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Bakalarka II
Bakalarka II
Filofická fakulta
Ústav románských jazyků a literatur
Radek Šimík
2009
Prohlašuji, že jsem bakalářkou diplomovou práci vypracoval samostatně
s využitím uvedených pramenů a literatury
Velmi rád bych poděkoval Mgr. Silvii Špankové za věnovaný čas, věcné připomínky a
především za trpělivost při vedení mé bakalářské práce. Mé poděkování si zaslouží i Clara
Oliveira a Eduardo Serra za pomoc při opravách mé práce.
I. ÍNDICE
I. ÍNDICE ................................................................................................................................... 1
FARMÁCIA) ........................................................................................................................... 26
1
II. INTRODUÇÃO
2
Durante os meus estudos na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, em
Portugal, frequentei as aulas da disciplina „Judeus em Portugal“, dadas pela reconhecida
especialista Prof. Elvira Cunha de Silva Mea, que se revelaram bastante úteis ao longo da
preparação desta obra. Esta obra é concebida como o sumário dos momentos mais
importantes da época em causa, servindo como guia durante os estudos mais profundos. O
objectivo desta obra é sobretudo, mostrar a influência enorme dos judeus e do Judaísmo na
Península Ibérica, nomeadamente no campo socio-cultural e económico e acentuar que o
Portugal, em véspera da Inquisição, foi um país onde a minoria judaica era bem integrada na
sociedade portuguesa medieval e que podia conviver com a maioria cristã.
3
III. O JUDAÍSMO
1
Quidnovi, Guerras e Religiões, Judaísmo, Matosinhos, 2002, p. 5.
2
Tanakh é o acrônimo utilizado dentro do judaísmo para denominar seu conjunto principal dos livros sagrados e
é o equivalente ao Antigo Testamento, porém com outra divisão, Tanakh, [on-line], disponível em:
<<http://tanakh.org >>.
3
Um dos correntes do Judaísmo que reúne os judeus que seguem escrupulosamente os mandamentos das suas
leis.
4
O primeiro patriarca bíblico.
5
O grande líder hebreu.
6
Quidnovi, Guerras e Religiões, Judaísmo, Matosinhos, 2002, p. 11.
7
A disperção do povo judeu no mundo antigo, no hebraico tefutzah, Eciclopédia Brasileira, História Geral, [on-
line] disponível em:<< http://br.geocities.com/vinicrashbr/historia/geral/diasporajudaica.htm >>.
4
romanas devastaram Jerusalém, destruindo completamente o grande Templo onde, durante
os séculos, era guardada a Arca Sagrada com Dez Mandamentos, o símbolo da aliança com
Deus.
Os hebreus dispersaram-se pelo Mediterrâneo e o Judaísmo passou a ser basicamente
nas sinagogas8. Por razões religiosas, os judeus foram muitas vezes perseguidos. Não
puderam ocupar muitas profissões e foram concentrados nos bairros especiais, impedindo-os
deslocar se daí, apesar de aumento do número total dos judeus. Estes bairros são chamados
guetos. Os maiores existiam em Itália, na Alemanha, em Espanha e nos Países da Coroa
Checa. Os decretos reais expulsaram os judeus da Grã-Bretanha (em 1290), da Espanha
(em 1492) e de Portugal (em 1497). De um modo geral, a Idade Média foi uma época cheia
de massacres e perseguições. No século XIX, os judeus dos vários países obtiveram, pouco
a pouco, as liberdades civis, ajudando-os a sair dos seus guetos e centros religiosos
e associar se a uma vida cultural da sociedade maioritária. Porém, muitos judeus assumiram
identidade das comunidades nacionais e, frequentemente, abandonaram a sua religião a qual
os seus ascendentes tinham sido fiéis durante muitos séculos. Muitos destes judeus
assimilados ganharam respeito e sucesso em ciências, em política, em artes, em literatura ou
música provocando, no entanto, as reacções anti-semitas9. O ambiente anti-semita espalhou-
se, rapidamente, por toda a Europa e entre os judeus resultou em criação do movimento
nacional judaico – o Sionismo10. As perseguições dos judeus foram reforçadas, sobretudo no
período entre as guerras e durante a Segunda Guerra Mundial, e culminaram no extermínio
dos judeus nos campos de morte. A história chama a esta „solução final“ o Holocausto ou
Shoah11. Durante a Segunda Guerra Mundial foram mortos quase seis milhões dos judeus. Em
1948, foi declarado o Estado de Israel, mas a maioria dos judeus continuava a viver em
Diáspora e o número total de judeus, actualmente, atinge treze milhões, com origem étnica
diferente.
8
Quidnovi, Guerras e Religiões, Judaísmo, Matosinhos, p. 16.
9
O Anti-semitismo é o nome que se dá à hostilidade contra os judeus e sua cultura.
10
O sionismo é um movimento político que defende o direito à autodeterminação dos judeus e à existência do
Estado judaico.
11
O termo utilizado pelos judeus.
5
IV. OS PRIMEIROS JUDEUS EM PORTUGAL
Já neste capítulo é importante explicar uma divisão entre os judeus que se encontraram
na Europa, tendo a origem no Médio Oriente. Durante a Idade Média formaram-se as duas
facções dos judeus na Europa: asquenazitas (ashkenazim) e sefarditas (sefaradim).
Os primeiros radicaram-se nomeadamente em França e na Alemanha donde se expandiram
para a Europa Central e a Rússia12. Nestas zonas fala-se o iídiche (uma das formas dialectais
de alemão). Sefarditas é o termo usado para aqueles judeus que têm origem no Mediterrâneo,
sobretudo na Espanha e em Portugal mas também em Itália, Grécia, Turquia entre os outros13.
A língua utilizada pelos sefarditas, após da Expulsão, é o dialecto chamado o ladino, cujo
conteúdo é formado pelas palavras arcaicas de várias línguas como: espanhol, português,
hebraico, árabe etc.14. Os dois grupos são divergem no que diz respeito a, principalmente, da
pronúncia da língua religiosa e teológica, das particularidades dentro dos serviços religiosos e
da própria língua falada. Nos sítios, onde estes dois grupos são obrigados a viver juntos,
reúnem-se separadamente, nas próprias sinagogas, e tentam manter a sua individualidade. Dos
asquenazitas surgiram duas correntes místicas: a cabala (provavelmente de origem hispânica),
relacionada com o esoterismo ocidental, e o hassidismo com o esoterismo ocidental de crença
mais espontânea, mais liberta dos estudos e rituais15. Este trabalho vai tratar, especialmente,
do grupo sefardita da Península Ibérica, de Portugal e da Espanha.
A minoria judaica tinha existido no território que se tornou depois Portugal já a partir
do tempo do império romano. Antes disso, os judeus conseguiram chegar à Península Ibérica
como comerciantes ou como fugitivos na época das perseguições contra eles (é provável que
já na época do rei Salomão os judeus imigrantes tinham se encontrado na península). Pertence
ao século III da nossa era, o mais antigo documento escrito relativo aos judeus na Península
12
Arnulf H. Baumann, Co by měl každý vědět o židovství, Kalich, Praha, 2000, p. 42.
13
Colectivo de autores, O Judaísmo na Cultura Ocidental, Lisboa, 1993, pp. 21 – 23.
14
Tomáš Pěkný, Historie Židů v Čechách a na Moravě, Sefer, Praha, 2001, p. 201.
15
Quidnovi, Guerras e Religiões, Judaísmo, Matosinhos, p. 32.
6
Ibérica, e é do século VI, o mais antigo vestígio que nos fala deles16. Nos tempos do reino
visigodo, a situação dos judeus foi instável consoante a necessidade do seu dinheiro para
respectivo rei. Havia os reis que protegeram os judeus ou aqueles que os perseguiram mas
sem qualquer intenção religiosa. Isto mudou com a conversão do rei Recaredo
ao Cristianismo, e outro, posterior a este, em que se ponderou um maior rigor em relação
à convivência entre cristãos e judeus17. Com a invasão dos árabes na Península, a situação foi
mais favorável, acompanhando com o crescimento da cultura judaica posto que a atmosfera
anti-judaíca implantada já no resto da Europa por causa do Cristianismo não apareceu
no reinado muçulmano. Os judeus foram protegidos pelos califas peninsulares e até exerceram
funções importantes na administração, nas finanças e na cultura. Porém, este facto dividiu
a comunidade hebraica durante a Reconquista porque alguns judeus tomaram o partido dos
cristãos e ficaram na luta contra aqueles que eram bem implantados no sistema e defenderam
os mouros. Durante a formação de nacionalidade portuguesa, em 1143, a minoria judaica já
foi espalhada nos importantes sítios do Estado como em Coimbra, Lisboa ou em Santarém,
onde se encontra a mais antiga sinagoga do país18. O número dos judeus aumentava devido
às necessidades dos primeiros reis portugueses (D.Afonso Henriques, D.Sancho I.) para cobrir
as áreas conquistadas dos Mauros. Em todos os sítios, onde o número total de judeus
ultrapassa dez pessoas, é criada a comuna ou aljama19. O seu centro organizador é uma
sinagoga que não serve só para serviços religiosos mas também para dar informações do rei
ou as decisões do rabbi-mor e representa papel idêntico ao da Igreja na vida do conselho
cristão. A sinagoga serviu como a sede do governo da comunidade judaica.
Ao falar sobre a população judaica, temos que mencionar dois termos importantes
de organização dos judeus. Estes são comuna e judiaria. Apesar de a segunda ser mais
conhecida hoje em dia, não podemos confundi-las, porque a primeira é mais abrangente
do que a segunda. Assim, judiaria era o espaço, a rua ou ruas do concelho, onde habitavam
os judeus inicialmente misturados com os cristãos20. Estes espaços encontraram-se, em geral,
nas zonas mais importantes da cidade, onde o comércio e a produção dos produtos foram mais
16
Maria José Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XIV, Guimarães Editores, Lisboa, 2000, p. 11.
17
Ibid., p. 12.
18
Joaquim de Assunção Ferreira, Estatuto Jurídico dos Judeus e Mouros na Idade Média Portuguesa,
Universidade Católica Portuguesa, Lisboa 2006, pp. 37–39.
19
O nome para as comunidades judaicas da Espanha antes de terem sido expulsos. A palavra tem origem árabe e
significa um grupo ou uma reunião.
20
Maria José Ferro Tavares, Os judeus na época dos descobrimentos, Edição ELO, p. 13.
7
intensivos. Sempre foram colocadas perto das portas da cidade, onde maioria dos mercadores
tinha que passar. Depende da posição dentro da prória cidade se este espaço fosse englobado
no espaço amuralhado. Limitada por portas que se abriam ao nascer do sol e se encerravam
ao pôr do sol, a rua ou o bairro dos judeus continuou a ser frequentado por homens e mulheres
cristãs que aí se iam abastecer de produtos e artigos21. De acordo com Maria José Ferro
Tavares podemos sistematizar a localização das judarias:
- “proximidade com as vias de longo curso ou a fixação junto das ruas direitas, as ruas
principais dos concelhos onde reside normalmente o núcleo mais importante da vida
económica e social”
- “vizinhança de templos cristãos a que não será estranha a ideia de conversão da população
judaica” 22
A maioria das casas dos judeus pertence ao rei, e estes pagam-lhe os impostos, tanto
em dinheiro, como em mercadoria. O resto era a propriedade da comuna ou dos cristãos. Estas
comunidades têm os seus próprios oficiais, eleitos pelos membros da comunidade, reunidos
na Sinagoga, e como autoridade máxima, dirige-as o rabi-mor, judeu da confiança do rei.
A pessoa que exereceu este cargo era duma camada bastante elevada da sociedade judaica,
ou seja, era uma pessoa rica e educada. O rabi-mor era eleito pelos centros mais importantes
do país: Porto (região de Entre Douro e Minho), Torre de Moncorvo (Trás-Os-Montes), Viseu
(Beira), Covilhã (Beira/Serra de Estrela), Santarém (Estremadura), Évora (Alentejo) e Faro
(Algarve). Estes centros lograram a judicatura sobre todas as comunidades do país.
Pelo contrário, a comuna era uma unidade administrativa, religiosa, judicial fiscal e cultural,
com uma autonomia da sociedade cristã. Havia casos em que poderíamos identificar
a comuna com judiaria, caso a comuna tivesse só uma judiaria, como por exemplo, na Guarda,
Santarém, Trancoso, Faro ou Coimbra. As outras, como em Lisboa ou no Porto, foram
constituídas por duas ou três judiarias, conforme a sua importância e a sua densidade
populacional.
O centro de poder, a sinagoga, não servia só como casa de oração, mas também como
tribunal ou escola. Na maioria das comunas, a sinagoga era o centro da vida comunitária, não
tendo outro edifício público. Por isso existem sérias dúvidas sobre a existência de comunas
em todos os locais. A documentação portuguesa nos menciona a existência de judeus ou
de judaria, dado o número reduzido daqueles para justificar a abertura de uma sinagoga,
21
Maria José Ferro Tavares, Os judeus na época dos descobrimentos, Edição ELO, p. 14.
22
Maria José Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XIV, Guimarães Editora, Lisboa, 2000, p. 28.
8
quanto mais capaz de manter o organismo administrativo ou judicial que era comuna23.
Assim, algumas das judiarias serviram só como satélites das comunas mais importantes como
no caso de Lisboa, do Porto ou de Belmonte. Até agora foram mencionados os centros
urbanos mas verdade é que os judeus se instalaram também nas áreas rurais, em pequenos
concelhos, nomeadamente agrícolas. A criação da comuna foi possível, depois da autorização
do rei, através de uma carta de privilégios como, por exemplo, a possibilidade de construir
os seus templos ou de praticar livremente a sua religião. Algumas comunas foram dispersas
de serviço militar.
No século XIII, o rei Afonso II legisla as Ordenações Afonsinas24, tentando criar as
leis para protegerem a minoria judaica porque a maioria cristã começava a causar-lhe os
primeiros problemas. Isto quer dizer o seguinte: os judeus não podiam ter um criado que fosse
o cristão sob pena de perda dos bens, qualquer judeu convertido ao cristianismo que voltasse
ao judaísmo podia ser condenado à morte, os judeus não podiam ocupar os lugares públicos
da maneira que qualquer cristão ficasse prejudicado com esta decisão. Logo depois, estas leis
perderam a sua eficácia e com o reinado do seu filho, D. Sancho II25 podiam voltar aos cargos
públicos em prejuízo dos cristãos. Certamente, esta decisão deixou os cristãos vexados
e estes, via Bispo de Lisboa, fizeram as queixas ao Papa, Gregório IX. Este enviou, depois
do IV concílio de Latrão, de 1215, aos Bispos de Astorga e Lugo a bula Ex Speciali, a fim
de estes advertirem o soberano português de que não pode dar a judeus, cargos com
autoridade sobre os cristãos.26 O reinado do rei Afonso III defende os interesses, ao mesmo
tempo, tanto dos judeus como cristãos. Afonso III publica as leis inspiradas pelos reis Jaime I
de Aragão e Afonso X de Castela, restringindo o usurário dos judeus. Assim, proíbe que
os juros ultrapassem a importância do capital emprestado. Simultaneamente, protege também
os judeus como no caso da comuna em Santarém onde estavam em questão os cristãos que
vendiam ou alugavam os bens que estão hipoteticados aos judeus e estes perdiam dinheiro
ou mesmo as propriedades. Afonso III manda que aquele que comprou os bens hipoteticados
tinha que compensar a diferença ao prestamista. Este rei, pela primeira vez, regulou
as posições dos judeus e cristãos em litígio27. Deste modo:
- os litigantes são considerados com igualdade de direitos
23
Maria José Ferro Tavares, Os judeus na época dos descobrimentos, Edição ELO, p. 15.
24
Joaquim de Assunção Ferreira, Estatuto Jurídico dos Judeus e Mouros na Idade Média Portuguesa,
Universidade Católica Editora, Lisboa 2006, p. 256.
25
Ibid., pp. 244–245.
26
Maria José Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XIV, Guimarães Editora, Lisboa, 2000, p. 15.
27
Joaquim de Assunção Ferreira, Estatuto Jurídico dos Judeus e Mouros na Idade Média Portuguesa,
Universidade Católica Editora, Lisboa 2006, pp. 247–250.
9
- o cristão prova contra o judeu com testemunhas cristãs e judaicas
- o judeu prova contra o cristão com as mesmas testemunhas
- em litígio entre os cristãos, o judeu não pode servir como testemunha
- o judeu jura, antes de testemunhar, na sinagoga, na Tora, com a presença de rabi e oficial
da comuna
Mais uma vez, o clero queixou-se ao Papa que o monarca coloca os judeus nos cargos
administrativos mas também que não os compele a trazer sinais nas roupas, tal como ordena
o IV concílio de Latrão e Inocêncio III, nem a pagar o dízimo à Igreja28.
Desta época ainda não existem notícias sobre distúrbios ou represálias dos cristãos aos
judeus ou seja, durante os primeiros reinados, estes viveram, em paz e protecção dos reis. Só
às vezes aconteceu que cristãos abusaram os judeus nos assaltos às igrejas, sobre o que fala
uma lei que condena qualquer judeu à pena de morte e cristão que o tenha instigado a pena
igual se fosse da classe normal, ou à expulsão se fosse fidalgo. Porém, estes casos não
aparecem frequentemente. É certo que a convivência da minoria judaica com os cristãos não
era fácil mas, nestes tempos, era relativamente tranquila. Só às vezes era necessária uma
maior acção repressiva sobre certas actividades judaicas, precisamente económicas e aquelas
que eram ligadas ao convívio com cristãos. A situação dos judeus em Portugal foi similar aos
outros que viveram na Europa cristã. Existe um outro facto extremamente importante em
relação aos judeus. Os judeus foram obrigados pagar numerosos impostos e é com isto mais
agravada do que a maioria cristã. A possibilidade de conviver religiosamente, de manter os
seus direitos, usos e costumes é paga por uma série de tributos ao rei que vão da capitação
ao rendimento e mantimento diário, à entrega da dízima à Igreja a e a toda uma
comparticipação nos impostos e despesas dos concelhos e das comunas29.
Já durante o reinado do D. Dinis os judeus ficam espalhados por todo o reino. A
população judaica situa-se em comunas que só podem ser construídas através da autorização
do rei. Esta autorização é em forma da carta régia com os outros privilégios e mercês e é
publicada pelos respectivos reis. Nem todas são, hoje em dia, conhecidas, mas há informações
sobre numerosas confirmações às comunas feitas pelos D. Afonso IV, D. Pedro I e
D. Fernando (considerado o rei). Nesta época já existem as comunas como de Lisboa,
Santarém, Beja, Guarda, Coimbra, Bragança, Estremoz, Tavira, Leiria, Faro e os outros. Aqui
vemos que cada região do reino já tem a sua população hebraica.
28
Maria José Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XIV, Guimarães Editora, Lisboa, 2000, p. 17.
29
Ibid., p. 18.
10
Para a comuna é a escola e a educação uma das coisas mais importantes dentro da
comunidade. É certo que nem todos os judeus sabiam ler ou escrever, mas o facto que os
judeus eram geralmente bilingues (alguns médicos sabiam também o latim) mostra que eram
bastante cultos. Na escola elementar, as crianças aprendem a ler e escrever e assim adquirem
os seus primeiros conhecimentos religiosos e históricos da sua história rica.
Enquanto a escola é a parte situada dentro da comuna, os cemitérios são sempre
construídos fora, mas têm grande importância para a vida da sociedade judaica. Infelizmente
não existem conservados os grandes monumentos da época pois estes foram destruídos pelos
cristãos que aí tentaram descobrir os bens judaicos ou o motivo deste comportamento foi a
intolerância religiosa. Em termos económicos, a vida tem a sua base no comércio e artesanato
mas há, certamente, os judeus que se dedicam à agricultura ou à criação do gado.
“As comunidades judaicas são um corpo vivo, administrativa e religiosamente
independente, directamente ligado ao rei, teoricamente desligado do conselho onde reside,
mas, na prática, intimamente a ele associado”30.
30
Maria José Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XIV, Guimarães Editora, Lisboa, 2000, p. 49.
11
VI. OS JUDEUS NA SOCIEDADE PORTUGUESA NOS
SÉCULOS XIV E XV
Os judeus são protegidos pelos membros da nobreza e, geralmente, pelo próprio rei
que, ao longo de tempo, toma a defesa dos judeus. É obvio que esta actividade real tem como
o intento as grandes fontes da sua receita que os judeus apresentam e apesar de terem direitos
e liberdades definidos, estes mudavam de acordo com a política aplicada por respectivos
monarcas ao longo dos tempos32. Esta protecção real é lhes dada pela coroa, em troca de
dinheiro. Contudo, esta protecção é, na maioria dos casos, delimitada para os seus favoritos,
através de concessões de privilégios e doações de bens. Deste modo, podemos dividir os
31
Oceanos, Diáspora e Expansão, Os Judeus e os Descobrimentos Portugueses, Comissão Nacional para
as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, número 29 – Janeiro/Março 1997, pp. 11–12.
32
Angelo Adriano Faria de Assis, O Medievo Português em tempos de livre crença: relações entre judeus
e cristãos em Portugal antes do monopólio católico iniciado em 1497, [on-line] disponível em:
<<http://www.revistamirabilia.com/Numeros/Num3/artigos/art11.htm>>.
12
judeus entre os privilegiados e não privilegiados. Os privilégios nunca podem ser hereditários,
quer dizer, têm validade temporária, durante o reinado de respectivo monarca. De acordo com
Maria Ferro Tavares33, podemos dividir estes privilégios em:
- “privilégios de isenções fiscais” (libertação do pagamento dos direitos reais, dos
tributos extraordinários e dos impostos)
- “privilégios de inebilidade para os cargos comunais” (para muitos judeus, sobretudo
para médicos ou servidores do rei, cargo público dentro da comunidade judaica não
recompensa a despesas e responsabilidades que levam)
- “privilégios de qualificação social” ( concessão de privilégios de distinção social)
33
Maria José Pimenta Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XV, Universidade Nova de Lisboa,
Lisboa, 1982, pp. 216–218.
34
Ibid., pp. 220–221.
13
renovo sobre o que a terra produzir, entre outros”35. Outro dos serviços que a população
hebraica deve à Coroa, tal como a cristã, é o imposto para apresamento das galés reais, nos
estaleiros. Igualmente os judeus são obrigados à prestação do serviço militar. Os que tiverem
bastante dinheiro com cavalos e armas, os restantes fazem este serviço a pé36. Esta obrigação
é idêntica para os cristãos. Na verdade, a obrigação do serviço militar mostra como são
os judeus a parte integrante da sociedade portuguesa medieval, participando nas guerras com
o seu rei a senão todos os judeus, maioria deles cumpre esta prestação. Os que não querem
cumprir este serviço fazem queixas por parte de algumas comunas contra os municípios que
os obrigam. Cada dos concelhos tem obrigação a prestar a aposentadoria à família real,
aos oficiais reais ou aos membros da nobreza. Esta obrigação é comungada com a comuna
e esta tem de fornecer o concelho com roupas ou alimentação, casas e camas têm que ser
sempre a disposição. Muitas vezes os judeus queixaram-se, causando-lhes grande prejuízo,
pois é o problema mais económica do que social. Não é problema dar pousada a cristãos até
porque esta é gratuita, nomeadamente durante várias festas, ou seja, na época quando ganham
a mais.
Pelo contrário, às vezes é o monarca que obriga os cristãos a estarem à disposição aos
judeus, quase sempre aos judeus em serviço real. Entre os privilégios especiais para os judeus
existe também o privilégio de isenção de aposentadoria37.
35
Maria José Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XIV, Guimarães Editora Lisboa, 2000, p. 56.
36
Maria José Ferro Tavares, Os judeus na época dos descobrimentos, Edição ELO, p. 19.
37
Reuven Faingold, Judeus nas Cortes Portuguesas, [on-line] disponível em:
<<http://www.reuvenfaingold.com/artigos/12.pdf>>.
38
Joaquim de Assunção Ferreira, Estatuto Jurídico dos Judeus e Mouros na Idade Média Portuguesa,
Universidade Católica Portuguesa, Lisboa, 2006, p. 275.
14
a possibilidade da dispensa do uso de sinal. Muitos judeus começaram vestir-se da mesma
forma que a maioria cristã para se confundirem com ela. Pretende-se que desta época começa
distinção entre vestuário dos os Sefarditas e os Asquenazis39. Não devemos esquecer que não
apenas os judeus e os cristãos vivem em vizinhança mas estes são também misturados com
os mouros40.
E é mesmo após 1215 quando se começa a sentir maior pressão para separar estes dois
grupos religiosos – cristãos e judeus, apesar de as comunas, mais ou menos separadas, já
existirem. Só agora é ordenado que comunidade judaica que conta com mais do que dez
membros deve viver no próprio bairro.
A este respeito, Maria José Ferro Tavares diz: “Embora, teoreticamente, os judeus devam
morar nos seus bairros, a realidade apresenta-se muito diferente. De facto, as suas casas e as
suas propriedades são vizinhas, quer nas cidades quer nas vilas e aldeias, onde se encontrem.
Por isso, cremos ser impossível afirmar-se essa separação, entre as gentes dos dois credos,
baseando-nos, somente, nas leis, sem olharmos para a outra documentação existente, donde
se pode deduzir precisamente o inverso“41. Os judeus vivem fora das judiarias e os cristãos
arrendam casas dentro delas. As relações, tanto pessoais como económicas, são bastante
complicadas. Estas relações são reguladas pelas leis canónicas e reais.
Qualquer relação pessoal entre judeu e cristã ou entre judia e cristão são proibidas sob
a pena de morte com excepção do caso do indivíduo judeu convertido. Mas deve-se dizer que
estas ordenações têm mais a ver com a rivalidade socioprofissional do que religiosa. Também
as relações económicas sofrem de certas restrições. Há concelhos que ordenam que o judeu
não contrate trabalhadores cristãos para certos trabalhos devendo utilizar outros judeus.
Apesar disso, há os judeus e os cristãos ligados entre si, pelo próprio trabalho, umas
vezes como patrões, outras como empregados. Os judeus ocupam profissões como rendeiro,
mordomo, almoxarife, procurador etc. Trabalham para o rei e a sua família, para a nobreza
mas também para os membros do clero. Contudo, existem os rendeiros hebraicos que podem
ter ao seu serviço oficias e magistrados cristãos.
Todos estes contactos económicos significam que entre judeus e cristãos realizam-se
contractos de compra e venda, de arrendamento, de empréstimos, etc. Alguns monarcas
39
Maria José Pimenta Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XV, Universidade Nova de Lisboa,
Lisboa, 1982, p. 222.
40
Há poucas informações sobre convivência entre judeus e mouros. Os judeus mais ricos têm, provavelmente, os
mouros como servos. Os mouros também desempenham o papel dos banqueiros nos contratos judaicos.
41
Maria José Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XIV, Guimarães Editora, Lisboa, 2000, p. 77.
15
tentam regular estes contactos: “D. Dinis ordena por duas leis, em 1314, que nenhum judeu
faça qualquer espécie de contrato com cristão, sem ser na presença de dois alvazis, alcaides
ou juízes, consoante os locais, do tabelião e de testemunhas”42 e por outra carta manda que
”[…] enquanto um dos alcaides, ou alvazis, ou juízes, se encontrar fora da localidade, que o
outro permaneça nela, para poder realizar qualquer contrato entre judeus e cristãos”43. Não
é certo que esta condição seja cumprida mas, pelo menos, todos os contratos comerciais
devem ser feitos perante o tabelião do lugar ou perante o juiz e o tabelião.
Até agora estudei a descrição da minoria judaica e a sua convivência com a maioria
cristã, ora pacífica, ora não. Contudo, quais são os motivos principais que levam os cristãos a
rejeitarem os judeus? Qual é a definição de judeu? E como se vê a minoria judaica, a si
própria? É provável que a opinião cristã tenha sido formada pela ideologia, ao longo do
tempo, pelo direito canónico e pelo direito civil. A partir desta influência foram criados certos
estigmas inconscientes sobre os judeus.
O primeiro, criado logo depois da morte de Cristo, é o deicídio – morte que os judeus
deram a Cristo44 e que lhes foi conferido. Esta acusação religiosa é, frequentemente, presente
nos livros apológicos antijudaicos dos vários teólogos cristãos e não só na época medieval,
como descreve Bruno Feitler: “[...] nos séculos XVI e XVII difundiu-se em Portugal uma
grande quantidade de obras de polémica antijudaica quando oficialmente já não existiam
judeus no país com o objectivo de converter os cristãos novos, ainda identificados como
judeus45”.
A rejeição do Messias e do dogma da Trindade também define a visão que os cristãos
têm dos judeus. Cria-se uma visão ou uma ideia que o judeu personifica Satanás ou mal
absoluto46. A igreja, apesar de reconhecer a religião judaica, tenta definir certa limitação
nos contactos e no convívio entre dois grupos religiosos porque estes podem ser prejudiciais
para os cristãos. Por causa disso são proibidos os casamentos e as relações íntimas entre
as pessoas de crença diferente, a não ser que o indivíduo judaico renuncie formalmente
os erros religiosos em acto público e assim converta ao cristianismo. A segregação religiosa
42
Maria José Ferro Tavares, Os Judeus em Portugal no século XIV, Guimarães Editora, p. 82.
43
Ibid., p. 84.
44
Diccionário Língua portuguesa, Universal, Texto Editores, Lda. 1995.
45
Bruno Feitler, O Catolismo como ideal, [on-line] disponível em: <<http://www.cebrap.org.br>>.
46
podemos encontrar a reflexão desta ideia na literatura portuguesa como na obra de Gil Vicente
16
não se limita só a vida religiosa ou profissional, mas existe, evidentemente, no quotidiano.
O judeu vê-se como uma pessoa impura, com a qual tudo fica sujo, depreciando os alimentos.
Os cristãos recusam-se a comer algo que já foi tocado por um judeu por suspeitar que
a comida seja envenenada. Este medo aumenta ainda mais no tempo da peste.
Da tradição oral vêm outras formas do comportamento antijudaico como assassínio
ritual, várias formas de conspiração e, sobretudo, profanação de hóstia (também chamada
Eucaristia). Todas estas acusações pioraram a atmosfera de convivência pacífica e, ao mesmo
tempo, criaram novas ameaças e restrições (em relação à liberdade religiosa, vida social,
cultural e económica ou direitos civis e residência – criação dos guetos). Neste sentido
podemos citar Fritz B.Voll: “O povo cristão ataca ora indivíduos, ora comunas inteiras,
levando consigo vandalismo, pilhagens ou mesmo massacres”47.
Há mais consequências que têm origem nesta atitude antijudaica que ultrapassa o
carácter individual e torna-se colectiva e inconsciente. O judeu é definido como inferior na
sociedade cristã (isto muda, por exemplo, a validade do testemunho contra o cristão), existem
as restrições da casa real, do clero e da nobreza em relação aos judeus e seus cargos públicos.
Porém, estas restrições variam muito, dependendo de atmosfera actual e de atitude tomada
pelo respectivo soberano. Por fim, o judeu é também definido pela falta de qualidades
positivas do homem medieval. Cristão é sinónimo de coragem, judeu, ao contrário, é o da
cobardia, facto que transparece na isenção de serviço militar de alguns judeus. Porém, por
parte dos judeus, esta isencão tem motivos religiosos e económicos. Os cristãos não se sentem
seguros com os judeus, potencialmente, armados a seu lado. Neste contexto vemos esta
recriminação como tendenciosa48.
Já chamei atenção para o facto que esta animosidade não é só popular mas é evidente
nas relações comerciais. A manipulação financeira e a prática de usura causam aversões seja
entre os lavradores (em Portugal medieval predomina a agricultura), seja entre a burguesia
mercantil. E como o factor negativo predominante em relação à atmosfera antijudaica vemos,
precisamente, a concorrência profissional. Recorde-se que a distinção entre crédito e usura, na
Idade Media, é regulada pela Igreja nas doutrinas eclesiásticas, especialmente na doutrina
usurária cujo núcleo forma princípios incluídos no Antigo e no Novo Testamento. III Concílio
47
Fritz B.Voll, Cristãos e Judeus, Um Breve Retrospecto duma Triste História, [on-line] disponível em:
<<http://www.cristaos-e-judeus.info/1004.htm>>.
48
Maria José Pimenta Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XV, Universidade Nova de Lisboa, 1984,
pp. 25-26.
17
de Latrão49 excluiu usureiros da ideia de comunidade cristã e o Concílio de Viena50
proclamou como herético qualquer um que derrogava esta doutrina usurária. Esta doutrina que
contém ainda explicação escolástica mas, na verdade, nunca se tornou numa norma judicial.
É importante que estes princípios escolástico-canónicos não se apliquem aos judeus, que
foram, cada vez mais, impelidos do comércio tradicional e, portanto, o comércio financeiro
tornou-se a actividade principal. Com o desenvolvimento do negócio financeiro, em toda
a Europa medieval, os especialistas judaicos são quase indispensáveis. Sem apoio dos
banqueiros judaicos não seria possível realizar muitas actividades medievais, nomeadamente
na área de construção e na área militar (cruzadas p.e.). À medida que o tempo passa, surge
certa libertação, em relação à doutrina usurária. No fim do século XV e sobretudo no século
seguinte, ocorrem mudanças socio-económicas e, portanto, as autoridades religiosas cristãs
são obrigadas a mudar a sua atitude que impediu aos cristãos contribuir para esta parte
do negócio financeiro. Os judeus, consequentemente, perderam a sua posição dominante nesta
área51.
Este clima antijudaico e opressivo tem de influenciar a minoria judaica e
a autodefinicão dela perante a sociedade maioritária, incorporando nela inferioridade, medo
inconsciente, simplicidade e impotência52. No entanto, referindo-se ao anti-semitismo, a
existência do anticristianismo de judeus não surpreende. Os judeus denominam-se como
sendo „o povo escolhido“ por Deus, recusando os pilares básicos do cristianismo: a Trindade,
Messias e a Ressurreição. Esta atitude anticristã não é, publicamente, revelada mas não há
dúvidas que ficou enraizada na religião judaica.
Afinal, todos os contactos e relações, tanto profissionais como civis, entre os judeus
e os cristãos, implicam certa sensação de medo e ódio inconscientes aos dois lados,
acompanhados com intolerância religiosa mas, na verdade, a maioria cristã nunca conseguiu
afastar a minoria judaica da sua vida social com todos seus aspectos. Esta denominação
do judeu faz parte de todo o mundo cristão ocidental, na época medieval, ao mesmo tempo
que a situação em Portugal não tenha sido tão grave como no resto da Europa. Apesar
de existirem as dificuldades mencionadas em cima, podemos dizer que não são frequentes
49
O Terceiro Concílio de Latrão, o décimo primeiro ecuménico, realizado em 1179, convocado pelo Papa
Alexandre III.
50
O concílio realizado na Catedral de Viena, na França, entre 16 de Outubro de 1311 e de 6 de Maio de 1312.
Foi convocado pelo Papa Clemente V.
51
Tomáš Pěkný, Historie Židů v Čechách a na Moravě; Sefer, Praha 2001; pp. 288-289.
52
Maria José Pimenta Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XV, Universidade Nova de Lisboa, 1984,
p. 34.
18
ou constantes, nos séculos XIV e XV, o clima mantém-se ainda aceitável, em comparação
com o século seguinte.
Até este momento referi somente sobre as relações entre judeus e cristãos,
marginalmente mencionei a convivência com os mouros. Sobre as relações entre os próprios
judeus na época do século XIV e XV não há muita documentação. Os judeus, como o povo
bastante ligado a sua fé, têm as regras rigorosas que graduam a vidas deles. Na vida familiar
há muitas coisas que diferenciam esta minoria perante maioria cristã. A família é patriarcal, o
núcleo da família é o casal com o seus filhos mas, no sentido mais amplo, a família é
constituída por todos de mesmos laços de sangue a parentesco, ou seja, pais, avós, irmãos,
tios e primos53. Os casamentos entre os membros da família são permitidos, nos graus
referidos pelo Levítico54 porque família judaica cresce pelo casamento. Por causa dos
interesses económicos, a esposa é escolhida numa outra família ou na própria. Por mais que a
lei judaica permita poligamia, os rabinos preferem os casamentos monógamos, se calhar para
se adaptarem à sociedade maioritária.
A puridade do sangue é importante e por causa disso não é aceite o casamento com
os indivíduos da crença diferente. Também nos divórcios, judeus diferiam-se de cristãos
porque têm possibilidade de repudiar a sua mulher com assim chamada carta de repúdio. Isto
significa que a mulher pode casar de novo mas o homen nunca mais pode voltar a casar com
ela. Na maioria dos casos, o motivo de repúdio é esterilidade do casal.
O pior que pode acontecer a judeu é o H´érem, que significa a excomunhão. Este
processo é dirigido pelos oficiais da comunidade e pelo rabi e por causa dos motivos graves.
Este judeu é expulso da comunidade com a sua família. O H´érem, certamente, acontece
a judeu que se tornar o cristão, por qualquer motivo, com possibilidade de pena de morte
e este nunca mais pode ser o membro da comunidade hebraica. Justiça, dentro da comunidade,
é administrada segundo a lei mosaica. Há, certamente, os crimes entre judeus, como
em qualquer outra comunidade dos seres humanos e estes crimes são julgados dentro
da comunidade, na sinagoga, pelo rabi-menor. No julgamento pode solicitar o cristão como
testemunha com igual validade (caso contrário, no licítio entre os cristãos só, o judeu não
53
Maria José Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XV, Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 1982,
p. 227.
54
Levítico é terceiro livro da Bíblia, faz parte de Pentateuco, os cincos primeiros livros bíblicos.
19
pode testemunhar). Naturalmente, os judeus são solidários entre si nos julgamentos perante
os cristãos e o soberano mas, decididamente, esta coesão não ocorre entre eles, sobretudo em
questão de dinheiro. Para concluirmos a realidade jurídica dos judeus, podemos constatar que:
„Apesar de se reger por um direito próprio, é um facto que a minoria judaica acaba por se
sujeitar às ordenações gerais do reino e […] as ordenações do reino determinam que, entre
judeu e judeu, se cumpra inteiramente o direito mosaico […]”55.
As épocas com tolerância religiosa relativamente estável são alternadas com as fases
da intolerância e o ódio que espalharam o medo e a morte entre a comunidade judaica. O
facto que os mercadores vêem nos judeus os seus rivais com a basto poder, sobretudo, no
comércio a distância é um dos responsáveis por esta situação,. Nesta situação e com
a Inquisição nos séculos seguintes pode ser surpreendente que a Igreja de Roma, no século
XIV, seja tolerante com o povo judaico, a nível oficial e coloque os judeus sob a sua defesa e
protecção específica impedindo todas as atitudes de fanatismo religioso por parte da minoria
cristã. As maiores autoridades da Igreja tentam defender os judeus quando “o Papa proíbe
aos cristãos sob pena de excomunhão, que os apedrejem ou maltratem, que lhes destruam os
templos e cemitérios, ou que os forcem ao baptismo56”. Apesar de ser frequentes as queixas
sobre as humilhações sofridas pelos cristãos por parte dos judeus, não há informações de
perseguições aos judeus, nem o clero as estimula. Pelo contrário, tolera-os e aceita-os na
administração dos bens clérigos. Para concluirmos este assunto, podemos dizer que a
tolerância religiosa dos judeus predomina nesta época.
O facto que as igrejas cristãs são muitas vezes construídas perto dos templos judaicos
tem como o objectivo a conversão dos judeus, nesta época ainda pelo exemplo e palavra. É
bastante comum que, ainda numa atmosfera pacífica, os rabis e os sacerdotes discutem sobre
as suas fés.
Para concluir a situação do povo hebraico em Portugal no século XIV e XV faço
destacar o seguinte:
- os judeus têm a posição importante na sociedade portuguesa e marcam o contributo
para ela
- ocupam vários cargos económicos e sociais que os ajudam a criar, aprofundar
e manter as relações favoráveis com a maioria cristã
55
Maria José Pimenta Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XV, Universidade Nova de Lisboa,
Lisboa, 1982; pp. 243-244.
56
Maria José Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XIV, Guimarães Editora, p. 61.
20
- aversão religiosa é bastante incomum, só o dinheiro é o que pode causar os ataques
da maioria cristã contra aos judeus e suas casas, seus bens ou até seus cemitérios
- dois credos tão diferentes conseguem viver sem grande ódio e fanatismo num país,
a realidade que não existe no resto da Península Ibérica e na Europa
- são os judeus que aproveitam a sua ciência, o seu dinheiro e toda a sua capacidade
para obter prestígio a para ancorar a sua posição social que leva consigo ódio também.
21
VI. A INFLUÊNCIA DOS JUDEUS NA CIÊNCIA E NA
CULTURA PORTUGUESAS
Desde sempre, os judeus foram considerados pessoas cultas, com grandes capacidades
intelectuais e científicas e com grande efeito para a cultura portuguesa e consequentemente
europeia. Chegando à Península Ibérica, não trouxeram só a sua cultura de nível elevado mas
também a cultura árabe que os influenciou durante séculos e as obras por eles produzidas
criaram o contacto entre a cultura oriental e a ocidental. Ao falar de literatura medieval
portuguesa, não conhecemos, infelizmente, muitos autores nem obras, contudo, alguns nomes
ficam conhecidos até hoje. Em Portugal, podemos dividir a produção literária medieval
em obras produzidas pelos judeus e as produzidas pelos cristãos. Em seguida mencionaremos
também alguns autores do século XVI por causa da sua importância em relação aos judeus.
2) Muitas obras de origem judaica, propriamente ditas não originais, foram influenciadas
por famosos intelectuais espanhóis. Estas obras copiadas foram populares
nomeadamente no século XV. Destacaram-se, sobretudo, os judeus espanhóis como
Maimónides com a Mishna Torá (rabi Moshe ben Majmon Ramban, nascido
57
Joaquim de Assunção Ferreira, Estatuto Jurídico dos Judeus e Mouros na Idade Média Portuguesa,
Universidade Católica Editora, Lisboa 2006, pp. 45-46.
22
em Cordoba, filósofo e médico, uma das pessoas mais conhecidas de filosofia
medieval judaica e europeia58), Nahamânides com Comentário sobre o Pentateuco
ou Gabirol (Solomon Ben Judah, poeta e filósofo, nascido em Málaga59). Na produção
dos textos religiosos e outros para serem divulgados, foram indispensáveis copistas
e escolas ou oficinas de manuscritos. Os judeus sobressaem neste campo também.
Entre os séculos XIII e XV, muitos manuscritos de Pentateuco foram produzidos,
precisamente, em Portugal. No século XV existia uma escola excelsa de manuscritos
hebraicos em Lisboa60.
3) Como foi dito, não há muitos nomes conhecidos até ao presente mas existem alguns
autores sobre os quais temos de fazer referência. Já da baixa Idade Média conhecemos
os judeus trovadores como Samuel de Leiria ou Vidal, o „Judeu d’Elvas“, cujos dois
cantares encontramos no Cancioneiro da Vaticana61. O historiador Gomes Eanes de
Zurara menciona na sua Crónica de Tomada de Ceuta por el rei D. João I. o grande
trovador Yuda Negro62. Do século XV conhecemos Isaac Abranavel (nascido em
Lisboa em 1437, membro das mais poderosas famílias de mercadores e banqueiros de
Portugal no século XV) que esteve presente na corte de D. Afonso V, onde escrevia
textos filosófico-religiosos. O seu filho Iehudad Abranavel, mais conhecido como
Leão Hebreu escreveu o famoso tratado Os Diálogos de Amor. Nesta obra filosófica,
além do amor, desenvolve outros temas como a estética, cosmologia ou metafísica63.
Neste sentido, podemos considerá-lo como um dos primeiros judeus portugueses
renascentistas. O último autor importante judaico de passagem dos séculos XV e XVI
em Portugal é Abraão Zacuto com a obra Livro de Genealogias, a crónica que inclui
58
Comunidade Judaica Masorti de Lisboa, [on-line] disponível em: <<http://www.beitisrael.org>>.
59
Classic Encyclopedia, [on-line] disponível em: << http://www.1911encyclopedia.org/Ibn_Gabirol>>.
60
Joaquim de Assunção Ferreira, Estatuto Jurídico dos Judeus e Mouros na Idade Média Portuguesa,
Universidade Católica Editora, Lisboa 2006, p. 49.
61
Mário Martins, A Sátira na Literatura medieval Portuguesa (Séculos XIII e XIV), Biblioteca Breve, Instituto
de Cultura Portuguesa, Amadora 1977, pp. 88-89.
62
Carolyn P. Collete, The legend of Good Women, [on-line] disponível em:
<<http://www.books.google.pt/books?id=e__fgQHkHHMC&pg=PA37&lpg=PA37&dq=%22Yuda+Negro%22
&source=bl&ots=sImVuLjMZJ&sig=sDG4GaLcYdge8Cwk426GTzDxISU&hl=cs&sa=X&oi=book_result&res
num=2&ct=result >>.
63
Pedro Calafate, Abraão Zacuto, [on-line] disponível em: <<http://www.instituto-
camoes.pt/cvc/filosofia/ren9.html>>.
23
dados autobigráficos64. Porém, a importância de Abraão Zacuto é nomeadamente na
área científica.
Pouco sabemos sobre a literatura judaica medieval mas temos ainda menos
informações sobre as obras de autores portugueses que teriam o judeu como tema principal.
Os judeus estiveram presentes na corte de muitos reis portugueses, por isso influenciaram as
obras literárias produzidas aí. A reflexão dos judeus nas obras da época variavac onsoante a
atmosfera, seja positiva, seja negativa, que predominava na corte. Há poucas referências
sobre os judeus nos cancioneiros medievais mas até aí encontramos certas excepções. Existe,
por exemplo, uma lírica religiosa nas Cantigas de Santa Maria, da produção de Afonso X,
que faz referência sobre um judeu convertido67. No Livro da Corte Imperial, de fins do século
XIV, a „igreja militante“ procura demonstrar, contra pagãos, mouros e judeus, por razões
evidentes e necessárias, os principais pontos da doutrina católica romana. O autor foi
o teólogo Raimundo Lúlio68.
A história rica do povo hebraico e o seu registo perfeito deu, junto da tradição latina,
visigoda e árabe, o fundamento à historiografia ibérica medieval. Sem dúvida, muitos dos
historiadores, quer portugueses, quer europeus, tomaram como base as fontes históricas dos
judeus.
64
Ciência em Portugal: Abraão Zacuto, [on-line] disponível em:
<<http://ecodanoticia.net/phpBB3/viewtopic.php?f=47&t=13952>>.
65
David Franco Mendes, J.Mendes dos Remédios, Os Judeus Portugueses em Amesterdão, Edições Távola
Redonda, Lisboa, 1990, pp. 11–12.
66
António José Ramos de Oliveira, Gutenberg e Gacon na origem da Imprensa, [on-line] disponível em:
<<http://www.pena-lobo.blogspot.com/2007/08/gutenberg-e-gacon-na-origem-da-imprensa.html>>.
67
Susani Silveira Lemos França, O choque das semelhanças; : [on-line] disponível
em<<http://pphp.uol.com.br/tropico/html/textos/1636,1.shl>>.
68
António José Saraiva; Iniciação na Literatura Portuguesa, Colecção Saber, Publicações Europa-América, 2a
tiragem, 1984, p. 35.
24
Influência judaica na língua portuguesa
- palavras da linguagem religiosa, ligadas aos textos bíblicos e à prática litúrgica71, desta
área surgem palavras como: aleluia, bálsamo, jubileu, messias, páscoa, sábado, ámen
etc.
69
Cristão-novo – designação dada ao judeu recém-convertido a fé cristã ou a descendente seu
Cripto-judeu (marrano) – o cristão-novo que manteve secretamente o seu judaismo; Diccionário Eletrónico,
disponível em: [on-line].<< http://priberam.pt/>>.
70
António Carlos Carvalho, Os Judeus do Desterro de Portugal, Quetzal Editores, Lisboa, 1999, pp. 15-17.
71
Encontro do Português com as línguas não europeias: textos interlinguísticos ; [on-line] disponível em:
<< http://www.bnportugal.pt/index.php?option=com_content&view=article&id=222%3Aencontro-do-
portugues-com-as-linguas-nao-europeias&catid=1%3A2008&Itemid=59 >>.
25
- encontramos muitas palavras em outras áreas como: ciência (iode72), finanças (cacife)
ou magia (abrakadabra)
Além destas palavras, existem ainda expressões e dizeres populares na língua portuguesa
de origem judaica ou cristã-nova. São frequentes tanto em Portugal como no Brasil para onde
imigraram imensos cristãos-novos depois de 1497 e onde influenciaram fortemente a cultura
nacional brasileira. Exemplos:
- “deus te crie” – após o espirro de alguém é uma herança judaica da frase Hayim
Tovim, que significa tenha uma boa vida;
- “passar a mão na cabeça” – com o sentido de perdoar erro cometido por algum
protegido, é memória da maneira judaica de abençoar de cristãos-novos, passando
a mão pela cabeça e descendo pela face, enquanto pronunciava a benção73 .
Como já referimos acima neste capítulo, o nível elevado da educação dos judeus
e os conhecimentos adquiridos durante a convivência com culturas diferentes causaram que
um impacto na minoria judaica não se sentia apenas no campo da cultura mas também na área
científica. Os ramos da ciência nos quais encontramos grandes personalidades de origem
judaica são nomeadamente a Matemática, Astronomia, Medicina, Farmácia e Ciência náutica.
Muitos destes sabedores abrangeram, na sua obra científica, mais do que um ramo,
verificando o facto da ligação interdisciplinar. Para tornarmos esta visão mais simples,
mencionamos somente os nomes com maior destaque, mesmo que se situem aquando
na transição dos séculos XV e XVI. Temos de acentuar também que muitos destes judeus
suplantaram os cientistas cristãos da época e, deste modo, contribuíram para o grande
desenvolvimento da sociedade medieval, ora portuguesa, ora europeia.
72
Portal da Língua Portugusa, [on-line] disponível em: << http://www.portaldalinguaportuguesa.org/ >>.
73
Jane Bichmacher de Glasman, Presença judaica na língua portuguesa; [on-line] disponível em:
<<http://www.filologia.org.br/viiifelin/39.htm >>.
26
1) Matemática – a implantação oficial da Matemática em Portugal deve-se a D. Afonso
Henriques74. A Matemática medieval pode ser caracterizada como uma fusão
da matemática grega com a árabe. Os árabes, verdadeiros mestres, ocuparam a posição
principal na área até que foram obrigados afastarem-se da Península Ibérica.
A convivência estreita dos mouros e dos judeus causou que os últimos assumiam estes
conhecimentos e ainda os desenvolviam. O mais notável é, no campo de matemática,
Pedro Nunes. Além da matemática, dedicou-se à geometria, medicina ou cosmologia.
Ao par das traduções e comentários, Pedro Nunes criou uma vasta obra original.
Dos livros matemáticos podemos citar Libro de Algebra en Aritmetica y Geometria75.
A sua obra levanta Portugal ao ponto mais alto em matemática na Península Ibérica76.
74
Teresa Monteiro, Uma curta viagem pela história da matemática, [on-line] disponível em:
<<http://danibra.blogspot.com/2008/01/uma-curta-viagem-pela-histria-da.html>>.
75
Pedro Calafate, Pedro Nunes, [on-line] disponível em: << http://www.instituto-
camoes.pt/cvc/filosofia/ren2.html>>.
76
Teresa Monteiro, Uma curta viagem pela história da matemática, [on-line] disponível em:
<<http://danibra.blogspot.com/2008/01/uma-curta-viagem-pela-histria-da.html>>.
27
D. Manuel até consultou com ele sobre a possibilidade da viagem de Vasco de Gama
a África 77.
3) Farmácia e medicina
Na Idade Média baixa não podemos falar ainda sobre a profissão farmacêutica.
Primeiro tinham existido os especieros que foram substituídos pelos boticários.
Os primeiros utilizaram as especiarias para fins terapêuticos, misturando-lhes vários
medicamentos e funcionavam como vendedores ambulantes. Daqui provém
a diferença entre os especieiros e os boticários, quer dizer, os boticários têm sítios
fixos para venderem os medicamentos. Entre os boticários destacam-se os judeus
como narra, por exemplo, Fernão Lopes na sua Crónica de D. Pedro.
77
Joaquim de Assunção Ferreira, Estatuto Jurídico dos Judeus e Mouros na Idade Média Portuguesa;
Universidade Católica Editora, Lisboa, 2006, p. 49.
78
Maria José Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XIV; Guimarães Editores, Lisboa, 2000; p. 99.
79
Jaime Moacyr Scliar, Da Bíblia à psicanálise: saúde, doença e medicina na cultura judaica. [doutorado]
Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacinal de Saúde Pública, 1999, [on-line] disponível em:
<<http://portalteses.icict.fiocruz.br/transf.php?script=thes_chap&id=00001802&lng=pt&nrm=iso>>.
28
tropical. A obra de mais relevo de Garcia d´Orta chama-se Colóquio dos simples
e drogas e coisas medicinais da Índia. O médico Amato Lusitano, durante a sua
carreira profissional, permaneceu em Antuérpia, na Itália (na Universidade de Ferrara
foi nomeado professor de medicina) para se estabelecer, finalmente, em Salônica. Foi
convidado para tratar do Papa Júlio III por ser um dos mais famosos médicos
da época. Escreveu o tratado Index Dioscorides ou Curationium Centuriae Septem,
uma descrição impecável dos seus 700 casos clínicos80.
80
Joaquim de Assunção Ferreira, Estatuto Jurídico dos Judeus e Mouros na Idade Média Portuguesa,
Universidade Católica Editora, Lisboa, 2006, pp. 46-47.
29
VII. CONCLUSÃO
Os judeus, o povo escolhido por Deus, a nação que nasceu há 6000 anos. O povo que,
desde tempos imemoriais, influenciou a história mundial. O povo que tem a história marcada
pelos momentos gloriosos e pelos momentos trágicos. Os judeus foram expulsados
da sua terra prometida e desde aquele tempo começou diáspora deles. Tiveram de aprender a
viver nos países e nas culturas que, frequentemente, não eram favoráveis para eles, quer
por motivos religiosos, quer por outros. Os vestígios dos judeus encontram-se em todos
os países da civilização ocidental e portanto não surpreende que um dos regiões onde se logo
estabeleceram era a Península Ibérica e Portugal, respectivamente.
A presença judaica na Península Ibérica é verificável a partir da Antiguidade. Os
judeus, com os mouros, godos e romanos, foram os primeiros habitantes desta região. Durante
a formação de Portugal, os judeus viviam entre os cristãos, dividindo o mesmo espaço. Os
primeiros monarcas ainda não se preocuparam com qualquer separação entre estes dois
credos. As tentativas desta separação surgiram só nos séculos seguintes, na maioria dos casos,
por causa da influência da Igreja católica. Entretanto, os judeus aproveitaram o seu trabalho e
as suas qualidades intelectuais para obterem a posição estável dentro da sociedade portuguesa
medieval. Os judeus destacam-se tanto no negócio como na cultura ou ciência, são
mercadores, médicos, banqueiros, etc. Resultados excelentes do seu esforço registam-se
nomeadamente na área do negócio financeiro e na ciência náutica. Podemos dizer que o
Estado português medieval não poderia funcionar sem judeus. Estes tiveram os cargos
importantes nas cortes reais, muitos dos reis portugueses aproveitaram os empréstimos
judaicos para financiarem guerras, cruzadas ou, simplesmente, funcionamento do Estado. Na
época dos Descobrimentos, os judeus desempenham o papel importante, apoiando o
financiamento e o desenvolvimento da ciência náutica.
Os judeus, em troca de convivência pacífica com a maioria cristã, foram obrigados a
pagar vários tributos e impostos bastante elevados. Os reis portugueses obrigaram-nos a
prestar vários serviços, seja à corte, seja à nobreza. O quotidiano dos judeus, de mesmo modo
como a convivência com os cristãos, foram regulados por decretos régios, que, porém, nem
sempre foram cumpridos. Os judeus mais importantes, frequentemente, têm os privilégios
especiais.
30
Em conclusão, a situação dos judeus, dentro da sociedade portuguesa dos séculos XIV
e XV, é favorável e estável. Os judeus têm um papel significante na sociedade portuguesa
medieval. A sua posição não tem só importância económica mas social também. Não existe,
realmente, separatismo efectivo entre a minoria judaica e a maioria cristã. Não há provas das
grandes perseguições brutas, típicas para o resto da Península Ibérica e da Europa. Se existe
alguma animosidade entre estes dois grupos religiosos, raramente é do tipo religioso. É o
dinheiro e a situação económica dos judeus que motivam os ataques dos cristãos, quer aos
judeus, quer aos seus bens. A convivência pacífica, ou seja, certa indiferença entre os judeus e
os cristãos, distingue Portugal do resto da Europa, onde predomina o ódio e o fanatismo
religioso.
31
VIII. BIBLIOGRAFIA, FONTES
VIII.I. BIBLIOGRAFIA
Joaquim de Assunção Ferreira, Estatuto Jurídico dos Judeus e Mouros na Idade Média
Portuguesa, Universidade Católica Portuguesa, Lisboa 2006.
Maria José Ferro Tavares, Os judeus na época dos descobrimentos, Edição ELO.
Maria José Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XIV, Guimarães Editora, Lisboa,
2000.
Maria José Pimenta Ferro Tavares, Os judeus em Portugal no século XV, Universidade Nova
de Lisboa, Lisboa, 1982.
Mário Martins, A Sátira na Literatura medieval Portuguesa (Séculos XIII e XIV), Biblioteca
Breve, Instituto de Cultura Portuguesa, Amadora 1977.
32
António José Saraiva; Iniciação na Literatura Portuguesa, Colecção Saber, Publicações
Europa-América, 2a tiragem, 1984.
Jaime Moacyr Scliar, Da Bíblia à psicanálise: saúde, doença e medicina na cultura judaica.
[doutorado] Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacinal de Saúde Pública, 1999, disponível em:
[on-line]
<<http://portalteses.icict.fiocruz.br/transf.php?script=thes_chap&id=00001802&lng=pt&nrm
=iso>>.
Teresa Monteiro, Uma curta viagem pela história da matemática, disponível em: [on-line]
<<http://danibra.blogspot.com/2008/01/uma-curta-viagem-pela-histria-da.html>>.
Encontro do Português com as línguas não europeias: textos interlinguísticos, disponível em:
[on-line]
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Jane Bichmacher de Glasman, Presença judaica na língua portuguesa; disponível em: [on-
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Susani Silveira Lemos França, O choque das semelhanças; disponível em: [on-line]
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33
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