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Pastor Marcos Alexandre Monteiro

LITERATURA
APÓCRIFA

Pastor Marcos Alexandre Monteiro


Igreja Evangélica Missão Boas Novas – Rua São José, 137, Jardim Tropical, Serra, ES
Pastor Marcos Alexandre Monteiro

LITERATURA APÓCRIFA

Introdução
Todo livro é escrito com uma ou mais características literárias, a
depender do contexto, do local ou da finalidade do livro. No período
interbíblico 1 surgiram muitos tipos de literatura, dos quais podemos
destacar algumas como: história, ficção, sabedoria, gêneros
devocionais e apocalípticos.

A maioria destes livros perderam-se com o tempo, sendo que alguns


conseguiram sobreviver, devido a judeus cristãos que preservaram. Os
judeus procuraram destruir todos estes livros, que eles denominaram
de “livros de fora”. “Foi costumeiro agrupar esses escritos em duas
classificações conhecidas como Apócrifos 2 (aqueles juntados com o
Velho Testamento, em vários manuscritos da Septuaginta) e os
Pseudo-epígrafos3 (aqueles escritos durante o período, mas não
juntados à LXX4)” (HALE).

1 Período Interbíblico: é o período que marca o fim do Antigo Testamento e o


início do Novo Testamento, é o chamado silêncio profético que vai de Malaquias
até a pregação de João Batista. Um período que durou cerca de 400 anos.
Praticamente quase todos os livros apócrifos surgiram neste período e, como a
igreja compreendeu que neste período Deus não trouxe nenhuma revelação, ela
denominou os livros que surgiram neste período de apócrifos ou não inspirados.
Este período de silêncio de Deus foi um dos critérios para negar a inspiração de
vários livros.
2 Apócrifos: do grego apókryphos, que significa “oculto” ou o que tem “coisas

escondidas”. São livros não originais, cuja veracidade não foi comprovada. Não
pertence ao autor a que é associado, portanto, não canônico.
3 Pseudo-Epígrafos: são livros aos quais é atribuída falsa autoria. Foram escritos

no período apostólico, mas não atribuídos aos apóstolos ou a um de seus


discípulos.
4 LXX ou Septuaginta: é a mais antiga tradução em grego do texto hebreu do

Antigo Testamento. A história conta que esta tradução foi feita por 72 tradutores,
de onde deriva o nome Septuaginta ou LXX.
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O Cânon Judaico
O cânon do Antigo Testamento foi formado por estágios, sendo
completado somente por volta do ano 70 d.C., período em que houve
a separação entre cristãos e judeus. Após este período, “os judeus
farisaicos mudaram-se para Jâmnia5 e voltaram ao estudo da Torah6
com o novo propósito de reedificar o judaísmo” (HALE).

Os judeus não toleraram nenhum outro escrito como sendo


inspirados, mas somente os 39 livros conhecidos do Antigo
Testamento Protestante. Estes só reconheciam como livros inspirados
os escritos em hebraico e aramaico antes do período do Império Persa
(550 a 330 a.C.). Os livros apócrifos que sobreviveram foram
preservados pelos cristãos. “Os cristãos, contudo, desde o princípio
reconheceram os ‘livros de fora’ como não sendo parte das Sagradas
Escrituras. O Concilio de Trento 7 (1546), ao colocar a tradição em igual
autoridade com o cânon aceito do Novo Testamento, declarou onze
desses ‘livros de fora’ como sendo genuínos” (HALE).

5 Jâmnia: local onde ocorreu o Concílio de Jâmnia. Um concílio rabínico ocorrido


no final do século I. O concílio tornou canônico apenas os livros escritos em
hebraicos, compostos em Israel e até o tempo do profeta Esdras. Com isso tornou-
se canônico para os judeus apenas o conhecido Antigo Testamento Protestante.
Com a destruição de Jerusalém e o crescimento do Cristianismo, o objetivo dos
judeus ao definir seu cânone, era fortalecer a fé e a tradição judaica.
6 Torah: a palavra significa instrução, lei, apontamento, direção. Torah, refere-se

ao Pentateuco, os cinco primeiros livros da Bíblia, sendo uma das três divisões do
cânon judeu, o Tanakh. O Tanakh é o Antigo Testamento hebraico, dividido em
três partes: a Torah (Leis), os Nevi’im (Profetas) e os Ketuvim (Escritos).
7 Concílio de Trento: foi um concílio ecumênico da igreja católica, com objetivo de

se opor ao Protestantismo e afirmar a fé católica. Como a Reforma Protestante


aderiu com relação ao Antigo Testamento ao cânon judaico, a igreja católica
aderiu a vulgata latina, uma tradução latina do Antigo Testamento que contém o
acréscimo de sete livros (os considerados apócrifos para os Protestantes).
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Os Livros Apócrifos
Os livros apócrifos não são em sua totalidade rejeitados, pois, alguns
têm grande valor histórico, enquanto outros são invenções.
Praticamente toda literatura apócrifa é abertamente supersticiosa,
estando em desarmonia com o restante das Escrituras inspiradas.
Estes livros apócrifos podem ser lidos para efeito de conhecimento,
mas não deve ser usado para criar e sustentar doutrinas. Segue abaixo
uma pequena classificação destes livros apócrifos.

Literatura Histórica: este tipo de literatura é a mais confiável do


período. Entretanto, nelas há muitos erros gritantes e, portanto, são
rejeitadas como literatura inspirada. São exemplos de livros apócrifos
históricos: I Esdras e I e II Macabeus.

Literatura de Ficção: “estas obras são o que seria denominado hoje


ficção histórica. Esta ficção, colocada numa estrutura histórica, era
usada para propósitos didáticos” (HALE). Este tipo de gênero era
usado para propagandas judaicas contendo lições éticas, religiosas e
patrióticas. São exemplos de livros de ficção: Tobias, Judite, Epístolas
de Jeremias, III Macabeus e Carta de Aristeas.

Literatura Gnômica (Sabedoria): este tipo de literatura é uma


composição entre pensamentos judaicos e pensamentos gregos. Isto
ocorreu no período de helenização 8, que o foi a absorção judaica da

8Helenismo: foi o período de expansão da cultura grega, um ideal de Alexandre o


Grande. Com a expansão do império grego, vários povos, inclusive, a Palestina,
absorveu a cultura grega, como o idioma. Isto é percebido no próprio Novo
Testamento. Apesar dos discípulos do primeiro século viverem sob o domínio de
Roma, a língua usada era predominantemente o grego, inclusive o Novo
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cultura grega. Na literatura do Antigo Testamento os autores estão
mais preocupados com a prática e o concreto, já na literatura grega a
preocupação está com as ideias (o raciocínio lógico especulativo).
“Para o judeu, a sabedoria precisa realizar-se na conduta diária. Sua
origem se encontra na sabedoria de Deus e não é, portanto, o
resultado da especulação” (HALE). São exemplos de literatura
gnómica: Eclesiástico, Testamento dos Doze Patriarcas, Sabedoria de
Salomão, Livros dos Jubileus, Oráculos Sibilinios, IV Macabeus, Oração
de Manasses, Assunção de Moises, Livros de Baruque e Adições ao
livro de Daniel.

Literatura Apocalíptica: este tipo de literatura é uma das mais


conhecidas e utilizadas e abarca ao menos três dimensões: o conteúdo
da mensagem, a forma da mensagem e o propósito da mensagem. A
literatura apocalíptica normalmente surgiu em períodos de
perseguição, pois, seu objetivo era encorajar o povo a perseverar na
fé. Esta literatura tem algumas características como: “significação
histórica, autoria pseudônima, uso liberal de visões, forte elemento
preditivo, altamente simbólico, dramático, e era uma defesa radical do
povo para o qual era escrito” (HALE).

Quanto à forma, era: a) pseudônimo, isto é, um autor que assina com


um nome que não é seu; b) simbólico, pois, é carregado de símbolos e
linguagem figurativa; c) mitológico, pois, é formado por mitos e
lendas; d) alegórico, isto é, de linguagem metafórica; e) visionário,
pois, o autor fundamenta-se em visões.

Testamento foi escrito em grego, uma marca forte da helenização na cultura


judaica da época.
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Quanto ao conteúdo, era: a) escatológico, pois refere-se ao fim dos
tempos; b) determinista, pois, fala de acontecimentos futuros já
determinados para ocorrer; c) pessimista acerca da história; d)
dualístico, pois identifica na história humana forças que se opõe como
bem e mal, trevas e luz; e) transcendental, pois seu conteúdo diz ter
vindo de fora e transcende a realidade material humana.

Quanto à função, o objetivo era fortalecer a fé de um povo


perseguido. Diante de todo sofrimento humano, a mensagem do livro
aborda a justiça de Deus.

A literatura apocalíptica é uma das mais distintas produzidas pelo


judaísmo. Nela estão contidos os ideais de esperança, sendo uma
mensagem intensamente messiânica 9 e profundamente profética. Esta
literatura surgiu principalmente em tempos difíceis, períodos de
perseguição, por isso a mensagem destes livros visa confortar e
fortalecer a fé dos fiéis. O período de perseguição “foi adaptado para a
produção do gênero apocalíptico por causa de intensa perseguição e
sujeição aos poderes estrangeiros. Comumente olhada como ‘tratados
para tempos difíceis’, essa literatura tentou responder a perguntas
sobre por que o povo de Deus sofre” (HALE).

Estes livros relatam uma relação especial de Israel com Deus, pois,
mesmo que o povo de Israel sofra por conta de perseguições, esta

9 Messianismo: provém da palavra hebraica mashiah, e christos em grego,


significando “Salvador”. É a crença na vinda de um libertador divino. No Antigo
Testamento, o profeta que mais falou do Messias foi Isaías. O povo judeu sempre
esperou a vinda do Messias, mas como um libertador humano, semelhante aos
libertadores do livro de Juízes. O Messias, Jesus Cristo, veio, mas o povo judeu não
acreditou, entretanto, todos que os que creem em Jesus Cristo como Salvador se
tornam filhos de Deus.
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literatura fala de uma possível destruição dos inimigos de Israel.
Nestes livros as visões e profecias não são específicas, mas gerais. E
“para proteger tanto o autor como os leitores, a obra era geralmente
escrita no nome de um dos homens famosos do Velho Testamento”
(HALE). São exemplos de livros apocalíticos apócrifos: o Livro dos
Segredos de Enoque, o Segundo Livro de Baruque, IV Esdras, os Livros
de Adão e Eva e o livro de Enoque.

Abaixo vou detalhar especificamente o livro de Enoque, que se tornou


um dos livros muito utilizado em tempos contemporâneos para
defender doutrinas que não estão na Bíblia.

O Livro de Enoque: “comumente chamado Enoque Etiópico, para


distingui-lo de “Os Segredos de Enoque” (ou Enoque Eslavônico). Este
é o mais importante de todos os apocalipses” (HALE). De toda a
literatura apócrifa, somente esta tem proximidade com o texto do
Antigo e do Novo Testamento. No livro há uma explicação completa a
respeito dos filhos de Deus e das filhas dos homens citado em Gênesis
6.1-410. O livro também fala das pregações de Enoque citadas em
Judas 14,15 11, além de falar dos anjos aprisionados citados em II Pedro
2.412.

10 (Gênesis 6.1-4). E aconteceu que, como os homens começaram a multiplicar-se


sobre a face da terra, e lhes nasceram filhas, viram os filhos de Deus que as filhas
dos homens eram formosas; e tomaram para si mulheres de todas as que
escolheram. Então disse o Senhor: Não contenderá o meu Espírito para sempre
com o homem; porque ele também é carne; porém os seus dias serão cento e
vinte anos. Havia naqueles dias gigantes na terra; e também depois, quando os
filhos de Deus entraram às filhas dos homens e delas geraram filhos; estes eram
os valentes que houve na antiguidade, os homens de fama.
11 (Judas 14, 15). E destes profetizou também Enoque, o sétimo depois de Adão,

dizendo: Eis que é vindo o Senhor com milhares de seus santos, para fazer juízo
contra todos e condenar dentre eles todos os ímpios, por todas as suas obras de
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O livro de Enoque existe em três versões: grega, latina e etiópia, sendo


que apenas a versão etiópia é completa, contendo 108 capítulos. Este
livro foi escrito provavelmente entre os anos 200 e 264 a.C., com o
propósito de encorajar os judeus fieis e predizer a queda dos inimigos
de Israel. “A maioria dos estudiosos concorda que este é o livro mais
desafiador e gratificante fora do cânon. Há muita coisa nele que leva a
uma compreensão da teologia do Novo Testamento, e muita coisa que
o mantém fora do cânon. Contudo, a popularidade deste livro presta-
se a um importante estudo, que não pode ser encontrado no Velho
Testamento” (HALE).

Conclusão
O fato de Judas citar o texto de Enoque não significa necessariamente
que devemos considerar o Livro de Enoque como inspirado e nem
desconsiderar a inspiração de Judas. Judas poderia estar usando uma
tradição oral, fato que era comum pelos demais escritores do Novo
Testamento. No verso 9, Judas também cita um texto do livro apócrifo
chamado Assunção de Moises.

Paulo também fez referências a escritores pagãos, conforme Atos


17.28: Porque nele vivemos, e nos movemos, e existimos; como
também alguns dos vossos poetas disseram: Pois somos também sua
geração. I Coríntios 15.33: Não vos enganeis: as más conversações
corrompem os bons costumes. E Tito 1.12: Um deles, seu próprio

impiedade, que impiamente cometeram, e por todas as duras palavras que


ímpios pecadores disseram contra ele.
12 (II Pedro 2.4). Porque, se Deus não perdoou aos anjos que pecaram, mas,

havendo-os lançado no inferno, os entregou às cadeias da escuridão, ficando


reservados para o juízo.
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profeta, disse: Os cretenses são sempre mentirosos, bestas ruins,
ventres preguiçosos. Além de citar a tradição rabínica, conforme 2
Timóteo 3.8: E, como Janes e Jambres resistiram a Moisés, assim
também estes resistem à verdade, sendo homens corruptos de
entendimento e réprobos quanto à fé. E um midrash judaico,
conforme 1 Coríntios 10.4: E beberam todos de uma mesma bebida
espiritual, porque bebiam da pedra espiritual que os seguia; e a pedra
era Cristo.

Portanto, citar um texto qualquer não significa considerá-lo inspirado.


Sendo assim, todos estes livros apócrifos citados acima, seja histórico,
ficção, sabedoria, apocalíptico ou outro qualquer, não são
considerados inspirados pela igreja. A igreja Protestante considera
inspirados apenas os 39 livros do Antigo Testamento, que vai de
Gênesis a Malaquias e os 27 do Novo Testamento, que vai de Mateus a
Apocalipse. A igreja católica, além destes livros, tem mais sete livros
apócrifos que são: Tobias, Judite, 1 Macabeus, 2 Macabeus, Sabedoria,
Eclesiástico e Baruc, além de uma adição ao livro de Daniel (todos
estes livros acrescentados pela igreja católica são considerados pela
Igreja Protestante como apócrifos por conter heresias, portanto, não
inspirados).

Devemos prestar atenção num fato. Todos os livros apócrifos contem


heresias, que são erros doutrinários sérios comparados ao restante
das Escrituras. Entretanto, por mais que nós protestantes não
consideramos estes livros como inspirados por conter heresias,
devemos nos atentar ao fato de que hoje no meio cristão, existem
muitas heresias, seja em livros evangélicos, seja em pregações, seja

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em músicas (este assunto tratarei em outro momento). Portanto, é
fundamental conhecer as Escrituras, conhecer as Verdades Bíblicas,
para não ser enganado pelas falsas doutrinas propagadas em muitos
púlpitos. O conhecimento é indispensável para não perecer. Quem
tem o conhecimento verdadeiro da Palavra estará no caminho correto,
mas quem não tem, corre o risco de ser destruído 13 (Oséias 4.6).

Fontes de Pesquisa
1. Bíblia Sagrada João Ferreira de Almeida Corrigida e Fiel.
2. Introdução ao Estudo do Novo Testamento, de Broadus David Hale.
3. O Cânon das Escrituras, de F.F. Bruce.

13 (Oséias 4.6). O meu povo foi destruído, porque lhe faltou o conhecimento;
porque tu rejeitaste o conhecimento, também eu te rejeitarei, para que não
sejas sacerdote diante de mim; e, visto que te esqueceste da lei do teu Deus,
também eu me esquecerei de teus filhos.
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