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Resumo
Abstract
CGI technology made Animation an important tool for information Design and audiovisual
production, turning possible in moving images, in a hyper-realistic way, the presence of
everything created by human imaginary. When subverted by the creative mind, this
technology based on realism can provide new levels of visual information, accounting for
concepts and visually reinforcing elements of the audiovisual discourse presented. This paper
is a part of a research that investigates the search for realism in Animation Cinema. In this
context, we reflect about the use of digital Animation in contemporary cinema productions
like Waking life and A scanner darkly.
Introdução
O presente texto é um desdobramento de uma pesquisa mais abrangente – apresentada
anteriormente no 4º Congresso Internacional de Design da Informação –, que investiga a
busca pelo realismo no Cinema de Animação, desde as origens dessa arte cinematográfica até
os dias atuais, em que a Animação permite dar movimento às criações produzidas com a
tecnologia CGI (Computer-Generated Imagery, ou simplesmente imagens geradas por
computador). Possibilita, assim, que sejamos capazes de visualizar não apenas seres e locais
nunca presenciados por olhos humanos, como também conceitos, simulações, previsões ou até
mesmo emoções. A computação gráfica também viabilizou a produção de uma imagem
híbrida – analógica e digital – que tem como principal traço e expressão o realismo. Graças à
animação, caminhamos de maneira realista com os dinossauros e voamos por entre as
montanhas flutuantes da lua Pandora, guiados pela imaginação do cineasta James Cameron
no filme Avatar (2009). Graças também a recursos visuais, compreendemos facilmente o
conceito do movimento dos elétrons de um átomo (a partir de um esquema hipotético), a ação
nociva de um vírus no interior das células e a futura movimentação das frentes frias. O
desenvolvimento das técnicas de animação tornaram-na não apenas um recurso valioso da
produção audiovisual, como também do próprio Design da informação.
Em encontro realizado em 1961, a Associação Internacional do Filme de Animação
(ASIFA) definiu Cinema de Animação como sendo
(...) toda criação cinematográfica realizada imagem por imagem. Difere do cinema
de tomada direta pelo fato deste proceder de uma análise mecânica, por meio da
fotografia, de fatos semelhantes àqueles que serão reconstituídos na tela, enquanto o
Cinema de Animação cria os fatos por outros meios além do registro automático.
Em um filme de animação, os fatos têm lugar pela primeira vez na tela. (Moreno,
[s/d], p. 1)
Movimentação realista
A busca pelo realismo na animação tem início na década de 1910 com a invenção da
rotoscopia, patenteada por Max Fleischer. Trata-se de um recurso que utiliza por referência
imagens live action para produzir movimentos realistas em animação. Assim, eram realizadas
rápidas filmagens com atores que serviam depois de referência para os animadores
desenharem a ação animada quadro a quadro a partir dos fotogramas do filme original. A
técnica foi criada para agilizar a produção de filmes instrucionais no Bray Studio, onde
Fleischer trabalhava como animador. John Randolph Bray, o proprietário do estúdio, foi a
West Point com seus animadores durante a Primeira Guerra Mundial e criou curtas de
treinamento para o governo americano. O emprego da rotoscopia garantiria o realismo que se
exigia de um filme documental e também permitia a interpretação artística que Bray desejava
(Evans, 2005:12).
A rotoscopia acelerou o processo de produção, mas não tornou os movimentos
animados mais próximos do real. A preocupação na reprodução tendo o fotograma original
como referência, ao invés de seguir o fluxo dos desenhos (em que os quadros anteriores é que
são as referências) resultava, frequentemente, em personagens de feições hiperrealistas, mas
de movimentos duros e mecânicos.
Apesar de também ter experimentado a técnica de rotoscopia, não foi com ela que
Disney e seus animadores atingiram o tão almejado realismo no movimento. Até hoje, são
considerados os grandes responsáveis pelos avanços técnicos da Animação tradicional em
direção ao realismo de movimentos, estabelecendo paradigmas que se tornaram referências
para a área (os princípios da animação). Disney alegava estar mais preocupado em fazer as
pessoas se divertirem do que em se expressar artisticamente. Para atingir seu objetivo,
percebeu que os filmes como vinham sendo feitos até aquele momento não teriam futuro, pois
estavam estruturados sobre piadas visuais e não no movimento, essência da animação. As
personagens destas obras possuíam um pequeno número de movimentos característicos,
pouco elaborados e repetitivos. Faltavam ação e movimentos convincentes. Disney anunciou
aos seus animadores que almejava atingir, com a animação, a ilusão da vida. A personagem
animada “tinha de atuar, de representar convincentemente; parecer que pensa, respira;
convencer-nos de que é portadora de um espírito. E para envolver completamente a audiência,
essa personagem tinha, por fim, de estar inserida em uma história” (Barbosa Júnior, 2002:99).
Segundo a orientação de Disney, portanto, uma obra de animação deveria apresentar
atuação teatral, a partir de que se explicitaria a personalidade das personagens. Diversos
recursos foram inventados nos estúdios Disney com o objetivo de facilitar o trabalho dos
animadores em sua busca por movimentos mais fluidos e convincentes. Disney comprava
animais empalhados ou cadáveres para entender a dinâmica de seus movimentos. Instituiu
programas de treinamento para seus animadores que incluíam aulas de anatomia, de desenho
de modelo vivo, de psicologia da cor e de representação. Insistia na observação de mímicos e
dos grandes atores do cinema mudo e agendava palestras com grandes artistas como Orson
Welles, Frank Lloyd Wright e Charles Chaplin. Tudo que era necessário aos seus animadores
para atingir a almejada ilusão da vida, Disney providenciava.
Apesar de empregar animais antropomorfizados como personagens, os mesmos já não
eram mais vistos como criações de traço e tinta, mas seres vivos, tridimensionais, com
motivações e densidade psicológica, reais dentro do universo diegético de que faziam parte. O
dispositivo – todo o aparato técnico e de produção necessário à realização da obra – permite
que aceitemos como real toda uma gama de situações surreais como bigornas que caem do
céu e burros falantes. Para os espectadores, se tratam de situações reais em seu absurdo irreal.
E de seres vivos, mas que são cartuns.
(distância e ângulo) em relação ao objeto. Esta relação determina ainda a escala, que levou a
classificação de planos em: Plano Geral, Plano Médio (ou de Conjunto), Plano Americano,
Primeiro Plano (close up). Em relação aos ângulos de câmera, considera-se de modo geral que
a posição normal é na altura dos olhos de um observador. Além disso, teremos a câmera alta e
a câmera baixa, cada uma com funções específicas.
De acordo com Xavier, tudo neste cinema caminha em direção ao controle total da
realidade criada pelas imagens. Ao mesmo tempo, tudo aponta para a invisibilidade dos meios
de produção desta mesma realidade. Taticamente, tal atitude tem como objetivo a
demonstração da neutralidade do sistema de representação e a possibilidade de sua utilização
dentro de diferentes perspectivas ideológicas. Noel Burch (1999) afirma que este cinema
produz um espectador descorporificado, pois o envolve de tal forma que o mesmo abandona
seu corpo na poltrona e se identifica completamente com o que acontece na tela.
Para discutir estes dois modelos de representação (ilusionista e antiilusionista) Xavier
utiliza os termos opacidade e transparência. Estas duas maneiras de conceituar e pensar o
cinema nos remetem a um debate dos anos 1970, que teve origem no centro de uma série de
questões que buscavam explicar como se dá a relação entre o espectador e o cinema, no
processo de recepção do filme. Nestas abordagens, o aparato tecnológico e econômico do
cinema (chamado na época de “o dispositivo”) foi analisado para verificar como o espectador
é abordado, ou como esse cinema leva o seu público a identificar-se com e através das
camadas de subjetividade construídas pelo filme. A partir destas reflexões, concluiu-se que
quando o dispositivo é ocultado, em favor de um ganho maior de ilusionismo, a operação é
chamada de transparência. Quando o dispositivo é revelado ao espectador, possibilitando um
ganho de distanciamento e crítica, a operação é considerada de opacidade. Opacidade e
transparência são os dois pólos de tensão que resumem o essencial do pensamento dos anos
1970 (Xavier, 2005:6).
A princípio, a rotoscopia faz parte da concepção ilusionista e opera com transparência,
já que busca uma imagem naturalista. Entretanto, observamos que a mesma pode levar a
resultados estéticos diferentes do realismo e apresentar uma representação na qual predomina
a operação de opacidade. É o que pretendemos verificar em Waking life e O homem duplo,
filmes dirigidos por Richard Linklater que utilizam rotoscopia digital e alternam as operações
de transparência e opacidade.
Waking life
A primeira característica que salta aos olhos em Waking life (2001) é o seu método de
produção: o fato de se tratar de dois filmes em um único. O diretor Richard Linklater primeiro
filmou todas as cenas com os atores em locações. Em seguida, passou as imagens live action
para Bob Sabiston, que com sua equipe de 30 animadores redesenhou cada cena com o auxílio
da computação gráfica, modificando-as e realizando-as em um longa-metragem de Animação.
Outro aspecto importante a ser ressaltado é que a obra não possui um roteiro linear. O filme
foi baseado em estudos de filosofia e espiritualidade, tendo por principais referências Platão,
Aristóteles, Nietzsche e Sartre. O enredo é construído em diálogos e questões levantadas a
partir dos encontros do protagonista (Wiley Wiggins) com outras pessoas, cada uma delas com
uma contribuição filosófica e/ou espiritual.
Figura 1: material de divulgação do filme Waking life (EUA, 20th Century Fox, 2001).
Apesar de utilizar rotoscopia digital, Waking life não tem tendências realistas e não
apresenta características atribuidas à narrativa clássica. Muito pelo contrário, as interferências
da computação gráfica tornaram as imagens instáveis, flutuantes, rompendo com a noção
espacial do espectador. A não-linearidade do roteiro e a ausência de estrutura temporal clara
também escapam do padrão que caracteriza a continuidade clássica, de operação de
transparência. Em relação ao enredo, a quebra de continuidade narrativa é ainda mais visível,
pois as histórias são independentes e não se relacionam, apenas tem a personagem principal
que sonha como fio condutor da ação.
Esta percepção de sonho é construída já na primeira sequência do filme, que começa
com um menino e uma menina brincando com um jogo de origami. O menino escolhe os
números e cores no jogo e o seu destino é revelado com a frase "sonho é destino”. Em
seguida, o protagonista é apresentado como se estivesse despertando, mas tal expectativa não
se confirma quando o mesmo passa a flutuar no jardim da sua casa. As opções estéticas do
diretor por imagens quase expressionistas também não se assemelham às soluções tradicionais
de representação de sonhos da estrutura clássica fílmica, no qual ocorre apenas uma mudança
na cor da imagem (azulada, em preto e branco...) ou o surgimento de algum elemento que
remeta ao sonho (moldura esfumaçada, desfoque etc.). A ocorrência destas imagens flutuantes
do início ao fim do filme produz a sensação de que tudo que acontece no universo diegético
pertence à outra realidade, que ultrapassa inclusive a dos nossos sonhos.
A instabilidade das imagens criadas representa muito mais a sensação que o sonho nos
provoca do que a representação do sonho em si. O desejo de sair daquele lugar onde não
temos controle, onde as regras que regem o nosso mundo não são válidas e estamos à mercê
do desconhecido. A cena do barco-carro, um elemento totalmente discrepante da realidade, e
a afirmação do piloto revelam um pouco isso: “A ideia é permanecer em um estado de saída
constante, embora sempre chegando”. Na verdade, não faz diferença estar saindo ou
chegando, já que os seus pontos de referência não fazem mais sentido naquele universo.
A cena seguinte é a de um professor falando para sua classe sobre o existencialismo:
“A razão pela qual eu me recuso a tomar o existencialismo como apenas outra mania francesa,
ou curiosidade histórica, é que eu acho que tem algo muito importante para nos oferecer para
o novo século. Tenho medo que estejamos perdendo as virtudes reais de viver a vida com
paixão, no sentido de assumir a responsabilidade de quem você é, a capacidade de fazer algo
de si mesmo e sentir-se bem com a vida. Existencialismo é frequentemente discutido como se
fosse uma filosofia do desespero, mas acho que, na verdade, é justamente o oposto. Sartre, em
uma entrevista, disse que nunca sentiu um dia de desespero em sua vida. A única coisa que sai
da leitura desses caras não é um sentimento de angústia sobre a vida, tanto real como uma
espécie de exuberância, de sentir em cima dela. É algo como sua vida é sua para criar”.
Na sequência seguinte, o professor caminha com Wiley e continua discorrendo sobre a
filosofia existencialista e as abordagens equivocadas. As conversas filosóficas são o fio
condutor do filme, elas ocorrem em cafés, bares, depois de um ato de amor (as personagens
Céline e Jesse continuam uma possível conversa de Antes do amanhecer, filme de 1995) e
quando as personagens caminham pela rua. Os temas se deslocam do existencialismo ao
evolucionismo, passando por questões sociais e psicológicas.
Figura 3: Céline (Julie Delpy) e Jesse (Ethan Hawke). Imagem do filme Waking life.
O homem duplo
A história de O homem duplo (A scanner darkly) se passa num futuro próximo (daqui
a sete anos), quando o governo monitora as ações de todos os cidadãos e se aproveita da
dependência crescente da população em drogas pesadas – em especial, a fictícia substância D.
Keanu Reeves interpreta um policial infiltrado entre um grupo de viciados que procura
descobrir seus fornecedores, mas acaba também se viciando na droga. Ao longo da trama,
‘Fred’ (codinome recebido para manter seu anonimato) recebe a importante missão de
espionar o “traficante” Bob Arctor, seu alter ego entre os viciados. Porém, com o consumo
crescente da droga (inicialmente para evitar suspeitas), a personalidade de Fred (ou seria
Bob?) começa a se fragmentar. A paranóia cresce, afetando também seus amigos viciados:
Jim Barris (Robert Downey Jr.), Ernie Luckman (Woody Harrelson) e Donna Hawthorne
(Wynona Ryder). Reeves revive Neo de Matrix, cinessérie que, apesar de não citar, é repleta
de referências à obra de K. Dick. Mas o policial da trama não sabe mais se ele é Neo ou
Thomas Anderson, não tem certeza de em qual realidade vive (é um viciado, um traficante ou
um policial?) e mantém uma constante guerra entre os hemisférios de seu cérebro.
Figura 4: Fred (Keanu Reeves). Wallpaper do filme O homem duplo (EUA, Warner Bros., 2006. Divulgação).
O conto é baseada nas experiências pessoais de K. Dick e seus amigos (para os quais a
história foi dedicada) com entorpecentes. Além de O homem duplo, há ainda quatro outras
adaptações de obras de K. Dick para o cinema: Blade Runner (Ridley Scott, 1982) O
Vingador do Futuro (Total Recall, Paul Verhoeven, 1990), Minority Report (Steven
Spielberg, 2002) e O Pagamento (Paycheck, John Woo, 2003). Todas as histórias ocorrem
em possíveis futuros próximos, e envolvem reflexões sobre lei e ordem, consumo de
entorpecentes, o domínio das grandes empresas sobre a liberdade individual, armadilhas da
memória e subjetividade.
Apesar de alguns dos elementos do filme não existirem – como o traje de distorção,
fantasia que torna o policial impossível de ser identificado no departamento de polícia –, a
história é ancorada na realidade dos usuários de drogas. Algo que a opção pela rotoscopia
potencializa, dando à trama contornos oníricos. Mas que não chegam a sobrepujar a estética
naturalista do filme. Ao contrário de Waking life, onde temos imagens oscilantes e não
conseguimos distinguir realidade e sonho, em O homem duplo, mesmo com os efeitos e
estética da rotoscopia digital, as imagens apresentam uma tendência mais realista.
Figura 5: Fred (Keanu Reeves) e Donna (Wynona Ryder). Imagem do filme O homem duplo.
animação, todos seguindo uma mesma orientação. “Queríamos um filme que tivesse um estilo
visual singular”, afirmou.
Figura 6: Sequência que ilustra o processo de rotoscopia digital do filme O homem duplo.
Originalmente disponível no website do filme (atualmente fora do ar).
Referências
MANOVICH, L. Image after Matrix. In: Lev Manovich website, 2004. Disponível em:
<http://www.manovich.net>. Acesso em: 28 nov. 2009.