Você está na página 1de 4

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

INSTITUTO DE HUMANIDADES E SAÚDE

CURSO DE PRODUÇÃO CULTURAL

VITOR CIVIDANIS PATUELI CORRÊA LIMA

Suleando novas concepções de mundo

Rio das Ostras

2021
Antes de pautar novas epistemologias, ou especificamente epistemologias do
sul (parafraseando Boaventura de Sousa Santos), é importante atentar
cronologicamente às origens do sistema-mundo em que a sociedade se insere.
Evidencia-se, portanto, temáticas como: o eurocentrismo, a colonialidade, o
nascimento da modernidade, para construção desta discussão.
Para contextualização inicial, torna-se necessário definir as origens do
Eurocentrismo, e a ideia de episteme hegemônica. Com a expansão marítima -início
do Imperialismo- e, posteriormente, a estruturação do capitalismo, o sistema-mundo
foi inteiramente modificado. Assim, as relações econômicas, sociais e políticas foram
moldadas dentro deste formato. Evidenciando-se, dessa maneira, a formação de um
Estado Moderno dedicado às práticas mercantilistas.
Juntamente com a força do capital, aliada à meritocracia, começou a ser
disseminada a imagem de uma Europa próspera e superior frente ao restante do
mundo. Assim, uma dominação ideológica se instaurou. A ideia central, era: a
Europa possui o domínio da verdade absoluta, a luz, e precisa levá-la aos povos
considerados, por eles, imaturos e incapazes de gerir politicamente suas vidas.
Dessa forma, a prática colonialista utilizou a noção de supremacia européia,
atrelado à essa ‘’ajuda humanitária’’ aos povos ‘’atrasados’’, para justificar o
verdadeiro objetivo: a exploração dos diversos recursos naturais existentes naquele
território (petróleo, minérios, espécies vegetais etc).
O tópico central de toda a discussão perpassa exatamente por essas práticas
colonialistas e suas respectivas influências no sistema-mundo. Entretanto, o que
provoca maior impacto é o quão essa ideologia ainda se mantém presente, nos dias
atuais. Para complementar a argumentação, o livro Colonialidade a partir do Brasil
traz reflexões importantes acerca da temática, destacando um trecho do prefácio,
que integra a discussão central:

É possível que instituições criadas para viabilizar interesses de um


grupo de pessoas e construir o seu sistema econômico possam
servir a outros interesses? Ou melhor formulando: é possível que as
instituições acima referidas, criadas para viabilizar o capitalismo e os
interesses da nobreza e da burguesia, possam servir à dignidade e
liberdade de todes, todas e todos? Ou ainda melhor: é possível que
racionalidades, instituições e sistemas criados para servir aos
homens brancos, proprietários e ricos, europeus, sirvam à toda forma
de vida? (Borges, P. H; Quadros, J. L; Miranda, P, 2020).

Este modelo de dominação ideológica praticada pelos europeus, afetou os


âmbitos econômicos, políticos, sociais, e por fim, culturais. Apesar desta ideologia
ser amplamente criticada, ainda restam vestígios enraizados na cultura de cada
povo. Embora tenham acontecido movimentos de independência dos países
colonizados, os mesmos ainda permanecem subordinados aos seus colonizadores.
Visto que, apesar da independência política, continuam alimentando as metrópoles,
exportação de matéria prima a preços quase nulos, facilitação tributária de
importação, entre outros.
A partir deste tipo de questionamento a respeito da ideologia imperialista,
eurocêntrica, tornou-se necessário a estruturação de novas concepções do mundo.
Dessa forma, autores como Boaventura Santos emergiram, com autoria, para
sustentar novas epistemes, ou epistemes do sul. Assim, surgiu o conceito de sulear.
Sua premissa, é substituir o conceito ‘’usual’’ nortear (dar sentido, dar um norte), por
sulear (dar um sul).
O sentido de norte e sul não é só territorial, pois também tem a ver com o
contexto colonizador e colonizado. Os países do norte, apresentam-se como os
colonizadores, já os do Sul, são considerados colonizados. Isso demonstra que, até
em situações mínimas, essa dominação ideológica está presente. Mesmo nos
países do Sul, que deveriam se desvincular dessa situação, utilizam o termo
‘’nortear’’, sem nem ter noção do peso cultural/ histórico deste termo.
Em qualquer âmbito (social, político, cultural), percebe-se os reflexos dessa
dominação imposta secularmente do Norte sobre o Sul (até mesmo do Ocidente
para o Oriente, apesar de não estar ligada às epistemologias do Sul, está ligada ao
imperialismo europeu). É necessário portanto, a contínua busca de desvinculação
destas normas/ padrões culturalmente enraizados.
Para sulear novas concepções de mundo, é fundamental a construção de
novas epistemes. E, para esse fim, é inevitável seguir por caminhos alternativos.
Somente em uma idealização radicalmente diferente, encontram-se possibilidades
de mudança significativa do sistema-mundo vigente. Portanto, sulear novas
concepções de mundo, é, na realidade, pensar em modificações estruturais que
rompam este sistema eurocentrista e autoritário historicamente estabelecido.
REFERÊNCIAS:
BORGES, Paulo Henrique; QUADROS, José Luiz; MIRANDA; Patrícia.
Decolonialidade a partir do Brasil, Vol. 1. Belo Horizonte, Ed. Dialética, 2020.

Você também pode gostar