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07/08/2017 Conheça a ideologia que, apesar de não ser contra o Capitalismo, é acusada até hoje de comunista: o Trabalhismo

Conheça a ideologia que, apesar de não ser contra o


Capitalismo, é acusada até hoje de comunista: o Trabalhismo
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26/04/2017

O Trabalhismo no século XXI: da ideologia do desenvolvimento a um projeto de nação


O trabalhismo é uma ideologia política que engloba outras categorias de ideologias, como por exemplo, a
econômica e a cultural; e esse conceito vai se transmutando ao longo do tempo. As ideologias políticas não
possuem conteúdos fixos ao longo do tempo, pois elas se moldam, adaptam as realidades e sofrem inumeráveis
redefinições. Robert Srour em seu livro, “Poder, cultura e ética nas organizações” (2012), afirma as ideologias
políticas não designam conteúdos fixados para todo o sempre, porque esses se movem ao longo do tempo e
sofrem inumeráveis redefinições. É o caso patente, por exemplo, da social-democracia contemporânea. Evoluiu
de um ideário revolucionário, no final do século XIX, para proposições reformistas já nas primeiras décadas do
século XX. Iniciou ruptura com o marxismo em meados dos anos 50 e passou a adotar um ideário moderado de
democratização do capitalismo, num processo que a aproxima cada vez mais do liberalismo político. Até o inicio
do século XX, os partidos social-democratas ainda eram considerados como partidos revolucionários. Foi a partir
da 1º Guerra Mundial – e da Revolução Russa de 1917 – que há uma divisão dentro do movimento socialista. De
um lado, os comunistas, influenciados por Lenin e pela Revolução Russa, continuaram a defender a necessidade
de uma revolução que mudasse de forma radical o modo de produção característico do sistema capitalista. De
outro lado, os social-democratas argumentaram que deveria ser por meio da via partidária e democrática
as reformas dentro do capitalismo, para torná-lo mais social e humano. Em resumo, os social-democratas
consideravam que havia duas vias para o socialismo: a democrática (social-democratas) e a autoritária
(comunistas). Entretanto, com esse foco reformista, por meio do aumento da representatividade no parlamento, o
movimento foi perdendo o horizonte do socialismo, embora trouxe muitos ganhos para a classe trabalhadora da
Europa. A partir da 2º Guerra Mundial, a social-democracia afasta-se definitivamente da ruptura com o capitalismo
. Essas transformações podem ser melhor estudadas abordando o debate entre Eduard Bernstein, Karl Kautsky
e a turma dos socialistas fabianos na Inglaterra que influenciaram diretamente na criação do Labour Party.

Portanto, o trabalhismo, enquanto ideologia política, não é um conceito estático, e sim adaptado ao seu contexto
histórico. Geralmente é por meio das ideologias políticas e econômicas que nos são oferecidos o enredo que
justifica as decisões a serem tomadas e as ações que determinados governos executam em uma determinada
nação. No caso do trabalhismo no Brasil, essa ideologia política sempre veio acompanhada de uma ideologia
econômica desenvolvimentista. Nos governos de Getúlio Vargas foi o nacional-desenvolvimentismo, no de
João Goulart foi o nacional-reformismo e nos dos presidentes Lula (a partir de 2006) e Dilma Rousseff foi o
social-desenvolvimentismo. Um contraponto a essa associação pode ser o do governo Geisel: um governo
de nacional-desenvolvimentismo sem ser trabalhista.

Continua Srour, que as ideologias econômicas põem em jogo as relações entre o Estado e a economia, ou entre o
planejamento e o mercado. O autor lembra a clássica distinção entre liberalismo político e liberalismo econômico
para verificar que não há simples coincidência ou superposição entre os dois ideários. Esclarece ele que é possível
ser liberal do ponto de vista econômico, ao mesmo tempo em que se é politicamente conservador. Entende-se
nesse artigo, portanto, o termo “ideologia política” como um conjunto de idéias, de uma pessoa ou partido, que traz
uma visão, ideal, de como deveria ser a relação entre as pessoas em determinado espaço público, enquanto a
ideologia econômica traz uma visão de como deveria ser o papel dos agentes econômicos, e suas relações, na
busca por solucionar problemas no âmbito da produção, distribuição, acumulação e consumo de bens e serviços.
Nesse sentido, o desenvolvimentismo seria uma ideologia econômica, enquanto o trabalhismo uma ideologia
política.

Cabe contextualizar e esclarecer o conceito histórico do trabalhismo brasileiro: a formulação do trabalhismo, tal
como desenvolvido na Inglaterra, passou por transformações no Brasil, adaptando-se à realidade e adquirindo
características próprias, e teve como um de seus principais ideólogos no país, o sociólogo e político, Alberto
Pasqualini, que tinha como base os princípios do solidarismo cristão (democracia-cristã das Encíclicas Rerum
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Novarum e Quadragésimo Anno), assim como, o pensamento keynesiano da época e elementos do trabalhismo
inglês com o pensamento de uma de suas lideranças políticas do Labour Party, o historiador Harold Laski, o
qual definiu o trabalhismo como expressão equivalente à de capitalismo solidarista. Por essa expressão, tem-se
que a ideologia trabalhista reconhece o capitalismo como sistema econômico, defendendo consequentemente a
propriedade privada. Porém, a ideologia trabalhista (por meio do seu complemento econômico) defende uma
intervenção do Estado na economia, de modo a corrigir os excessos do sistema capitalista e atingir uma forma
mais equilibrada e humana do capitalismo, dando ênfase nas políticas públicas com objetivo de melhorar a
condição de vida dos trabalhadores, o que seria atingindo baseado na “conciliação de classes”. O trabalhismo
sustenta a prevalência do trabalho sobre o capital, buscando a sua convivência harmônica, bem como a superação
das diferenças de classe, sem violência, através da melhor distribuição da riqueza e da promoção da justiça social.
Pasqualini, nos seus escritos entre 1945 e 1950, fez a consolidação do trabalhismo originado a partir da
Revolução de 30 e iniciado com algumas medidas já nos 15 anos do primeiro governo Vargas. Seus escritos
contribuíram para dar uma diretriz ao PTB.

Alguns autores atribuem, ainda, a origem do trabalhismo ao próprio positivismo. Miguel Bodea, em “A greve de
1917: as origens do trabalhismo gaúcho” (1979) e “Trabalhismo e populismo no Rio Grande do Sul” (1992), destaca
a atuação de Borges de Medeiros nas greves de 1917, pois recebeu os trabalhadores no palácio do governo e
considerou justas suas reivindicações por reajuste de salários e aumentou os vencimentos do funcionalismo
público para servir de exemplo à iniciativa privada, algo muito raro naquele período. Enfim, Bodea sustenta a tese
de que o trabalhismo no Brasil seria o “herdeiro” do positivismo. Para o autor, há a mesma ideia central entre o
“republicanismo castilhista” e o “trabalhismo”. Bodea (1979) percebe uma continuidade em termos de linguagem e
valores na passagem do positivismo de Júlio de Castilhos e Borges de Medeiros para o trabalhismo de Getúlio
Vargas e Alberto Pasqualini, apontando, ainda, seus desdobramentos e invariâncias nas gerações subsequentes
como em João Goulart e Leonel Brizola. Ele afirma que a “intervenção estatal” e “aliança com o operariado” são
elementos estabelecidos no pensamento do Partido Republicano Rio-Grandense e apontam para o ideário que
caracterizaria o trabalhismo gaúcho. Sintetiza seu argumento defendendo que os positivistas haviam formulado “de
forma embrionária” experiências que vieram a se generalizar no país, identificando a “herança positivista” na
legislação trabalhista e em um “novo modelo de desenvolvimento nacional”, que incluiria a “mobilização dos
trabalhadores” e a “bandeira do nacionalismo e do desenvolvimentismo”. Assim, conforme Pedro Fonseca, em “As
fontes do pensamento de Vargas e seu desdobramento na sociedade brasileira” (2001), o trabalhismo herdaria do
positivismo as noções de progresso (o desenvolvimento), de “integração do proletariado à sociedade moderna” e
de aversão a perturbações drásticas na ordem social, mas afastou-se ao admitir maior interferência estatal nos
conflitos de classe e ao prescindir da ortodoxia em matéria de política econômica (orçamento equilibrado,
austeridade, finanças sadias), além de sua base filosófica: o materialismo.

Em trabalho posterior, Bodea (1992) aprofunda suas teses. Apoiando-se nos conceitos de “intelectual orgânico” e
de “hegemonia” de Gramsci e na noção de “interpelações democrático-populares” de Laclau, ressalta os mesmos
elementos para caracterizar o trabalhismo: aproximação com setores populares, nacionalismo,
desenvolvimentismo, intervenção estatal. Para ele há uma complementaridade ou divisão de tarefas entre Vargas e
Pasqualini, o que volta a acontecer entre João Goulart e Leonel Brizola.

Bodea, enfim, caracteriza a formação do partido político como resultado do processo doutrinário e de produção de
consenso “no momento da sociedade civil” (obra de Alberto Pasqualini) e de estratégia política “no nível do
aparelho de Estado” (tarefa visualizada em Getúlio Vargas). Ele sustenta que o conteúdo “reformador” e
“modernizante” do trabalhismo com “raízes” no “positivismo”, evoluiria para “populismo operário e socialista”. Bodea
(1992) ainda faz uma separação em três vertentes na formação do PTB antigo:

a) corrente sindicalista;
b) corrente doutrinária-pasqualinista;
c) corrente pragmático-getulista.

Argumenta que o entrecruzamento entre tais vertentes estabeleceu um modelo evolutivo no PTB gaúcho. A
articulação entre corrente pragmático-getulista (elite política), corrente sindicalista (setores populares) e a corrente
doutrinária-pasqualinista (intelectuais orgânicos) possibilitaria a ligação com a “herança positivista” e transmitiria
esse “legado” (aproximando nacionalismo e socialismo) para futuros líderes do partido – entre eles o denominado
herdeiro de Vargas – João Goulart.
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O trabalhismo deriva do sentido de organização dos trabalhadores pela busca e ampliação dos seus direitos.
Existem partidos trabalhistas em diversos países do mundo, mas podemos apontar como sua origem a Inglaterra
em virtude de ser o berço da revolução industrial. Na Noruega, recentemente o partido trabalhista (ideologia
política) aproximou-se do liberalismo econômico (ideologia econômica). Nos Estados Unidos, o governo do
presidente Franklin Roosevelt e seu New Deal pode ser considerado trabalhista (ideologia política) e keynesiano
(ideologia econômica). Recentemente no Brasil, conforme Fernando Nogueira da Costa (em artigo intitulado
“Mirem-se no Exemplo da Suécia” de 2014) o Partido dos Trabalhadores (PT) pode ser considerado um partido
trabalhista semelhante o do Partido Operário Social-Democrata da Suécia, de origem trabalhista-sindicalista
fundado em 1889, e que assim como o sueco tem como seu objetivo a formação de um Estado de Bem-Estar
Social para o país. Ou até mesmo o Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD) que passa por problemas
parecidos com os do Partido dos Trabalhadores (PT): que parte de um partido de operários originalmente de
oposição e que cresce em seu prestígio social e político e acaba cedendo a uma aristocracia da elite do dinheiro
em não realizar reformas mas apenas concessões a classe trabalhadora. Conferir Robert Michels com a
“Sociologia dos Partidos Políticos”, onde ele aborda bem sobre o SPD, já na década de 1910, três décadas após a
sua fundação. E a seguir, o Congresso de Bad Godsberg em 1958 onde o SPD abole o marxismo e assume de vez
o reformismo. Experiências históricas diferentes, mas o PT passa pelos mesmos dilemas. Sobre a história do
trabalhismo no Brasil e a refutação do sentido de populista ver artigo “A história do Trabalhismo brasileiro e seus
reflexos na conjuntura atual” de Nilton Chagas de 2016 e o primeiro capítulo do livro “O Projeto de Nação do
Governo João Goulart: o Plano Trienal e as Reformas de Base, de 2014, de autoria de Cássio Silva Moreira.

Entretanto, embora na Internacional-Socialista (é um grupo de partidos políticos adeptos da social democracia que
atua em escala mundial) estão partidos socialistas, social-democratas e o trabalhista britânico (da linha libor-
britânicos, australiana e canadense). O surgimento do trabalhismo no Brasil, durante o governo Vargas, tem uma
simbiose de características muito marcantes. Conforme Cássio Moreira (em O Projeto de Nação do Governo João
Goulart, de 2014) quatro elementos formaram o trabalhismo brasileiro: trabalhismo, desenvolvimentismo,
nacionalismo e estatismo. Entretanto, esse trabalhismo está em constante mutação. Desde a perspectiva
varguista do trabalhismo, a visão de Pasqualini que contribuiu para o avanço do nacional-reformismo do governo
João Goulart, sendo atualizado no final do século passado pela ideia de socialismo moreno de Brizola e Darcy
Ribeiro. Em relação a essa reaproximação do trabalhismo com um tipo de socialismo, o democrático, ver a Carta
de Lisboa, o Manifesto do PDT e a Carta de Mendes. Nesses documentos, existem uma clara reafirmação da
democracia, do nacionalismo, do socialismo com liberdade por meio de um partido nacional e popular. Cujas
influências do pensamento marxista e da Teoria da Dependência (Ruy Mauro Marini, André Gunder Frank,
Theotonio dos Santos, Vania Bambirra, entre outros) fica consolidado no novo trabalhismo preconizado pelo
PDT. Em 2001, Celso Furtado, atualiza a ideologia trabalhista nacional-desenvolvimentista, formulando o que
seria a síntese do trabalhismo social-desenvolvimentista, ou seja, o entendimento de que o desenvolvimento
socioeconômico é fruto do crescimento da renda e emprego com política social ativa o que resultou na ideologia
política e econômica dos governos Lula e Dilma nos últimos anos.

Parafraseando Moniz Bandeira, o trabalhismo no Brasil, foi a manifestação nacional do que na Europa foi a social-
democracia após a guerra de 1914/1918, ou seja, uma corrente política que tratou de empreender reformas sociais
dentro da moldura do sistema capitalista. Nesse aspecto, cabe mencionar o importante papel do Partido Social-
Democrata, enquanto governo na Alemanha, na elaboração e na criação de uma constituição avançada no campo
dos Direitos Sociais como a Constituição de Weimar em 1919. Essa constituição representa o auge da crise do
Estado Liberal do século XVIII e a ascensão do Estado Social do século XX e que consagrou direitos sociais e
reorganizou o Estado em função da solidariedade e não mais baseado no individualismo.

Procurando contribuir na atualização do conceito de trabalhismo para o século XXI, e inspirado nas ideias de
Pasqualini, definimos trabalhismo como uma ideologia política formulada e/ou executada, de forma deliberada, e
implementada por um partido político, tendo como principio básico a co-existência de solidariedade com as
liberdades individuais. Na esfera econômica o trabalhismo está umbilicalmente associado a uma ideologia
econômica que visa o desenvolvimento socioeconômico por meio de uma ação indutora do Estado em paralelo ao
fortalecimento do trabalho sobre o capital (sempre tendo em vista a convivência harmônica por meio da superação
democraticamente das diferenças de classe) e do trabalho produtivo frente ao rentismo, por meio de uma melhor
distribuição da renda e da riqueza objetivando promover progresso, desenvolvimento, igualdade e justiça social.
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Partindo desse conceito, o trabalhismo do século XXI traz como dogma o chamado PRODUTIVISMO
INCLUDENTE, por meio de uma revolução na educação pública. Que na sua esfera econômica busca atualizar o
conceito de nacional-desenvolvimentismo para uma economia globalizada.

De certo modo, essa ideia faz uma critica construtiva aos rumos do trabalhismo social-desenvolvimentista dos
governos de Lula e Dilma. Esse modelo foi baseado na busca pela conciliação de classes e na produção e
exportação de commodities, de produtos primários, aproveitando as riquezas da natureza, para distribuir renda por
meio de programas de transferências e valorização real do salário mínimo. Essa popularização do acesso ao
consumo, por meio do aumento da renda popular e ampliação do crédito, teve no Estado brasileiro o principal
agente dessa inclusão social que resgatou milhões de brasileiros da pobreza extrema e possibilitou a emergência
de uma nova classe média desprovida de consciência política.
A critica construtiva, portanto, está no fato de que esse modelo exauriu o seu potencial, pois foi eficiente na
produção de pleno emprego, mas ineficiente na ampliação da sua capacidade produtiva, em especial de base
tecnológica. Portanto, não serve mais como paradigma de projeto de nação, por ser insuficiente para o
desenvolvimento do país. Esse modelo foi possível de implementar enquanto havia obtenção de renda mundial
fruto da valorização do preço dos commodities (diga-se de passagem que em virtude da visão acertada de política
externa do governo Lula – que retoma a política externa independente de Jânio Quadros/João Goulart – que
valorizou a relação comercial Sul-Sul, especialmente com a China). Todavia, em situação de escassez esse modelo
não conseguiu prover o rompimento da dependência, principalmente a tecnológica. O caminho para isso é
promover a ação empreendedora e inovadora dos agentes econômicos nacionais (principalmente as pequenas e
médias empresas, visto que as grandes – maioria são multinacionais estrangeiras – já estão entrelaçadas com
cadeias de produção e de desenvolvimento de P&D globais, e que não permitem transferir tecnologia). Ademais,
resolver o problema da baixa produtividade da nossa economia sem afetar a qualidade de vida dos nossos
trabalhadores.

Mangebeira Unger descreve a combinação de três características desse sistema que foi desenvolvido nos últimos
anos: a primeira é que o Estado conseguiu manter, nos períodos de altas e de baixas do ciclo econômico, um
altíssimo nível de emprego, porém empregos de baixa qualificação e baixíssima produtividade, com limitadas
possibilidades de ascensão social. A segunda característica é que uma imensa energia empreendedora, vindo de
baixo no tecido social, coexistiu e coexiste com um primitivismo produtivo que mantém parcas possibilidades de
crescimento desses pequenos empreendimentos. E a terceira característica é que a abundância das exportações
dos recursos naturais mascarou as fragilidades desse modelo. Continua mangabeira (atualmente filiado ao PDT),
que as políticas contracíclicas, uma espécie de keynesianismo vulgar, chegou ao fim e agravou os problemas do
país e que hoje necessita de um ajuste que subordine esse “keynesianismo vulgar” ao imperativo de realismo
fiscal.

Contudo, esse realismo fiscal não deve ter como estratégia ganhar a confiança financeira para a retomada do
crescimento (como parece ser o raciocínio do governo Temer de que o ajuste é para ganhar confiança financeira, e
a confiança financeira para trazer o investimento, e o investimento para assegurar o crescimento). Mangabeira
afirma que esse timo de estratégia nunca funcionou em qualquer lugar do mundo, e cita como exemplo a Europa,
atualmente entregue hoje à estagnação e à austeridade ao mesmo tempo.

Mas sim, no sentido de que o ajuste serve para retomar a capacidade do investimento do Estado e fortalecer o
poder estratégico para a construção de um novo projeto nacional de desenvolvimento. Nesse sentido, seria um erro
apostar no setor privado como o gatilho do desenvolvimento. Fazendo uma analogia, o Estado seria a locomotiva e
o setor privado os vagões nos trilhos do desenvolvimento.

Assim como Pasqualini faz uso de uma analogia entre “cérebro e corpo”, o Estado é o cérebro da sociedade, o
órgão mais especializado e complexo, no sentido de elaborar estratégias, ao qual cabe um papel de direção e
organização. Fazemos o uso de outra analogia, que produção e consumo são como pernas necessárias para o
andar do desenvolvimento e não apenas o consumo e a demanda ou a produção e a oferta. Continua Mangabeira
que a diferença fundamental entre democratizar a economia do lado da demanda e democratizá-la do lado da
oferta é que a democratização do lado da demanda se pode fazer com dinheiro; mas a de democratização do lado
da oferta exige transformação estrutural, inovação nas instituições, inclusive nas instituições que definem a
economia de mercado. Não basta regular a economia de mercado, não basta atenuar as desigualdades geradas no
mercado por políticas compensatórias de redistribuição. É preciso democratizar o mercado no seu conteúdo
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institucional, para ampliar as oportunidades econômicas e educativas, e, portanto, para dar braços, asas e olhos a
este dinamismo humano que fervilha frustrado no nosso país: os pequenos e médios empresários.
O trabalhismo prega que é fundamental subordinar os interesses do rentismo financeiro aos interesses do trabalho
e da produção. E desse modo é necessário incorporar na cultura do país, não mais essa visão rentista e sim um
impulso produtivista.

O novo projeto nacional é, portanto, um projeto produtivista e capacitador, não é um nacional-consumismo. É um


produtivismo includente acompanhado por uma revolução na educação pública que permita uma consciência das
massas aliado ao vanguardismo tecnológico e organizacional pelas empresas.

Desse modo, é fundamental que essas classes de empresários e trabalhadores emerjam com consciência social e
nacional. Para isso, o trabalhismo prega a necessidade de educar e conscientizar as massas em prol de um projeto
nacional de desenvolvimento. Retomando as idéias de Álvaro Vieira Pinto, contidas em um livro intitulado
“Ideologia do Desenvolvimento Nacional”, as bases para que projeto nacional de desenvolvimento seja sustentável
ao longo do tempo consistem em:

I – Sem ideologia do desenvolvimento não há desenvolvimento nacional;


II – A ideologia do desenvolvimento tem necessariamente de ser fenômeno de massa;
III – O processo de desenvolvimento é função da consciência das massas;
IV – A ideologia do desenvolvimento tem de proceder da consciência das massas.

Salientava ele ainda que só estariam credenciados para promover o desenvolvimento nacional aqueles que fossem
escolhidos pelas massas ou, noutras palavras, não pode haver solução política para os problemas brasileiros fora
do voto popular. Ademais, ele (como para o maior teórico do trabalhismo, Pasqualini) acreditava que a educação
era o aspecto capital dessa teoria do desenvolvimento e a forma de difusão dessa ideologia.

Ressalta ainda, em tempos de terceirização, que o trabalhismo prega o avanço nos ganhos de produtividade sem
ter como contrapartida a precarização do trabalho, no arrocho dos salários, na desqualificação do trabalhador e
enfraquecimento do servidor público. Portando, há a necessidade de ao lado do respeito com as leis trabalhistas
existentes, um segundo corpo de regras, para governar este novo mundo de relações produtivas e resgatar os
trabalhadores dessa precarização eminente que pretende transformar um Brasil numa plataforma de exportação
para as economias desenvolvidas.

O que torna a ideologia do liberalismo econômico um instrumento de convencimento para facilitar a dominação
dos detentores de tecnologia frente as que não possuem, em outras palavras, dos países centrais versus países
periféricos.

Parafraseando o ex-presidente Artur Bernardes: as nações expansionistas viram que o domínio sobre os povos
de outra raça, outra língua, outra religião e outros costumes, é odioso e desperta o orgulho pela pátria, gera
nacionalismo e incita os ânimos à revolta e às reivindicações da liberdade. A experiência ensina assim aos povos
fortes outros caminhos que os leva, sem aqueles inconvenientes, à mesma finalidade: é o caminho da dominação
econômica, que prescinde do ataque frente à soberania política. Esse é o perigo que nos cumpre evitar. Os fortes
passaram então a apossar-se das riquezas econômicas dos povos fracos, reduzindo-os à impotência e, pois, à
submissão política. Contudo, para isso é necessário o convencimento ideológico desses povos, e para isso serve o
liberalismo econômico. Pois é uma ideologia para domínio dos fracos pelos fortes. Citando Galbraith: “faz
parte da natureza da posição privilegiada que ela desenvolva a própria justificação política e, com frequência, a
doutrina econômica e social que lhe seja mais conveniente. Ninguém gosta de acreditar que seu bem-estar pessoal
está em conflito com a necessidade pública maior.”

Karl Popper atribuía a necessidade da intervenção do Estado para proteger o mercado dos capitalistas, pois para
ele a ideia de um mercado livre é paradoxal ou é uma contradição, isto é, se o Estado não intervir, então poderão
intervir outras organizações semi-políticas, como as dos monopólios, oligopólios, Trusts, sindicatos, etc., reduzindo
a uma ficção a liberdade do mercado. O mercado ficaria livre do Estado, para ficar preso aos interesses de uma
pequena elite do dinheiro.

A seguir dois pensamentos que podem definir bem o encontro entre passado e o futuro do trabalhismo brasileiro. O
encontro da teoria de Alberto Pasqualini corporificado nos governos Vargas e Goulart com o pensamento de
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Mangabeira Unger (materializado no possível projeto de governo do virtual candidato à presidência Ciro Gomes do
PDT).

Alberto Pasqualini, em discursos contido no livro “Bases e Sugestões para uma política social”, de 1948, traz a
essência do trabalhismo histórico brasileiro quando define que o trabalhismo não é um movimento socialista, e
sim, uma forma de organização econômica tendo em vista a eliminação da usura social. O sistema de iniciativa
privada (capitalismo) deve ser mantido em termos de delineamentos gerais, entretanto isso não significa que seja
qualquer tipo de capitalismo que o trabalhismo possa admitir e defender. Em primeiro lugar, o trabalhismo brasileiro
não poderia solidarizar-se com um capitalismo de caráter individualista e parasitário; em segundo lugar, há certas
atividades e empreendimentos, certas riquezas e certas formas de poder econômico que devem ser socializados.

Em um modelo de liberalismo econômico o capital visa exclusivamente o lucro (o que incentiva o individualismo e o
consumo sem limites à custa do produto social). O trabalhismo não poderá admitir tal forma de capitalismo. Para o
trabalhismo, o capital deve ser um conjunto de meios instrumentais ou aquisitivos, dirigidos e coordenados muitas
vezes pela iniciativa e atividade privadas, tendo em vista o desenvolvimento da economia, e o bem-estar coletivo.
Portanto, o lucro não deverá ser o produto da exploração do trabalhador, mas, deduzida a justa remuneração do
empresário, deverá constituir aquela parte do produto social que é investido para a criação de novas riquezas e
produção de bens. Para o trabalhismo, o capital de caráter meramente especulativo e explorador é inaceitável. O
capital é um conjunto de meios destinados à produção, à circulação e à troca. O capitalismo, porém, é uma relação
de propriedade ou de exploração do capital. Se essa propriedade ou essa exploração é exercida contra o interesse
coletivo, o capitalismo é, evidentemente, um mal que deve ser combatido. Na constituição do capital há sempre
uma parcela de usura do trabalho, e que é representada por aquela parte que está cristalizada no aparelhamento
produtor.

O trabalhismo aceita o lucro como uma forma de expropriação do valor do trabalho do trabalhador como algo
necessário (e que também aconteceria num sistema socialista por meio da taxação) para a inversão desse valor
em investimento. Portanto, isso não será uma injustiça social se esse valor (lucro) não for desmedido. O problema,
portanto, não é o da existência ou supressão do lucro e sim o de sua aplicação.

O capitalismo, portanto (isto é, a exploração privada dos meios de produção, circulação e troca) será injusto na
medida em que proporcione, a alguns, possibilidades de consumo sem limites, à custa do produto social, isto é, do
trabalho de outros; e será nocivo, na medida em que, para alcançar essas possibilidades, use de métodos e
processos anti-sociais; será, por fim, inconveniente na medida em que tumultue o processo econômico, dando dá
lugar às crises periódicas ou ciclos conjunturais, que são uma consequência natural da liberdade de iniciativa e da
livre concorrência.

Injustiças e inconveniências sempre existirão no regime capitalista, portanto sempre será possível atenuá-las.
Taxar, por exemplo, os rendimentos, e aplicar o produto da taxação em investimentos socialmente úteis será uma
forma de canalizar o lucro e os rendimentos capitalistas para as suas verdadeiras finalidades. Taxar fortemente os
artigos de luxo e com o produto da taxação custear serviços de assistência social será outra forma de corrigir
certas injustiças. É isso que pretende o trabalhismo, isto é, tornar efetiva a solidariedade social. O aumento do lucro
do empresário, portanto, é necessário para aumentar o salário do trabalhador. Um regime socialista dos meios de
produção apenas poderia ser eficiente se a administração da empresa socializada pudesse ser mais eficiente do
que a empresa privada. Entretanto, para isso, porém, seria necessário um alto nível de educação social, o que não
existe ainda na maior parte dos homens. A socialização integral dos meios de produção, no estado atual da
humanidade, poderia trazer ainda outros inconvenientes, pois o Estado se tornaria todo-poderoso e seria difícil
encontrar homens perfeitos para geri-lo.

A tendência deve ser aumentar as funções do Estado, evoluindo da função simplesmente policial à função social e
à função econômica. Essa evolução, porém, está condicionada a um maior grau de perfeição dos homens. Por
outro lado, não será demais observar que, se a forma socialista da produção pode ser desaconselhada, não será
para atender aos interesses capitalistas, mas para atender ao maior interesse da própria coletividade. Será
desnecessário esclarecer que há setores da economia onde a socialização ou a estatização se impõe como
estratégicas para o desenvolvimento nacional.
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Mangabeira, em discurso de 2015 (que trouxe a base da proposta de “Pátria Educadora” que objetivava
implementar o segundo governo Dilma Rousseff) apontava que o ensino deve ser focado no essencial, nas
capacitações analíticas, de entendimento verbal e raciocínio lógico e priorizar um ideal de aprofundamento seletivo.
A profundidade é o caminho para aquisição de capacitações analíticas e organizar todo o ensino como uma
sequência cumulativa de capacitações. Em relação às inibições pré-cognitivas e capacitações de comportamento
(de disciplina e de cooperação) o ensino deve ser organizado com um conjunto de redes e equipes para superar a
combinação de individualismo e autoritarismo. Em síntese é uma revolução nas capacitações e na consciência do
povo brasileiro. A necessidade de uma mudança no pacto federativo em relação à educação no Brasil para que
fortaleça a cooperação federativa entre o governo federal e os estados e os municípios com o principal objetivo de
qualificar os professores (por meio de uma carreira nacional de professor para que ele possa ministrar este ensino
analítico) e o foco no ensino analítico e capacitador, priorizando operações conceituais básicas, como análise
matemática e leitura crítica.

Em resumo, o trabalhismo é uma ideologia política que necessita estar associado com uma ideologia econômica.
Que em determinado contexto histórico foi nacional-desenvolvimentismo e em outro o social-desenvolvimentismo.
Ele defende a intervenção do Estado na economia, de modo a corrigir os excessos do sistema capitalista e tornar o
capitalismo mais humano e equilibrado, por meio da ênfase nas políticas públicas, principalmente na área da
educação (educação como a única forma de emancipar o povo e consolidar uma ideologia do desenvolvimento
nacional) e do assistencialismo, com objetivo de melhorar a condição de vida dos trabalhadores buscando uma
conciliação de classes dentro de um ambiente cada vez mais participativo e democrático.

No âmbito externo, defende uma política externa independente e que preserve e fortaleça a autonomia e soberania
nacional. Embora ele reconheça o capitalismo como sistema econômico, defendendo consequentemente a
propriedade privada, tem como lema os seus objetivos norteadores: progresso com justiça social e
desenvolvimento com igualdade.

Portanto, existe a necessidade de reformas estruturais que sirvam de base para o desenvolvimento do país.
Podemos apontar algumas dessas reformas necessárias para um projeto de nação como: o fim do oligopólio dos
meios de comunicação (que atualmente domina e manipula a informação e combate uma ideologia nacional de
desenvolvimento), uma reforma tributária com viés progressivo, uma reforma política (que amplie a participação
popular e fortaleça as ideologias partidárias), e uma revolução na educação que traga uma visão holística sobre a
sociedade, entre outras. Apenas assim, será possível uma mudança de mentalidade das massas e o
desenvolvimento sustentável de um projeto de nação. Portanto, apenas por meio da forte intervenção do Estado na
economia, respeitando as liberdades e o empreendedorismo, para superar a dependência econômica com o
estrangeiro e promover a libertação política e econômica do Brasil.

A síntese desse projeto trabalhista, portanto, é a junção de um modelo produtivista e capacitador por meio de uma
transformação radical do ensino público.

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