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Hermenêutica

Elaboração:

- Rita Estefânia Luz dos Passos Matos

- Rogério de Moraes Silva

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Apresentação............................................................................................................................

Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa .......................................................................

Organização da Disciplina .........................................................................................................

Introdução ................................................................................................................................

Unidade I – Aspectos Introdutórios........................................................................................

Capítulo 1 – Introdução à Hermenêutica Bíblica.......................................................................

Capítulo 2 – História da Interpretação.....................................................................................

Unidade II – Análises.............................................................................................................

Capítulo 3 – Análise Histórico-Cultural e Contextual................................................................

Capítulo 4 – Análise Léxico-Sintática.......................................................................................

Capítulo 5 – Análise Teológica...............................................................................................

Unidade III – Métodos e Princípios........................................................................................

Capítulo 6 – Métodos Literários Especiais...............................................................................

Capítulo 7 – Princípios de Interpretação................................................................................

Referências ................................................................................................................................

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Caro aluno,

Bem-vindo ao estudo da disciplina Hermenêutica.

Este é o nosso Caderno de Estudos e Pesquisa, material elaborado com o objetivo de


contribuir para a realização e o desenvolvimento de seus estudos, assim como para a
ampliação de seus conhecimentos.

Para que você se informe sobre o conteúdo a ser estudado nas próximas semanas, conheça os
objetivos da disciplina, a organização dos temas e o número aproximado de horas de estudo
que devem ser dedicadas a cada unidade.

A carga horária desta disciplina é de 40 (quarenta) horas, cabendo a você administrar o tempo
conforme a sua disponibilidade. Mas, lembre-se, há uma data-limite para a conclusão da
disciplina, incluindo a apresentação ao seu tutor das atividades avaliativas indicadas.

Os conteúdos foram organizados em unidades de estudo, subdivididas em capítulos de forma


didática, objetiva e coerente.

Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, que farão parte
das atividades avaliativas da disciplina; serão indicadas também fontes de consulta para
aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares.

Desejamos a você um trabalho proveitoso sobre os temas abordados nesta disciplina. Lembre-
se de que, apesar de distantes, podemos estar muito próximos.

A Coordenação

Apresentação

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Apresentação: Mensagem da Coordenação.

Organização da Disciplina: Apresentação dos objetivos e da carga horária das unidades.

Introdução: Contextualização do estudo a ser desenvolvido por você na disciplina, indicando a


importância desta para sua formação acadêmica.

Ícones utilizados no material didático

Provocação: Pensamentos inseridos no material didático para provocar a reflexão sobre sua
prática e seus sentimentos ao desenvolver os estudos em cada disciplina.

Para refletir: Questões inseridas durante o estudo da disciplina, para estimulá-lo a pensar a
respeito do assunto proposto. Registre sua visão, sem se preocupar com o conteúdo do texto.
O importante é verificar seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. É
fundamental que você reflita sobre as questões propostas. Elas são o ponto de partida de
nosso trabalho.

Textos para leitura complementar: Novos textos, trechos de textos referenciais, conceitos de
dicionários, exemplos e sugestões, para lhe apresentar novas visões sobre o tema abordado no
texto básico.

Sintetizando e enriquecendo nossas informações: Espaço para você fazer uma síntese dos
textos e enriquecê-los com sua contribuição pessoal.

Sugestão de leituras, filmes, sites e pesquisas: Aprofundamento das discussões.

Praticando: Atividades sugeridas, no decorrer das leituras, com o objetivo pedagógico de


fortalecer o processo de aprendizagem.

Para (não) finalizar: Texto, ao final do Caderno, com a intenção de instigá-lo a prosseguir com
a reflexão.

Referências: Bibliografia consultada na elaboração da disciplina.

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Organização da Disciplina

Ementa

Introdução à Hermenêutica Bíblica. História da Interpretação Bíblica. Análise


Histórico-Cultural e Contextual. Análise Léxico-Sintática. Análise Teológica. Métodos
Literários Especiais e Princípios de Interpretação

Objetivos

• Definir e distinguir os termos hermenêutica e exegese.

• Descrever os vários campos de estudo bíblicos (estudo do cânon, crítica textual,


crítica histórica, exegese, teologia bíblica e teologia sistemática).

• Apresentar a necessidade e a base bíblica da hermenêutica.

• Levantar aspectos da história da interpretação bíblica.

• Considerar o ambiente histórico-cultural do autor, a fim de entender suas


alusões, referências e propósitos.

• Relacionar uma passagem com o escrito completo do autor, conhecendo melhor


seu pensamento geral e melhorando a compreensão da passagem.

• Analisar melhor a definição das palavras (lexicologia) e sua relação umas com
as outras (sintaxe) objetivando melhor compreender o sentido original do texto.

• Considerar o nível de compreensão teológica na época da revelação, levando em


conta os textos correlatos, a fim de prover uma melhor compreensão do
significado do texto para os seus primitivos destinatários.

• Diferenciar: Símiles, Metáforas, Provérbios, Parábolas, Alegorias, Tipos e


Profecias.

• Identificar os Princípios Gerais de Interpretação, Princípios Gramaticais de


Interpretação, Princípios Históricos e Culturais de Interpretação e Princípios
Teológicos de Interpretação.

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Unidade I – Aspectos Introdutórios

Carga horária: 10 horas

Conteúdo Capítulo

Introdução a Hermenêutica Bíblica 1

História da Interpretação Bíblica 2

Unidade II – Análises

Carga horária: 15 horas

Conteúdo Capítulo

Análise Histórico-Cultural e Contextual 3

Análise Léxico-Sintática 4

Análise Teológica 5

Unidade III – Métodos e Princípios

Carga horária: 15 horas

Conteúdo Capítulo

Métodos Literários Especiais 6

Princípios de Interpretação 7

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Introdução

Como cristãos e integrantes do povo de Deus, devemos buscar o entendimento dos


ensinamentos bíblicos de acordo com seus significados.

Devemos aprender a discernir esses significados na variedade de contextos novos ou


diferentes dos nossos próprios dias, que é a tarefa da HERMENÊUTICA.

Os assuntos relevantes de nossa disciplina serão: a história da hermenêutica, as formas


de análise, os métodos e os princípios de interpretação bíblica.

Portanto, nosso material didático tratará da disciplina Hermenêutica, que é a síntese dos
resultados da exegese, tornando-a relevante para todo leitor da Palavra de Deus.

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UNIDADE I – ASPECTOS INTRODUTÓRIOS

Capítulo 1 – Introdução a Hermenêutica Bíblica

1. DEFINIÇÕES

a) Do nome HERMES, deus grego que servia de mensageiro dos deuses, transmitindo e
interpretado suas comunicações.

b) Do grego HEMENEUO: Interpretar.

c) Ciência e Arte de Interpretar

Ciência: porque tem normas, ou regras, e essas podem ser classificadas num sistema
ordenado.

Arte: porque a comunicação é flexível. Uma aplicação mecânica e rígida das regras, às
vezes distorcerá o verdadeiro sentido de uma comunicação.

d) Hermenêutica Bíblica, é o estudo metódico dos princípios e regras de interpretação


das Sagradas Escrituras.

Diferença entre Interpretar e Aplicar

• Interpretar: explicar, traduzir exegeticamente; buscar o espírito do que


está escrito.

Aplicar: por em prática, adaptar, adequar.

2. A EXEGESE

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Nossa tarefa é dupla: Primeiro, descobrir o que o texto significava originalmente, esta
tarefa é chamada exegese.

Para nós, exegese é ler e explicar os textos em empatia (e simpatia) com os escritores
bíblicos. O exegeta é primeiramente um historiador que analisa os documentos.
Todavia, ele tem de ir além da análise impessoal: é necessário assumir a fé que o
escritor possuía para entender seus escritos. A exegese é um trabalho literário-espiritual.

. Exegese é uma palavra que vem da língua grega, sendo composta da preposição EK
(de) e da forma substantiva do verbo HEGEOMAI (ir, guiar, conduzir) e significa
"conduzir para fora" o sentido original de um texto. Na exegese procuramos entrar no
texto (EIS), e ficar nele (EN), para então sairmos dele (EK) tirando lições para nós.

A primeira tarefa do intérprete chama-se exegese. A exegese é o estudo cuidadoso e


sistemático da Escritura para descobrir o significado original que foi pretendido. A
exegese é basicamente uma tarefa histórica. É a tentativa de escutar a Palavra conforme
os destinatários originais devem tê-la ouvido; descobrir qual era a intenção original das
palavras da Bíblia. Esta é a tarefa que frequentemente exige a ajuda do "perito," aquela
pessoa cujo treinamento a ajudou a conhecer bem o idioma e as circunstâncias dos
textos no seu âmbito original. Não é necessário, no entanto, ser um perito para fazer boa
exegese.

Na realidade, todos são exegetas dalgum tipo. A única questão real é se você vai ser um
bom exegeta. Quantas vezes, por exemplo, você ouviu ou disse: "O que Jesus queria
dizer com aquilo foi..." "Lá naqueles tempos, tinham o costume de .. ."? São expressões
exegéticas. São empregadas mais frequentemente para explicar as diferenças entre
"eles" e "nós" — por que não edificamos parapeitos em redor das nossas casas, por
exemplo, ou para dar uma razão do nosso uso de um texto de uma maneira nova ou
diferente — por que o aperto da mão frequentemente tomou o lugar do "ósculo santo."
Até mesmo quando tais ideias não são articuladas, são, na realidade, praticadas o tempo
todo de um modo que segue o bom-senso.

O problema com boa parte disto, no entanto, é (1) que tal exegese frequentemente é
seletiva demais, e (2) que frequentemente as fontes consultadas não são escritas por
"peritos verdadeiros," ou seja: são fontes secundárias que também empregam outras

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fontes secundárias, ao invés das fontes primárias. São necessárias umas poucas palavras
acerca de cada um destes problemas:

1. Embora todos empreguem exegese nalgumas ocasiões, e embora muito


frequentemente semelhante exegese seja bem feita, mesmo assim, tende a ser
empregada somente quando há um problema óbvio entre os textos bíblicos e a cultura
moderna. Posto que realmente deve ser empregada para tais textos, insistimos que é o
primeiro passo ao ler TODO texto. De início, isto não será fácil de fazer, mas aprender a
pensar exegeticamente pagará ricos dividendos no entendimento, e tornará a leitura, sem
mencionar o estudo da Bíblia, uma experiência muito mais emocionante. Note bem, no
entanto: Aprender a pensar exegeticamente não é a única tarefa; é simplesmente a
primeira tarefa.

O problema real com a exegese "seletiva" é que a pessoa frequentemente atribuirá suas
próprias ideias, completamente estranhas, a um texto e, assim, fará da Palavra de Deus
algo diferente daquilo que Deus realmente disse. Por exemplo, um dos autores deste
livro recentemente recebeu uma carta de um evangélico bem conhecido, que
argumentou que o autor não deveria comparecer a uma conferência juntamente com
outra pessoa bem conhecida, cuja ortodoxia era algo suspeita. A razão bíblica dada para
evitar a conferência foi 1 Tessalonicenses 5.22: "Abstende-vos de toda forma do mal".
Se, porém, nosso irmão tivesse aprendido a ler a Bíblia exegeticamente, não teria usado
o texto dessa maneira. Ora, 1 Ts. 5:22 foi a palavra final de Paulo num parágrafo aos
tessalonicenses a respeito das expressões carismáticas na comunidade. "Não tratem as
profecias com desprezo", diz Paulo. "Pelo contrário, testem tudo, e apeguem-se ao que é
bom, mas evitem todas as formas malignas." "Evitar o mal" tem a ver com "profecias,"
que, ao serem testadas, revelam-se não serem do Espírito. Fazer este texto significar
alguma coisa que Deus não pretendeu é abusar do texto, não usá-lo. Para evitar erros
deste tipo, devemos, aprender a pensar exegeticamente, ou seja: começar no passado, lá
e então, e fazer assim com todos os textos.

2. Conforme logo notaremos, não se começa consultando os "peritos." Mas quando for
necessário fazê-lo, devemos procurar usar as melhores fontes. Por exemplo, em Marcos
10.23 (Mt. 19.23; Lc 18.24), no término da história do jovem rico, Jesus diz: "Quão
dificilmente entrarão no reino de Deus os que têm riquezas!" Passa a acrescentar: "É

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mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha, do que entrar um rico no reino
de Deus." Frequentemente se diz que havia uma porta em Jerusalém chamada o "Fundo
da Agulha," pela qual os camelos somente poderiam atravessar de joelhos, e com grande
dificuldade. A lição desta "interpretação" é que um camelo poderia realmente passar
pelo "Fundo da Agulha." O problema desta "exegese," no entanto, é que simplesmente
não é verdadeira. Nunca houve semelhante porta em Jerusalém, em qualquer período da
sua história. A primeira "evidência" que se conhece em prol de tal ideia é achada no
século XI d.C. (!), num comentário de um eclesiástico grego chamado Teofilacto, que
tinha a mesma dificuldade com o texto que nós temos. Afinal das contas, é impossível
para um camelo passar pelo fundo de uma agulha, e era exatamente o que Jesus queria
ensinar. É impossível para alguém que confia nas riquezas entrar no Reino. É necessário
um milagre para uma pessoa rica receber a salvação, o que é certamente a lição das
palavras que se seguem: "Para Deus tudo é possível."

Devemos aprender a discernir esse mesmo significado na variedade de contextos novos


ou diferentes dos nossos próprios dias, esta é a tarefa da HERMENÊUTICA. Em
definições clássicas a hermenêutica abrange ambas as tarefas, mas em tratados recentes
a tendência tem sido separar as duas.

Hermenêutica é a síntese dos resultados da exegese, tornando-a relevante para o leitor,


ou auditório.

• Descrever os vários campos de estudo bíblicos (estudo do cânon, crítica textual,


crítica histórica, exegese, teologia bíblica e teologia sistemática). Apresentar a
necessidade e a base bíblica da hermenêutica.

3. ESTUDO DA CANONICIDADE

Perceberemos neste campo que se estuda a diferenciação entre os livros que não trazem
o selo da inspiração divina e os que o trazem. Este foi um processo histórico no qual o
Espírito Santo guiou a Igreja neste reconhecimento.

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CRÍTICA TEXTUAL

Observamos que o estudo aqui é focado na análise do fraseado primitivo de um


texto(conhecido também com BAIXA CRÍTICA), isto por não possuirmos os originais,
sim apenas cópias e estas variando muito entre si. F.F.Bruce diz que:

“As variantes leituras acerca das quais permanece alguma dúvida entre os críticos
textuais do NT, não afetam nenhuma questão essencial do fato histórico ou da fé e
práticas cristãs.”

É importante considerar que na prática, não devemos nos esquecer que as dúvidas são
suscitadas no campo acadêmico, e as divergências devem permanecer nele.

CRÍTICA HISTÓRICA

Neste campo os pressupostos de partida são liberais, por isso também é conhecida como
LIBERALISMO. No campo histórico, ou ALTA CRITICA, como é também conhecido,
o foco de estudos são a autoria de um livro, a data de sua composição, as circunstâncias
históricas que cercam sua composição, a autenticidade de seu conteúdo e sua unidade
literária..

EXEGESE

Quando focamos a Exegese levamos em conta que o passo seguinte aos anteriores é
aplicar os princípios da hermenêutica para chegar-se a um entendimento correto do
texto. O prefixo. Ex: “fora de”, “para fora”, refere-se á ideia de que o interprete está
tentando derivar seu entendimento do Texto, em vez de ler seu significado no “para
dentro” texto- eisegese. Temos assim uma definição de Hermenêutica Contemporânea,
contrária da praticada na Igreja Primitiva.

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4. TEOLOGIA BÍBLICA E TEOLOGIA SISTEMATICA

Teologia Bíblica é o estudo da Revelação divina no Antigo e Novo Testamentos. Ela


procura saber como A revelação contribuiu para o conhecimento e tenta mostrar como o
conhecimento teológico se desenvolveu através dos tempos do AT e NT.

A Teologia Sistemática por sua vez, organiza os dados bíblicos de uma maneira lógica
antes que histórica. Como exemplo podemos citar: A Natureza de Deus, Cristologia,
Bibliologia, Eclesiologia, o mistério dos Anjos, etc.. Estas teologias são
complementares.

O Diagrama de Virkler resume a discussão de modo claro e didático:

1-Estudo doCanon---2-CríticaTextual---3-CríticaHistórica---

4-Hermenêutica(Exegese) 4.1Teol.Bíblica e 4.2 Teologia Sistemática

5. A NECESSIDADE E A BASE BÍBLICA DA HERMENÊUTICA.

É fundamental consideramos que o alvo de uma boa interpretação não tão é simples:
chegar ao "sentido claro do texto." E o ingrediente mais importante que a pessoa traz a
essa tarefa é o bom-senso aguçado. Uma boa interpretação dependerá do conhecimento
do verdadeiro sentido do texto. Portanto a interpretação correta, traz alívio à mente bem
como uma sacudida no coração.

Todavia, se o significado claro é aquilo sobre o que a interpretação diz respeito,


pergunta-se: então para que interpretar? Simplesmente não bastaria ler? O significado
simples não vem pela mera leitura? Consideremos que em parte sim. Porém num
sentido mais verdadeiro, semelhante argumento é tanto superficial tanto quanto
irrealista por causa de dois fatores: Não podemos desconsiderar a natureza do leitor e a
natureza da Escritura.

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a- O Leitor Como Intérprete – 1ª Parte

A primeira razão por que precisamos aprender como interpretar é que, quer deseje, quer
não, todo leitor é ao mesmo tempo um intérprete. ou seja a maioria de nós toma por
certo que, enquanto lemos, também entendemos o que lemos. Tendemos, também, a
pensar que nosso entendimento é a mesma coisa que a intenção do Espírito Santo ou do
autor humano. Apesar disso, invariavelmente levamos para o texto tudo quanto somos,
com toda nossa experiência, cultura e entendimento prévio de palavras e ideias. Às
vezes, aquilo que levamos para o texto, sem o fazer deliberadamente, nos desencaminha
ou nos leva a atribuir ao texto ideias que lhe são estranhas.

Desta maneira, quando uma pessoa em nossa cultura ouve a palavra "cruz", séculos de
arte e simbolismo cristãos levam a maioria das pessoas a pensar automaticamente numa
cruz romana (T) embora haja pouca probabilidade de que aquele era o formato da Cruz
de Jesus, que provavelmente tinha a forma de um "T". A maioria dos protestantes, e dos
católicos também, quando lê textos acerca da igreja em adoração, automaticamente
forma um quadro de pessoas sentadas numa construção com bancos, muito semelhante
às deles. Quando Paulo diz: “Nada disponhais para a carne, no tocante às suas
concupiscências” (Rm 13.14), as pessoas nas culturas de idiomas europeus tendem a
pensar que "a carne" significa “o corpo" e, portanto, que Paulo está falando nos
"apetites físicos." Mas a palavra "carne," conforme Paulo a emprega, raras vezes se
refere ao corpo — e neste texto quase certamente não tem esse sentido — mas, sim, a
uma enfermidade espiritual, uma doença de existência espiritual às vezes chamada "a
natureza pecaminosa." O leitor, portanto, sem o fazer deliberadamente, está
interpretando o que lê, e, infelizmente, por demais frequentemente interpreta
incorretamente.

Isto nos leva a notar ainda mais arte o leitor de uma Bíblia em idioma latino já está
envolvido na interpretação. A tradução, pois, é em si mesma uma forma (necessária) de
interpretação. Sua Bíblia, seja qual for a tradução que você empregar, que para você é o
ponto de partida, é, na realidade, o resultado final de muito trabalho erudito. Os
tradutores são regularmente conclamados a fazer escolhas quanto aos significados, e as
escolhas deles irão afetar como você entende.

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Os bons tradutores, portanto, levam em consideração as diferenças entre nossos
idiomas. Esta, porém, não é uma tarefa fácil. Em Romanos 13.14, por exemplo,
devemos traduzir "carne" porque esta é a palavra que Paulo empregou, e depois deixar o
intérprete contar-nos que "carne" aqui não significa "corpo"? Ou devemos "ajudar" o
leitor e traduzir "natureza pecaminosa" porque é isto que Paulo realmente quer dizer?
Retomaremos este assunto com maiores detalhes no capítulo seguinte. Por enquanto,
basta indicar que o próprio fato da tradução já envolveu a pessoa na tarefa da
interpretação.

b. O Leitor Como Intérprete – 2ª Parte

A necessidade de interpretar também é achada por meio de notar aquilo que acontece
em nosso redor o tempo todo. Uma simples olhada para a igreja contemporânea, por
exemplo, torna abundantemente claro que nem todos os "significados claros" são
igualmente claros para todos. É de interesse mais do que passageiro que a maioria
daqueles na igreja de hoje que argumentam que as mulheres devem guardar silêncio na
igreja, com base em 1 Coríntios 14.34-35, negam, ao mesmo tempo, a validez do falar
em línguas e da profecia, o próprio contexto em que a passagem do "silêncio" ocorre. E
aqueles que afirmam que as mulheres, e não somente os homens, devem orar e
profetizar, com base em 1 Coríntios 11.2-16, frequentemente negam que devem fazê-lo
com a cabeça coberta. Para alguns, a Bíblia "ensina claramente" o batismo dos crentes
mediante a imersão; outros acreditam que podem defender o batismo de crianças por
meio da Bíblia. Tanto a "segurança eterna" quanto a possibilidade de "perder a
salvação" são pregadas na igreja, mas nunca pela mesma pessoa! As duas posições, no
entanto, são afirmados como sendo o significado claro dos textos bíblicos. Até mesmo
os dois autores deste livro têm certos desacordos entre si quanto ao significado "claro"
de certos textos. Mesmo assim, todos nós estamos lendo a mesma Bíblia e todos
estamos procurando ser obedientes àquilo que o texto "claramente" significa.

Além destas diferenças reconhecíveis entre "crentes bíblicos," há, também, todos os
tipos de coisas estranhas em andamento. Usualmente podemos reconhecer as seitas, por
exemplo, porque têm uma autoridade além da Bíblia. Mas nem todas elas a têm; em
todos os casos, porém, torcem a verdade pelo meio que selecionam textos da própria
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Bíblia. Toda heresia ou prática que se possa imaginar, desde o arianismo (a negação da
divindade de Cristo), das Testemunhas de Jeová e de "O Caminho", até o batismo em
prol dos mortos entre os mórmons, até o manipular de serpentes entre as seitas
apalacianas, alega ser "apoiada" por algum texto.

Até mesmo entre pessoas mais teologicamente ortodoxas, no entanto, muitas ideias
estranhas conseguem ganhar aceitação em vários círculos. Por exemplo, uma das modas
atuais entre os protestantes norte-americanos, especialmente os carismáticos, é o assim-
chamado Evangelho da riqueza e da saúde. As "boas novas" são que a vontade de Deus
para você é a prosperidade financeira e material! Um dos defensores deste "evangelho"
começa seu livro ao argumentar em prol do "sentido claro" da Escritura e ao alegar que
coloca a Palavra de Deus em posição de absoluta primazia no decurso do seu estudo.
Diz que não conta aquilo que pensamos que ela diz, mas, sim, o que ela realmente diz.
O "significado claro" é o que ele quer. Começamos, porém, a ter nossas dúvidas acerca
de qual é realmente o "significado claro" quando a prosperidade financeira é
argumentada como sendo a vontade de Deus a partir de um texto tal como 3 João 2:
"Amados, acima de tudo faço votos por tua prosperidade e saúde, assim, como é
próspera a tua alma" — texto este que realmente não tem nada a ver com a prosperidade
financeira. Outro exemplo toma o significado claro do jovem rico (Marcos 10.17-22)
como sendo exatamente o oposto daquilo "que realmente diz," e atribui a
"interpretação" ao Espírito Santo. Podemos talvez questionar com razão se o significado
claro realmente está sendo procurado; talvez o significado claro seja simplesmente
aquilo que semelhante escritor quer que o texto signifique a fim de apoiar suas idéias
prediletas.

Dada toda esta diversidade, tanto dentro quanto fora da igreja, e todas as diferenças até
mesmo entre os estudiosos, que alegadamente conhecem "as regras," não é de se
maravilhar que alguns argumentam em prol de nenhuma interpretação, em prol da
simples leitura. Esta, porém, é uma opção falsa, conforme vimos. O antídoto à má
interpretação não é simplesmente nenhuma interpretação, mas, sim, a boa interpretação,
baseada nas diretrizes do bom senso.

Os autores deste livro não sofrem de ilusões de que, ao ler e seguir nossas diretrizes,
todos finalmente concordarão quanto ao "significado claro", nosso significado! O que

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esperamos realizar é aumentar a sensibilidade do leitor a problemas específicos
inerentes em cada gênero, informá-lo por que existem opções diferentes e como fazer
julgamentos de bom-senso, e especialmente ter a capacidade de discernir entre
interpretações boas e as não tão boas — e de saber o que as faz assim.

6. A NATUREZA DA ESCRITURA
(Parte 1 – O Lado Divino)

Uma razão mais significante para a necessidade de interpretação acha-se na natureza da


própria Escritura. Historicamente a igreja tem compreendido a natureza da Escritura de
maneira muito semelhante à sua compreensão da Pessoa de Cristo — a Bíblia é, ao
mesmo tempo, humana e divina. Conforme o Professor George Ladd certa vez
expressou o fato: "A Bíblia é a Palavra de Deus dada nas palavras de (pessoas) na
história." É esta natureza dupla da Bíblia que exige da nossa parte a tarefa da
interpretação.

Porque a Bíblia é a Palavra de Deus, tem relevância eterna; fala para toda a humanidade
em todas as eras e em todas as culturas. Porque é a Palavra de Deus, devemos escutar e
obedecer. Mas porque Deus escolheu falar Sua Palavra através das palavras humanas na
história, todo livro na Bíblia também tem particularidade histórica; cada documento é
condicionado pela linguagem, pela sua época, e pela cultura em que originalmente foi
escrito (e nalguns casos também pela história oral que teve antes de ser escrito). A
interpretação da Bíblia é exigida pela "tensão" que existe entre sua relevância eterna e
sua particularidade histórica.

Há alguns, naturalmente, que acreditam que a Bíblia é meramente um livro humano, e


que contém somente palavras das pessoas na história. Para estas pessoas, a tarefa de
interpretar é limitada à pesquisa histórica. Seu interesse, como no caso de Cícero ou
Milton, é com as ideias religiosas dos judeus, de Jesus, ou da igreja primitiva. A tarefa
para eles, no entanto, é puramente histórica. O que estas palavras significavam para as
pessoas que as escreveram? O que pensavam acerca de Deus? Como se compreendiam a
si mesmos?

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Há, do outro lado, aqueles que pensam na Bíblia somente em termos da sua relevância
eterna. Porque é a Palavra de Deus, tendem a pensar nela como sendo apenas uma
coletânea de proposições a serem cridas e de imperativos a serem obedecidos —
embora, invariavelmente, haja grande medida de selecionamento e escolha a ser feita
entre as proposições e imperativos. Há, por exemplo, cristãos que baseados em
Deuteronômio 22.5 ("A mulher não usará roupa de homem"), argumentam literalmente
que a mulher não deve usar calça comprida nem short. As mesmas pessoas, porém, raras
vezes tomam literalmente os demais imperativos naquela lista, que incluem a construção
de um parapeito no telhado da casa (v. 8), a não plantação de dois tipos de sementes
numa vinha (v. 9), e fazer borlas nos quatro cantos do manto (v. 12).

A Bíblia, no entanto, não é uma série de proposições e imperativos; não é simplesmente


uma coletânea de "Ditados da parte do Presidente Deus," como se Ele olhasse para nós
aqui em baixo, estando Ele no céu, e dissesse: "Ei, vocês aí em baixo, aprendam estas
verdades. Número 1: Não há Deus senão Um só, e Eu o sou. Número 2: Eu sou o
criador de todas as coisas, inclusive a humanidade" — e assim por diante, chegando até
a proposição número 7.777 e ao imperativo número 777.

Estas proposições, naturalmente, são verdadeiras; e acham-se na Bíblia (embora não


nessa forma exata). Realmente, semelhante livro poderia ter tornado muitas coisas mais
fáceis para nós. Mas, felizmente, não foi assim que Deus escolheu falar conosco. Pelo
contrário, escolheu falar Suas verdades eternas dentro das circunstâncias e eventos
específicos da história humana. É isto também que nos dá esperança. Exatamente
porque Deus escolheu falar no contexto da história humana, real, podemos ter certeza
que estas mesmas palavras falarão novamente em nossa própria história "real",
conforme têm feito no decorrer da História da igreja.

7. A NATUREZA DA ESCRITURA
(Parte 2 – O Lado Humano)

O fato de que a Bíblia tem um lado humano é nosso encorajamento; também é o nosso
desafio, e é a razão porque precisamos interpretar. Duas coisas precisam ser notados
quanto a isto.

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1. Ao falar através de pessoas reais, numa variedade de circunstâncias, por um período
de 1500 anos, a Palavra de Deus foi expressada no vocabulário e nos padrões de
pensamento daquelas pessoas, e condicionada pela cultura daqueles tempos e
circunstâncias. Ou seja: a Palavra de Deus para nós foi primeiramente a Sua Palavra a
elas. Se iriam ouvi-la, somente poderia ser através de eventos e linguagem que elas
poderiam ter entendido. Nosso problema é que estamos muito longe delas no tempo, e
às vezes no pensamento. Esta é a razão principal porque precisamos aprender a
interpretar a Bíblia. Se a Palavra de Deus acerca das mulheres usando roupas de
homens, ou das pessoas que devem ter parapeitos ao redor das casas pode falar conosco,
precisamos saber primeiro o que dizia aos seus ouvintes originais — e por que.

Logo, a tarefa de interpretar envolve o estudante/leitor em dois níveis. Primeiramente, é


necessário escutar a Palavra que eles ouviram; devem procurar compreender o que foi
dito a eles lá e então. Em segundo lugar, devemos aprender a ouvir essa mesma Palavra
no aqui e agora. Diremos mais acerca destas duas tarefas, abaixo.

2. Um dos aspectos mais importantes do lado humano da Bíblia é que Deus, para
comunicar Sua Palavra para todas as condições humanas, escolheu fazer uso de quase
todo tipo de comunicações disponível: a história em narrativa, as genealogias, as
crônicas, leis de todos os tipos, poesia de todos os tipos, provérbios, oráculos proféticos,
enigmas, drama, esboços biográficos, parábolas, cartas, sermões e apocalipses.

Para interpretar corretamente o "lá e então" dos textos bíblicos, não somente se deve
saber algumas regras gerais que se aplicam a todas as palavras da Bíblia, como também
se deve aprender as regras especiais que se aplicam a cada uma destas formas literárias
(gêneros). E a maneira de Deus comunicar-nos Sua Palavra no "aqui e agora"
frequentemente diferirá de uma forma para outra. Por exemplo, precisamos saber como
um salmo, uma forma que frequentemente era dirigida a Deus, funciona como a Palavra
de Deus para nós, e como os Salmos diferem das "leis," que frequentemente eram
dirigidas a pessoas em situações culturais que já não existem mais. Como tais "leis" nos
falam, e como diferem das "leis" morais, que sempre são válidas em todas as
circunstâncias? Tais são as perguntas que a natureza dupla da Bíblia nos impõe.

8. Importância / Necessidade
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a) Evita distorções – II Pe3.16 (seitas se originam, geralmente de distorções de textos
sagrados).( texto fora do contexto é pretexto)

b) A Bíblia é a arma do Cristão – desconhecê-la ou não saber usa-la é fatal.

c) Circunstâncias variadas que fizeram a produção da Bíblia – isso requer do


expositor das escrituras, estudos de acordo com os princípios hermenêuticos.

c.1- Escritores diversos: sacerdotes, poetas, profetas, guerreiros, pastores sábios.


Destes, uns fizeram leis, outros narraram histórias, biografias, escreveram cartas;
tudo isso requer respeito no estudo das Escrituras.

c.2- Tempos variados: variadas são as épocas entre os escritores sagrados.

Moisés, por exemplo, viveu 300 anos antes de aparecerem os sábios da Grécia e Ásia
como Pitágoras, Confúcio e outros; já o último escritor bíblico, João, viveu cerca de
1500 anos depois de Moisés.

c.3- Lugares diferentes: os pontos onde foram escritos também variam entre si.

Vão desde os desertos da Judéia, escolas de profetas, palácios da Babilônia, margens do


Rio Quedar aos cárceres e civilização ocidental.

Tais observações tornam ainda mais patente a importante necessidade do conhecimento


de sadia interpretação para o estudo proveitoso da Palavra de Deus.

21
Essencialmente, Hermenêutica serve de codificação para ajudar-nos a entender o
significado de uma comunicação. Pois até chegarmos a uma compreensão espontânea
das Escrituras, há diversos abismos para transpor:

1) Abismo Histórico _ O fato de estarmos largamente separados no tempo


dos escritores e primitivos leitores da Bíblia.

2) Abismo Cultural – Grande diferença cultural separa-nos dos tempos


Bíblicos

3) Abismo Lingüístico _ As línguas em que a Bíblia foi escrita, varia da


nossa tanto em estrutura como em expressões idiomáticas: Hebraico,
aramaico e grego.

4) Abismo Filosófico - É a lacuna das opiniões acerca da vida, das


circunstâncias e da natureza que variam se acordo com a cultura de quem
escreveu e de quem lê.

Se estes abismos não forem saltados sabiamente, a compreensão espontânea e extra das
Escrituras será obstruída. A Hermenêutica é, portanto, a ponte certa para passarmos de
cabeça erguida sobre esses abismos.

O estudo da Hermenêutica torna-se ainda mais importante, especialmente para o


ministro do Evangelho pelos Benefícios que certamente trará:

1) Material sadio para a construção de sua Teologia;

2) Consistência nos sermões, o que é de grande necessidade nos nossos dias;

3) Auxílio para as explicações improvisadas das Escrituras, por ocasião de


interrogações inesperadas;

4) Ajuda a defender a Verdade contra os assaltos dos críticos.

22
As Escrituras, pois, tratando de temas tão variados como céu, terra, tempo, eternidade,
visível e o invisível, material e espiritual, e escrita por pessoas distintas em modo de
vida e tempo, necessitam, para uma reta compreensão, do auxílio e conselho que a
Hermenêutica pode oferecer.

9 - Requisitos Espirituais e Intelectuais Necessários

a) Opinião correta acerca da Inspiração do Texto Sagrado – A opinião que o


estudioso da Bíblia tem sobre a Inspiração é de suma importância para os trabalhos
hermenêuticos:

b) Mente Humilde e Piedosa – hábito de atenção sincera e reverente a tudo que a


Escritura revela. Desejar o Ensino do Espírito Santo à nossa alma.

c) Dependência de Deus Para aprender – Ensinado por Deus é que o homem pode
aprender as Verdades que são reveladas somente aos que as sentem (Ef 4. 18; 1. 17; Jo
7. 17; Tg1. 5).

d) Consciência de que não haverá Nova Revelação – Por mais dócil, obediente e
piedoso que seja o cristão, o Espírito Santo não comunicará qualquer ensinamento que
já não esteja contido na própria Escritura. O estudo da Bíblia ,faz os homens sábios até
ao que está escrito, mas não além disso, (Is 8.20).

e) Novo Nascimento – Este acontecimento torna o homem sensível às coisas


concernentes ao Reino de Deus (I Co. 2. 14; I Jo. 2. 20; II Co. 4. 6).

23
4- Problemas Controversos na Hermenêutica Contemporânea

a) Autenticidade do Significado – É possível obter o verdadeiro significado do texto


bíblico? O relativismo contemporâneo diz que, o sentido de um texto é aquilo que ele
significa pra mim. No entanto, o trabalho do exegeta é determinar, o quanto lhe for
possível, o que Deus queria dizer em determinada passagem.

b) Harmonia entre autoria humana e divina – O ponto de vista ortodoxo diz que os
autores humanos e divinos trabalharam juntos na produção do texto inspirado. Pergunta-
se: “Que significado o autor humano tinha em mente?” Qual o significado pretendido
pelo autor divino? Para resolver, ou, apaziguar esta situação deva - se observar o
seguinte critério: “Quando uma passagem parecer ter um significado mais completo do
que o abrangido pelo autor humano, só deve ser assim interpretado quando Deus, por
meio de revelação posterior, tiver declarado tal significado. Ex: Is. 1. 1 – 3 ; Lc. 4.
17 – 21”.

c)Interpretação de linguagem Bíblica: Literal, Figurativa e Simbólica – Este é um


problema que só o contexto e a sintaxe pode resolver. É preciso entender que, uma
mesma palavra pode ser usada com várias conotações; uma análise do todo nos levara
ao sentido que ela tem naquela situação. Ex: “Se você não vier agora, vou virar uma
leoa”. “A leoa comeu o seu filhote”.No primeiro caso, temos uma figura de linguagem,
enquanto que no segundo, estamos falando, literalmente, de uma leoa. Já pensou se
invertêssemos a ordem dos respectivos sentidos de leoa, na nossa interpretação? Ex:
Disse Jesus: Eu sou a porta.

d) Fator Espiritual – o compromisso espiritual, ou sua ausência, influencia a


capacidade de perceber a verdade espiritual (Rm. 1. 18- 22; Ef. 4. 17- 24). Onde se
encaixa o fator espiritual, se, hermenêuticamente, o significado das Escrituras deve ser
24
encontrado pelo estudo cuidadoso das palavras, da cultura e da história? É só lembrar
que a Bíblia trata de verdades que não ficam apenas no nível do intelecto, necessitam da
iluminação que o Espírito Santo concede, aos que vivem na luz do conhecimento de
Deus.

e) Inerrância da Bíblia – Este é o mais controverso dos assuntos referentes à


hermenêutica: Tem ou não tem erro na Bíblia?

1) Posição de Jesus para com a Bíblia

- Respeitou igualmente, todas as narrativas históricas do Velho


Testamento com fontes de confiança.

- Usou as histórias que os críticos rejeitam como base nos seus discursos:
Mt. 24 37-39 o dilúvio de Noé; Mt 10-15 -Sodoma e Gomorra; Mt. 12.
39- 41 Jonas.

- As Escrituras foi sua arma de defesa e ataque quando tentado por


Satanás. Nem mesmo Satanás contestou o texto Sagrado (Mt. 4. 4-11).

2) Objeções quanto a Inerrância

- Jesus usou as histórias do Antigo Testamento apenas como fontes


ilustrativas e não literais.

- A Inerrância deveria ser reivindicada para os evangelhos mais não para a


Bíblia toda.

- Importante é ter um Cristo que salva, e não apegar-se a uma Escritura


inerrante.

25
Para se trabalhar com interpretação é preciso atentar para alguns critérios:

- Números por vezes, são dados aproximadamente.

- Discursos e citações podem vir parafraseados em vez de reproduzidos


literalmente.

- Os discursos feitos por homens ou Satanás estão registrados com


exatidão,mas não significa que eles estejam corretos: Conversa de
Satanás e Eva; Mentira de Abraão (mentir nunca foi correto, está
registrado como prova de falha humana).

10.A BÍBLIA

A Bíblia é formada por 66 livros. A Bíblia é a mensagem de Deus para o seu povo,
contendo relatos históricos, profecias e orientações para uma vida dedicada e
consagrada. Notamos que desde Moisés ao apóstolo Paulo, Deus escolheu e inspirou
homens para registrar suas palavras a fim de transmiti-las a outras pessoas. É
instrumento para orientação da vontade de Deus para nossas vidas. A Bíblia é uma
revelação especial de Deus. Com certeza se buscamos o livro mais lido no mundo,
encontraremos a Bíblia e não só mais lido como o mais traduzido. Encontraremos nele
acerca da obra da salvação, providência divina para a humanidade, em Cristo Jesus.

A revelação de quem Deus é, a obra que Cristo fez pela humanidade e como devemos
viver para testemunhar sua maravilhosa obra em nós, encontraremos na Bíblia.

ANTIGO TESTAMENTO

O Antigo Testamento escrito originalmente em hebraico e é formado por 39 livros, é


composto de um relato histórico da obra de Deus na terra antes do nascimento de Jesus.
Vários escritores dentre eles: Moisés, Isaías, Daniel e Davi que durante milhares de
anos escreveram o AT, que se divide em 3 partes principais: Livros Históricos, Poéticos

26
e Proféticos.

OS LIVROS HISTÓRICOS

Começando com os 5 livros escritos por Moisés, compondo o Pentateuco. Encontramos


no Pentateuco a história da criação do universo, Adão e Eva no Jardim do Édem, o
grande Dilúvio, o êxodo dos israelitas da escravidão no Egito. O Pentateuco contém
ainda as leis de Deus para seu povo. Deus passou à Moisés (Êxodo 20:1-17) nos Dez
Mandamentos e Moisés deveria ensinar os israelitas a honrarem a Deus em tudo que
fizessem.

Deus prometera a Abrão que faria dele uma grande Nação, e os israelitas se tornaram
essa poderoso nação, depois que tomaram posse da terra Prometida por Deus. Iniciando
com Saul sendo escolhido como primeiro rei de Israel, os livros históricos contam os
feitos do rei Davi, seu filho Salomão e os que os sucederam. Vários reis deram
continuidade assim, como Asa, seguiram as leis de Deus e foram abençoados. Outros,
como Acabe, que foram desobedientes e adoraram ídolos. Por causa disso, Deus disse
que destruiria o reino de Israel, que seria conquistado e escravizado pelos impérios da
Assíria e da Babilônia.

OS LIVROS POÉTICOS

Encontramos ainda no AT 5 livros poéticos escritos brilhantemente pelos reis Davi e


Salomão. Compostos com canções de louvor a Deus, princípios de sabedoria e um
maravilhoso poema de amor entre uma noiva e um noivo. Os Salmos, Provérbios e
Eclesiastes e Cantares da Salomão respectivamente. Neles encontramos maravilhosas
meditações sobre o amor de Deus por nós, seu poder sobre toda a criação e seu desejo
do nosso respeito e temor.

OS LIVROS PROFÉTICOS
27
Logo depois, com dezesseis diferentes autores encontramos os chamados Livros
Proféticos. Profeta Isaías, profeta Jeremias e profeta Daniel, que escreveram livros mais
longos, são conhecidos como os profetas maiores.

Profeta Ageu, profeta Zacarias e profeta Malaquias estão entre os chamados profetas
menores, cujos livros são mais curtos. Registra-se nesses livros de como Deus ficou
desapontado porque Israel o desobedeceu e não cumpriu suas ordens, e ainda desperta
ao povo quanto o amor incondicional de Deus por ele, além de profetizarem a vinda do
Cristo Messias que salvaria Israel para sempre.

O NOVO TESTAMENTO

O Novo Testamento com seus 27 livros, foram escritos em grego e aproximadamente


em 50 anos. Certamente a sua mensagem principal se refere à JESUS, a sua Encarnação,
ministério e a sua obra redentora. Identificamos ainda a igreja Cristã primitiva, mas
também oferece preciosos mandamentos sobre a vida com Deus. Pode ser dividido em 3
partes: Evangelhos, as Epístolas e Profecia.

OS EVANGELHOS

Os Evangelhos Sinóticos: Mateus, Lucas e Marcos, e João são os quatro primeiros


livros do Novo Testamento, que contam a história do nascimento, vida, morte e
ressurreição de Jesus. Encontramos ainda os ensinamentos de Jesus Cristo, orientações
para seus discípulos, como deveriam segui-lo e a responsabilidade de continuar sua obra
quando Ele retornasse ao céu. Em seguida, vem o livro de Atos dos Apóstolos onde
estão registrados os primeiros passos da igreja e a obra dos discípulos de Jesus
cumprindo o que fora predito por Jesus que eles fariam: milagres e pregação do
Evangelho de Deus.

28
AS EPÍSTOLAS

Depois de Atos dos Apóstolos vêm às epístolas ou cartas que Paulo e outros escreveram
para encorajar os primeiros cristãos na sua caminhada com Jesus. As cartas nos
apresentam muitas e ricas orientações sobre os desejos de Deus para a nossa conduta
diária.

O LIVRO PROFÉTICO

Apocalipse é o último livro do Novo Testamento, um livro com a mensagem profética


que apresenta detalhadamente a próxima vinda de Cristo à terra.

A VERDADE E AUTORIDADE DA BÍBLIA

A Bíblia é a "revelação especial" de Deus. Ela nos relembra nossa natureza pecadora e
nossa responsabilidade diária para com Deus e seus mandamentos. Com a sua leitura
aprendemos que Deus é todo-poderoso e tem autoridade ilimitada sobre todas as
pessoas. Quando rejeitamos seus ensinamentos, estamos rejeitando a Deus e negando a
autoridade que Ele tem sobre toda a Criação. Rejeitar a Deus não é fato novo. Os
israelitas vagaram no deserto porque não creram que Deus os protegeria. O Rei Acabe
erigiu ídolos a falsos deuses. Jonas se negou a ir para Nínive apesar da ordem de Deus.
Quando ignoramos as promessas de bênçãos de Deus sobre nós, estamos
deliberadamente desobedecendo a Sua pessoa e seguindo nossos próprios desejos e
vontades. A Bíblia nos alerta da autoridade eterna de Deus sobre todas as pessoas.

Muitas dessas mesmas pessoas que negam a autoridade de Deus também dizem que a
Bíblia não é verdadeira porque homens - propensos a erros - a escreveram. É certo que
se os escritores bíblicos não eram pessoas perfeitas, a Bíblia é clara em afirmar que foi

29
um trabalho inspirado por Deus e, portanto, perfeito. O apóstolo Paulo escreve que toda
Escritura é "inspirada por Deus (II Timóteo 3:16) e Pedro explica que "nunca jamais
qualquer profecia foi dada por vontade humana, entretanto homens falaram da parte de
Deus movidos pelo Espírito Santo" (II Pedro 1:21). Isto inclui o Velho e o Novo
Testamento

OS ORIGINAIS

Grego, hebraico e aramaico foram os idiomas utilizados para escrever os originais das
Escrituras Sagradas. O Antigo Testamento foi escrito em hebraico. Apenas alguns
poucos textos foram escritos em aramaico. O Novo Testamento foi escrito
originalmente em grego, que era a língua mais utilizada na época.

Os originais da Bíblia são a base para a elaboração de uma tradução confiável das
Escrituras. Porém, não existe nenhuma versão original de manuscrito da Bíblia, mas sim
cópias de cópias de cópias. Todos os autógrafos, isto é, os livros originais, como foram
escritos pelos seus autores, se perderam. As edições do Antigo Testamento hebraico e
do Novo Testamento grego se baseiam nas melhores e mais antigas cópias que existem
e que foram encontradas graças às descobertas arqueológicas.

Para a tradução do Antigo Testamento, a Comissão de Tradução da SBB usa a Bíblia


Stuttgartensia, publicada pela Sociedade Bíblica Alemã. Já para o Novo Testamento é
utilizado The Greek New Testament, editado pelas Sociedades Bíblicas Unidas. Essas
são as melhores edições dos textos hebraicos e gregos que existem hoje, disponíveis
para tradutores.

O ANTIGO TESTAMENTO EM HEBRAICO

Muitos séculos antes de Cristo, escribas, sacerdotes, profetas, reis e poetas do povo
hebreu mantiveram registros de sua história e de seu relacionamento com Deus. Estes
registros tinham grande significado e importância em suas vidas e, por isso, foram
copiados muitas e muitas vezes e passados de geração em geração.
30
Com o passar do tempo, esses relatos sagrados foram reunidos em coleções conhecidas
por A Lei, Os Profetas e As Escrituras. Esses três grandes conjuntos de livros, em
especial o terceiro, não foram finalizados antes do Concílio Judaico de Jamnia, que
ocorreu por volta de 95 d.C. A Lei continha os primeiros cinco livros da nossa Bíblia. Já
Os Profetas, incluíam Isaías, Jeremias, Ezequiel, os Doze Profetas Menores, Josué,
Juízes, 1 e 2 Samuel e 1 e 2 Reis. E As Escrituras reuniam o grande livro de poesia, os
Salmos, além de Provérbios, Jó, Ester, Cantares de Salomão, Rute, Lamentações,
Eclesiastes, Daniel, Esdras, Neemias e 1 e 2 Crônicas.

Os livros do Antigo Testamento foram escritos em longos pergaminhos confeccionados


em pele de cabra e copiados cuidadosamente pelos escribas. Geralmente, cada um
desses livros era escrito em um pergaminho separado, embora A Lei freqüentemente
fosse copiada em dois grandes pergaminhos. O texto era escrito em hebraico - da direita
para a esquerda - e, apenas alguns capítulos, em dialeto aramaico.

Hoje se tem conhecimento de que o pergaminho de Isaías é o mais remoto trecho do


Antigo Testamento em hebraico. Estima-se que foi escrito durante o Século II a.C. e se
assemelha muito ao pergaminho utilizado por Jesus na Sinagoga, em Nazaré. Foi
descoberto em 1947, juntamente com outros documentos em uma caverna próxima ao
Mar Morto.

O NOVO TESTAMENTO EM GREGO

Os primeiros manuscritos do Novo Testamento que chegaram até nós são algumas das
cartas do Apóstolo Paulo destinadas a pequenos grupos de pessoas de diversos
povoados que acreditavam no Evangelho por ele pregado.
A formação desses grupos marca o início da igreja cristã. As cartas de Paulo eram
recebidas e preservadas com todo o cuidado. Não tardou para que esses manuscritos
fossem solicitados por outras pessoas. Dessa forma, começaram a ser largamente
copiados e as cartas de Paulo passaram a ter grande circulação.

A necessidade de ensinar novos convertidos e o desejo de relatar o testemunho dos


31
primeiros discípulos em relação à vida e aos ensinamentos de Cristo resultaram na
escrita dos Evangelhos que, na medida em que as igrejas cresciam e se espalhavam,
passaram a ser muito solicitados. Outras cartas, exortações, sermões e manuscritos
cristãos similares também começaram a circular.

O mais antigo fragmento do Novo Testamento hoje conhecido é um pequeno pedaço de


papiro escrito no início do Século II d.C. Nele estão contidas algumas palavras de João
18.31-33, além de outras referentes aos versículos 37 e 38. Nos últimos cem anos
descobriu-se uma quantidade considerável de papiros contendo o Novo Testamento e o
texto em grego do Antigo Testamento.

OUTROS MANUSCRITOS

Além dos livros que compõem o nosso atual Novo Testamento, havia outros que
circularam nos primeiros séculos da era cristã, como as Cartas de Clemente, o
Evangelho de Pedro, o Pastor de Hermas, e o Didache (ou Ensinamento dos Doze
Apóstolos). Durante muitos anos, embora os evangelhos e as cartas de Paulo fossem
aceitos de forma geral, não foi feita nenhuma tentativa de determinar quais dos muitos
manuscritos eram realmente autorizados. Entretanto, gradualmente, o julgamento das
igrejas, orientado pelo Espírito de Deus, reuniu a coleção das Escrituras que constituíam
um relato mais fiel sobre a vida e ensinamentos de Jesus. No Século IV d.C. foi
estabelecido entre os concílios das igrejas um acordo comum e o Novo Testamento foi
constituído.

Os dois manuscritos mais antigos da Bíblia em grego podem ter sido escritos naquela
ocasião - o grande Codex Sinaiticus e o Codex Vaticanus. Estes dois inestimáveis
manuscritos contêm quase a totalidade da Bíblia em grego. Ao todo temos
aproximadamente vinte manuscritos do Novo Testamento escritos nos primeiros cinco
séculos.

Quando Teodósio proclamou e impôs o cristianismo como única religião oficial no


Império Romano no final do Século IV, surgiu uma demanda nova e mais ampla por
boas cópias de livros do Novo Testamento. É possível que o grande historiador Eusébio
32
de Cesaréia (263 - 340) tenha conseguido demonstrar ao imperador o quanto os livros
dos cristãos já estavam danificados e usados, porque o imperador encomendou 50
cópias para as igrejas de Constantinopla. Provavelmente, esta tenha sido a primeira vez
que o Antigo e o Novo Testamentos foram apresentados em um único volume, agora
denominado Bíblia.

11. HISTÓRIA DAS TRADUÇÕES

A Bíblia - o livro mais lido, traduzido e distribuído do mundo -, desde as suas origens,
foi considerada sagrada e de grande importância. E, como tal, deveria ser conhecida e
compreendida por toda a humanidade. A necessidade de difundir seus ensinamentos
através dos tempos e entre os mais variados povos, resultou em inúmeras traduções para
os mais variados idiomas e dialetos. Hoje é possível encontrar a Bíblia, completa ou em
porções, em mais de 2.000 línguas diferentes.

A PRIMEIRA TRADUÇÃO

Estima-se que a primeira tradução foi elaborada entre 200 a 300 anos antes de Cristo.
Como os judeus que viviam no Egito não compreendiam a língua hebraica, o Antigo
Testamento foi traduzido para o grego. Porém, não eram apenas os judeus que viviam
no estrangeiro que tinham dificuldade de ler o original em hebraico: com o cativeiro da
Babilônia, os judeus da Palestina também já não falavam mais o hebraico.
Denominada Septuaginta (ou Tradução dos Setenta), esta primeira tradução foi
realizada por 70 sábios e contém sete livros que não fazem parte da coleção hebraica;
pois não estavam incluídos quando o cânon (ou lista oficial) do Antigo Testamento foi
estabelecido por exegetas israelitas no final do Século I d.C. A igreja primitiva
geralmente incluía tais livros em sua Bíblia. Eles são chamados apócrifos ou
deuterocanônicos e encontram-se presentes nas Bíblias de algumas igrejas.

Esta tradução do Antigo Testamento foi utilizada em sinagogas de todas as regiões do


Mediterrâneo e representou um instrumento fundamental nos esforços empreendidos
pelos primeiros discípulos de Jesus na propagação dos ensinamentos de Deus.

33
OUTRAS TRADUÇÕES

Outras traduções começaram a ser realizadas por cristãos novos nas línguas copta
(Egito), etíope (Etiópia), siríaca (norte da Palestina) e em latim - a mais importante de
todas as línguas pela sua ampla utilização no Ocidente.

Por haver tantas versões parciais e insatisfatórias em latim, no ano 382 d.C, o bispo de
Roma nomeou o grande exegeta Jerônimo para fazer uma tradução oficial das
Escrituras.

Com o objetivo de realizar uma tradução de qualidade e fiel aos originais, Jerônimo foi
à Palestina, onde viveu durante 20 anos. Estudou hebraico com rabinos famosos e
examinou todos os manuscritos que conseguiu localizar. Sua tradução tornou-se
conhecida como "Vulgata", ou seja, escrita na língua de pessoas comuns ("vulgus").
Embora não tenha sido imediatamente aceita, tornou-se o texto oficial do cristianismo
ocidental. Neste formato, a Bíblia difundiu-se por todas as regiões do Mediterrâneo,
alcançando até o Norte da Europa.

Na Europa, os cristãos entraram em conflito com os invasores godos e hunos, que


destruíram uma grande parte da civilização romana. Em mosteiros, nos quais alguns
homens se refugiaram da turbulência causada por guerras constantes, o texto bíblico foi
preservado por muitos séculos, especialmente a Bíblia em latim na versão de Jerônimo.

Não se sabe quando e como a Bíblia chegou até as Ilhas Britânicas. Missionários
levaram o evangelho para Irlanda, Escócia e Inglaterra, e não há dúvida de que havia
cristãos nos exércitos romanos que lá estiveram no segundo e terceiro séculos.
Provavelmente a tradução mais antiga na língua do povo desta região é a do Venerável
Bede. Relata-se que, no momento de sua morte, em 735, ele estava ditando uma
tradução do Evangelho de João; entretanto, nenhuma de suas traduções chegou até nós.
Aos poucos as traduções de passagens e de livros inteiros foram surgindo.

12. AS PRIMEIRAS ESCRITURAS IMPRESSAS

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Na Alemanha, em meados do Século 15, um ourives chamado Johannes Gutemberg
desenvolveu a arte de fundir tipos metálicos móveis. O primeiro livro de grande porte
produzido por sua prensa foi a Bíblia em latim. Cópias impressas decoradas a mão
passaram a competir com os mais belos manuscritos. Esta nova arte foi utilizada para
imprimir Bíblias em seis línguas antes de 1500 - alemão, italiano, francês, tcheco,
holandês e catalão; e em outras seis línguas até meados do século 16 - espanhol,
dinamarquês, inglês, sueco, húngaro, islandês, polonês e finlandês.
Finalmente as Escrituras realmente podiam ser lidas na língua destes povos. Mas essas
traduções ainda estavam vinculadas ao texto em latim. No início do século 16,
manuscritos de textos em grego e hebraico, preservados nas igrejas orientais,
começaram a chegar à Europa ocidental. Havia pessoas eruditas que podiam auxiliar os
sacerdotes ocidentais a ler e apreciar tais manuscritos.

Uma pessoa de grande destaque durante este novo período de estudo e aprendizado foi
Erasmo de Roterdã. Ele passou alguns anos atuando como professor na Universidade de
Cambridge, Inglaterra. Em 1516, sua edição do Novo Testamento em grego foi
publicada com seu próprio paralelo da tradução em latim. Assim, pela primeira vez
estudiosos da Europa ocidental puderam ter acesso ao Novo Testamento na língua
original, embora, infelizmente, os manuscritos fornecidos a Erasmo fossem de origem
relativamente recente e, portanto, não eram completamente confiáveis.

13. DESCOBERTAS ARQUEOLÓGICAS

Várias foram as descobertas arqueológicas que proporcionaram o melhor entendimento


das Escrituras Sagradas. Os manuscritos mais antigos que existem de trechos do Antigo
Testamento datam de 850 d.C. Existem, porém, partes menores bem mais antigas como
o Papiro Nash do segundo século da era cristã. Mas sem dúvida a maior descoberta
ocorreu em 1947, quando um pastor beduíno, que buscava uma cabra perdida de seu
rebanho, encontrou por acaso os Manuscritos do Mar Morto, na região de Jericó.

Durante nove anos vários documentos foram encontrados nas cavernas de Qumrân, no
Mar Morto, constituindo-se nos mais antigos fragmentos da Bíblia hebraica que se têm
notícias. Escondidos ali pela tribo judaica dos essênios no Século I, nos 800
35
pergaminhos, escritos entre 250 a.C. a 100 d.C., aparecem comentários teológicos e
descrições da vida religiosa deste povo, revelando aspectos até então considerados
exclusivos do cristianismo.
Estes documentos tiveram grande impacto na visão da Bíblia, pois fornecem espantosa
confirmação da fidelidade dos textos massoréticos aos originais. O estudo da cerâmica
dos jarros e a datação por carbono 14 estabelecem que os documentos foram produzidos
entre 168 a.C. e 233 d.C. Destaca-se, entre estes documentos, uma cópia quase completa
do livro de Isaías, feita cerca de cem anos antes do nascimento de Cristo. Especialistas
compararam o texto dessa cópia com o texto-padrão do Antigo Testamento hebraico (o
manuscrito chamado Codex Leningradense, de 1008 d.C.) e descobriram que as
diferenças entre ambos eram mínimas.

Outros manuscritos também foram encontrados neste mesmo local, como o do profeta
Isaías, fragmentos de um texto do profeta Samuel, textos de profetas menores, parte do
livro de Levítico e um targum (paráfrase) de Jó.

As descobertas arqueológicas, como a dos manuscritos do Mar Morto e outras mais


recentes, continuam a fornecer novos dados aos tradutores da Bíblia. Elas têm ajudado a
resolver várias questões a respeito de palavras e termos hebraicos e gregos, cujo sentido
não era absolutamente claro. Antes disso, os tradutores se baseavam em manuscritos
mais "novos", ou seja, em cópias produzidas em datas mais distantes da origem dos
textos bíblicos.

Capítulo 2 – História da Interpretação Bíblica

36
Desde o início da igreja desenvolveram-se duas heranças:

(1) uma que sustenta que o significado das Escrituras se encontra apenas em seu sentido
primário, histórico e (2) outra que entende que o significado definitivo das Escrituras
está em seu sentido pleno ou completo. Dessa distinção desenvolveram-se alguns
modelos e combinações de paradigmas para a interpretação da Bíblia na igreja
primitiva.

A IGREJA PRIMITIVA

Os pais da Igreja no século II conheceram o pensamento dos apóstolos. Provando a


unidade das Escrituras e a essência da sua mensagem, estudiosos como Ireneu (c. 140-
202 d.C.) e Tertuliano (c. 155-225 d.C.) desenvolveram estruturas teológicas. Que
serviram como diretrizes de fé na Igreja Primitiva e que chegaram até os nossos dias.

Conservando a ênfase cristológica do primeiro século, a regra de fé esboçava as crenças


teológicas que encontravam seu centro no Senhor encarnado. A interpretação bíblica
alcançou novos níveis com o surgimento da escola de Alexandria no século III, com o
37
desenvolvimento da interpretação alegórica.

Quando a igreja entrou no século V, desenvolveu-se uma abordagem eclética e


multifacetada de interpretação, que às vezes destacava o literal e histórico, e às vezes, o
alegórico, mas sempre o teológico. Agostinho (354-430 d.C.) e Jerônimo (c. 341-420
d.C.) definiram os rumos desse período.

A IDADE MÉDIA E A REFORMA

Da época de Agostinho, a igreja, seguindo a liderança de João Cassiano (que morreu em


cerca de 433), abraçou a teoria do sentido quádruplo das Escrituras:

a) O sentido literal era o que nutria as virtudes da fé, esperança e amor.


b) O sentido alegórico indicava à igreja e à sua fé, àquilo em que ela devia crer.
c) O sentido moral ou tropológico apresentava aos indivíduos e ao que eles deviam
fazer, correspondendo ao amor.
d) O sentido anagógico ou relativo indicava a expectativa da igreja, correspondendo à
esperança.
Martinho Lutero: pai da Reforma Protestante na Alemanha, o grande reformador,
iniciou empregando o método alegórico, ele mesmo afirmou tê-lo abandonado depois.

Erasmo (1466-1536), mais que Lutero, quem redescobriu a primazia do sentido literal.

João Calvino (1509-1564), o intérprete mais coerente da Reforma, desenvolveu a


ênfase no método histórico-gramatical a partir da Bíblia, como base para o
desenvolvimento da mensagem espiritual.

A ERA ATUAL

A “Nova Hermenêutica” desenvolveu-se da abordagem existencial. Eles consideravam a


interpretação como a criação de um “evento lingüístico” em que a linguagem autêntica
da Bíblia confronta leitores contemporâneos, desafiando-os à decisão e à fé.

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Além da hermenêutica existencial, entre os interesses recentes estão as abordagens
lingüística, literária, estruturalista e sociológica. Essas abordagens tendem a destacar o
contexto histórico de um texto e a vida em seu ambiente original.
A hermenêutica canônica deve estar atenta para não reduzir as ênfases distintas dentro
do cânon em favor de harmonizações superficiais.

HISTÓRIA DAS VERSÕES DA BÍBLIA EM INGLÊS


Todas as traduções em inglês foram motivadas por necessidades práticas.

As versões anglo-saxônicas

As primeiras Bíblias em inglês não eram inglesas de maneira alguma, e a rigor nem
eram traduções. As verdadeiras traduções anglo-saxônicas começaram com a versão de
Salmos feita por Aldhelm em cerca de 700 d.C.

Na Idade Média

A Bíblia em inglês fez poucos avanços durante os primeiros anos dos normandos, após
1066. O reformador John Wycliffe, destacando a função das Escrituras, teve a visão de
traduzir toda a Bíblia para uso mais amplo.

Na Reforma

Tyndale. A Bíblia de Wycliffe foi um passo importante, mas uma oposição feroz, o
trabalho pesado, o alto custo de produção e as rápidas mudanças lingüísticas reduziram
seu impacto. William Tyndale foi o pioneiro, o incentivador e buscou patrocínio oficial
publicar a edição aperfeiçoada de 1534.

The Great Bible (A Grande Bíblia). Coverdale, protegido pelo arcebispo Cranmer, fez
então uma tradução rápida de toda a Bíblia a partir de fontes secundárias (1535); para
tanto obteve autorização real.

As Bíblias de Genebra, do Bispo e de Rheims. Um Antigo Testamento revisado


39
completou a Bíblia de Genebra em 1560. A versão incluía os apócrifos, mas negava
especificamente sua autoridade canônica.

Authorized Version (AV, KJV). John Reynolds produziu uma versão da Bíblia revisada.
Essa versão passou a ser chamada King James Version (KJV, Versão do Rei Tiago) ou
Authorized Version (AV, Versão Autorizada).

NO PERÍODO MODERNO

No período pós-Reforma. Trabalhos complementares na Bíblia em inglês tomaram três


rumos diferentes: paráfrase, pesquisa acadêmica e modernização estilística. As
paráfrases na realidade ten¬tam interpretar o texto de maneira popular para o leitor.

No século XIX. No século XIX, estudos bíblicos avançados e a utilização cada vez
maior logo geraram uma demanda de revisões que refletissem as conclusões acadêmicas
e o desenvolvimento lingüístico.

A revisão americana obteve mais sucesso. Essa versão não só divergiu da RV em


detalhes, como alcançou maior qualidade literária que conquistou o apreço de muitos
leitores.

NO SÉCULO XX

O século XIX concentrou-se principalmente no campo acadêmico, e o XX mostrou


interesse especial na modernização.

O final do século XX gerou novas tentativas de versões populares.


Nenhuma versão é perfeita, e é preciso realizar novos trabalhos quando surgem novos
dados e a língua muda. A Bíblia não é um livro comum. É a Palavra escrita de Deus e
carrega o testemunho autorizado da Palavra encarnada.

HISTÓRIA DAS VERSÕES DA BÍBLIA EM PORTUGUÊS


40
O início das traduções da Bíblia para o português remonta à Idade Média. O rei D. Diniz
(1279-1325) é considerado o precursor dessa tão nobre tarefa.

Foi o protestante português João Ferreira de Almeida, nascido em 1628, próximo a


Lisboa, quem marcou a história como o primeiro tradutor a trabalhar a partir das línguas
originais.

No início do século XX, em 1917, foi publicada no Brasil uma tradução bastante literal
e erudita que teve a colaboração de Rui Barbosa. Ficou conhecida como a Tradução
Brasileira e não é mais publicada atualmente.

No cenário evangélico, merece destaque a Bíblia na Linguagem de Hoje (BLH,


Sociedade Bíblica do Brasil — 1988), feita intencionalmente em linguagem popular,
sob uma filosofia de tradução mais flexível, mas baseada em exegese erudita e
respeitada.

Mais recentemente foi lançada a Nova Versão Internacional (NVI), publicada em março
de 2001 (Novo Testamento em 1994); trata-se de versão fiel ao sentido do original e em
linguagem contemporânea.

AS DIFERENÇAS NOS MANUSCRITOS DA BÍBLIA

Antes da invenção da imprensa por volta de 1450, todos os livros eram escritos e
copiados à mão. Uma obra escrita à mão é chamada manuscrito. As diferenças entre as
cópias dos livros do Antigo ou do Novo Testamento são chamadas leituras variantes.

Não é de admirar que haja diferenças nos manuscritos antigos. O processo laborioso de
cópia à mão levava inevitavelmente a erros acidentais. Além dos erros acidentais,
parece que alguns escribas desviavam-se deliberadamente do texto que estavam
copiando, com a intenção de corrigir erros anteriores.

A quantidade de variações nos manuscritos hebraicos do Antigo Testamento é


41
relativamente pequena. A maior parte dos manuscritos, porém, é medieval — afastada
dos originais em mais de mil anos. Exceções notáveis são os manuscritos de trechos
relativamente pequenos do Antigo Testamento encontrados em Qumran e escritos por
volta do início da era cristã, ou seja, alguns dos Manuscritos do Mar Morto.

Por causa do grande número de leituras variantes nos manuscritos bíblicos antigos, não
é “simples” traduzir do hebraico ou grego para alguma língua moderna. Além de
manuscritos hebraicos e gregos, os estudiosos também empregam as versões antigas
(traduções) na tentativa de restaurar o texto original.

Um tipo de texto é um grupo de manuscritos, versões e citações antigos em grego que


têm muito em comum. Em geral, o tipo considerado mais confiável é o alexandrino.
Outro tipo reconhecido pela maioria dos estudiosos, mas nem todos, é o ocidental. Seus
membros não têm tanto em comum entre si como os do tipo alexandrino e bizantino,
mas remontam a meados do século II.

Retirado do livro:
Manual Bíblico Vida Nova - Excelente Leitura

Qualificações do
livro sagrado

1. É a auto revelação de Deus (II Tm 3:16; II Pe 1:20-21). As Escrituras emanam de


Deus; são uma inspiração divina, fato que acarreta a sua confiabilidade histórica. Deus
ama sua Palavra e está moralmente comprometido a falar através dela!

2. A Bíblia é um livro igualmente humano e divino. Os cristãos não procuram ocultar


sua natureza humana. Sabemos que ela foi escrita por homens e que não desceu do Céu
numa bandeja de ouro. Todavia, também cremos que os homens que a escreveram
estavam sob a inspiração de Deus, conduzidos pelo Espírito Santo. A Palavra de Deus
nos é dada nas palavras desses autores humanos e por meio delas. Se o Espírito Santo
supervisionou a entrega e o registro da revelação, Ele, sendo Deus onipresente,
onisciente e onipotente, garantiu que isto seria feito sem erros — a Bíblia é inerrante.
42
3. Sua preservação é um milagre.

4. A Bíblia é tanto histórica quanto contemporânea. É um livro arraigado nas culturas,


nas línguas e nas tradições da Antiguidade. Mesmo assim é também um livro poderoso
para tocar a vida dos leitores de hoje (Mt 24:35).

5. É completo (Ap 22:18-19).

6. A Bíblia é singular em sua universalidade cósmica (reflete a glória de Deus sobre


todo o universo) e em sua universalidade social (dirige-se a todos os membros da
sociedade humana, a povos de todas as raças). É singular no impacto histórico, quanto à
iniciativa de Deus, ao poder de Deus e à vitória de Deus na história: é o único livro que
descreve uma história mundial com início e conclusão definidos no ato divino de
revelação. A história é a estrada que vai do primeiro jardim do Éden à gloriosa cidade
chamada Nova Jerusalém. É singular na comunicação: compreendida pela fé e
compreendida pela iluminação. E nos confronta com a vontade de Deus para nossa vida.
Temos de decidir favoravelmente ou contra a mensagem que recebemos.

7. Sua preeminência na literatura, em línguas e dialetos (Is 56:7; At 2:8; Ap 7:9).

8. A Bíblia é tanto um livro simples quanto complexo. As crianças podem desde cedo
começar a estudá-la e a amá-la, e milhões de crianças o fazem. Mas alguns dos mais
capacitados estudiosos em todo o mundo gastam a vida inteira estudando a Bíblia e
mesmo assim confessam ter somente um conhecimento superficial desse livro
maravilhoso. A Bíblia é o livro mais estudado em todo o mundo, assim como também o
mais publicado, e quase certamente o livro mais apreciado do mundo.

9. É uno em coesão de pensamentos (Is 7:14; Mq 5:2; Mt 1:23; 2:6).

10. Sua adaptabilidade alcança a todos (Lc 4:17-18; At 4:13; 8:27-28).

11. A mensagem singular da Bíblia e seu poder transformador. Sua eficácia, efeitos
reais e eternos (At 17:11-12; II Rs 22:13; 23:4-25).

12. O cumprimento das profecias. A Bíblia também demonstra sua origem divina pela
precisão com que suas profecias são cumpridas.

43
13. Juiz supremo. A partir do instante em que aceitamos a autoridade da Bíblia, somos
chamados pela força da Palavra a nos submeter à autoridade de Deus. Se Ele, o Criador,
de fato se revelou aos homens através de palavras, tal revelação tem a força de lei para
Suas criaturas. Como soberano do universo, Deus tem o direito de exigir plena
obediência às Suas ordens e fazer valer Sua autoridade através de justo julgamento.
Deus, sendo onisciente e eterno, faz da Sua Palavra autoridade para todas as áreas da
vida humana, sejam elas espirituais, morais, intelectuais ou físicas.

Quando um homem nasce de novo, o Espírito de Deus implanta nele novo princípio de
vida, que é chamado um novo coração, uma nova natureza, uma nova criação. O homem
torna-se “participante da natureza divina”, e dali em diante tem dentro de si a vida de
Deus — “Porei as minhas leis no seu entendimento, e em seus corações as escreverei”
(Hb 10:16) — é o que Deus opera pela regeneração. E com as leis escritas no coração, o
crente tem o desejo de obedecer à vontade de Deus e recebe também o poder de fazê-lo.

A Bíblia é um livro de pesquisa ímpar e indispensável para o cristão e para a igreja. É


luz para o nosso caminho (Sl 119:105). Ler suas palavras em voz alta é como saborear o
mel (Sl 119:103). É uma arma na luta por uma fé mais robusta (Ef 6:17). A vida do
cristão é moldada pela Bíblia, e ela é lida, ensinada, pregada, cantada, crida e amada na
igreja. A Bíblia concede aos cristãos uma visão de mundo. Fornece-lhes um conjunto de
valores morais. Propicia-lhes experiências com Deus. Transmite-lhes o sentido da vida.
Todo cristão pode afirmar como o salmista: “Quanto amo a tua lei! É a minha
meditação, todo o dia” (Sl 119:97).

Que retrato a Bíblia traça de si mesma?

É necessário considerar sobre as metáforas que a Escritura utiliza de si mesma para que
se crie um compromisso mais forte com o estudo da mensagem que Deus inspirou e os
autores bíblicos escreveram. Estas figuras literárias parecem as mais apropriadas para
descrever a Palavra em sua vitalidade e poder. Grandes lições são colhidas quando se
permite que Deus use essas metáforas para convencer seus servos da importância do
estudo e da exposição bíblica.

44
Espelho. A Bíblia é como um espelho no sentido de refletir com precisão nossa
aparência espiritual (ICo13:12; Tg 1:23, 25).

Espada. A Bíblia é como uma espada no sentido de poder ser utilizada como arma de
defesa e de ataque contra o inimigo (Hb 4:12; Ef 6:12, 17).

Luz e Lâmpada. A Bíblia é como luz no sentido de nos capacitar a enxergar na


escuridão da vida, manter-nos no caminho certo e evitar os perigos. A frase “Lâmpada
para os meus pés é a tua palavra” (Sl 119:105) deve ser entendida como o ganho da
perspectiva de Deus nas decisões que uma pessoa tome.

Água. A Bíblia é como água no sentido de saciar nossa sede e nos purificar as
impurezas espirituais (Jo 15:3; 13:10; IJo 1:9; Ef 5:25-27).

Alimento. A Bíblia é como alimento no sentido de satisfazer nossa fome espiritual e


fazer-nos crescer espiritualmente (leite, IPe 2:2; semelhante ao mel, Sl 119:103; carne,
Hb 5:12).

Semente (IPe 1:23-25; Tg 1:18). A palavra de Deus tem vitalidade quando ela é
aplicada pelo Espírito divino.

Martelo e Fogo. O “martelo que esmiúça a penha” (Jr 23:29) sugere que eventos,
completamente inesperados, ocorram quando Deus decide comandar transformações
pela sua Palavra. A “palha”, isto é, mensagens sem qualquer respaldo na revelação
divina, será queimada.

Arma (IICo 10:3-5). As armas “poderosas em Deus” referem-se à verdade revelada,


escrita e canonizada, à clara e inabalável Palavra de Deus explicada e sabiamente
aplicada, a única arma segura para explodir os “sofismas” e “fortalezas” men-tais,
desvios doutrinários que dão brechas para o usurpador.

Chicote ou açoite. IITm 3:16-17.

Poder. Rm 1:16; Is 55:11

Hóspede – Dono. Cl 3:16; Ef 5:18; Jo 5:38-39.

45
UNIDADE II – ANÁLISES

Capítulo 3 – Análise Histórico-Cultural e Contextual

• ANÁLISE HISTÓRICO-CULTURAL E CONTEXTUAL: Saber considerar o


ambiente histórico-cultural do autor, a fim de entender suas alusões, referências
e propósitos. Saber, também, relacionar uma passagem com o escrito completo
do autor, conhecendo melhor seu pensamento geral e melhorando a
compreensão da passagem.

Análise histórico-cultural que considera o ambiente histórico-cultural do autor, a fim de


entender suas alusões, referências e propósito. A análise contextual considera a relação
de uma passagem com o corpo todo do escrito de um autor, para melhores resultados de
compreensão provenientes de um conhecimento do pensamento geral.

CONTEXTO

O que quer dizer contexto? O contexto se refere ao que vem antes e ao que vem depois
de algo. Todas as principais seitas são formadas a partir da violação do princípio do
contexto: textos são arrancados do seu contexto e apresentados de maneira que o
significado original seja totalmente distorcido.

Há vários tipos de contexto. Cada um expressa um ponto de vista diferente sobre a


passagem que se está considerando.

Contexto literário – O contexto literário de qualquer versículo é o parágrafo do qual


faz parte, a seção da qual o parágrafo é parte, e o livro do qual a seção é parte. E devido
à unidade das Escrituras, o contexto definitivo de qualquer livro é a Bíblia toda.

46
Contexto histórico – Quando o fato está acontecendo? Onde na história a passagem se
encaixa? O que está acontecendo no mundo na mesma época? Quais são as influências
sociais, políticas e tecnológicas sobre o autor e sobre aqueles para quem escreve?

Contexto cultural – A cultura tem poderosa influência sobre todas as formas de


comunicação, e as culturas nos tempos bíblicos tiveram efeito na criação da Bíblia.
Assim, quanto mais você souber sobre culturas antigas, mais visão terá do texto.

Contexto geográfico – A investigação do contexto geográfico (geografia das terras


bíblicas) responde perguntas como: Como era o terreno? Que características
topográficas faziam a região especial? Como era o clima? Qual a distância entre essa
cidade e os lugares mencionados no texto? Quais eram as rotas de transporte para o
povo? Qual o tamanho da cidade? Como era a planta da cidade? Por que tipo de coisa o
local era conhecido?

Contexto teológico – A questão aqui é: O que este autor sabia sobre Deus? Qual o
relacionamento de seus leitores com Deus? Como o povo adorava a Deus na época? A
que partes das Escrituras o escritor e sua audiência têm acesso? Que outras religiões e
visões de mundo competem com influência?

O problema central aqui é: Onde a passagem se encaixa na expansão das Escrituras?


Você sabe, a Bíblia não caiu do céu como obra completa. Cerca de 1.600 anos foram
necessários

para formá-la. Durante esse tempo, Deus revelou progressivamente Sua mensagem aos
autores. Por isso, é importante localizar a passagem no fluxo das Escrituras.

Exemplo: Se você estiver estudando Noé, em Gênesis, estará antes dos Dez
Mandamentos, antes do Sermão da Montanha e antes de João 3:16. Na verdade, Noé
não tinha nenhum fragmento de texto bíblico para consultar. O que isso lhe diz quando
lê que “Noé achou graça diante do Senhor” (Gn 6:8).

A importância do contexto

1. Ajuda a não torcer a Palavra de Deus.

47
2. O sentido correto da Bíblia vem do contexto (cuidado com as associações de certos
textos com outros que nunca foram escritos para serem ligados com eles; as associações
só devem ser feitas quando o texto indica e justifica claramente a ligação, sempre em
harmonia com os contextos).

3. O sentido correto das palavras vem do contexto.

4. O contexto é a garantia da verdade na Escritura.

5. Passagens difíceis são aquelas em que o contexto original é desconhecido para nós ou
difícil de precisar.

A. Berkeley Mickelsen destaca a importância do contexto: “O contexto é importante


porque os pensamentos geralmente se expressam em uma série de ideias relacionadas.
Às vezes a pessoa faz uma pausa ou se afasta radicalmente do fluxo de pensamentos que
porventura se desenvolveu. Às vezes os pensamentos são reunidos de forma solta, em
um tema geral. Entretanto, sejam as ideias unidas assim, por lógica, sejam as
proposições principais desenvolvidas pela repetição, o significado de qualquer elemento
particular é quase sempre controlado por aquilo que o precede e o segue.”

ANTECEDENTES HISTÓRICO-CULTURAIS

Há interação entre a cultura e a história e não podemos considerar uma sem levar em
conta a outra – a história e a cultura se sobrepõem. Alguns dos fatores histórico-
culturais de um povo são: nacionalidade, política /governo, religião, idioma, literatura,
costumes, vida sócio-econô-mica, objetivos, aspirações, ambiente físico, localização
geográfica e relacionamento com as nações vizinhas (circunstâncias gerais nas quais

48
viveram e os diversos problemas que enfrentaram).

Circunstâncias histórico-culturais deixaram sua marca nos diferentes livros da Bíblia.

James Braga considera: “A Bíblia é pródiga em aspectos de importância cultural.


Estamos, porém, tão distantes das pessoas dos tempos bíblicos que é difícil para a atual
geração compreender as maneiras ou mesmo os padrões de pensamento e crença
daquela época. Entretanto, se quisermos entender corretamente a Bíblia, é necessário
aprendermos o máximo sobre a cultura dos diversos grupos raciais, religiosos e sociais
registrados na Bíblia. É impossível conhecer todas as peculiaridades, crenças, tradições
e outros aspectos das civilizações antigas. Entretanto, quanto mais soubermos acerca
dessas civilizações, tanto maior será a nossa capacidade de compreender as Escrituras,
pois estas foram originalmente escritas para eles e sobre eles.”

A interpretação de uma passagem deve harmonizar-se com a situação histórica e


cultural do livro. Você deve observar a passagem contra o fundo certo, com a luz certa
acesa sobre ela, para captar seu significado. Prestar atenção no contexto cultural e
histórico – nos fatores que levaram à escrita da passagem, as influências que tiveram
sobre o texto e o que acontece como resultado da mensagem. Certifique-se em verificar
o pano de fundo, recrie a cultura e o texto passará a ter vida hoje.

Walter C. Kaiser Jr. considera que algumas referências à cultura são neutras e
descritivas. Outros fatos culturais são veículos da revelação divina e a verdade prescrita
neles não pode ser reduzida arbitrariamente a “um mero relato de uma situação hoje
extinta”. O estudante não pode se atrapalhar com a natureza histórica ou culturalmente
condicionada de algumas exigências éticas ou ensinos gerais da Bíblia. Em outras
palavras, a história e a cultura submetem-se às Escrituras. Pelo fato de ser a Palavra de
nosso Criador soberano, a Bíblia interpreta a história e a cultura, não vice-versa.

O estudante da Bíblia deve procurar familiarizar-se com a história bíblica do Velho


Testamento e do Novo, conhecendo a cronologia dos principais eventos. Todo
conhecimento histórico sobre o período transforma-se em ferramenta de interpretação.
Só podemos entender o livro de Juízes se antes lermos Josué, que, por sua vez, tem suas
raízes no Pentateuco. Muitos dos oráculos dos profetas só podem ser entendidos se os
lermos à luz dos acontecimentos históricos descritos nos livros de I e II Reis e I e II
Crônicas, quando se conhece as condições políticas, militares, religiosas e sociais do
49
povo de Israel e dos povos vizinhos. É em Atos que lemos sobre as
condições da época em que as epístolas de Paulo foram escritas, ou
sobre o que aconteceu na fundação das igrejas. O estudante que
fizer uso inteligente de dados culturais e históricos enriquecerá sua
compreensão da passagem.

Exemplos:

1. Importância dos antecedentes históricos e culturais no estudo de Rute:

a) Não podemos entender o livro de Rute sem compreender o direito e a


responsabilidade que um parente próximo tinha de resgatar a terra do parente morto
e proporcionar um filho à viúva.

b) No primeiro verso encontram-se as palavras: “Nos dias em que julgavam os juízes,


houve fome na terra.” Essa informação nos remete a Juízes, livro anterior ao de Rute.
Deste modo, para obtermos uma visão exata da época em que viveram os personagens
do livro de Rute, necessitamos conhecer as condições da terra de Israel descritas em
Juízes. Ao lermos esse livro, especialmente os capítulos 17 a 21, concluímos que o país
era um caos, pois cada pessoa fazia “o que achava mais reto”. Entretanto, no meio de
tais lamentáveis circunstâncias, vemos no livro de Rute a mão de Deus a mover-se
silenciosa e discretamente a fim de cumprir o seu propósito em duas pessoas piedosas:
Boaz e Rute. Assim, o contexto histórico de Rute revela Deus no controle de tudo o que
acontece aos seus, e que, apesar das condições adversas, Ele é o todo-poderoso para
executar os seus desígnios naqueles que lhe pertencem.

2. Não é suficiente apenas ter consciência dos fatos históricos e dos costumes de
determinada cultura; o intérprete da Bíblia deve ter também consciência do impacto que
a mensagem teria sobre o público original. Uma plateia atual não se surpreende, por
exemplo, diante da ideia de um “bom samaritano”. Nos dias de Jesus, porém, havia
uma animosidade tão grande por parte dos judeus para com os samaritanos, que tal
alusão seria tão inconcebível quanto uma referência hoje a um terrorista bom. (O
problema histórico dos samaritanos e dos judeus já vinha desde a época de Esdras.)
50
3. Saber que César enviou um destacamento especial de 300 soldados com suas
famílias, para “romanizar” a cidade de Filipos, é algo que dá vida ao estudo da Epístola
aos Filipenses. Você pode imaginar as ordens dadas àquelas tropas de ocupação:
“Insistam para que o povo de Filipos fale a mesma língua de Roma. Exijam que adorem
o imperador. Matem-nos se eles não proclamarem religiosamente: ‘César é senhor’.
Àquele minúsculo grupo de crentes em Filipos, Paulo escreve: “Vivei, acima de tudo,
por modo digno do evangelho de Cristo” (1:27). O verbo “vivei” tem origem na palavra
grega politeuomai e significa agir como um cidadão. Aqueles poucos cristãos eram
membros de um reino maior que o de Roma. Eles tinham um Senhor maior do que
César. Sim, eles deviam ser bons cidadãos dos dois reinos, mas Cristo receberia
prioridade. Mesmo que isto significasse prisão ou morte, eles colocariam Jesus Cristo
acima do imperador. Nos dias de hoje, os cristãos verdadeiros constituem uma minoria.
Constantemente eles são tentados a assumir compromisso com o secularismo. Quando
insistem em falar sobre moralidade e ética cristã nos negócios ou na política, quase
sempre são ridicularizados e marginalizados.

Como encontrar os fatos e dados históricos e culturais rela-tivos ao texto em estudo? Há


dois recursos:

a. Recurso de natureza interior, relacionado com o espírito do estudante: trata-se de uma


disposição disciplinada de ler – o espírito de preguiça milita contra a leitura. Mas o bom
estudante bíblico irá cultivar o bom hábito de leituras amplas.

b. Suprimento mínimo de livros técnicos sobre a Bíblia (ver mais detalhes a seguir).

CONSULTA A FONTES SECUNDÁRIAS

51
No estudo do cenário histórico-cultural retiramos informações não somente da própria
Bíblia, mas também de fontes seculares dignas de confiança. Recursos secundários
podem trazer luz ao texto.

As escavações de arqueólogos e as pesquisas de muitos eruditos têm contribuído para


um maior conhecimento das antigas civilizações do Egito, da Grécia, de Roma e do
Oriente Próximo. Descobertas recentes de cavernas e túmulos em terras bíblicas, bem
como a interpretação de documentos cuneiformes e hieroglíficos de grandes bibliotecas
antigas aumentam constantemente o acervo de informações sobre a história e a cultura
desses povos. Grande parte dessas informações tem sido reunida em manuais bíblicos,
dicionários e enciclopédias, bem como em obras arqueológicas e em introduções ao
Antigo e ao Novo Testamento. Essas fontes contêm o resultado do trabalho de
arqueólogos, linguistas, historiadores, geógrafos e muitos outros. Com tanto material à
disposição, é possível a qualquer estudante da Bíblia obter conhecimento razoável dos
fundos histórico-culturais.

Você pode avançar consultando fontes secundárias, ou seja, usando a contribuição de


estudiosos da Bíblia que trilharam o mesmo caminho antes de nós e nos deixaram
ajudas valiosas.

“Não é assim com livros e o Livro?” pergunta Russell Shedd. E explica: “Deus revelou
Sua perfeita vontade por meio de culturas pecaminosas e costumes falhos humanos,
relatadas na Bíblia inspirada e perfeita. Livros cristãos, mesmo sendo falhos, como são
seus autores, podem refletir em parte a glória da revelação escriturísticas (cf. I Co
13:12). Paulo não limitou seu pedido a Timóteo à Bíblia. Quis os “livros” e os
“pergaminhos” (II Tm 4:13). Por meio deles também receberia ajuda e inspiração na
prisão úmida, fria e solitária de Roma”.1

Mas uma palavra de cautela: quando puser essas ferramentas para funcionar, cuidado
para não confiar demais nas informações secundárias. O uso de recursos extra bíblicos
nunca deve ser um substituto do estudo pessoal da Bíblia, mas um estímulo a ele. A
ordem é sempre a mesma: primeiro a Palavra de Deus; depois as fontes secundárias. Ir

1
Russell P. Shedd. A Bíblia e os livros. Abec, 1993, p. 18.
52
para as fontes secundárias sem nem mesmo consultar o texto deixa pouco espaço para a
Palavra de Deus. É por isso que a primeira coisa que você precisa, antes de obter
qualquer recurso mencionado no quadro abaixo, é de uma boa Bíblia de estudo. Comece
por ela. Depois, enquanto for prosseguindo, poderá acrescentar mais livros à sua
biblioteca.

Há algumas ferramentas especialmente úteis que servirão para o início da construção de


uma valiosa caixa de ferramentas para você usar no trabalho de interpretação.

TIPO DE DESCRIÇÃO USE-O PARA

RECURSO SUPERAR...

Atlas Coleção de mapas que mostram lugares mencionados no Barreiras


texto, e talvez descrição de sua história e significado. geográficas

Contém mapas e outras informações para quem quer


investigar o contexto geográfico bíblico.

Dicionários Explicam origem, significado e uso de palavras e termos Barreiras


de palavras chaves no texto. linguísticas
bíblicas

Manuais bíblicos Apresentam informação útil sobre assuntos do texto. Barreiras culturais

Um manual bíblico é um tipo de enciclopédia; menciona livro


por livro de toda a Bíblia, provendo todos os tipos de material
de pano de fundo.

Comentários Apresentam o estudo de um erudito bíblico. Barreiras


bíblicos linguísticas,
Um comentário oferece a você opiniões de um erudito que
culturais e
passou sua vida inteira investigando o texto bíblico. As
literárias
opiniões do comentário também podem ajudar você a avaliar
seu próprio estudo pessoal. Entretanto, você não pode ficar
dependente dos comentários, ao invés de se familiarizar com

53
o texto bíblico.

Textos Traduções com o texto grego ou hebraico posicionado entre Barreiras


interlineares as linhas para comparação. linguísticas

Concordâncias Depois da Bíblia de estudo, esta é a ferramenta mais essencial É útil para o
(Chave bíblica) ao estudo bíblico. Uma concordância é como um índice da estudo de palavras
Bíblia. Ela alista todas as palavras do texto alfabeticamente, e para localizar
com as referências de onde aparecem, e algumas palavras ao uma passagem
redor delas para prover um pouco do contexto. quando não se
lembra da
referência.

Recursos Sugestões: História de Israel no Antigo Testamento, de Eugene H. Merrill


adicionais (CPAD); Introdução ao Antigo Testamento, de William Lasor (Edições Vida
Nova);

Introdução ao Novo Testamento, de D. A. Carson (Edições Vida Nova)

A Vida Diária nos Tempos de Jesus, de Henri Daniel-Rops (Edições Vida Nova).

O manuseio honesto do texto no contexto é a maior ajuda que alguém pode dar a si
mesmo, no sentido de compreender a mensagem da Bíblia. Quando estudar um
versículo, parágrafo, seção, ou até um livro inteiro – consulte sempre os vizinhos
daquele versículo, parágrafo, seção ou livro. Quando se perder, suba numa árvore
contextual e ganhe visão.

Determinar o Contexto Geral Histórico-Cultural

54
Específico e a Finalidade de um Livro. O segundo passo, mais específico, é determinar
a finalidade (ou finalidades) explícita de um livro. Algumas perguntas secundárias são
guias úteis:

1. Quem foi o autor? Qual era seu ambiente e sua experiência espirituais?

2. Para quem estava ele escrevendo (e.g., crentes, incrédulos, apóstatas, crentes que
corriam o perigo de tornarem-se apóstatas)?

3. Qual foi a finalidade (intenção) do autor ao escrever este livro especial?

Geralmente é possível descobrir o autor e seus destinatários por via dos dados internos
(textuais) ou dos externos (históricos). Em alguns casos a prova parece razoavelmente
conclusiva; em outros, o melhor que se pode conseguir é uma hipótese culta.

Depois que o estudo nos revelar o contexto específico histórico-cultural em que o livro
foi escrito, devemos determinar a finalidade dele. São três as formas fundamentais de
fazê-los:

Em primeiro lugar, observar a declaração explicita do autor ou a repetição de certas


frases. Por exemplo, Lucas 1:1-4 e Atos 1:1 dizem-nos que o propósito de Lucas era
apresentar uma narração coordenada do começo da era cristã. João diz-nos (20:31) que
tinha em mira apresentar um registro do ministério de Jesus para que os homens
cressem. A primeira carta de Pedro é uma exortação a que os crentes permanecessem
firmes em meio à perseguição (5:12).

Em segundo lugar, observar a parte parenética (hortativa) de seu escrito. Uma vez que
as exortações fluem do propósito, elas propiciam importante pista das intenções do
autor. A carta aos Hebreus, por exemplo, está entremeada de exortações e advertências;
por isso pouca dúvida existe de que o objetivo do autor era persuadir os crentes judeus
que passavam por perseguições (10:32-35) a não voltar ao judaísmo, mas manter-se
fieis à sua nova profissão de fé (10:19-23; 12:1-

Em terceiro lugar, observar os pontos omitidos ou os problemas enfocados.

Por exemplo, o escritor de 1 e 2 Crônicas não nos dá uma história completa de todos os
acontecimentos nacionais durante o reinado de Salomão e da divisão do reino.

55
Ele seleciona fatos que mostram que Israel só pode resistir enquanto permanecer fiel aos
mandamentos de Deus e à sua aliança.

Desenvolver uma Compreensão do Contexto Imediato .Algumas perguntas secundárias


ajudam a entender um texto em seu contexto imediato.

Primeira, quais os principais blocos de material e de que forma se encaixam no todo?


Alternativamente, qual é o esboço do livro?

Segunda, como passagem que estamos considerando contribui para a

corrente de argumentação do autor? Alternativamente, qual a ligação entre a 4

passagem que estamos estudando e os blocos de material que vêm imediatamente

antes e depois?

Terceira, qual era a perspectiva do autor?

Como exemplo da importância deste princípio, consideremos a questão do

dilúvio: foi universal ou local? Por via do contexto é difícil determinar se a linguagem

dos capítulos 6-9 do Gênesis pretendia ser entendida numenologicamente (da

perspectiva divina) ou fenomenologicamente (da perspectiva humana). Se as frases

“Pareceu toda carne” e “cobriram todos os altos montes” são entendidas

numenologicamente, subentende-se um dilúvio universal. Se essas mesmas frases

são entendidas fenomenologicamente, elas poderiam significar “pereceram todos os

animais que pude observar”, e “todos os montes que pude observar ficaram

cobertos”.

56
Do ponto de vista hermenêutico, o princípio importante é que os escritores

bíblicos às vezes tencionaram escrever de uma perspectiva numenológica e às

vezes de uma fenomenológica. A interpretação que dermos ao que ele pretendiam

dizer erra se deixamos de estabelecer esta distinção.

Quarta, está à passagem declarando verdade descritiva ou prescritiva? As

pessoas descritivas relatam o que foi dito ou o que aconteceu em determinado

tempo. As passagens prescritivas da Escritura são tidas como articuladoras de

princípios normativos. As epístolas são antes de tudo prescritivas. A análise

contextual é a mais válida forma de diferençar entre passagens descritivas e

prescritivas.

Quinta, o que constitui o núcleo de ensino da passagem e o que representa

apenas detalhe incidental? Os pelagianos do começo do quinto século fizeram algo

semelhante com a história do filho pródigo. Na sua maneira de argumentar, uma vez

que o filho pródigo se arrependeu e voltou para o pai sem o auxilio de mediador,

segue-se que não necessitamos de mediador.

O debate em torno de 1 Coríntios 3:16: “Sois santuário de Deus” ou “sois o templo de


Deus”, dependendo da versão usada. O ponto central de Paulo nesse versículo é a
santidade do corpo de Cristo, a igreja. Concentrando-se num detalhe incidental (a
estrutura do templo do Antigo Testamento) esse educador concluiu que uma vez que o
templo tinha três partes (um pátio exterior, um pátio interior e um santo dos santos), e
uma vez que os cristãos são chamados de santuário, conclui-se, portanto, que o homem
possui três partes – corpo, alma e espírito!

Finalmente, a quem se destina a passagem? É bem conhecida a historieta humorística do


jovem que procurava freneticamente a vontade de Deus para a sua vida e resolveu
57
seguir a orientação bíblica, fosse ela qual fosse; a primeira passagem sobre a qual seus
olhos caíram foi Mateus 27:5 (“Então Judas... retirou-se e foi enforcar-se”); a segunda
passagem foi Lucas 10:37 (“Vai, e procede tudo de igual modo”); e a terceira, João
13:27 (“O que pretendes fazer, faze-o depressa”).

Resumo

Os passos seguintes estão envolvidos na análise histórico-cultural e contextual:

1. Determinar o ambiente geral histórico e cultural do escritor e de sua audiência.

a) Determinar as circunstâncias históricas gerais.

b) Estar atento às circunstâncias e normas culturais que adicionam significado a


determinadas ações.

c) Discernir o nível de compromisso espiritual da audiência.

2. Determinar o propósito (ou propósitos) do autor ao escrever um livro.

a) Observar as declarações explícitas ou frases repetidas.

b) Observar as seções parenéticas.

c) Observar os problemas omitidos ou os enfocados.

3. Entender de que forma a passagem se enquadra no contexto imediato.

a) Localizar os principais blocos de material no livro e mostrar como se encaixam num


todo coerente.

b) Mostrar como a passagem se ajusta à corrente de argumento do autor.

c) Determinar a perspectiva que o autor tenciona comunicar – numenológica (a


realidade das coisas) ou fenomenológica (a aparência das coisas).

d) Distinguir entre verdade descritiva e verdade prescritiva. Distinguir entre detalhes


incidentais e ponto central do ensino de uma passagem.

e) Localizar a pessoa ou categoria de pessoas às quais a passagem é dirigida

58
Capítulo 4 – Análise Léxico-Sintática

Definição e Pressuposições

Análise léxico-sintática é o estudo do significado de palavras tomadas isoladamente


(lexicologia) e o modo como essas palavras se combinam (sintaxe), a fim de determinar
com maior precisão o significa que o autor pretendia lhes dar.

A análise léxico-sintática fundamenta-se na premissa de que embora as palavras possam


assumir uma variedade de significados em contextos diferentes, elas têm apenas um
significado intencional em qualquer contexto dado. Assim, se eu dissesse “Ele é ou está
verde”, essas palavras poderiam significar que (1) ele é inexperiente, ou (2) ele está
doente, ou (3) ele está assustado. Conquanto minhas palavras pudessem significar
qualquer uma dessas três coisas, o contexto geralmente indicará qual dessas ideias eu
desejo comunicar. A análise léxico-sintática ajuda o intérprete a determinar a variedade
de significados de uma palavra

ou de um grupo de palavras, e então declarar que o significado X é mais provável do

que o significado Y ou Z de ser a intenção do autor nessa passagem.

Procedimento de sete passos:

1. Apontar a forma literária geral. A forma literária que um autor usa (prosa, poesia,
etc.) influencia o modo como ele pretende que suas palavras sejam entendidas.

2. Investigar o desenvolvimento do tema do autor e mostrar como a passagem em


consideração se encaixa no contexto. Este passo, já iniciado como parte da análise

59
contextual, dá uma perspectiva necessária para determinar o significado das palavras e
da sintaxe.

3. Apontar as divisões naturais do texto. As principais unidades conceptuais e as


declarações transicionais revelam o processo de pensamento do autor e, portanto,
tornam mais claro o significado que ele quis dar.

4. Identificar os conectivos dentro dos parágrafos e sentenças. Os conectivos


(conjunções, preposições, pronomes relativos) mostram a relação que existe entre dois
ou mais pensamentos.

5. Determinar o significado isolado das palavras. Qualquer palavra que sobrevive por
muito tempo numa língua começa a assumir uma variedade de significados. Por isso é
necessário procurar os diversos possíveis significados de palavras antigas, e então
determinar qual desses possíveis significados é o que o autor tencionava transmitir num
contexto específico.

6. Analisar a sintaxe. A relação das palavras entre si expressa-se por meio de suas
formas e disposição gramaticais.

7. Colocar os resultados de sua análise léxico-sintática em palavras que não tenham


conteúdo técnico, fáceis de ser entendidas, que transmitam claramente o significado
que o autor tinha em mente.

60
Forma Literária Geral

Para fins de análise é suficiente, a esta altura, falar de três formas literárias gerais –
prosa, poesia e literatura apocalíptica. Os escritos apocalípticos contêm palavras
empregadas com sentido simbólico. A prosa e a poesia empregam palavras com
sentidos literal e figurativo; na prosa predomina o uso literal; na poesia, usa-se com
maior frequência a linguagem figurativa.

Desenvolvimento do Tema

Este passo, já iniciado como parte da análise contextual, é importante por dois motivos.
Primeiro, o contexto é a melhor fonte de dados para a determinação de qual dos diversos
possíveis significados de uma palavra é o que o autor tinha em mente.

Segundo, a não ser que uma passagem seja colocada na perspectiva de seu contexto, há
sempre o perigo de ela se envolver tanto nas tecnicidades de uma análise gramatical
que o intérprete perca a visão da ideia (ou ideias) básica que as palavras realmente
comunicam.

Divisões Naturais do Texto

As divisões em versículos e capítulos que hoje constituem parte de nosso modo de


pensar não existiam nas primitivas Escrituras. Essas divisões foram acrescentadas
muitos séculos depois que a Bíblia foi escrita, como auxílio na localização de
passagens. Embora as divisões em versículos atendam bem a esta finalidade, a divisão
do texto versículo por versículo tem a nítida desvantagem de dividir os pensamentos de
modo antinatural.

Conectivos Dentro de Parágrafos e Sentenças

Os conectivos, incluindo conjunções, preposições, pronomes relativos, etc., muitas


vezes auxiliam no acompanhar a progressão do pensamento.

À guisa de ilustração, examinemos Gálatas 5:1 que diz: “Permanecei, pois, firmes e não
vos submetais de novo a jugo de escravidão”. Tomado isoladamente, o versículo
poderia ter qualquer de diversos significados: poderia referir-se à escravidão humana, à
escravidão política, à escravidão ao pecado, e assim por diante. O “pois” indica,
contudo, que este versículo é a aplicação de um ponto que Paulo apresentou no capítulo
61
anterior. Uma leitura dos argumentos de Paulo (Gálatas 3:1 – 4:30) e de sua conclusão
(4:31) esclarece o significado do outrora ambíguo 5:1. Paulo está incentivando os
Gálatas a não se escravizar de novo ao

jugo do legalismo (i.e., esforçar-se por ganhar a salvação pelas boas obras).

Significado da Palavra

Em sua maioria, as palavras que sobrevivem por longo tempo numa língua adquirem
muitas denotações (significados específicos) e conotações (implicações
complementares). Ao lado de seus significados específicos, muitas vezes as palavras
têm uma variedade de denotações vulgares, isto é, usos encontradiços na conversação
comum.

As palavras ou frases podem ter denotações vulgares e também técnicas. Por exemplo, a
frase “Há uma onda de coqueluche na cidade” tem um sentido quando empregada como
termo médico, mas o sentido muda por completo quando se diz que “a coqueluche da
cidade é andar com calças ‘jeans’ “ desbotadas”, onde a linguagem é vulgar.

As denotações literais podem, finalmente, conduzir a denotações metafóricas.

Usada literalmente, a palavra verde designa uma cor; empregada com sentido
metafórico, pode estender-se desde a cor de uma laranja que ainda não amadureceu até à
ideia de uma pessoa imatura, ou inexperiente.

Método para Descobrir as Denotações de Palavras Antigas

Há três métodos geralmente adotados para se descobrir a variedade de significados que


uma palavra possa ter:

O primeiro é estudar os modos como ela foi empregada em outra literatura antiga.

O segundo método é estudar os sinônimos, procurando pontos de comparação bem


como de contraste.

62
O terceiro método para a determinação dos significados de uma palavra é a etimologia
– o estudo do significado das raízes históricas da palavra.

Há disponíveis vários tipos de instrumentos léxicos que capacitam o atual estudioso das
Escrituras a averiguar os diversos possíveis significados de palavras antigas. Os mais
importantes tipos de instrumentos léxicos estão descritos a seguir.

Concordâncias. Uma concordância, ou chave bíblica, contém uma lista de todas as


vezes que determinada palavra é usada na Escritura. Para examinar os vários modos em
que determinada palavra hebraica ou grega foi empregada, consulte-se uma
concordância hebraica ou grega, que arrola todas as passagens em que aparece a
palavra.

Léxicos. Léxico é um dicionário de vocábulos hebraico ou gregos. Como um dicionário


da língua portuguesa, ele registra as várias denotações de cada palavra nele encontrada.
Muitos léxicos oferecem uma síntese do uso das palavras, tanto na literatura secular
como na bíblica, citando exemplos específicos. Muitas vezes as palavras hebraica e
gregos estão registradas em ordem alfabética, de modo que é útil conhecer os alfabetos
hebraico e grego a fim de usar esses instrumentos.

Sintaxe

A sintaxe trata do modo como os pensamentos são expressos por meio de formas
gramaticais. Cada língua tem sua própria estrutura, e um dos problemas que tanto
dificultam a aprendizagem de outra língua é que o estudante deve dominar não só as
definições e pronúncias das palavras da nova língua, mas também novos modos de
dispor e demonstrar a relação de uma palavra com outra.

A língua portuguesa é analítica: a ordem das palavras é um guia para o significado. O


hebraico é, também, uma língua analítica. O grego, pelo contrário, é uma língua
sintética: o significado é entendido apenas parcialmente pela ordem das palavras e
muito mais pelas terminações da palavra ou pelas terminações de casos.
63
Bíblias Interlineares. Estas bíblias contêm o texto hebraico ou grego com a tradução
impressa entre as linhas (daí o nome interlinear). Justapondo-se os dois conjuntos de
palavras, elas capacitam o estudante a indicar facilmente a palavra (ou palavras)
hebraica ou grega que ele deseja estudar.

Léxicos. Muitas vezes a palavra que encontramos no texto é uma variação da forma
radical da palavra. Por exemplo, em português poderíamos encontrar várias formas do
verbo Entregar:

entregou

entregado

entregue

entregaremos

Gramáticas hebraicas ou gregas. Se desconhecemos o significado da expressão


“acusativo singular” que descreve a forma de uma palavra, será valioso ter um terceiro
conjunto de auxílios gramaticais. As gramáticas hebraicas e gregas explicam as várias
formas que as palavras podem tomar em suas respectivas línguas, e o significado das
palavras quando aparecem numa dessas formas.

Confirmando o Que Foi Dito

Ponha os resultados de sua análise léxico-sintática em palavra não técnicas, de fácil


compreensão, que comuniquem com clareza o significado que o autor tinha em mente.
Sempre existe o perigo de a análise léxico-sintática envolve-se de tal maneira com os
detalhes técnicos (e.g., os nomes técnicos ou nomes de casos gramaticais, de
Bullinger), que perdemos de vista a finalidade da análise, a saber, comunicar o
significado do autor com a maior clareza possível. Há, também, a tentação de
impressionar os ouvintes com nossa erudição e profundas capacidades exegéticas. As
pessoas precisam ser alimentadas, não impressionadas. O estudo

64
técnico deve ser feito como parte de qualquer exegese, mas é preciso que seja parte da
preparação para a exposição. A maioria dele não precisa aparecer no produto

(exceto no caso de documentos teológicos acadêmicos ou técnicos).

RESUMO

Os sete passos seguintes foram recomendados para a elaboração de uma

análise léxico-sintática:

1. Apontar a forma literária geral.

2. Investigar o desenvolvimento do tema e mostrar como a passagem sob

consideração se enquadra no contexto.

3. Apontar as divisões naturais (parágrafos e sentenças) do texto.

4. Indicar os conectivos dos parágrafos e sentenças e mostrar como auxiliam na


compreensão da progressão do pensamento.

5. Determinar o que significam as palavras tomadas individualmente.

a) Apontar os múltiplos significados que uma palavra possuía no seu tempo e cultura.

b) Determinar o significado único que o autor tinha em mente em dado contexto.

6. Analisar a sintaxe para mostrar de que modo ela contribui para a compreensão de
uma passagem.

7. Colocar os resultados de sua análise em palavras não técnicas, de fácil compreensão,


que comuniquem com clareza o significado que o autor tinha em mente.

65
Capítulo 5 – Análise Teológica

Duas Perguntas Básicas

A pergunta fundamental feita na análise teológica é: “Como esta passagem se

enquadra no padrão total da revelação de Deus?

” De imediato se evidencia que primeiro devemos responder a outra pergunta, a saber:


“O que é o padrão da revelação de Deus?”

Sistemas Teoréticos Representativos

Os teólogos liberais, tipicamente veem a Bíblia como um produto do desenvolvimento


evolutivo da religião de Israel. Quando a consciência religiosa de Israel se tornou mais
sofisticada, aconteceu o mesmo com a sua teologia. Como consequência, os teólogos
liberais veem na Bíblia uma variedade de teologias – escritos que refletem diferentes
níveis de sofisticação teológica, às vezes conflitantes entre si. Em vez de verem a Bíblia
como a verdade divina que Deus revelou ao homem, creem que as Escrituras são
pensamentos do homem acerca de Deus. Visto que os pensamentos dos homens acerca
de Deus. Visto que os pensamentos dos homens mudaram com o correr do tempo,
creem eles que a Bíblia revela diversas ideias e movimentos de desenvolvimento
teológico em vez de uma teologia única, unificada.

TEORIA LUTERANA

Lutero acreditava que para uma adequada compreensão da Bíblia devemos distinguir
com cuidado entre duas verdades bíblicas paralelas e sempre presentes: a Lei e o
Evangelho. Conforme foi mencionado no capítulo 2, a Lei refere-se a Deus em seu ódio
ao pecado, seu juízo, e sua ira. O Evangelho refere-se a Deus em sua graça, seu amor, e
sua salvação.

66
A análise teológica pergunta: “De que modo esta passagem se encaixa no padrão total
da revelação de Deus?” Antes de respondermos a essa pergunta, devemos ter uma
compreensão do padrão da história da revelação.

Várias opiniões são apresentadas – desde as que acentuam grandes descontinuidades


dentro da história bíblica até as que acentuam continuidade quase total. Cinco dessas
teorias foram apontadas e discutidas com relação ao continuo, continuidade e
descontinuidade.

Também foram debatidos quatro conceitos bíblicos principais – graça, lei, salvação e o
ministério do Espírito Santo – termos do problema continuidade descontinuidade, e
esperamos que o leitor gaste algum tempo neste ponto tirando

suas próprias conclusões acerca da natureza da história da salvação. Este processo

forma a base para a análise teológica.

Os passos dessa análise são:

1. Determinar seu próprio ponto de vista da natureza do relacionamento de

Deus com o homem. A coleta de provas, a estruturação das perguntas, e a compreensão


de determinados textos são, sem dúvida alguma, tendenciosos pelas

concepções que o autor possui de uma visão bíblica da história da salvação. A


conclusão deste passo é por demais importante para adotar a de outrem sem que o

próprio leitor considere cuidadosamente e em espírito de oração a evidencia.

2. Descobrir as implicações deste ponto de vista para a passagem que está sendo
estudada. Por exemplo, uma posição sobre a natureza da relação de Deus

com o homem, basicamente descontínua, verá o Antigo Testamento como menos

pertinente aos nossos contemporâneos do que o Novo Testamento.

3. Avaliar a extensão do conhecimento teológico disponível às pessoas daquele tempo.


Que conhecimento prévio haviam elas recebido? (Nos livros que tratam de
hermenêutica, às vezes este conhecimento prévio é mencionado como “analogia da
Escritura”). Bons textos de teologia bíblica podem revelar-se muito úteis a este respeito.
67
4. Determinar o significado que a passagem possuía para seus primitivos destinatários à
luz do conhecimento que tinham.

5. Descobrir o conhecimento complementar acerca deste ponto que hoje temos


disponível em virtude de revelação posterior. (Nos livros de hermenêutica, às vezes este
ponto é mencionado como a “analogia da fé”).

UNIDADE III – MÉTODOS E PRINCÍPIOS

Capítulo 6 – Métodos Literários Especiais

São Métodos Literários Especiais:

Símiles, Metáforas, Provérbios, Parábolas, e Alegorias Símiles é uma comparação


expressa: é típico o emprego das palavras semelhante ou como “O reino dos céus é
semelhante....”). O sujeito e a coisa com a qual ele está sendo comparado são mantidos
separados (isto é, não “o reino dos céus é...”, e, sim, “o reino dos céus é semelhante...”).

Metáforas é uma comparação não expressa: ela não usa as palavras semelhante ou
como. O sujeito e a coisa com a qual ele é comparado estão entrelaçados. Jesus usou
metáforas quando disse: “Eu sou o pão da vida”, e “Vós sois a luz do mundo”.

Podemos entender a parábolas como um símile ampliado. A comparação vem expressa,


e o sujeito e a coisa comparada, explicados mais plenamente, mantêm-se separados. Por
semelhante modo pode-se entender a alegorias como uma metáfora ampliada: a
comparação não vem expressa, e o sujeito e a coisa comparada acham-se entrelaçados.

Damos a seguir exemplos de uma parábola e de uma alegoria para esclarecer esta
distinção:

68
Parábola

(Isaías 5:1-7)

Agora, cantarei ao meu amado,

O cântico do meu amado

A respeito da sua vinha.

O meu amado teve uma vinha

Num outeiro fertilíssimo.

Sachou-a, limpou-a das pedras e a plantou de vides escolhidas;

Edificou no meio dela uma torre, e também abriu um lagar.

Ele esperava que desse uvas boas, mas deu uvas bravas.

Agora, pois, ó moradores de Jerusalém e homens de Judá,

Julgai, vos peço, entre mim e a minha vinha.

Que mais se podia fazer ainda à minha vinha,

que eu lhe não tenha feito?

e como, esperando eu que desse uvas boas

veio a produzir uvas bravas?

Agora, pois, vos farei saber

69
o que pretendo fazer à minha vinha:

Tirarei a sua sebe,

para que a vinha sirva de pasto;

derribarei o seu muro,

para que seja pisada;

torná-la-ei em deserto.

Não será podada, nem sachada,

mas crescerão nela espinheiros e abrolhos;

às nuvens darei ordem

que não derramem chuva sobre ela.

Porque a vinha do Senhor dos Exércitos

é a casa de Israel, e os homens de Judá

são a planta dileta do Senhor;

este desejou que exercessem juízo,

e eis aí quebrantamento da lei;

justiça, e eis aí clamor.16

Alegoria (Salmo 80:8-16)

Trouxeste uma videira do Egito;

Expulsaste fora as nações, e a plantaste.

70
Dispuseste-lhe o terreno,

Ela deitou profundas raízes e encheu a terra.

Com a sombra dela os montes se cobriram,

e com os seus sarmentos os cedros de Deus.

Estendeu ela a sua ramagem até o mar,

e os seus rebentos até ao rio.

Por que lhe derrubaste as cercas,

de sorte que a vindimam todos os

que passam pelo caminho?

o javali da selva a devasta,

e nela se repastam os animais que pululam no campo.

Ó Deus dos Exércitos, volta-te, nós te rogamos,

Olha do céu, e vê e visita esta vinha;

Protege o que a tua mão direita plantou, o sarmento que para ti fortaleceste.

Está queimada pelo fogo, está decepada. Perecem pela repreensão do teu rosto.

71
Na parábola, a história se encontra nos versículos de um a seis e a aplicação no
versículo sete. Na alegoria, a história e sua aplicação se acham entre mescladas e
prosseguem juntas.

Pode-se conceber o provérbio como uma parábola ou uma alegoria comprimida, às


vezes possuindo as características de ambas. Em esquema, apresentamos abaixo a
relação entre esses cinco dispositivos literários: ampliado Símile , Parábola
comprimido, Provérbio ampliada comprimida Metáfora e Alegoria

Resumindo: Nos símiles e nas parábolas as comparações se acham expressas e


separadas, enquanto nas metáforas e nas alegorias não se acham expressas, mas entre
mescladas. Numa parábola há separação consciente da história e sua aplicação, ao
passo que na alegoria há entre mescla das duas. Os provérbios podem ser considerados
ou como parábolas condensadas ou como alegorias condensadas. As seções que vêm
em seguida estudarão a natureza e interpretação de provérbios, parábolas e alegorias em
maior extensão.

Provérbios

Um dos maiores problemas da religião é a falta de interação prática entre nossas


convicções teológicas e nosso comportamento diário. É possível separar a vida religiosa
das decisões práticas do dia-a-dia. Os provérbios podem proporcionar um importante
antídoto, pois demonstram a verdadeira religião em termos específicos práticos e
significativos.

Sabedoria, na Escritura, não é sinônimo de conhecimento. Ela começa com “o temor do


Senhor”. O temor do Senhor não é o medo normal, ou mesmo aquele tipo mais
profundo conhecido como “reverência Luminosa”, mas é basicamente uma postura, uma
atitude do coração que reconhece nosso relacionamento legítimo com o Deus-Criador.
A vida de sabedoria e prudência procede desta postura conveniente, deste
reconhecimento de nosso lugar legítimo diante de Deus. Dentro deste contexto, os
provérbios já não permanecem como motos piedosos para serem pendurados na parede,
mas se tornam meios intensamente práticos, significativos, de inspirar um anda íntimo
com o Senhor.

Parábolas
72
A palavra parábolas provém do grego, paraballo, que significa “lançar ou colocar ao
lado de”. Assim, parábola é algo que se coloca ao lado de outra coisa para efeito de
comparação. A parábola típica utiliza-se de um evento comum da vida natural para
acentuar ou esclarecer uma importante verdade espiritual. Jesus, o Mestre dos mestres,
usou parábolas regularmente enquanto ensinava. A palavra grega “parábola” ocorre
perto de cinquenta vezes nos Evangelhos Sinópticos em conexão com seu ministério,
dando a entender que as parábolas eram um de seus prediletos esquemas de ensino.

é uma história baseada em fatos do cotidiano com o objetivo de ilustrar ou


aclarar uma verdade.

As parábolas de Jesus aprendiam a atenção por falarem de aspectos comuns do


cotidiano: comercio, agriculturas, pecuária religião, casa, etc...

A Compreensão de Tipos e Símbolos

Tipos – semelhança, similaridade ou correspondência profunda com o


antítipo, que é a realização do tipo – o Tabernáculo ( Hb 8. 4-5)

Símbolos – objeto representativo. Tipo e símbolo não são a mesma


coisa. Enquanto o tipo representa um elemento futuro, o símbolo não se
prende a ideia de tempo. Ex: O Tabernáculo no deserto era um tipo de
Cristo. Por outro lado, quando se diz que Cristo é como um leão,
qualquer leão pode servir para retratar determinada característica do
Senhor.

Alguns Princípios Para a Interpretação das Parábolas

73
1. Atentar para o significado natural da história;

2. Identificar o problema, a pergunta ou a situação que originou a parábola;

3. Identificar a principal verdade ilustrada pela parábola;

4. Confirmar o tema principal da parábola por meio de um ensinamento bíblico


explícito;

5. Reparar na reação implícita ou explícita dos ouvintes.

5) Profecias

A profecia deve ser interpretada literalmente, a menos que o contexto ou alguma


referência posterior na Escritura indique outra coisa. Um exemplo de um ponto na
Escritura em que uma referência posterior na Escritura indica que não pode ser tomada
literalmente é a profecia de Malaquias a respeito do precursor de Cristo: “Eis que eu vos
enviarei o profeta Elias, antes que venha o grande e terrível dia do Senhor; ele
converterá o coração dos pais aos filhos, e o coração dos filhos a seus pais; para que eu
não venha e fira a terra com maldição” (Malaquias 4. 5-6)

Diz Malaquias que Deus enviará “o profeta Elias” quando aparecer João Batista como o
precursor de Jesus Cristo, gerou-se muita confusão o que mostra que o povo daquele
tempo esperava que a profecia iria cumpri-se literalmente. Contudo, Jesus disse que essa
profecia deveria ter cumprimento figurado, e não literal . ( Mt 11. 13- 14; 17. 10-13).
Essa ilustração constitui a exceção, e não a regra, na interpretação de profecias. Na
maior parte, as profecias podem e devem ser interpretadas literalmente.

Muitas vezes uma profecia se cumpre parcialmente numa geração com o restante
cumprindo-se noutra época – Joel 2. 28- 32 = At 2. 15- 21 / Is 61. 1-2 = Lc 4. 17- 21.

APLICAÇÃO DA MENSAGEM BÍBLICA


74
Levanta-se a seguinte pergunta: “Quais as implicações desse significado para nós em
época e cultura diferentes?”

Indicamos pelos menos duas as principais categorias de passagens bíblicas às quais a


pergunta acima deve ser endereçada. A primeira é constituída de porções narrativas.
Como podemos tornar essas porções bíblicas úteis para o ensino, para a repreensão, para
a correção, e para a educação na justiça de um modo hermeneuticamente válido?

Segunda, como podemos aplicar os mandamentos normativos da Escritura?

Transferimo-los por atacado para nosso tempo e cultura, sem levar em conta quão
arcaicos ou peculiares nos pudessem parecer? Ou devemos transformá-los? Que
diretrizes adotamos para responder a essas perguntas?

O texto propõe um modelo para traduzir mandamentos bíblicos de uma cultura para
outra.

Diferente da alegorização, que dá a uma história novo significado, atribuindo aos seus
detalhes significação simbólica que o autor não tencionava dar, a dedução de princípios
busca derivar seus ensinos de uma cuidadosa compreensão da própria história. Diferente
da desmitologização, a dedução de princípios reconhece a validade tanto dos detalhes
históricos de uma narrativa como dos princípios que esses detalhes tentam ensinar.

Metodologicamente, o sistema é o mesmo da exegese de qualquer passagem bíblica.


Observam-se cuidadosamente as circunstâncias históricas e os costumes culturais que
iluminam o significado de várias ações e mandamentos. Estuda-se a finalidade do livro
em que a narrativa ocorre, bem como o contexto mais estreito das passagens
imediatamente precedentes e seguintes à seção em exame. Também se examinam o
estado do conhecimento teológico e o compromisso.

Depois de realizado tudo isso, o intérprete está, pois, em posição de entender o


significado da narrativa em seu ambiente de origem. Por fim, com base neste
entendimento e usando um processo de dedução, o intérprete procura articular o
princípio ou princípios exemplificados na história, princípios que continuam a possuir
aplicabilidade ao crente hodierno. Examinaremos duas narrativas para esclarecer este
processo de deduzir princípios.

75
Exemplo Nº. 1: O “Fogo Estranho” de Nadabe e Abiú (Levítico 10:1-11)

A história de Nadabe e Abiú é interessante não só por causa de sua brevidade, mas
também pela severidade e singularidade do juízo que trouxe sobre eles. Ela desperta
curiosidade porque não se vê de imediato o que era o “fogo estranho”, nem por que
trouxe reação tão rápida e poderosa da parte de Deus.

Ações da Narrativa

Arão e seus filhos acabavam de ser consagrados ao sacerdócio (Levítico 8). Depois de
ordenar que o fogo ardesse continuamente sobre o altar (6:13), Deus confirmou a oferta
sacrificial de Arão por si e pelo povo, acendendo o fogo miraculosamente (9:24).

Nadabe e Abiú, os dois filhos mais velhos de Arão, tomaram “fogo estranho” e fizeram
uma oferta de incenso ao Senhor. De imediato o fogo do Senhor os feriu de morte.
Moisés profetizou, e a seguir deu ordens aos parentes de Arão que tirassem do
acampamento os corpos de Nadabe e de Abiú. Arão e seus filhos restantes, que também
eram sacerdotes, receberam ordens para não demonstrar as tradicionais expressões de
luto (desgrenhar os cabelos e rasgar as vestes), embora os parentes tivessem permissão
de fazê-lo.

Então o Senhor deu a Arão três ordens (Levítico 10:8-10): (1) nem ele nem outro
qualquer de seus descendentes sacerdotais deviam tomar bebidas fermentadas antes de
entrar para o exercício de seus deveres sagrados; (2) deviam diferençar entre o santo e o
profano, entre o imundo e o limpo; e (3) deviam ensinar ao povo todos os estatutos do
Senhor. Significado ou Sentido das Ações Análise histórico-cultural Israel acabara de
sair da adoração idólatra, mas continuava rodeado de cultuadores idólatras. Havia um
constante perigo de sincretismo, isto é, de associar o culto ao verdadeiro Deus com as
práticas do culto pagão.

Análise contextual. Este era o dia de investidura de Arão e de seus filhos como
iniciadores do sacerdócio Levítico. Suas ações seriam, se a menor dúvida, consideradas
como precedentes para os que viessem depois. De igual modo, a aceitação ou rejeição
dessas ações por parte de Deus influiria sobre os futuros desenvolvimentos do próprio
sacerdócio e das atividades sacerdotais.

76
Análise léxico-sintática e teológica. Quase todas as religiões antigas, incluindo o
judaísmo, consideravam o fogo como símbolo divino. Explica-se o fogo profano ou
“estranho” que Nadabe e Abiú ofereceram como fogo que Deus não lhes havia
ordenado oferecer (v.1). Uma expressão semelhante encontra-se em Êxodo 30:9, onde o
incenso que não fora preparado segundo as instruções do Senhor é chamado de “incenso
estranho”.

Uma análise mais completa da seqüência de tempo dos capítulos 9 e 10 mostra que
Nadabe e Abiú fizeram a oferta de incenso entre a oferta sacrificial (holocausto) (9:24) e
a oferta de manjares que a devia ter seguido (10:12-20), isto é, numa hora que não a
designada para a oferta de incenso. Keil e Delitzsch dizem que não é improvável que:
Nadabe e Abiú tencionavam associar-se aos gritos do povo como uma oferta de incenso
para o louvor e glória de Deus, e apresentaram a oferta de incenso não só numa hora
imprópria, mas não preparada do fogo do altar, e comentaram tal pecado com esta
adoração de iniciativa própria, que foram mortos pelo fogo que saiu de diante de Jeová.

... O fogo do Deus santo (Êxodo 14:18), que acabara de santificar o serviço de Arão
como agradável a Deus, trouxe destruição a seus filhos mais velhos, porque não haviam
santificado a Jeová em seus corações, mas haviam eles próprios assumido a
responsabilidade de um serviço rebelde.

Esta interpretação é ademais confirmada pela profecia de Deus a Arão, por intermédio
de Moisés, imediatamente depois de o fogo haver consumido a Nadabe e Abiú. “Isto é o
que o Senhor disse: Mostrarei a minha santidade naqueles que se cheguem a mim, e
serei glorificado diante de todo o povo” (v. 3).

Logo depois disto, Deus falou diretamente a Arão, dizendo:

“Vinho nem bebida forte tu e teus filhos não bebereis, quando

entrardes na tenda da congregação, para que não morrais;

estatuto perpétuo será isso entre as vossas gerações; para

fazerdes diferença entre o santo e o profano e entre o imundo

e o limpo” (vv. 9-10)

77
Alguns comentaristas têm inferido desses versículos que Nadabe e Abiú estavam sob a
influência de bebidas embriagantes quando ofereceram o fogo estranho. O texto não
nos permite afirmar tal coisa, com absoluta certeza, embora seja provável que Deus
estivesse dando mandamentos relacionados com a infração que trouxera juízo de morte
sobre Nadabe e Abiú.

A principal lição das três ordens é clara: Deus fora cuidadoso em mostrar o modo pelo
qual os israelitas podiam receber expiação por seus pecados e manter com ele um
relacionamento reto. Deus havia demonstrado claramente a Arão e seus filhos as
diferenças entre santo e profano, limpo e impuro, os quais haviam sido instruídos a
ensinar essas coisas ao povo. Nadabe e Abiú, num gesto de obstinação, haviam adotado
sua própria forma de adoração, obscurecendo a diferença entre o santo (os
mandamentos de Deus), e o profano (os gestos religiosos de iniciativa própria do
homem). Esses gestos, se não fossem prontamente reprovados, podiam facilmente
conduzir à assimilação de todos os tipos de práticas pagãs pessoais no culto a Deus.

A segunda lição reside no fato de que a reconciliação com Deus depende da graça
divina, e não de práticas obstinadas do homem e de sua própria iniciativa. Deus havia
dado os meios de reconciliação e de expiação. Nadabe e Abiú tentaram acrescentar algo
aos meios divinos de reconciliação. Como tal, eles continuam como exemplo a todos os
povos e religiões que colocam suas próprias ações no lugar da graça de Deus como
meio de reconciliação e salvação.

Aplicação

Deus é o iniciador de sua misericórdia e graça na relação divino-humana; cabe-nos a


responsabilidade de aceitar essa graça. Os crentes, especialmente os que se acham em
postos de liderança dentro da comunidade cristã, têm uma responsabilidade oriunda de
Deus de ensinar, com todo o cuidado, que a salvação vem pela graça de Deus, e não por
via de obras do homem, e a diferençar entre o santo e o profano (v. 10). Crer e atuar
como se fôssemos os iniciadores e não os respondentes em nosso relacionamento com
Deus, especialmente se ocupamos postos com probabilidade de servir de modelo para o

78
comportamento de outras pessoas, como no caso de Nadabe e Abiú, é trazer sobre nós
mesmos a desaprovação divina.

Diretrizes para a Dedução de Princípios

1. Essa dedução focaliza os princípios implícitos num relato, aplicáveis através dos
tempos e das culturas. Os detalhes podem variar, mas os princípios permanecem os
mesmos.

2. Ao derivar o significado de uma narrativa como base para deduzir princípios, o


significado deve sempre desenvolver-se a partir de uma cuidadosa análise histórica e
léxica: o significado deve ser aquele que o autor tinha em mente.

3. De uma perspectiva teológica, o significado e os princípios derivados do relato


devem estar em consonância com todos os demais ensinos da Escritura. Um princípio
dedutivo extraído de uma narrativa que contradiz o ensino de outra passagem bíblica
não é válido.

4. Os princípios derivados por este método podem ser normativos ou não normativos.

5. Os textos têm somente um significado, mas podem ter muitas aplicações. A dedução
de princípios é um método de aplicar o significado que o autor tinha em mente, mas as
aplicações desse significado podem referir-se a situações que o autor, num tempo e
cultura diferentes, nunca imaginou.

Alguns Passos Propostos na Tradução de Mandamentos Bíblicos de uma Cultura


e Tempo para Outra Cultura e Tempo

1. Discernir tão precisamente quanto possível o princípio por trás do mandamento


comportamental dado. Por exemplo, os cristãos devem julgar o pecado individual em
sua comunidade local cometido pro crentes, porque se não for corrigido, o mal exercera
efeito sobre toda a comunidade (1 Coríntios 5:1-13, especialmente o v. 6).

2. Discernir se o princípio é permanente ou limitado a uma época (transcultural ou


cultural). Na última seção apresentamos algumas sugestões para se fazer isto. Uma vez
79
que a maior parte dos princípios bíblicos está arraigada na natureza imutável de Deus,
parece deduzir-se que o princípios deve ser considerado transcultural, a menos que haja
evidencia contrária.

3. Se um princípio é transcultural, estude a natureza da aplicação comportamental em


nossa cultura. A aplicação comportamental dada então será apropriada para nossos dias,
ou será ela uma esquisitice anacrônica?

É muito grande o perigo de conformar a mensagem bíblica ao nosso molde cultural. Há


ocasiões em que a expressão de um princípio dado por Deus levará os cristãos a
comportar-se de um modo diferente dos não-cristãos (Romanos 12:2),

mas não desnecessariamente, não por amor à diferença em si. O critério para discernir
se um mandamento comportamental deve aplicar-se à nossa cultura não há de ser se ele
se conforma ou não às práticas culturais modernas, mas se ele expressa ou não,
adequada e precisamente, o princípio intencional de Deus.

4. Se a expressão comportamental de um princípio deve ser mudada, proponha um


equivalente cultural que expresse adequadamente o princípio de origem divina que está
por trás do mandamento primitivo. Por exemplo, J. B. Phillips acha que “Saudai-vos uns
aos outros com cordial aperto de mão” pode ser um bom equivalente cultural para o
Ocidente de “Saudai-vos uns aos outros com ósculo santo”.

Se não houver equivalente cultural, talvez valesse a pena considerar a criação de um


novo comportamento cultural que expresse de modo significativo os princípios
envolvidos. (De um modo semelhante, mas não estritamente análogo, algumas das mais
recentes cerimônias de casamento expressam os mesmos 25 princípios que os mais
tradicionais, porém em novas fórmulas muito criativas e significativas).

5. Se depois de cuidadoso estudo a natureza do princípio bíblico e o mandamento que


o acompanha continuam em dúvida, aplique o preceito bíblico da humildade. Por de
haver ocasiões em que, mesmo depois de cuidadoso estudo de determinado princípio e
de sua expressão comportamental, ainda continuamos em dúvida se devemos
considerá-lo transcultural ou cultural. Se temos de decidir sobre tratar o mandamento de
um modo ou de outro, mas não temos meios conclusivos para tomar a decisão, pode ser
proveitoso o princípio da humildade. Afinal de contas, seria melhor tratar um princípio

80
como transcultural e levar a culpa de ser excessivamente escrupuloso em nosso desejo
de obedecer a Deus? Ou seria melhor tratar um princípio transcultural como sujeito á
cultura e ser culpado de quebrar uma exigência transcendente de Deus? A resposta
deveria ser óbvia. Se este princípio de humildade estiver isolado das demais diretrizes
mencionadas acima, com facilidade ele poderia ser mal interpretado como base para
conservadorismo desnecessário. O princípio só deve ser aplicado depois de havermos
cuidadosamente tentado determinar se ele é transcultural ou cultural, e a despeito de
nossos melhores esforços, o problema ainda continua em dúvida. Esta é uma diretriz de
último recurso e seria destrutiva se usada como primeiro.

Capítulo 7 – Princípios de Interpretação

Walter A. Henrichsen, no livro “Princípios de Interpretação da Bíblia”, relaciona 24


leis ou regras de interpretação, agrupadas em quatro categorias:2

Princípios Gerais de Interpretação – são os que tratam da matéria global da


interpretação. São princípios universais em sua natureza, não se limitando a
considerações específicas, incluídas estas nas outras três seções.

1. Estude partindo do pressuposto de que a Bíblia é a autoridade suprema em questões


de religião(CRISTÂ), fé e doutrina.

2. A Bíblia é a melhor intérprete de si mesma; portanto, compare Escritura com


Escritura.

2
Todos os princípios de Interpretação são vistos com profundidade na disciplina denominada
Hermenêutica Bíblica, que é o estudo do significado da linguagem da Bíblia.
81
3. Dependa da fé salvadora e do Espírito Santo para compreender e interpretar bem as
Escrituras.

4. Interprete a experiência pessoal à luz das Escrituras, e não as Escrituras à luz da


experiência pessoal.

5. Os exemplos bíblicos só têm autoridade prática quando amparados por uma ordem
que os faça mandamento universal.

6. O propósito primário da Bíblia é mudar as nossas vidas, e não aumentar nossos


conhecimentos.

7. Cada cristão tem o direito e a responsabilidade de investigar e interpretar


pessoalmente a Palavra de Deus, seguindo princípios universalmente aceitos pela
ortodoxia bíblica.

8. A História da Igreja é importante, mas não é decisiva na interpretação da Escritura.

9. As promessas divinas, exaradas na Bíblia, estão disponíveis ao Espírito Santo para


aplicá-las a favor dos crentes de todas as gerações.

Princípios Gramaticais de Interpretação – são os que tratam do texto propriamente


dito. Estabelecem as regras básicas para o entendimento das palavras e sentenças da
passagem em estudo. As Escrituras devem ser interpretadas em consonância com as
regras básicas da gramática, incluindo questões como sintaxe e estilo.
82
10. A Escritura tem somente um sentido, e deve ser tomada literalmente.

11. Interprete as palavras do texto bíblico no sentido que tinham no tempo do autor.

12. Interprete as palavras em relação à sua sentença e ao seu contexto.

13. Interprete a passagem em harmonia com o seu contexto.

14. Quando um objeto inanimado é usado para descrever um ser vivo, a proposição
pode ser considerada figurada.

15. Quando uma expressão não caracteriza a coisa descrita, a proposição pode ser
considerada figurada.

16. As principais partes e figuras de uma parábola representam certas realidades.


Considere somente essas principais partes e figuras quando estiver tirando conclusões.

17. Interprete as palavras dos profetas no seu sentido comum, literal e histórico, a não
ser que o contexto ou a maneira como se cumpriram indiquem claramente que têm
sentido simbólico. O cumprimento delas pode ser por etapas, cada cumprimento sendo
uma garantia daquilo que há de seguir-se.

Princípios Históricos e Culturais de Interpretação – são os que tratam do substrato


ou contexto em que os livros da Bíblia foram escritos. As situações políticas,
83
econômicas e culturais são importantes na consideração do aspecto histórico do seu
estudo da Palavra de Deus.

18. Uma vez que as Escrituras se originaram de modo histórico, elas devem ser
interpretadas à luz da história. (Como revelação sobrenatural de Deus, ela contém
elementos que transcendem os limites do contexto histórico.)

19. Embora a revelação de Deus nas Escrituras seja progressiva, tanto o Antigo
Testamento como o Novo são partes essenciais desta revelação e formam uma unidade
harmônica.

20. Os fatos ou acontecimentos históricos se tornam símbolos de verdades espirituais,


somente se as Escrituras assim os designaram.

Princípios Teológicos de Interpretação – são os que tratam da formação da doutrina


cristã; desempenham papel de profunda relevância na obra de dar forma àquele corpo de
crenças a que você chama suas convicções. São, por necessidade, regras “amplas”, pois
a doutrina tem de levar em consideração tudo que a Bíblia diz sobre dado assunto.

21. Você precisa compreender gramaticalmente a Bíblia, antes de compreendê-la

teologicamente.

22. Uma doutrina não pode ser considerada bíblica, a não ser que resuma e inclua tudo o
que as Escrituras dizem sobre ela.

23. Quando parecer que duas doutrinas ensinadas na Bíblia são contraditórias, aceite
ambas como escriturísticas, crendo confiantemente que elas se explicarão dentro de uma
unidade mais elevada.

24. Um ensinamento simplesmente implícito nas Escrituras pode ser considerado


bíblico quando uma comparação de passagens correlatas o apoia.
84
PARA (NÃO) FINALIZAR:

Que Deus encontre em cada um de nós um espírito submisso, apto para aprender d’Ele,
por meio da Revelação Escrita, capaz de transmitir com fidelidade o que recebemos.

Experimente ser fiel no seu trabalho de Interpretação e conhecerá os insondáveis


mistérios de Deus. “Quem não crê, não experimenta ; quem não experimenta não pode
Saber”(Anselmo).

“Aquele que se contentar com o uso destes meios e puser de parte os preconceitos...
em que muitos envolvem todas as questões adquirirá decerto a compreensão da
Sagrada Escritura; se não for em tudo, será na maior parte, e, se não for
imediatamente, com certeza será depois.”

( Whitaker)

85
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, Antônio – “Manual de Hermenêutica Sagrada”, Casa Editora


Presbiteriana.

BARCLAY, Palavras Chaves do NT – Ed. Vida Nova

BERKHOF, Louis - Princípios de Interpretação Bíblica. Tradução de Merval Rosa.


3ª edição

BOYER, Orlando – Pequena Enciclopédia Bíblica – Ed. Vida

BRUGGEN, Jakob Van. Para ler a Bíblia – Ed. Cultura Cristã

CESAR de F. A. Bueno Vieira. São Paulo. Editora Vida Nova, 1994

CHEN, Christian. Os números na Bíblia – Ed. Betânia

E. LUND / P. C. Nelson Hermenêutica. Tradução: Etuvino Adiers. São Paulo . Editora


Vida,1986

86
FERREIRA, Julia – Conheça Sua Bíblia – Ed. Luz para o Caminho

FRIBERG, Bárbara – O NT Grego Analítico – Ed. vida Nova

GUILHUIS, Pedro – Como interpretar a Bíblia – Introdução a Hermenêutica - Ed.


Cristã Unida

JAGER, Dr.. Palavras Chaves do NT – Ed. Felire

LINS, Paulo Aragão. Curiosidades Bíblicas – Cultura Cristã

LUND, E. – “Hermenêutica Sagrada”, Editora Vida.

MANUAL Bíblico Vida Nova

RIENECKER, Fritz. Chave Linguística do NT Grego, Ed. Vida Nova

RUSSELL P. Shedd. A Bíblia e os livros. Abec, 1993, p. 18.

TAYLOR, W.C. – Dicionário do NT Grego, JUERP

WALTER A. Henrichsen, no livro “Princípios de Interpretação da Bíblia”,

VIRKLER, Henry A. – Hermenêutica - Princípios E Processos De Interpretação -


Ed Vida.

ZUCK, Roy B. A interpretação bíblica: meios de descobrir a verdade da Bíblia /


tradutor:

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