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ARTIGO

Aspectos econômicos e políticos determinantes


da política social brasileira

Economic and political aspects of the brazilian social policy

Maria Luiza Amaral RIZZOTTI1

Resumo: O caminho recente das políticas sociais brasileiras encontra dificuldades que devem ser ava-
liadas à luz do seu processo histórico e estrutural. O presente artigo tem a finalidade de retomar as
reflexões sobre tais aspectos sob a égide das tradicionais funções do Estado moderno e das principais
características do modelo do Estado Brasileiro. A pesquisa bibliográfica busca trilhar um caminho
analítico a partir da tradição marxista, tanto no que concerne às explicações dos fundamentos do Esta-
do, quanto na leitura da sociologia histórica brasileira.
Palavras-chave: Estado. Políticas Sociais. Aspectos Econômicos e Políticos. Sociedade Civil.

Abstract: The recent path of Brazilian social policies has met difficulties which should be assessed in
the light of their structural and historical process. This article aims to resume the discussions on such
issues under the auspices of the traditional functions of modern State and the main features of the
model of the Brazilian State. The bibliographical research pursues an analytical path from the Marxist
tradition, both with regard to explanations of the foundations of the State, as in reading the historical
sociology.
Keywords: State. Social Policies. Economic and Political Aspects. Civil Society.

Submetido em: 10/4/2013. Aceito em: 16/6/2013.

1Assistente Social, doutora em Serviço Social e Política Social pela PUC/SP, professora associada da
Universidade Estadual de Londrina (UEL), Brasil. E-mail: <marialuizarizzotti@gmail.com>.

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Argumentum, Vitória (ES), v. 5, n.1, p. 165- 179, jan./jun. 2013.
Maria Luiza Amaral RIZZOTTI

Introdução tradição marxista. Já nas obras políticas


de Marx em O Capital - a despeito do

O
estudo da gestão de políticas ponto no qual se interrompe esta últi-
sociais que pretende subsidiar ma obra - a análise aponta quatro fun-
análises referentes aos seus ções básicas que desempenha o Estado
entraves e desafios deve ser pensado contemporâneo na produção capitalis-
considerando o seu arcabouço teórico e ta.
histórico. Tais dimensões fundam-se e
sofrem influência dos modelos econô- Em primeiro lugar, o Estado desempe-
micos, políticos e sociais adotados pe- nha a função de capitalista coletivo
los Estados Nacionais, assim como se ideal, segundo a qual atua na criação
transformam a partir dos fundamentos de condições materiais genéricas para
legais e teóricos que lhes oferecem ca- a produção (isto é, a infraestrutura ne-
pacidades explicativas. cessária ao desenvolvimento do capital
em seus diferentes ramos - energia,
O estudo do tema aqui empreendido transporte, comunicações, etc.). Essa
reserva alguns desafios que estão mes- função inicial do Estado pode ser cons-
clados e influenciados pelo campo crí- tatada desde o período da acumulação
tico de análise das políticas sociais com primitiva do capital e, após a existência
o objetivo de amalgamar a importante de um curto período de capitalismo
presença da relação entre Estado e so- concorrencial, ganha ênfase novamente
ciedade civil no aprimoramento das com o surgimento das condições mo-
políticas sociais e, por consequência, a nopolistas de produção.
extensão de sua capacidade protetiva
de garantia de direitos. Em segundo lugar, o Estado contem-
porâneo desempenha na produção a
Com isso a composição deste estudo função de árbitro, através da criação e
perpassa fundamentos do Estado Bra- sustentação do sistema geral de leis,
sileiro que têm influência sobre as polí- destinado a regulamentar as relações
ticas sociais, conjugando conteúdos na sociais fundadas na e destinadas à
perspectiva histórica e conceitual que produção de mercadorias.
permitam a sistematização de conhe-
cimentos capazes de garantir uma aná- Subsidiariamente, uma terceira função
lise crítica do tema. Perpassam estes agrega-se a esta última: o Estado regu-
conteúdos aspectos referentes à relação lamenta as relações entre capital e tra-
do modelo capitalista de produção e a balho assalariado, intervindo desde
posição do Estado burguês na compo- um ponto exterior no conflito de clas-
sição das lutas sociais que tematizaram ses e completando o conjunto de con-
as proposições de políticas sociais. dições internas para a produção.

As relações condicionantes entre o Es- Finalmente, uma última, mas não me-
tado Moderno e a produção capitalista nos importante função consiste na polí-
foram reiteradamente abordadas pela tica comercial externa desempenhada

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pelos Estados contemporâneos, através aram, ainda mais, as funções do apare-


da qual logram prover as condições lho político do Estado no processo de
necessárias à expansão do capital na- produção capitalista. Não obstante, o
cional total no mercado internacional. papel desempenhado na realização da
acumulação primitiva do capital, as
Segundo a análise marxiana, portanto, atribuições do Estado durante o pro-
o Estado realiza sua função estratégica cesso normal de produção capitalista
ao prover as condições necessárias e concorrencial deveriam resumir-se es-
suficientes à formação do capital social sencialmente à função de árbitro dos
conjunto, propiciando a subsunção do contratos e garantidor da forma mer-
capital comercial ao industrial e das cadoria e de suas manifestações na
formas não capitalistas de produção à produção. Mas as transformações ocor-
forma mercadoria. Nesse sentido é que ridas no modo de produção capitalista
pode ser definido como instrumento durante o último século tornaram essa
de opressão de classe sobre classe, a- função por si só insuficiente, ocasio-
través do qual a burguesia impõe um nando uma alteração-chave, que con-
modo específico de dominação política sistiu na conversão do Estado de árbi-
e de exploração econômica na era capi- tro da economia em interventor ativo
talista. no processo de acumulação do capital.
O resultado essencial desse seu papel é Paralelamente, essa nova condição
que se produz a socialização dos cus- provoca também transformações nas
tos de reprodução da força de trabalho instituições políticas de nossa época,
e do capital em geral, permanecendo sintetizadas no esvaziamento do poder
subordinada à política econômica do legislativo e das formas de representa-
Estado (em sua forma monetária, fiscal ção que o Estado incorpora em favor
ou social) e aos setores monopolistas e de uma organização corporativa do
competitivos da produção capitalista. poder e na transição da fórmula clássi-
Nesse processo, cujo ponto extremo ca de lei geral para uma intervenção
pode ser localizado na constituição e legislativa ad hoc na vida social.
evolução das formas do capital finan-
ceiro, duas lógicas antagônicas coexis- Com efeito, a organização e desenvol-
tem: a do capital, consubstanciada no vimento do Estado de Bem-Estar no
caráter quantitativo do valor e na fina- mundo ocidental expressa genuina-
lidade de produção de mercadorias e a mente essas transformações do apare-
do Estado, expressa no caráter qualita- lho político do Estado na sociedade
tivo das diferentes demandas públicas capitalista contemporânea. Como res-
e na finalidade de produção de servi- posta capitalista à crise econômica e
ços. social evidenciada com o episódio da
grande depressão americana e como
A emergência do estágio monopolista reação política ao avanço do socialismo
de produção e da subsequente fase da ocorrido desde o período entre guer-
acumulação flexível de capital acentu- ras, o advento do Estado de Bem-Estar
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criou para as sociedades capitalistas lados, os direitos fundamentais de li-


(nas quais se desenvolveu) uma nova berdade pessoal, política e econômica,
realidade política, a saber: a de que a constituídos a partir da ideologia libe-
legitimidade do poder do Estado, antes ral e da distribuição da riqueza social
residente na forma racional-legal da produzida. De outro, extingue-se a ci-
organização política democrática, en- são das esferas pública e privada 2 ori-
contrar-se-ia desde então condicionada ginada da separação entre sociedade e
ao grau de eficácia da ação do Estado Estado com a constituição daqueles
na resposta à crise capitalista, que de direitos fundamentais, fundindo-se
um lado expressava-se pelo perigo da ambas numa nova realidade, através
estagnação nas economias de mercado, da qual se processa a reprodução social
de outro tomava a forma de aberta ex- capitalista.
clusão social.
Desse modo, é nosso objetivo, ao em-
Se, ademais, considerarmos o caráter preendermos essa reflexão, situar no
de clara dependência fiscal do apare- universo de transformações políticas e
lho político de Estado em relação à e- econômicas do capitalismo contempo-
conomia capitalista privada - depen- râneo e, nos condicionantes recíprocos
dência que se configura em sua forma que deles emergem, a análise das polí-
cabal na contradição entre a natureza ticas sociais no Brasil. Com as atuais
do objeto fiscal e os vínculos de uma mudanças no mundo do trabalho, um
economia concorrencial de um lado e, novo componente surge na relação das
de outro, no incremento incontrolável políticas sociais geradas pelo fundo
(do ponto de vista das instâncias inter- público e reprodução da força de tra-
nas do aparelho do Estado) da deman- balho. A relação do capital com o fun-
da de despesa pública - podemos então do público direciona-se mais para o
apreciar com relativa precisão o pro- financiamento do avanço tecnológico e
cesso pelo qual a legitimidade do po- menos para a reposição da força de
der político resulta corroída nas novas trabalho. Além disso, os modelos de
configurações da sociedade contempo- flexibilização dos contratos do trabalho
rânea. vivo mantém sua suscetibilidade à a-
propriação do capital, agora não ape-
À mudança nas formas de legitimida-
de do poder corresponde uma profun-
da transformação do aparelho político 2 Essa cisão entre as esferas tem parte de sua
do Estado. A questão central, aqui, explicação pautada no posicionamento de An-
derson (1992). “Por um lado, funções públicas
consiste na frágil possibilidade de coe-
hoje normalmente atribuídas ao Estado - edu-
xistência das formas clássicas do Esta- cação, bem-estar social, saúde, comunicações -
do de Direito com os novos papéis de- estão localizadas no espaço da sociedade civil.
sempenhados pelo Estado de Bem- Por outro lado, as associações corporativas
Estar Social. E isto porque de um lado, originárias da sociedade civil estão inseridas
na estrutura política do Estado, como as uni-
não podem ser livremente compatibili-
dades eletivas da Assembleia dos Estados”
zados, sem prejuízo para qualquer dos (ANDERSON, 1992, p. 21).
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nas com centralidade na força física, mos limites no financiamento público


mas multidimensionada e com capaci- de reprodução da mão de obra. En-
dade de plasmar a obrigatoriedade de quanto os capitais convertem-se em
trabalhar para viver ao mesmo tempo transnacionais, os custos de reprodu-
em todas as demais dimensões da vida ção da força de trabalho permanecem
estão absortas pelo trabalho. Esse cená- nacionais, no sentido de serem banca-
rio imprime novas exigências do Esta- dos pelo fundo público estatal.
do no que concerne à regulação e am-
pliação do modelo de proteção social A trajetória brasileira e sua influência
contributivo e não contributivo. nas políticas sociais

Em economias onde o recurso público As explicações referentes à política so-


tinha de ser utilizado para a reprodu- cial brasileira não podem e não devem
ção do contingente total da força de ser fracionadas, sobretudo quanto a
trabalho, isso não aparecia para o capi- determinantes econômicas, políticas e
tal como um gasto elevado. A partir do ideológicas, se elas se constituem como
momento em que os ganhos de produ- partes de uma mesma organicidade
tividade do trabalho, baseados no de- explicativa. Neste sentido, faz-se ne-
senvolvimento tecnológico e nas novas cessário articular temas como o desen-
técnicas de produção, possibilitam li- volvimento do capitalismo no Brasil, a
berar grande parcela da força de traba- constituição do Estado brasileiro, a
lho, tornando-as desnecessárias para a participação da sociedade civil e a in-
manutenção de ciclos de reprodução fluência do pensamento social brasilei-
do capital, os gastos em políticas soci- ro nas explicações para a questão social
ais aparecem ao capital como desne- no Brasil.
cessários, já que perderam sua função
O conjunto destes aspectos só pode ser
estratégica na economia capitalista.
compreendido e constituído numa to-
Nos casos dos países subdesenvolvi- talidade, se articulados do ponto de
dos, Cignolli (1985) salienta que desde vista da crítica e da história. Portanto,
o princípio a tecnologia utilizada ca- torna-se indispensável a discussão so-
racterizou-se como poupadora de mão bre o desenvolvimento econômico e as
de obra e, portanto, inexistiu o mo- características do Estado brasileiro,
mento de ampla reprodução da força tendo como elemento central da ques-
de trabalho. Neste sentido, para estes tão social no Brasil e da relação socie-
países, aos olhos do capital sempre dade civil e Estado, as especificidades
apareceu como um gasto excessivo. da burguesia nacional delineadas pela
estrutura econômica dependente.
Segundo Oliveira (1988), os verdadei-
ros motivos da crise do Estado de Bem- A particularidade da classe burguesa
Estar Social podem estar associados à brasileira está associada ao modelo
ultrapassagem dos limites nacionais da econômico que se desenvolve sob as
produção e à manutenção destes mes- marcas do neocolonialismo e das fortes

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determinações do capital externo. A Segundo Fernandes (1975), duas etapas


análise do processo de desenvolvimen- foram vividas na sociedade brasileira:
to econômico é feita através da passa-
1º) a ruptura da homogeneidade da aris-
gem do padrão colonial de crescimento
tocracia agrária; 2º) o aparecimento de
econômico para o padrão de desenvol- novos tipos de agentes econômicos sob a
vimento capitalista, o que não ocorreu pressão da divisão do trabalho em escala
linearmente, mas configurou-se muito local, regional ou nacional (FERNAN-
mais na passagem do colonial para o DES, 1975, p.27).
neocolonial e, consequentemente, para
As origens agrárias brasileiras impedi-
o capitalismo dependente.
ram a noção de competitividade, im-
O período colonial brasileiro sofreu plicando na inexistência de um libera-
estagnação econômica e foi demarcado lismo genuíno. Este país apresentou-se
pelo contexto socioeconômico e políti- como um Estado oligárquico que vai
co, sobretudo porque lhe impunha a persistir até a revolução de 1930.
característica de uma sociedade coloni-
A constituição da burguesia nacional
al. Um dos fortes aspectos desta eco-
nos interessa, sobretudo quanto ao fato
nomia é a sua tendência para a expor-
de que a classe dominante brasileira,
tação de produtos naturais - açúcar,
desde sua origem, nunca teve em seu
tabaco, posteriormente ouro, diamante,
ideário a luta e a garantia de cidadania
etc. (PRADO JÚNIOR, 1987).
e de democracia, pensada sob a luz de
A formação social é determinada de extensão de direitos sociais. Ao discu-
fora para dentro, e tudo deveria con- tir o surgimento da burguesia nacional,
vergir para favorecer o mercado exter- Fernandes (1975) faz referência ao mo-
no, desde as especulações no campo vimento abolicionista, localizando-o,
produtivo e financeiro até o recruta- sobretudo, como núcleos nos espaços
mento de mão de obra de índios e ne- urbanos:
gros. O rompimento com este estatuto
Por fim, destes núcleos é que partiu o
colonial e a criação de um Estado na- impulso que transformaria o antiescra-
cional se constituiu a condição pri- vismo e o abolicionismo numa revolu-
mordial para mudanças na ordem eco- ção social dos brancos: combatia-se as-
nômica e social. sim não a escravidão em si mesma, po-
rém o que ela representava como ano-
malia, numa sociedade que extinguira o
Esse processo que demarcou a ruptura
estatuto colonial, pretendia organizar-se
com o regime colonial, apesar de imbu- como nação e procurava, por todos os
ído do espírito burguês, não tinha em meios, expandir internamente a econo-
pauta a defesa de direitos sociais ou a mia de mercado (FERNANDES, 1975,
luta pela cidadania, mas somente li- p.19).
vrar-se dos grilhões da sociedade colo-
O envolvimento da classe burguesa
nial marcada pela escravidão e pelo
pelo fim do escravismo teve sua moti-
patrimonialismo.
vação na criação de condições políticas

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para a expansão da economia nacional do brasileiro organizou-se sob forte


e internacional, portanto, não se trata- influência de uma burguesia frágil (sob
va de uma conquista pelo ideário abo- a ótica de outros países), porém capaz
licionista. de imprimir internamente uma força
reguladora em relação aos interesses
A burguesia nacional sustentou-se e de outras classes sociais. A questão da
pôde adequar-se às novas demandas repressão ou do enquadramento e re-
econômicas por sua capacidade de re- gulação é colocada no âmbito do con-
adaptar-se estruturalmente. Esse pro- trole senhorial:
cesso de readequação que lhe permitiu
superar a própria crise do poder bur- Resguardava-se a sociedade do corrosi-
guês, só foi possível por três aspectos vo espírito burguês, fortalecendo-se os
laços que prendiam os homens aos seus
explicativos: a articulação com o mer-
níveis sociais aos correspondentes códi-
cado externo, a organização política gos de honra, e ao mito que o Brasil é
própria e o favorecimento do Estado ingovernável sem a versão autocrático-
na manutenção do poderio econômico paternalista do despotismo esclarecido
(FERNANDES, 1975). Destas três, a (FERNANDES, 1975, p.165).

última nos interessa mais de perto, por


A história brasileira foi demarcada pe-
tratar-se do posicionamento do Estado
la separação entre a sociedade civil e o
em face da manutenção da ordem soci-
Estado. Esta separação tem engenhosa
al vigente.
ação da classe dominante burguesa,
A possibilidade de converter o Estado que buscou identificar sua luta com o
em um eixo político de recomposição do “direito natural revolucionário” (FER-
poder econômico, social e político da NANDES, 1975, p.302). E, também,
burguesia, estabelecendo-se uma cone- com a capacidade de relacionar o con-
xão direta entre dominação de classe, e
ceito de nação a algo distante e abstra-
livre utilização, pela burguesia, do po-
der político estatal daí resultante (FER- to do cotidiano da vida social, exceto
NANDES, 1975, p.264). apenas quando esta deve se interpor a
favor de ideário da minoria.
As consequências disto são: a inexpres-
sividade de forças antagônicas com [...] a dominação burguesa não é só uma
perspectivas de organizar-se sob a ló- força socioeconômica espontânea e uma
força política regulativa. Ela polariza po-
gica de contraposição política e revolu-
liticamente toda a rede de ação auto de-
cionária e um rígido controle sob o fensiva e repressiva, percorrida pelas
processo de organização das classes instituições ligadas ao poder burguês,
populares. da empresa ao Estado, dando origem a
uma formidável superestrutura de o-
Características como a ausência de um pressão e de bloqueio, a qual converte,
relativamente, a própria dominação
projeto político nacional, fortalecimen-
burguesa na única fonte de poder legí-
to externo das oligarquias regionais na timo (FERNANDES, 1975, p.303).
organização política e a repressão às
formas de participação popular estão Ao apontar as características da bur-
determinadas pela forma como o Esta- guesia nacional, o autor coloca que sua
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identidade com a modernidade e civi- Cabe, porém, lembrar que o mesmo


lização era equacionada por interesses autor considera a burguesia brasileira
particulares e, quando reclamado seu como fruto de uma transmutação da
posicionamento a favor de outros gru- oligarquia, chamada de nova aristocra-
pos, respondia de forma conservadora cia, vulnerável e manipulável pela oli-
e reacionária: garquia conservadora.

[...] que nos sirva de exemplo o trata- A ênfase na caracterização nacional


mento das greves operárias da década das classes dominantes justifica-se pela
de 1910, em São Paulo, com puras ques-
intrínseca relação entre esta e o desen-
tões de polícia; ou quase meio século
depois a repressão às aspirações demo- volvimento capitalista. No caso brasi-
cráticas das massas (FERNANDES, 1975, leiro, o comportamento particularista
p.206)3. dos que conduziam o processo permi-
tiu:
3 A história oficial brasileira reserva pouco [...] a continuidade da dominação impe-
espaço para a ação dos movimentos sociais que rialista externa; -a permanente exclusão
lutaram e expressaram necessidade de mudan- (total e parcial) do grosso da população
ças. Também fala-se pouco na forma de trata- não possuidora do mercado e do sistema
mento que as classes dominantes dispensavam de produção especificamente capitalista;
a estas manifestações, através de seu aparato e dinamismos econômicos débeis e osci-
repressivo. Apenas como exemplo vale lem- lantes, aparentemente insuficientes para
brar as lutas dos operários no período da velha alimentar a universalização efetiva (e
república que, apesar de não ter desenvolvido não apenas legal) do trabalho livre, a in-
formas mais avançadas de organização, foram tegração nacional do mercado interno e
fortemente reprimidas. A história oficial brasi- do sistema de produção em bases genu-
leira reserva pouco espaço para a ação dos inamente capitalistas, e a industrializa-
movimentos sociais que lutaram e expressa- ção autônoma (FERNANDES, 1975,
ram necessidade de mudanças. Também fala- p.223).
se pouco na forma de tratamento que as classes
dominantes dispensavam a estas manifestaç- O potencial de luta, ou focos de tensão
ões, através de seu aparato repressivo. Apenas
como são chamados por Florestan Fer-
como exemplo vale lembrar as lutas dos operá-
rios no período da velha república que, apesar
nandes, era transmutado em relações
de não ter desenvolvido formas mais avança- de obediência e dever com os homens
das de organização, foram fortemente repri- entre si e destes com seus senhores. Os
midas. Del Roio (1986), em seu livro sobre a instrumentos de cooptação eram utili-
história dos movimentos sociais no Brasil, co-
zados sob a forma de garantia de po-
loca “Os primeiros anos do século assistiram a
uma série de paralisações do proletariado, der, riqueza e prestígio.
buscando melhores salários e, sobretudo, uma
A competição continha alguma signifi-
redução da longuíssima jornada de trabalho. A
cação estrutural e funcional apenas por-
parede dos tecelões na capital contou com
25.000 adesões. Um número enorme para a
época! Seguiram-se os sapateiros, os gráficos, em todos os portos. Entre derrotas e vitórias
os chapeleiros e os carroceiros(bloqueando a parciais, quase sempre coibido o movimento
circulação). Também a marinha mercante pa- avançava” (DEL ROIO, 1986, p.41).
rou em protesto contra o recrutamento forçado
para a marinha de guerra, havendo embates
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que a dominação patrimonialista- cos que demarcaram a história do Bra-


tradicional expunha os parentelos, como sil.
grupos ou através de seus chefes, uma
constante emulação na luta pela preser-
Tais contornos foram analisados por
vação ou pelo aumento de riqueza, de
prestígio social e poder. Mas ela não se
pesquisadores diferentes sob marcos
manifestava como um processo diferen- também diferenciados. Ianni (1971)
ciado e social percebido ou valorizado realiza uma análise a partir das ruptu-
como tal. Ao contrário constituía um ras nas estruturas políticas e econômi-
componente estrutural e dinâmico das
cas. Para o autor, no período entre a
obrigações sociais que ligavam os ho-
mens entre si e ao senhor... através das Primeira Guerra Mundial e o Golpe de
tradições, do dever de mando ou de o- Estado de 1964, ocorreram fatos que
bediência e da solidariedade moral demarcam tanto as rupturas, quanto as
(FERNANDES, 1975, p.152). transformações institucionais impor-
tantes. Das citadas por Ianni (1971),
O autor está preocupado com a passa-
cabe destacar a relação entre o acele-
gem para uma nova ordem competiti-
ramento da indústria com uma política
va no Brasil e, no cerne desta discus-
de massas. As décadas anteriores ao
são, está a tradição patrimonialista, na
Golpe Militar foram marcadas por for-
qual o equilíbrio social se faz por soli-
te populismo e, ao mesmo tempo, fo-
dariedade gestada sob formas autocrá-
ram se organizando os partidos políti-
ticas. Em sua análise, complementa as
cos de esquerda:
explicações pondo em pauta não ape-
nas questões ligadas à identidade na- Em consequência a nova organização do
cional, mas especificamente á relação poder, característica da ação política,
entre as características particulares dos floresceram atividades políticas e cultu-
rais, criando uma cultura urbana dife-
estamentos ou classes, que detinham o
rente e mais autenticamente nacional.
poder na condução do desenvolvimen- Ao mesmo tempo, desenvolveram con-
to capitalista no Brasil. tradições econômicas, políticas e sociais
e criaram organizações políticas de es-
Além disto, apontou as suas conse- querda (IANNI, 1971, p.9).
quências como determinantes para a
existência de um sistema econômico No período posterior ao governo Getú-
dependente, no qual a exclusão social lio Vargas, nos anos de 1956 a 1960,
passou a ser uma marca que se perpe- governado por Juscelino Kubitschek,
tuou em todas as suas etapas. Agrega- houve uma junção de interesses eco-
se a esta marca, a repressão aos movi- nômicos dominados pelos ditames do
mentos populares que estampavam a capital externo com a manutenção de
necessidade de medidas governamen- uma política de massas. Não mais de
tais nesta área. O estudo da configura- conotação nacional, este período foi
ção econômica e política de tal forma importante para o fim da proposta de
imbricada, como apresenta Fernandes desenvolvimento de caráter nacionalis-
(1975), é difícil de ser superado. Porém ta. Naturalmente a passagem de um
vale fazer menção aos contornos políti- projeto que invocasse o nacionalismo

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foi sendo substituído em função de tiplicação de instauração e ações de


acontecimentos no campo internacio- grupos políticos de esquerda e a orga-
nal. nização dos trabalhadores urbanos.
Desta forma, puderam-se ver no cená-
Segundo Ianni (1971), as principais rio nacional lutas políticas associadas a
causas foram: a possibilidade de o Bra- projetos de modernização exigidos pe-
sil ser independente e ter ascendência lo desenvolvimento urbano industrial
sobre os países da América Latina e a e a constituição de um proletariado
liderança norte americana sobre o urbano que passa a apresentar, de
mundo capitalista e, ainda, os acordos forma mais pontual, suas reivindica-
internacionais definirem sua liderança ções por melhores condições de vida e
exclusiva sob a América Latina. Do trabalho.
ponto de vista da política interna, um
aspecto que punha em risco a seguran- O Estado Militar, que teve início em
ça do poderio econômico, foi a ascen- abril de 1964, buscou a estabilização
são de movimentos de esquerda que econômica com prevalência no inves-
ameaçavam a ordem e o poder bur- timento urbano industrial. Com ele,
guês. A participação popular após a implantou-se um regime de repressão
década de 1940 foi se modificando mo- que acabou por desagregar o nacional
tivada pela luta política que exigiu, populismo que vigia até então. A aná-
tanto da direita como da esquerda, no- lise de Celso Furtado recolocada por
vas estratégias de luta pelo poder: Cardoso (1993) indica a reação dos ato-
res políticos de então, sobretudo, das
Embora o populismo ainda perdurasse
classes médias que passaram a desen-
muito além de 1945, aceitando as pres-
sões populares e manipulando seus an- volver as seguintes ações:
seios em nome da ordem instituída, pa-
a) luta pela retomada da democracia
rece claro que as alianças partidárias ex-
formal; b) tentativas, a partir da juven-
perimentavam o impacto causado pela
tude, de mobilização das massas especi-
crescente força das reivindicações dos
almente as rurais, para contrapor-se ao
trabalhadores (VIEIRA, 1987, p.20).4
Estado Militar; c) infiltração do estamen-
to militar por ideologias favoráveis ao
A relação entre Estado e sociedade ci-
desenvolvimento autenticamente nacio-
vil foi tomando contornos diferentes nal, ideologias estas que também encon-
numa mescla de ditames econômicos e tram base em setores de classe média
políticos externos, mudanças nos inte- (CARDOSO, 1993, p. 59).
resses da economia interna, sobretudo
com a passagem do modelo agroexpor- Neste sentido, não apenas as formas de
tador para o urbano industrial, a mul- repressão e controle do Estado deram
conta de conter as pressões, foi neces-
sária a inclusão de algumas forças so-
4 No livro Estado e Miséria Social no Brasil de ciais tais como: as classes médias e al-
Getúlio a Geisel, Evaldo Vieira faz importantes
guns setores das Forças Armadas. Ca-
associações entre aspectos econômicos e políti-
cos no Brasil e a instituição e implementação
minharam de forma plasmada o proje-
de políticas sociais.
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to econômico dependente associado 5 e so de democratização no Brasil, coloca


o processo político. O modelo político a década de 1940 como o período em
por um lado, associava as classes mé- que a democracia rompe com o sim-
dias com o projeto de um desenvolvi- ples formalismo e vai tomando os con-
mentismo industrial dependente e, por tornos de uma participação popular
outro, um sistema repressor que desa- efetiva.
tivou organizações de classe com forte
característica de uma sociedade politi- O mesmo autor, porém, aponta para os
camente fechada. Os instrumentos pa- limites desta forma de organização,
ra isso, além da repressão militar, fo- ressaltando o fato de o Estado se apre-
ram a centralização administrativa e a sentar multifacetado e emaranhado de
burocratização do Estado. compromissos com os vários segmen-
tos tanto da direita quanto da esquer-
A abertura política e a reconstrução do da. Um dos problemas deste tipo de
Estado de Direito traz à tona a discus- organização ou desorganização parti-
são da relação entre Estado e sociedade cipativa é que as massas ficam à mercê
civil, agora dentro das conformações de manipulações de cunho clientelista,
da democracia. As características que semelhantes às utilizadas pelo corone-
este novo momento político apresenta, lismo, também difundidas nos espaços
estão diretamente associadas a outros urbanos.
momentos de vivência democrática no
país. Para Furtado (1979), esta prática de-
mocrática pode ter sido determinada
Nas décadas de 1940 e 1950 a defesa da tanto pelo ritmo lento pelo qual se ins-
democracia tinha em seu cerne a preo- tituiu a democracia formal no Brasil,
cupação de incorporar a classe traba- quanto pelas resistências em torno de
lhadora ao processo político com o ob- uma organização, em que as chamadas
jetivo de controlar as pressões por ela massas populares pudessem expressar
exercidas sobre o Estado. seus interesses.

O período do populismo apresentou A defesa da democracia passou a ser


uma forma de relação entre o Estado e bandeira dos mais diversos grupos
a população. A marca deste período intelectuais6 e da classe dominante.
era o trato direto com as lideranças Para estes últimos, a democracia signi-
populistas e as reivindicações de mas- ficava a possibilidade de melhorar as
sa. Weffort (1978), ao analisar o proces-

6 A relação dos intelectuais e a democracia foi


5 Ianni (1971) no livro O Colapso do Populismo tratado por Pécaut em seu livro Os intelectuais e
no Brasi, ao falar sobre os modelos de desen- a Política no Brasil: entre o povo e a nação de 1990.
volvimento do Brasil denomina-os de exporta- Ao analisar os anos 54-64 aponta para a pouca
dor, substituição, associado . O modelo asso- participação política partidária deste segmento
ciado refere-se ao período da ditadura militar e a defesa da democracia real, identificando o
no qual há a combinação de empresas brasilei- povo à nação.
ras e estrangeiras.
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relações econômicas de domínio exter- O destaque não foi apenas para a di-
no, portanto passaram a compor gru- versidade de sujeitos políticos que
pos organizados como a Ação Demo- permitiu uma característica própria
crática Popular (ADEP) (RESENDE, para o fim da ditadura militar, mas,
1996). sobretudo a politização das lutas que
foram de inicio mais pontuais como o
Alguns grupos de esquerda entendiam movimento sindical, as comunidades
que o cerne da luta deveria ser a possi- eclesiais de base, as associações de mo-
bilidade de a população constituir-se radores e foram se transformando em
em sujeitos políticos de transformação lutas pela reconstrução do Estado de
e a questão da democracia não compu- Direito no Brasil. 7
nha estes interesses, ao contrário, signi-
ficava aspectos a serem superados para Se por um lado, o processo que deu
a constituição de um novo projeto na- fim ao autoritarismo militar pode ser
cional. A democracia passou a ser uti- visto como aceitação de uma proposta
lizada pela direita como instrumento de negociação deste regime, já desgas-
de desarticulação e enfrentamento dos tado e internacionalmente criticado
grupos opositores, chegando ao final pelo desrespeito aos direitos humanos,
da década de 1960 com proposição o- gerando uma liberação controlada e
posta à ideia de transformação social: negociada dentro do próprio Estado,
por outro lado, a importante reação da
Por um lado, o regime militar e seu sociedade civil organizada, mobilizan-
grupo de poder insistiam em que suas do suas forças adquiriu capacidade de
medidas ditatoriais eram a expressão resistir ao autoritarismo. Neste sentido,
da verdadeira democracia que convi- a abertura democrática significou um
nha ao país. Por outro, parte da es- movimento dialético de confronto e
querda mostrava-se empenhada numa correlação de forças.
transformação revolucionária e não via
com bons olhos qualquer menção à Por se tratar de um processo de lutas e
palavra democracia (RESENDE, 1996, conquistas, a democracia no Brasil foi
p.36). suscitando adjetivações como partici-
pativa, democracia como ação política,
A construção de uma sociedade demo- democracia social, indicando a neces-
crática, que historicamente sempre foi sidade de articular as diversas dimen-
frágil no Brasil, demandaria a partici- sões institucionais, econômicas e polí-
pação efetiva da classe trabalhadora no ticas.
processo político. Isto significaria a
emergência dos movimentos sociais o
7 Sader (1988) em seu livro Quando os novos
que foi intensificado a partir do final
atores entram em cena cumpre um papel impor-
da década de 1970 e nos anos 1980.
tante em delinear a participação dos movimen-
Sader (1988) destaca a importância dos
tos sociais no processo de redemocratização do
movimentos sociais organizados.
Brasil.
.

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Estas dimensões estão postas por ter-relação entre ambos. Percebe-se,


Chauí (1997) ao discutir as condições porém, a dominação dos interesses
sociais para a democracia. Mais do que econômicos. A reversão desta tendên-
a defesa da liberdade (bandeira dos cia dependeria de uma recolocação nas
liberais) ou da igualdade (bandeira das agendas políticas da questão das polí-
esquerdas) a democracia deve ser en- ticas sociais, diretamente relacionadas
tendida como uma forma de vida. com a sobrevivência da democracia. A
esse respeito, Kühn (1971) coloca que,
Se, na tradição do pensamento democrá-
nos países nos quais se tem maior a-
tico, democracia significa: a) igualdade,
b) soberania popular, c) preenchimento cesso aos bens de consumo tem-se
das exigências constitucionais, d) reco- maior participação política, e que o
nhecimento da maioria e dos direitos da inverso é verdadeiro, ou seja, maior
minoria, e) liberdade, torna-se óbvia a participação política dá maior condição
fragilidade democrática no capitalismo
de defender uma sociedade mais igua-
(CHAUÍ, 1997, p.141).
litária.
Segundo a autora, deve-se acrescentar
Além disso, esta discussão pressupõe a
a esta discussão pendular entre a i-
concepção de um Estado que suporta a
gualdade e a liberdade, a questão da
correlação de forças e a necessidade da
exploração de classe e o papel do Esta-
conquista de hegemonia através da
do nela, o que necessariamente, reme-
ação da sociedade civil, considerando a
teria a pensar a alienação e o Poder.
organização política dos vários grupos
Três sujeitos estão postos nesta discus- sociais. Dá-se neste contexto a discus-
são: o Estado, a sociedade civil e a so- são dos graus de consciência (econô-
ciedade política, cujo caminho para a mico-corporativo, a solidariedade en-
democracia seria a possibilidade de tre os membros de um grupo social e o
uma atuação rumo à hegemonia das grau que supera o círculo corporativo e
classes populares e à “[...] vida social incorpora interesses de grupos subor-
como coisa pública” (CHAUÍ, 1997, dinados). Esta participação é possível
p.183). Está implícita nesta colocação a por haver reivindicações e até mesmo
concepção de Estado que reconhece a reformas, mas sem alterações na estru-
correlação de forças expressadas pelas tura do Estado (GRAMSCI, 1991).
lutas das minorias e pelos movimentos
O estudo das políticas sociais, mais
mais amplos e populares, de forma a
especificamente daquelas resultantes
superar o modelo de grupos de pres-
da relação Estado e sociedade civil,
são que tinha vigorado até então no
recolocou o tema do Estado brasileiro
Brasil.
aqui posto de forma sucinta apenas
Conclusão para demarcar sua constituição eco-
nômica e política. Se por um lado, a
A reflexão sobre das políticas sociais política social é uma invenção do mo-
não se circunscreve apenas ao campo do capitalista de produção e do gover-
da economia ou da política, mas à in- no liberal, por outro, a história nos
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mostra a necessidade de existirem su- FERNANDES, F. A revolução burgue-


jeitos sociais que engendrem lutas e sa no Brasil: ensaio de interpretação
conquistas para a constituição de direi- sociológica. Rio de Janeiro: Zahar,
tos sociais. 1975.

No caso brasileiro foi necessário articu- FURTADO, C. Brasil: da república oli-


lar a luta por liberdades democráticas e gárquica ao Estado militar. Rio de Ja-
o aprimoramento de direitos políticos neiro: Paz e Terra, 1979. (Brasil Tempos
com a garantia de direitos sociais. Nes- Modernos).
te pequeno estudo, foi nossa intenção
explicitar o peso da história e do mo- GRAMSCI, A. Maquiavel, a política e
delo brasileiro que, muito embora ilu- o Estado moderno. 8. ed. Rio de Janei-
minem as reflexões atuais sobre as difi- ro: Civilização Brasileira, 1991.
culdades de mudanças no plano políti-
IANNI, O. O colapso do populismo
co-ideológico e no cotidiano da gestão
no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Civili-
das novas proposições, também permi-
zação Brasileira, 1971.
tem coadunar as explicações sobre as
possibilidades de limites de rompi- KÜHN, Reinhard. El liberalismo. In:
mento com as antigas práticas e propo- ABENDROTH, W.; LENK, K. Intro-
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