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MONTADOR INVISÍVEL
No corredor de um hospital, um homem caminha de um lado para o outro. Pega, no bolso da
calça, um maço de cigarros e um isqueiro. Coloca um cigarro na boca. Guarda o maço no bolso.
Com a mão muito trêmula, acende o cigarro que está na sua boca. Dá uma longa tragada. Sopra
a fumaça.
Pessoas que não estão muito habituadas às técnicas da linguagem cinematográfica assistem a
essa cena atentas ao contexto, vivenciando a ansiedade, o nervosismo com o personagem: ele é
um homem inquieto, que caminha num hospital e treme ao acender um cigarro.
Do outro lado da tela, o montador que trabalhou nessa cena pensou assim: “Bem, precisamos
mostrar que esse homem está num corredor de hospital. Então, vamos ver... esse plano aqui,
mais aberto, em que o personagem aparece de corpo inteiro e, na parede, vemos um cartaz
com o rosto de uma enfermeira. Pronto, mostramos o homem num hospital. Agora, bom...
Agora ele pega o cigarro. Ok. Nesse mesmo plano, ele caminha de um lado para o outro. Ok, ele
está nervoso. Ah, veja só, temos aqui um plano bem fechado, em que vemos apenas sua mão
trêmula acendendo o cigarro. Vou fazer o seguinte: deixar em plano aberto até ele aproximar o
isqueiro para acender o cigarro. Depois corto para esse plano fechado em que vemos apenas sua
mão, trêmula, acendendo o cigarro. Legal. Vou manter esse plano fechado e vamos ver a boca
do homem soprando a fumaça. Isso, sem dúvida, mostra com clareza que ele está nervoso”.
Num filme em que vemos duas pessoas conversando, geralmente não prestamos atenção nos
cortes que nos levam de uma pessoa para outra. Uma delas fala, e é ela que nós vemos. A outra
fala, nós passamos a vêla. A outra pessoa reage, vemos sua reação. Enfim, assistimos com a
maior naturalidade do mundo a uma conversa entre duas pessoas, como se estivéssemos
presentes no lugar e pudéssemos mover nossa cabeça, mudando o foco de nosso olhar.
Bem, é exatamente para isso que existe o montador de cinema: para pontuar o que é mais
importante mostrar ou não mostrar numa cena. Para escolher a melhor hora de passar
informações ao espectador. Para direcionar a leitura do filme. Para manipular o tempo. Para
entender o que o diretor quer, analisar o material que foi captado e fazer um filme melhor
ainda.
O montador existe para trabalhar com as técnicas mais conhecidas de montagem e para inventar
novas modas. Existe pra fazer tudo isso da maneira mais rítmica possível, respeitando os
atores, o clima e o contexto do filme. Enfim, o montador de cinema existe para ser tão bom que
possa, em muitos casos, passar despercebido pelo público, que, certamente, vai adorar assistir
a um filme bem montado – ainda que sem reparar.
Texto: Henry Grazinoli
Consultoria de conteúdo: Paulo Sacramento
http://www.telabr.com.br/oficinasvirtuais/texto/58 1/1