadas no servidor net/>) do banco de dados Postgresql.
de imagens. Um mapa digital, editado em ambiente A interface do sistema é responsiva, ou
de Sistemas de Informações Geográficas (SIG), faz seja, permite o uso tanto em computadores como
formatos: .XLS, .CSV, .ODS, .JSON, .XML alcançados. No Jabot, existe um módulo com
e no padrão de dados do sistema speciesLink esse objetivo, que foi desenvolvido com base
( < h t t p : / / s p l i n k . c r i a . o r g . b r > ) . Ta m b é m em estudos anteriores sobre qualidade de dados
exporta para publicadores de dados nacionais em coleções botânicas (Chapman 2005a; Silva
e internacionais: a) Global Biodiversity et al. 2010; Dalcin et al. 2012).
Information Facility (<http://www.gbif.org>); Esse módulo é dividido em três grupos
b) Sistema de Informação sobre a Biodiversidade (Fig. 14), de acordo com os tipos de erros
Brasileira (Gadelha et al. 2014); c) Portal da característicos de coleções botânicas:
Biodiversidade, do Instituto Chico Mendes taxonômicos, georreferenciamento e de coletas.
(<https://portaldabiodiversidade.icmbio.gov. Para facilitar esse acompanhamento o sistema
br>); e d) Centro Nacional de Conservação da resume numericamente os totais de erros da base.
Flora e o Herbário Virtual - Reflora (<http:// Quanto à localização geográfica das
www.herbariovirtualreflora.jbrj.gov.br>), coleções biológicas, a confiabilidade dos dados
ambos sistemas coordenados pelo JBRJ. passou a ser fundamental para os botânicos,
Para a comunidade de usuários do R (R Core permitindo monitorar e modelar o ambiente da
Team (2015), foi implementado um pacote distribuição geográfica dos indivíduos, visando
denominado RJabot que possibilita a extração ações conservacionistas. A Figura 15 apresenta a
das amostras com coordenadas. tela para a correção geográfica de uma amostra.
Dessa maneira, buscando diminuir a
2.5. Módulo de Qualidade de Dados possibilidade de erros de digitação nos atributos
A análise e acompanhamento da qualidade geoespaciais, a entrada de novos registros no
de dados em bancos de dados é fundamental Jabot passou a ser feita com o uso de filtros que
para prover pesquisas, facilitando inclusive que definem a pertinência de valores para latitude,
os resultados dos trabalhos científicos sejam longitude e denominação de municípios.
PostGIS para o sistema gerenciador de banco de limpeza de dados (Chapman 2005b). Para
de dados (SGBD) PostgreSQL é usada para tal, foi desenvolvida uma rotina de importação
o suporte ao armazenamento, gerenciamento, de planilhas (Fig. 16). A planilha padrão pode
tratamento e análise de dados espaciais ser baixada diretamente pelo sistema (<http://
(Urbano & Cagnacci 2014). Em sistemas que jabot.jbrj.gov.br/v2/download/BasePadrao_
envolvem dados associados à localização JabotEspecime.xls>). Nesse componente, o
geográfica, a integração do PostGIS com SIG curador pode selecionar entre 81 possíveis
(Longley 2013) e WebGIS possibilita diversos filtros a serem aplicados antes da importação.
recursos para consulta, visualização e análise Desta forma, erros encontrados nos dados de
geoespacial. Atualmente, os pesquisadores coletas são evitados, como por exemplo, o uso
utilizam equipamentos GPS (Global Positioning de um táxon que não consta na Flora 2020 (Flora
System) nas excursões de campo para obterem do Brasil 2020 em construção 2017), adotada
as coordenadas dos pontos de coleta com como dicionário. A inclusão de táxons de
nível de precisão da ordem de 5 a 15 metros. espécies exóticas pode ser feita no módulo
Com o registro das coordenadas dos pontos Taxonomia, a ser descrita na subseção 2.7.
de coleta, consultas são realizadas com a Após o processo de validação, quando a
extensão PostGIS, como por exemplo, em planilha não apresentar mais erros, os registros
polígonos. O sistema não avalia apenas o nível podem ser incluídos no sistema. O usuário então
de qualidade de dados existentes. Há uma seleciona o tipo de coleção botânica e segue as
grande preocupação em impedir a entrada de instruções do sistema para completar o processo
novos erros, diminuindo o tempo em atividades (Fig. 17).
2.6. Módulo Lista de Espécies parte da tela que detalha os dados para um
O sistema possui um módulo para a determinado táxon.
construção e gerenciamento de listas taxonômicas
regionais, como a Lista da Flora do Rio de 2.7. Módulo Espécies (Taxonomia)
Janeiro (Nadruz 2017). Atualmente mantida com O módulo taxonômico tem sua importância
o trabalho colaborativo de aproximadamente destacada em qualquer banco de dados de flora.
150 taxonomistas, o módulo segue o conceito As funcionalidades presentes nesse módulo têm
de um Sistema Colaborativo (Pimentel & Fuks como objetivo gerenciar os táxons, possibilitando
2011). Neste módulo os pesquisadores podem que sejam incluídos (Fig. 19) e revisados
associar os táxons de uma lista geral, indicando somente por supervisores, com a finalidade
aqueles que ocorrem na região de estudo, um de manter e aprimorar a qualidade dos nomes
estado, por exemplo; acrescentar detalhes de adotados no sistema.
ocorrência, como a unidade de conservação, O sistema possibilita também o controle
ecossistemas, municípios onde ocorrem; entre das atualizações taxonômicas armazenando
outras informações. Na Figura 18 é apresentada o histórico das determinações das amostras.
O Specify usa o MySQL, porém foi observado que etiquetas aleatórias ou configuradas pelo usuário
o suporte para o idioma português existe apenas (Figs. 22; 23), permitindo ao usuário a geração de
na versão 6.2 ou 6.5, que é desktop, impactando etiquetas de barras em diferentes tamanhos.
na perda das vantagens de uma aplicação web. Diante do apresentado pode-se observar que
Outro diferencial é que o Jabot tem integração com algumas características não encontradas no Brahms
a Flora 2020, assim, as alterações taxonômicas e no Specify foram decisivas para a implementação
realizadas na lista oficial do país são refletidas nos do Jabot e de sua nova versão. São elas: sistema
dados. O sistema possui o recurso de emissão de de gerenciamento da coleção viva; controle de
coleções correlatas; integração com a Flora do não ter sido disponibilizado de forma aberta; seu
Brasil; e a gerência da aplicação pela web. Esta uso já está sendo feito por algumas instituições
última característica foi fundamental para o sucesso parceiras na modalidade de trabalho baseada em
do sistema, facilitando o trabalho da equipe de computação em nuvem, no modelo SaaS (Kavis
informática na sua administração. 2014), permitindo utilizar a aplicação dentro da
O Jabot foi desenvolvido com tecnologia infraestrutura de computação do Jardim Botânico
livre e apesar de, no momento, seu código-fonte do Rio de Janeiro, sem custos.