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A memória da Educação Profissional e Tecnológica em foco: concepção e implantação do

Programa Núcleo de Memória do IFRS

CAROLINE CATANEO1

RESUMO: O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul é uma
instituição de ensino criada em 2008 a partir da união de quatro autarquias federais de educação
profissional presentes em diferentes cidades do estado. No decorrer dessa década foram criados
ou incorporados outros campi que totalizam, no ano de 2019, dezessete unidades. As atuais
unidades que compõe a instituição possuem tempo de atuação e de integração com as suas
comunidades de abrangência bastante discrepantes: de meados do século XX há poucos anos
de funcionamento. Foi no ano em que a nova institucionalidade completou uma década que foi
criado o Programa Institucional Núcleo de Memória do IFRS, com o objetivo e o desafio de
trabalhar com uma história plural e multifacetada que, ao mesmo tempo que possui diferenças,
compreende um núcleo comum: a Educação Profissional e Tecnológica. O objetivo do
Programa se assemelha aos dos Centros de Memória presentes nas mais diversas instituições:
resgatar e (re)conhecer sua história, memória e identidade.

INTRODUÇÃO

A Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica no Brasil (RFEPCT) possui


uma história centenária. Apesar de já existirem iniciativas pontuais durante o Brasil Império, a
preocupação sistemática com a educação profissional pelo governo federal ocorreu apenas após
o advento da Proclamação da República, já no início do século XX, em certa medida por
demandas oriundas da própria sociedade.
O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS),
parte da RFEPCT, foi criado através da Lei n° 11.892/08 a partir da união de quatro autarquias
federais já existentes nas cidades de Porto Alegre, Bento Gonçalves, Rio Grande e Sertão. Além
disso, englobava uma escola técnica que posteriormente seria implantada na cidade de Canoas,
mas que naquele momento ainda não possuía sede própria.
A constituição do IFRS - assim como dos demais institutos federais que fazem parte da
RFEPCT - aproveitou-se da capacidade instalada de instituições já existentes, como Escolas
Técnicas (ETF), Escolas Agrotécnicas (EAF) e Centros Federais de Educação Tecnológica
(CEFETs). Nessa direção, os institutos federais - apesar de se colocarem como uma nova

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Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul, Mestranda do Mestrado Profissional
em Educação Profissional e Tecnológica (ProfEPT) no IFRS Campus Porto Alegre.
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institucionalidade - carregam consigo uma importante história pregressa. Este também é o caso
do IFRS.
As comemorações são sempre momentos profícuos para a emergência da memória. No
ano de 2018 o IFRS completou dez anos desta nova institucionalidade. A partir de então, foram
pensadas alternativas para a preservar e divulgar a memória de uma instituição que, ao mesmo
tempo que é jovem, carrega consigo uma história de mais de cem anos na Educação Profissional
do estado do Rio Grande do Sul.
O Programa Institucional Núcleo de Memória do IFRS surgiu da necessidade de se
preservar e se divulgar e memória da instituição de maneira organizada, sistematizada e
permanente. As primeiras tratativas iniciaram no ano de 2017 com a primeira composição da
comissão de criação e implantação do Núcleo. Atualmente, o programa encontra-se em fase de
reorganização e de consolidação do processo de implantação.
O artigo abordará, portanto, o processo de criação e implantação do Núcleo de Memória
do IFRS. Com o objetivo de contextualizar o tema, será apresentado, primeiramente, um
histórico da Rede Federal e da Educação Profissional e Tecnológica no Brasil e do transcurso
de criação do IFRS. Logo após será exposto o processo de criação e implantação do Programa
Núcleo de Memória na instituição que tem por objetivo primordial colocar a memória da
Educação Profissional e Tecnológica em foco.

A REDE FEDERAL E A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA NO BRASIL:


UM BREVE HISTÓRICO

A Educação Profissional e Tecnológica (EPT) no Brasil possui uma trajetória de mais


de um século de existência. Apesar de já existirem algumas iniciativas pontuais no Brasil
Império, foi com o advento da República - e toda a sorte de questões por ela trazida - que o
Estado Brasileiro preocupou-se de maneira mais contundente com a Educação Profissional.
Manfredi (2003), coloca que o período imbricado entre os últimos anos do Império e os
primeiros anos da República foi marcado por inúmeras mudanças sociopolíticas no país, como
a extinção da escravatura, o estímulo à imigração estrangeira e a expansão do setor cafeeiro.
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Foram algumas dessas mudanças que estimularam a preocupação estatal com a


Educação Profissional e Tecnológica. No ano de 1909, o então presidente Nilo Peçanha criou,
por meio do Decreto nº 7.566, dezenove Escolas de Aprendizes e Artífices em diversas capitais
no país. Entretanto, conforme demonstrado no próprio marco legal, a preocupação
governamental naquele momento era a de, por meio da instrução para o trabalho, moralizar os
“filhos dos desfavorecidos da fortuna”:

Considerando: que o augmento constante da população das cidades exige que se


facilite às classes proletarias os meios de vencer as dificuldades sempre crescentes da
lueta pela existencia: que para isso se torna necessario, não só habilitar os filhos dos
desfavorecidos da fortuna com o indispensavel preparo technico e intelectual, como
faze-los adquirir habitos de trabalho proficuo, que os afastara da ociosidade ignorante,
escola do vicio e do crime; que é um dos primeiros deveres do Governo da Republica
formar codadões uteis à Nação. (BRASIL, 1909)

São essas escolas as que posteriormente dariam origem a Rede Federal de Educação
Profissional e Tecnológica e ao conjunto de escolas técnicas federais e estaduais. No entanto,
Kuenzer (2001) atenta para o fato de que, naquele momento, esse conjunto de escolas:

Antes de pretender atender às demandas de um desenvolvimento industrial


praticamente inexistente, obedeciam uma finalidade moral de repressão: educar, pelo
trabalho, os órfãos, pobres e desvalidos da sorte, retirando-os da rua. Assim, na
primeira vez que aparece a formação profissional como política pública, ela o faz na
perspectiva moralizadora da formação do caráter pelo trabalho. (KUENZER, 2001: p.
27)

A partir desse movimento inicial, a Educação Profissional ganha novos contornos no


país. Manfredi (2003) coloca que é durante o período que vai até a década de 1930 que o sistema
educacional e a Educação Profissional ganham novas configurações. O número de instituições
aumenta e os destinatários passam a não ser apenas os “desfavorecidos da fortuna”, mas aos
diversos setores assalariados e populares urbanos.
É durante o governo de Getúlio Vargas que importantes mudanças sociais e políticas
irão refletir também no cenário educacional. Saviani (2013) aponta que uma das primeiras
medidas adotadas pelo governo provisório de Vargas foi criar, ainda em 1930, o Ministério da
Educação e Saúde Pública, o primeiro ministério da área da educação no país. Durante o período
da chamada Era Vargas (1930-1945), houve uma série de decretos e leis que modificaram de
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sobremaneira o sistema educacional nacional. Uma das principais é a Reforma Capanema


(1942)2 e a criação, durante a década de 1940 do hoje conhecido “Sistema S”.
Na década de 1960, após intensos debates que duraram de 1948 a 1961, é publicada a
primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Pela primeira vez, conforme aponta
Kuenzer (2001), a legislação educacional torna equivalentes, para fins de prosseguimento de
estudos, o ensino profissional e o sistema regular de ensino, nos níveis profissionalizante e
propedêutico respectivamente. No ano de 1971 - já durante o Regime Militar - ocorreu mais
uma significativa mudança na EPT no país. Através da Lei nº 5.692, se estabeleceu a
profissionalização compulsória no Ensino Médio para todos. No entanto, conforme afirma
Moura (2010) o caráter compulsório se restringiu apenas a esfera pública, sendo revogado já no
ano de 1982.
Já no período da redemocratização, entre as décadas de 1980 e 1990, conforme
salientam Escott e Moraes (2012) a educação profissional no Brasil, passa a ocorrer quase que
exclusivamente nas Escolas Técnicas Federais – ETF, Escolas Agrotécnicas Federais – EAF e
em alguns poucos sistemas estaduais de ensino. Neste ínterim, há a publicação de uma nova Lei
de Diretrizes e Bases da Educação no ano de 1996, que dedica um espaço para a Educação
Profissional.
A Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica, oriunda das Escolas de
Aprendizes e Artífices criadas em 1909, foi marcada pelas diversas legislações e conjecturas
políticas e sociais do século XX. As instituições de ensino profissional e técnico federais
passaram por diferentes nomenclaturas durante esse período: Escolas de Aprendizes e Artífices
(1909), Liceus Industriais (1937), Escolas Industriais e Técnicas (1942), Escolas Técnicas
Federais (1959), Escolas Agrícolas Federais (1967) e Centros Federais de Educação
Tecnológica (paulatinamente a partir de 1978). Em 2005, através da Lei nº 11.195, é instituído
o projeto de expansão da Rede Federal, com o objetivo de fomentar a criação de novas unidades
(MEC, 2019).

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A Reforma Capanema foi um conjunto de dispositivos legais que, sob a coordenação de Gustavo Capanema
enquanto ministro da Educação (1942-46), estruturou o ensino industrial, comercial e criou o Sistema Nacional de
Aprendizagem Industrial (SENAI) que daria origem ao Sistema S.
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No ano de 2008, o sistema federal da EPT no país é reorganizado, através da Lei nº


11.892 que institui a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, cria os
Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. De acordo com Pacheco (2011) essas
instituições foram estruturadas a partir do do potencial instalado nos Cefets, escolas técnicas e
agrotécnicas federais. A Rede é composta, atualmente, além dos IFs, pela Universidade
Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), pelo CEFET-RJ e CEFET-MG, pelo Colégio Pedro
II e por Escolas Técnicas Vinculadas às Universidades Federais que, na ocasião, optaram por
não se transformar em IF. Sobre isso, Minghelli (2015) salienta que:

O principal objetivo era a criação e a efetivação de uma nova matriz institucional,


capaz de redirecionar a política educacional e ao mesmo tempo potencializá-la por
meio da expansão de unidades. Essa nova matriz baseava-se nos Institutos Federais,
o centro da política de reestruturação da Rede Federal, sendo que a permanência das
outras institucionalidades pode ser considerada um resquício da conjuntura política
que não conseguiu agregar a totalidade das instituições. (MINGUELLI, 2015:38)

A expansão ocorrida durante os anos de 2005 a 2014, conforme aponta Santos (2018)
constituiu-se num marco histórico para a Rede Federal, na medida que produziu mudanças tanto
de ordem quantitativa - com o aumento das unidades de ensino e ampliação de sua atuação -
quanto de natureza estrutural. Desta forma, a nova institucionalidade apresentada pela criação
dos Institutos Federais conformou instituições com características distintas.
Aproveitando o potencial já instalado dos CEFETs, EAFs e Escolas Técnicas, os
Institutos Federais, aglutinam unidades com características bem díspares: enquanto algumas
unidades trazem uma importante história pregressa na EPT, outras foram criadas após o projeto
de expansão da Rede. Toda essa diversidade transforma os IFs em instituições com uma história
plural e multifacetada desde a sua origem.

A CRIAÇÃO DO IFRS: UMA HISTÓRIA MULTIFACETADA

A reorganização da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica (RFEPCT)


culminou no agrupamento de diversas instituições já existentes que possuíam, muitas vezes,
histórias centenárias. Os IFs se constituíram de diferentes maneiras pelo país. O Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS) foi criado -
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juntamente com os demais IFs do país - através da Lei n° 11.892/2008, englobando autarquias
com uma história pregressa importante no estado. Além dessas instituições apresentarem
tempos de atuação distintos, elas também possuíam características específicas: do ensino
agrícola - como as Escolas Agrotécnicas Federais (EAFs) -, passando por Centros Federais
de Educação Tecnológica (CEFETs) a escolas técnicas vinculadas a Universidades Federais.
Este é o caso do IFRS.

No contexto nacional a formação dos IFs ocorreu de maneiras diversas. Em alguns


casos houve tão somente a transformação em Centro Federal ou de uma Escola
Técnica em Instituto, agregando apenas suas unidades originais. Em outras
experiências, mais raras, houve a congregação entre autarquias (CEFETs e EAFs) e
escolas vinculadas a universidades e escolas técnicas, constituindo uma diversidade
organizacional e cultural bastante diversa. O IFRS está situado no contexto das
experiências mais raras, sendo o resultado da fusão de quatro instituições históricas
no âmbito da educação profissional do Rio Grande do Sul. (FIGUEIREDO, 2014:24).

O IFRS se constituiu, portanto, do agrupamento de quatro autarquias federais já


existentes: Centro Federal de Educação Tecnológica de Bento Gonçalves/RS, da Escola
Agrotécnica Federal de Sertão/RS, da Escola Técnica vinculada à Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, localizada em Porto Alegre/RS e do Colégio Técnico Industrial da Universidade
Federal de Rio Grande, localizado em Rio Grande/RS. Além disso, somou-se a essas a recém
criada Escola Técnica Federal de Canoas, que, naquele momento, ainda não possuía espaço
físico. A Reitoria da instituição localiza-se na cidade de Bento Gonçalves/RS.
No ano de 2008, o então CEFET-BG foi incorporado ao IFRS. No entanto, sua origem
remonta a meados do século passado, quando foi criado através a Lei n° 3646 no ano de 1959
sob a denominação de Colégio de Viticultura e Enologia, sendo a primeira no Escola de
Enologia do país (PDI 2019-2023, 2018). No ano de 1979, passa a ser chamada de Escola
Agrotécnica Federal. A Lei n° 7.390 de 1985 altera a denominação da instituição para Escola
Agrotécnica Federal Juscelino Kubitschek (CARDOSO, 2016). No ano de 2003 a instituição
emerge para Centro Federal de Educação Tecnológica. Conforme aponta Figueiredo (2014,
p:36) coube a esta instituição, por se tratar de um CEFET, a tarefa de coordenar o processo de
efetivação do IFRS.
O então Campus Porto Alegre do IFRS possui uma história que remete ao início do
século XX. No ano de 1909, através do Decreto n° 7.566, foram criadas dezenove Escolas de
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Aprendizes e Artífices no país. Em 26 de novembro do mesmo ano, foi criada a Escola de


Comércio de Porto Alegre, vinculada a Faculdade Livre de Direito. No ano de 1950, houve um
processo de federalização e a Escola de Comércio passa a funcionar ligada a Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) como Escola Técnica da UFRGS. No ano de 2008,
desvincula-se da UFRGS e passa a compor o IFRS. (ANTUNES, FRANÇA, SANTOS, 2013).
Outra importante instituição que deu origem ao IFRS foi a Escola Agrotécnica Federal
de Sertão. Foi criado por meio da Lei n° 3.215 de 1957, iniciando o seu funcionamento no ano
de 1963 sob a denominação de Escola Agrícola de Passo Fundo. No ano de 1964, passa a ser
chamado de Ginásio Agrícola de Passo Fundo e em 1968 Colégio Agrícola de Sertão. No ano
de 1979 obteve a alcunha de Escola Agrotécnica Federal de Sertão, denominação que vigorou
até o ano de 2008, quando se tornou IFRS Campus Sertão. (PDI 2019-2023, 2018).
O Colégio Técnico Industrial (CTI) vinculado a Universidade Federal de Rio Grande
(FURG) foi a outra instituição a dar origem ao IFRS. O CTI foi criado no ano de 1964 junto a
Escola de Engenharia Industrial que posteriormente, no ano de 1969, se transformaria em
FURG. O CTI originou-se de demandas do próprio município, que via crescer o seu pólo
industrial e necessitava de profissionais para ocupar estes postos de trabalho (PDI 2019-2023,
2018). A partir da reorganização da Rede Federal em 2008 passou a integrar o IFRS, como
IFRS Campus Rio Grande.
No decorrer desta década de existência, o IFRS aglutinou mais unidades que também
apresentam distintas características. Algumas oriundas de escolas que foram federalizadas,
outras que foram incorporadas após os Planos de Expansão da Rede Federal, num total de
dezessete unidades ano ano de 2019. No ano que a nova institucionalidade da Rede completou
dez anos, tornou-se emergente a criação de mecanismos para preservar, tanto a história das
unidades mais antigas, quanto as que foram incorporadas já sob o signo de Instituto Federal. A
partir de então, iniciaram-se os trâmites para a criação do Programa Institucional Núcleo de
Memória do IFRS.

NÚCLEO DE MEMÓRIA DO IFRS: DA CONCEPÇÃO À IMPLANTAÇÃO


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Comemorações são sempre momentos importantes para que a memória coletiva emerja.
Não é diferente com as instituições. No ano em que o IFRS completou dez anos de existência,
tornou-se necessário criar mecanismos para que a memória da instituição se consolide. Essa
demanda foi assinalada também na Política de Comunicação da instituição. Ela destaca que:

A preservação da memória institucional do IFRS propicia a visualização de sua


história e evolução no decorrer do tempo, contribui para consolidar sua identidade, o
entendimento sobre seu papel na sociedade, na vida das pessoas. [...] Algumas
iniciativas têm sido realizadas nos campi para marcar datas importantes, mas o esforço
deve ser sistemático e permanente, com o desenvolvimento de ações que recuperem e
registrem fatos, documentos e personagens. [...] Como resultado desse esforço, podem
ser elaborados materiais, a exemplo de vídeos, livros e publicações, e organizados
eventos e espaços para a divulgação de fatos importantes da história do Instituto. Esse
trabalho deve incluir depoimentos de gestores, de servidores, de alunos e egressos e
de representantes da comunidade que, com seu testemunho, podem contribuir para
evidenciar a presença e a atuação expressiva no âmbito local, regional e estadual.
(POLÍTICA DE COMUNICAÇÃO DO IFRS, 2015:59-60)

A preocupação acerca da preservação da memória do IFRS também é preconizada do


Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI 2019-2023) da instituição. No documento, é
salientado que:

Ao longo de seus 10 anos de existência, o IFRS consolidou-se no cenário educacional


do estado e do país, sendo referência com seus programas institucionais e também na
história de vida de seus alunos e servidores. Entretanto, mais do que alcançar esse
reconhecimento, é preciso garantir que toda narrativa e memória originadas a partir
da sua existência se fortaleça e se enraíze. (PDI 2019-2023, 2018:41)

Em dois importantes documentos da instituição a dimensão do reconhecimento e da


preservação da memória estão presentes. No entanto, por se tratar de uma organização de
estrutura descentralizada, com dezessete unidades espalhadas pelo estado do Rio Grande do
Sul, a consolidação de um espaço físico central para o acervo memorial fica comprometido.
Além disso, a disparidade de temporalidades apresentadas pelos campi do IFRS também
impossibilitava uma gestão única ou centralizada como a de um Centro de Memória, por
exemplo.
Nessa direção - e movida pela preocupação assinalada especialmente na Política de
Comunicação - iniciaram-se, no ano de 2017, as tratativas para a criação de um Programa
Institucional que englobasse todas essas especificidades. No entanto, apesar das diferenças
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advindas das diversas temporalidades existentes, existe uma identidade comum: a da Educação
Profissional e Tecnológica. A primeira iniciativa, portanto, foi a criação de uma comissão que
seria responsável pela redação do projeto e pela sua implantação. Essa comissão, designada por
portaria, foi recomposta no ano de 2018, agregando novos membros, dentre eles profissionais
docentes e técnicos administrativos em educação de diversas áreas.
A ideia do Programa Núcleo de Memória do IFRS surgiu como uma proposta de caráter
interdisciplinar e multicampi, com o objetivo central da criar um espaço virtual específico
destinado do Núcleo e aos projetos nele desenvolvidos. O projeto pretende, portanto, selecionar,
organizar e disponibilizar ao público a história e a memória tão diversificadas que ajudaram a
constituir o IFRS ao longo de seus dez anos, não desconsiderando a história e a memória
pregressas das instituições que deram origem ao IFRS.
Apesar da comemoração dos dez anos de criação do IFRS ter originado a ideia da
criação do Núcleo de Memória, o projeto pretende ser permanente:

A proposta gira em torno de um Núcleo Central, com ramificações nos campi, com o
objetivo de desenvolver espaços, ferramentas e projetos de resgate e preservação da
memória de forma sistemática e permanente. As atividades serão ainda em dois
sentidos: o de contribuir com projetos com esse viés já existentes dentro da instituição
e o de incentivar o surgimento de propostas semelhantes. (NÚCLEO DE MEMÓRIA
DO IFRS, 2019, n.p.)

Na direção de buscar a aproximação com projetos já existentes na instituição, foi


realizada uma busca por programas, projetos e ações desenvolvidas no IFRS durante seus dez
anos de existência por meio de relatório extraído no Sistema de Informação e Gestão de Projetos
(SigProj), no qual a instituição realiza o cadastro de suas ações. Foram encontradas trinta e sete
ações, relativas à memória e identidade nas dimensões do ensino, da pesquisa e da extensão.
Após análise dos resumos destas ações, dez delas se enquadram na categoria “memória
institucional.”
Desta forma, percebeu-se que, antes mesmo da surgimento do Núcleo de Memória, já
existia por parte dos servidores do IFRS a intenção de preservar memória da instituição, tanto
nos campi mais antigos quanto nos mais atuais. Um dos próximos passos do Núcleo é a
aproximação com esses projetos de modo a verificar quais deles estão ativos, quais as demandas
e dificuldades deles.
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Uma das preocupações da equipe que redigiu o projeto do Núcleo de Memória foi o de,
ao mesmo tempo que se busca uma centralidade nas atividades, respeitar as diferenças de cada
unidade da instituição, justamente por suas diferentes características e temporalidades. O que
se propôs para o Núcleo de Memória é, portanto que ele “seja unificado enquanto identificação
do IFRS, mas simultaneamente descentralizado e multicampi, de modo a respeitar todas as
singularidades de nossas unidades institucionais” (NÚCLEO DE MEMÓRIA DO IFRS, 2019,
n.p).
Além disso, a proposta é trabalhar com uma dimensão ampliada de documento histórico,
buscando localizar, registrar, catalogar e reunir não apenas documentação escrita, mas também
iconografia, filmografia, registros sonoros e objetos tridimensionais, que sejam significativos
da história do IFRS. Além disso, o Núcleo de Memória pretende atuar de forma sistemática e
permanente, auxiliando na elaboração de projetos de pesquisa, ensino e extensão que versem
sobre a memória e a identidade institucional do IFRS.
No ano de 2018, após a reestruturação da comissão de criação e implantação do Núcleo
de Memória do IFRS, o projeto foi redigido e uma das primeiras atividades da equipe foi
efetivada: o desenvolvimento do site do Núcleo e sua publicação, ocorrida em 19 de março de
2019. Em fevereiro de mesmo ano, após consulta aos diretores-gerais dos campi do IFRS, foram
designados os representantes do Núcleo em cada uma das unidades da instituição. Em maio do
corrente ano, foi lançado um edital para seleção de um bolsista que está atuando junto à Reitoria
e a comissão central do Programa, de modo a analisar as demandas referente ao espaço virtual
e outras questões referentes do Núcleo.
As atividades que estão em desenvolvimento no momento são a elaboração de um banco
de dados para o Núcleo, de modo a sistematizar um modelo para informações a serem
catalogadas pelas unidades da instituição. Além disso, há uma pesquisa vinculada ao Mestrado
Profissional em Educação Profissional e Tecnológica (ProfEPT) do IFRS Campus Alegre
denominada “De onde vêm as histórias? um guia para identificação, registro e organização de
dados memoriais do IFRS 3” que têm como objetivo principal a elaboração de um instrumento

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A pesquisa intitulada “De onde vêm as histórias? Um guia para identificação, registro e organização de dados
memoriais do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do IFRS” está em desenvolvimento no
Mestrado Profissional em Rede Nacional Educação Profissional e Tecnológica (ProfEPT) do Campus Porto
Alegre do IFRS, por mim, Caroline Cataneo, sob a orientação da Profa. Dra. Maria Cristina Caminha de Castilhos
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para nortear as atividades do grupo. O produto educacional proveniente deste estudo está em
fase de elaboração.
Com as pesquisas e atividades que estão em andamento, pretende-se consolidar o
Núcleo de Memória como um espaço permanente de afirmação da identidade e do
reconhecimento da memória institucional do IFRS e do seu lugar na história da Educação
Profissional e Tecnológica do Rio Grande do Sul e do Brasil. Para isso, é preciso uma maior
aproximação com os projetos em andamento e o incentivo à elaboração de novas ações. Além
disso, é salutar o estímulo ao desenvolvimento de publicações acerca da temática.

CONSIDERAÇÕES FINAIS E PERSPECTIVAS DE PESQUISA

A história da Educação Profissional e Tecnológica possui uma trajetória centenária.


Trajetória essa que foi composta diversas mudanças tanto no âmbito dos sistemas de ensino e
nas nomenclaturas das instituições educativas, quanto nos modos de ensinar e nas perspectivas
de futuro dos estudantes. Por algum tempo, a EPT foi destinada aos “pobres e desvalidos”,
inicialmente assumindo uma perspectiva claramente assistencialista. A Rede Federal de
Educação Profissional, Científica e Tecnológica nasce a partir dessa noção. Entretanto, essa
proposição se modifica ao longo do último século, agregando novas características à formação
profissional no país, especialmente no âmbito do sistema de ensino federal.
O IFRS, criado no ano de 2008, nasceu da aglutinação de unidades com histórias,
temporalidades e perfis distintos. Enquanto o atual Campus Porto Alegre possui uma caminhada
centenária ligada à formação profissional na capital - inicialmente na área comercial - as
unidades de Sertão e Bento Gonçalves possuíam características - especialmente anteriores a
2008 - mais ligadas à formação agrícola. O Campus Rio Grande, por sua vez, tem uma trajetória
mais alinhada à formação industrial. Nesse sentido, além de agregar diferentes temporalidades
e formações, a estrutura do IFRS contempla regiões do estado do Rio Grande do Sul com
características acentuadamente discrepantes.

França O projeto já foi submetido à exame de qualificação e o produto educacional oriundo da pesquisa está em
fase de desenvolvimento.
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A criação do Programa Institucional Núcleo de Memória do IFRS nasce da necessidade


de contemplar a história e memória tão diversificadas. A implantação do programa ainda está
em fase de execução, mas espera-se que ele possa incentivar o desenvolvimento de ações e
projetos em memória e identidade institucional. Depreende-se, portanto, que se trata de um
importante trabalho que proporcionará grandes avanços no âmbito do reconhecimento da
importância da preservação da memória institucional do IFRS, além de reconhecer – a partir
dos projetos posteriores que o Núcleo desenvolvida ou venha a impulsionar – os movimentos
de rupturas e continuidades na Educação Profissional e Tecnológica no Brasil, colocando-a em
foco.

REFERÊNCIAS

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