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Justino Felizberto Justino, 2021- UniZambeze

DIREITO CONSTITUCIONAL

(Texto de apoio)

Parte-1

I. CONSIDERAÇÕES GERAIS

1. O Direito Constitucional como fundamento do direito público e do direito


privado

O direito constitucional é o cerne do direito público interno, uma vez que tem por
objecto a organização fundamental do Estado, designadamente estruturar o Estado,
donde deriva a subordinação dos ramos de direito público (Direito Administrativo,
Direito Penal, Direito Fiscal, Direito Aduaneiro, Direito Financeiro, Direitos
Processuais, etc) a si.
É o fundamento do direito privado, pois é o direito constitucional que define as bases
da organização económica e social do Estado, que constituem o alicerce do direito
privado (Direito Civil, Direito Comercial, Direito das Obrigações, Direito da Família,
Direito do Trabalho, Direito das Sucessões, etc).

2. Conceito do Direito Constituciional

O Direito Constitucional está íntima e directamente ligado à ideia da Constituição,


que é o seu objecto do estudo, por isso, o estudo do direito constitucional passa
necessariamente por estudar a Constituição.

Direito Constitucional é o sistema de normas jurídicas que definem a estrutura


principal do Estado, designadamente a forma do Estado, a forma de governo, a forma
e os limites do exercício do poder político, a relação entre os órgãos do poder
político e os governados, o sistema económico, social e cultural de um Estado.
Justino Felizberto Justino, 2021- UniZambeze

O direito constitucional também é conhecido por direito político, pelo facto de se


constituir por normas que, de forma directa e imediata, definem o Estado,
nomeadamente, o estatuto jurídico ou político do Estado1.

3. Classificação do Direito Constitucional


3.1.Direito constitucional positivo ou particular

Sabido que cada Estado apresenta peculiaridades na sua organização jurídica


fundamental, o que a permite distinguir das constituições doutros Estados, o direito
constitucional particular ocupa-se do estudo da organização jurídica fundamental de
um determinado Estado2.

3.2.Direito Constitucional Geral

Direito constitucional geral ou teoria geral do direito constitucional ocupa-se da


sistematização dos princípios universalmente respeitados em matéria constitucional.
Esses princípios universais resultam da comparação dos direitos constitucionais
positivos donde se extraem pontos comuns.

II. A CONSTITUIÇÃO COMO FENÓMENO JURÍDICO

A Constituição corresponde à organização jurídica fundamental, que é o conjunto de


normas positivas que regem a produção do direito, isto é, o conjunto de regras
concernentes à forma do Estado e do governo, ao modo de aquisição e exercício do
poder, à criação e aos limites de actuação dos órgãos do Estado3.

1
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: preliminares. O Estado e os sistemas
constitucionais. Tomo I, 6ª edição, Coimbra Editora, 1997, pp.14.
2
FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira. Curso de direito constitucional, 28ª edição, Editora Saraiva, 2002,
pp. 17.
3
FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira. Curso de direito constitucional, 28ª edição, Editora Saraiva, 2002,
pp. 11.
Justino Felizberto Justino, 2021- UniZambeze

Segundo Jorge Miranda, “enquanto parcela do ordenamento jurídico do Estado, a


Constituição é o elemento conformado e elemento conformador de relações sociais,
bem como resultado e factor de integração política. Ela reflecte a formação, as
crenças, as atitudes mentais, a geografia e as condições económicas de uma sociedade
e, simultaneamente, imprime-lhe carácter, funciona como princípio de organização,
dispõe sobre os direitos e os deveres de indivíduos e dos grupos, rege os seus
comportamentos, racionaliza as suas posições recíprocas e perante a vida colectiva
como um todo, pode ser agente ora de conservação, ora de transformação4”.

“Sendo lei fundamental, a lei das leis, a Constituição é a expressão imediata dos
valores jurídicos básicos acolhidos ou dominantes na comunidade politica, a sede da
ideia de Direito nela triunfante, o quadro de referência do poder político que se
pretende ao serviço desta ideia, o instrumento último de reivindicação de segurança
dos cidadãos frente ao poder. E, radica na soberania do Estado, torna-se também ponte
entre a sua ordem interna e a ordem internacional5”.

1. Sentido da constituição

Qualquer tipo de Estado e em qualquer época histórica em que este, assenta em regras
fundamentais próprias, isto é, envolve a institucionalização jurídica do poder.
Entretanto, só no século XVIII é que a Constituição começou a ser concebida como o
conjunto de regras que definem as relações do poder político e o estatuto de governantes
e governados: era o surgimento do constitucionalismo moderno6.

A Constituição pode ser encarada numa perspectiva material, formal e instrumental.

1.1.Sentido material da constituição

4
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: constituição e inconstitucionalidade. Tomo II, 3ª
edição, Coimbra Editora, 1996, pp.67.
5
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: constituição e inconstitucionalidade. Tomo II, 3ª
edição, Coimbra Editora, 1996, pp.67.
6
Justino Felizberto Justino, 2021- UniZambeze

Em sentido material, consideram-se o objecto, o conteúdo e a função da constituição, o


que corresponde ao estatuto jurídico do Estado.

É o conjunto de regras materialmente constitucionais, pertencente ou não à


Constituição escrita7. Isto decorre do facto de que a Constituição escrita nem sempre
contém todas as regras relativas às matérias constitucionais, existindo deste modo,
Constituição não escrita – costumes8.

1.1.1. Classificações materiais de Constituições


a) Critério da Análise Ontológica da Concordância das Normas Constitucionais
Com a Realidade do Processo do Poder:

Classificação apresentada por Karl Loewenstein9, distingue Constitucionais normativas,


nominais e semânticas.

Constituições normativas: apresentam normas que dominam o processo político, pois o


processo do poder político se adapta e se submete às normas constitucionais. Limitam
efectivamente o poder político.

Constituições nominais: não conseguem limitar o poder político, pelo que ficam sem
realidade existencial10.

Constituições semânticas: Constituem a formalização da situação do poder político


existente, nomeadamente do benefício exclusivo dos detentores desse poder. Servem
para estabilizar e eternizar a posição dos dominadores de facto na comunidade11.

b) Critério baseado no factor económico:

7
FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira. Curso de direito constitucional, 28ª edição, Editora Saraiva, 2002,
pp. 13.
8
FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira. Curso de direito constitucional, 28ª edição, Editora Saraiva, 2002,
pp. 13.
9
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: constituição e inconstitucionalidade. Tomo II, 3ª
edição, Coimbra Editora, 1996, pp.23.
10
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: constituição e inconstitucionalidade. Tomo II, 3ª
edição, Coimbra Editora, 1996, pp.23.
11
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: constituição e inconstitucionalidade. Tomo II, 3ª
edição, Coimbra Editora, 1996, pp.23-24.
Justino Felizberto Justino, 2021- UniZambeze

Basea-se nos grandes sistemas económicos e classificava as constituições materiais


em: Constituições de Estados capitalistas, socialistas e do terceiro mundo. As
constituições dos Estados capitalistas subdividiam-se em Constituições liberais,
sociais-democratas (ou do Estado social), autoritário-fascistas e compromissórias.

c) Critério baseado no longo ciclo ou diversos ciclos de conteúdos constitucionais:

Distingue Constituições estatuárias das Constituições programáticas.

Constituições estatutárias ou orgânicas: ocupam-se do estatuto do poder, dos seus


órgãos e da participação política dos cidadãos. Tratam fundamentalmente do sistema e
da forma de governo, podendo cuidar também do sistema económico e social.

Constituições programáticas, directivas ou doutrinais: ocupam-se da organização


política e definem programas, directrizes e metas para a actividade do Estado no campo
económico, social e cultural12.

Ainda quanto ao conteúdo, é possível distinguir Constituições simples, complexas ou


compromissórias.

Segundo Jorge Miranda, o carácter simples ou compromissório de uma constituição


depende dos circunstancialismos da sua formação, da sua aplicação e das suas
vicissitudes; depende da ausência ou da presença de um conflito de fundamentos de
legitimidade ou de projectos de organização colectiva que as normas constitucionais
tenham de ultrapassar, através de entendimento: depende do modo como é encarada a
integração política (…)13.

1.2.Constituição em sentido formal

Em sentido formal ocupa-se da posição das normas constitucionais em confronto com


as demais normas jurídicas e da forma de articulação desses dois níveis de normas.

12
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: constituição e inconstitucionalidade. Tomo II, 3ª
edição, Coimbra Editora, 1996, pp.26.
13
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: constituição e inconstitucionalidade. Tomo II, 3ª
edição, Coimbra Editora, 1996, pp.28.
Justino Felizberto Justino, 2021- UniZambeze

Trata-se de um conjunto de normas formalmente qualificadas como constitucionais e


revestidas de força jurídica superior à de quaisquer outras normas14.

1.3.Constituição em sentido instrumental

A Constituição instrumental é o documento contendo normas constitucionais (quer


estejam em vigor quer não); é o texto constitucional.

A Constituição instrumental pode conter a Constituição formal (que está em vigor) e


normas constitucionais que já não estejam em vigor, o que representa uma divergência
entre a Constituição formal e Constituição instrumental.

2. A FORMAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO

2.1.O poder constituinte


2.1.1. Poder constituinte material e poder constituinte formal

Como se constitui ou se forma a Constituição? em que momento se revela o poder


constituinte ou a soberania do Estado?

A fase marcante para o início de uma determinada época constitucional é o do corte


com a situação anterior, o que pode acontecer por meio de uma revolução, transição
constitucional ou outra via, e não propriamente o da aprovação da nova constituição. No
caso moçambicano, o momento que determinou a era constitucional de Moçambique
independente foi a própria independência de Moçambique, que se traduziu no corte da
situação constitucional vigente no período colonial. A independência nacional foi
determinante para a aprovação da Constituição da República Popular de Moçambique.

Por conseguinte, há-de haver sempre uma entidade responsável pelo rompimento com a
ordem preexistente, e decide pela elaboração de uma Constituição formal que reflicta a

14
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: constituição e inconstitucionalidade. Tomo II, 3ª
edição, Coimbra Editora, 1996, pp.12.
Justino Felizberto Justino, 2021- UniZambeze

nova era, podendo ser ela mesma a elaborar a nova Constituição, ou designar uma
assembleia para o fazer. Tal entidade poderá ser força social, política, movimento
militar, etc. por exemplo, o caso moçambicano foi Movimento de Libertação de
Moçambique que liderou a libertação de Moçambique do julgo colonial e elaborou e
decretou a primeira Constituição de Moçambique independente em 1975.

A nova Constituição é concebida tendo em conta a ideia que o grupo que liderou o
corte com a ordem anterior, tem sobre o direito.

O sentido inicial do poder constituinte material é o do poder constituinte originário, que


é o poder de auto-ordenação.

O poder constituinte material originário consiste no conteúdo essencial da soberania,


que significa a faculdade originária de livre regência da comunidade política mediante
a instituição de um poder e a definição do seu estatuto jurídico15.

O poder constituinte significa a capacidade de escolher um ou ouro rumo, nos


momentos de viragem histórica e grandes crises, tais como:

(I) A formação de um Estado ex novo: nos casos em que nasce um novo Estado,
nomeadamente por desmembramento, sucessão de Estado e agregação com
outros Estados;
(II) A restauração: nos casos em que um Estado volta a surgir depois do seu
eventual desaparecimento. Pode-se falar também dos casos em que se liberta de
uma ocupação estrangeira do seu território;
(III) A transformação da estrutura de um Estado: nos casos em que se verifica a
modificação da soberania, por exemplo quando um Estado passa a ser um
protectorado, ou passa a pertencer uma confederação ou sai da mesma. Uma vez
que há continuidade do Estado, o que a nível jurídico é que a nova Constituição
vai reflectir aspectos que justificaram a transformação da soberania ou do
território;
(IV) A mudança de um regime político: verifica-se apenas uma sucessão de regimes
políticos, sem alterar o Estado. Há substituição da ideia do Direito, que pode
consistir em:

15
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: constituição e inconstitucionalidade. Tomo II, 3ª
edição, Coimbra Editora, 1996, pp.76.
Justino Felizberto Justino, 2021- UniZambeze

(a) supressão: desaparece a Constituição, entretanto, subsiste o poder


constituinte;
(b) destruição: desaparece a Constituição e o próprio poder constituinte (o
princípio da legitimidade);
(c) revolução;
(d) transição constitucional ou reforma política: passagem sem ruptura ou
mudança na continuidade.

Nos casos em que se verifica a formação de um novo Estado, a restauração ou a


transformação radical, surge uma Constituição material, donde resultará a Constituição
formal. Essa Constituição material pode resultar de:

(i) Formação duma Constituição nova, que traduz de forma directa e imediata o
exercício da soberania;
(ii) Heteroconstituição: nos casos em que o novo Estado ou o Estado restaurado
ou transformado assume uma constituição produzida por um outro Estado,
como é o caso de Canadá, Nova Zelândia, Austrália, Jamaica e Maurícia que
assumiram as Constituições aprovadas pelo parlamento Britânico;
(iii) Novação: nos casos em que o Estado restaurado ou transformado assume a
sua Constituição anterior ao facto que originou a transformação ou a
restauração.

De todo o modo, nos casos de novação e heteroconstituições se verifica ainda o


exercício do poder constituinte material, uma vez que o texto constitucional
encomendado passa a ter novo valor jurídico nesse Estado que lhe é atribuído pelo
poder constituinte desse novo Estado, ou seja, material e formalmente trata-se de uma
nova constituição desligada da sua origem histórica, apesar da Constituição instrumental
continuar a ser o texto encomendado16.

a) A revolução como fenómeno constituinte

16
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: constituição e inconstitucionalidade. Tomo II, 3ª
edição, Coimbra Editora, 1996, pp.80-81.
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A revolução não é um acto antijurídico (não jurídico), apenas é anticonstitucional, uma


vez que se opõe à Constituição anterior. Mas ela é um fenómeno constituinte, um facto
ou acto normativo, pois implica o surgimento de um novo direito, de um novo
fundamento de validade do sistema jurídico positivo do Estado.

b) A transição constitucional

Na transição verifica-se um dualismo, que consiste no seguinte: enquanto se prepara a


nova Constituição formal, continua a vigorar a Constituição formal anterior, a qual só
deixará de vigorar com a entrada em vigor da nova, entretanto, o órgão encarregue de
preparar a nova constituição pode assumir as posições de Poder Constituído ao abrigo
da Constituição anterior e Poder Constituinte na medida em que estiver a preparar o
novo texto constitucional17.

2.1.2. Relação entre poder constituinte material e poder


constituinte formal

Até à aprovação da Constituição formal, o órgão encarregue para elaborá-la (que


exercerá o poder constituinte formal) é ainda órgão provisório ou transitório e os seus
actos de decisão política carecerão de convalidação ou eficácia.

Segundo Jorge Miranda, as relações que se estabelecem entre o poder constituinte


material e poder constituinte formal são as seguintes:

a) O poder constituinte material precede logicamente ao poder constituinte formal,


uma vez que, (i) a ideia de direito é logicamente precedente à regra de direito (ii)
o valor comanda a norma (…)
b) O poder constituinte material precede historicamente o poder constituinte
formal, uma vez que o momento da afirmação de certa ideia de direito ou do
nascimento do regime é sempre anterior ao da formalização dessa ideia ou desse
regime.
c) O poder constituinte material envolve o poder constituinte formal, porquanto, da
mesma forma que a Constituição formal contém uma referência material, o

17
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: constituição e inconstitucionalidade. Tomo II, 3ª
edição, Coimbra Editora, 1996, pp.87.
Justino Felizberto Justino, 2021- UniZambeze

poder constituinte formal complementa e especifica a ideia de Direito ditada


pelo poder constituinte material. Através do poder constituinte formal se declara
e firma a legitimidade da nova ordem constitucional.
d) O poder constituinte formal confere estabilidade e garantia de permanência
hierárquica ou sistemática ao princípio normativo inerente à Constituição
material, uma vez que a ideia de direito é traduzida em regra.

2.2.O poder constituinte formal

Uma vez formada a ideia de direito, ou seja exercido o poder constituinte material,
segue-se o acto constituinte stricto sensu, que consiste na decretação da Constituição
formal, que no fundo trata-se de formalização da Constituição material.

Entretanto, desde o momento da concepção da nova ideia sobre o Direito (exercício do


poder constituinte material) até à decretação da Constituição formal, pode ocorrer um
lapso de tempo mais ou menos longo. Durante o período de concepção da Constituição
formal poderá estar em vigor uma Pré-Constituição/Constituição
provisória/Constituição revolucionária, que terá uma dupla finalidade:

a) Definição do regime de elaboração da Constituição formal;


b) Estruturação do poder político durante este período de interregno constitucional;
ou ainda de eliminação dos resquícios do antigo regime.

As normas de Pré-Constituição, por reconhecer-se que estabelecem princípios


fundamentais nos quais vai se basear a Constituição formal, têm tido um valor
reforçado.

2.2.1. Tipos de actos constituintes stricto sensu

O processo constituinte (a feitura da Constituição formal) pode ocorrer de diversas


formas, dependendo dos factores históricos, jurídico-culturais, da forma de Estado, da
legitimidade do poder e da participação da comunidade política, designadamente, acto
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constituinte unilateral singular, acto constituinte unilateral plural e acto constituinte


bilateral.

2.2.1.1.Actos constituintes unilaterais singulares

Quando o poder constituinte couber a um único órgão ou sujeito. Formas do acto


constituinte unilateral singular, segundo Jorge Miranda:

a) A outorga da Constituição pelo monarca;


b) Decreto do Presidente da República ou de outro órgão do Poder Executivo;
c) Acto da autoridade revolucionária ou de autoridade constitutiva do Estado;
d) Aprovação por assembleia representativa ordinária ou comum dotada de poder
para o efeito;
e) Aprovação por assembleia formada especificamente para isso;
f) Aprovação por assembleia eleita simultaneamente como assembleia constituinte
e como assembleia ordinária.

2.2.1.2.Actos constituintes unilaterais plurais


a) Aprovação por referendo, prévio ou simultâneo da eleição de assembleia
constituinte, de um ou vários grandes princípios ou opções constitucionais e, a
seguir, a elaboração da Constituição de acordo com o sentido da votação;
b) A definição por assembleia representativa ordinária dos grandes princípios, a
elaboração de projecto de Constituição pelo Governo e a aprovação final por
referendo;
c) A elaboração por assembleia constituinte, seguida de referendo;
d) A elaboração por órgão provindo da Constituição anterior, com subsequente
aprovação popular;
e) A elaboração por autoridade revolucionária ou órgão legitimado pela revolução,
seguida de referendo.

2.2.1.3.Actos constituintes bilaterais


Justino Felizberto Justino, 2021- UniZambeze

a) A elaboração e aprovação da Constituição por assembleia representativa, com


sujeição a sanção do monarca;
b) A aprovação da Constituição por assembleia representativa, seguida de
ratificação pelos Estados componentes da União.

As constituições aprovadas por actos bilaterais designam-se de Constituições Pactícias,


na medida em que pressupõem a existência de um pacto ou contrato constitucional entre
dois órgãos no mínimo.

2.2.2. Forma, legitimidade e conteúdo dos actos constituintes

a) Do ponto de vista político, as constituições serão de origem democrática quando


resultarem de um processo de efectiva e livre participação dos cidadãos. Serão
autocrática em caso contrário, nomeadamente quando impostas pelos
governantes;
b) Pela natureza do órgão, uma Constituição elaborada em assembleia constituinte,
livremente eleita, é de origem democrática.
c) Contudo, segundo Jorge Miranda, nem sempre houve coincidência entre uma
Constituição de origem democrática ou autocrática com a Constituição de
conteúdo democrático ou autocrática, pois, “não é a fonte ou o poder
constituinte criador da Constituição que dá garantia, por si só, de que a forma
de governo instituída venha a ser de democracia, pluralista ou não, ou de
autocracia”.
d) Ou seja, uma constituição de origem democrática pode apresenar conteudo
autocrático. A constituição de origem autocrática pode ser de conteúdo
democrático.

2.3. Os limites materiais do poder constituinte

Do ponto de vista lógico, o poder constituinte é anterior e superior aos poderes


constituídos clássicos, designadamente, legislativo, executivo e judicial.
Justino Felizberto Justino, 2021- UniZambeze

Cabe ao poder constituinte definir e enquadrar formal e materialmente os poderes


constituídos, os quais só podem agir dentro das normas e princípios constantes da
Constituição formal. De todo o modo, o poder constituinte não é absoluto no sentido de
colocar na Constituição quaisquer regras, pois está sujeito a limites.

Esses limites podem categorizar-se em transcendentes, imanentes e heterónomos.

2.3.1. Limites transcendentes

“São os que, antepondo-se ou impondo-se à vontade do Estado (e, em poder


constituinte democrático, à vontade do povo) e demarcando a sua esfera de
intervenção, provêm de imperativos de Direito natural, de valores éticos superiores, de
uma consciência jurídica colectiva18”.

Dentre os limites transcendentes, podem apontar-se os relativos aos direitos


fundamentais imediatamente ligados com a dignidade da pessoa humana, por exemplo,
o direito a vida, a liberdade de crença, a liberdade pessoal, a igualdade de tratamento,
etc.

Assim o poder constituinte não pode conceber uma Constituição formal que preveja, por
exemplo a escravatura, a desigualdade entre os seres humanos, sob pena dessa
Constituição ser inválida e ilegítima.

2.3.2. Limites imanentes

São os que “decorrem da noção e do sentido do poder constituinte formal enquanto


poder situado, que se identifica por certa origem e finalidade e se manifesta em certas
circunstâncias. 19.

18
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: constituição e inconstitucionalidade. Tomo II, 3ª
edição, Coimbra Editora, 1996, pp.107.
19
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: constituição e inconstitucionalidade. Tomo II, 3ª
edição, Coimbra Editora, 1996, pp.107-108.
Justino Felizberto Justino, 2021- UniZambeze

São limites ligados à configuração do Estado à luz do poder constituinte material ou à


própria identidade do Estado de que cada Constituição representa apenas um momento
da marcha histórica20.

Integra limites relativos à soberania do Estado, as vezes, à forma de Estado e à


legitimidade política em concreto.

2.3.3. Limites heterónomos

Os limites heterónomos resultam da conjugação com outros ordenamentos jurídicos.


Fazem parte desses limites, entre outros:

(i) Os que provêm das regras ou certos actos de Direito Internacional;


(ii) As regras resultantes de Direito interno, quando se trate de um Estado
composto ou complexo;
(iii) Os princípios gerais de Direito Internacional, maxime os princípios do jus
cogens

Limites heterónomos de Direito internacional: correspondem a limitações do conteúdo


da Constituição resultantes dos deveres assumidos pelo Estado perante outros Estados
ou perante a Comunidade internacional. Exemplo, as regras relativas as garantias de
direitos de minorias nacionais e linguística impostas a certos Estados por tratado de paz
apos a primeira e segunda Guerra mundiais.

Limites heterónomos de Direito interno: fazem parte desses limites, as regras sobre a
união federativa, por exemplo, uma vez que os Estados federados devem respeitar as
razões da sua existência como federados e o Estado federal deve vincular com as razoes
da sua criação.

20
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional: constituição e inconstitucionalidade. Tomo II, 3ª
edição, Coimbra Editora, 1996, pp.108.

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