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UNIVERSIDADE VILA VELHA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA ANIMAL

AVALIAÇÃO IN VITRO DA PROLIFERAÇÃO, APOPTOSE E ESTRESSE


OXIDATIVO DE CÉLULAS TRONCO MESENQUIMAL SOB DIFERENTES
CONCENTRAÇÕES DE DEXAMETASONA

DARIELE DOS SANTOS VIEIRA GONÇALVES

VILA VELHA-ES
MAIO/2020
UNIVERSIDADE VILA VELHA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA ANIMAL

AVALIAÇÃO IN VITRO DA PROLIFERAÇÃO, APOPTOSE E ESTRESSE


OXIDATIVO DE CÉLULAS TRONCO MESENQUIMAL SOB DIFERENTES
CONCENTRAÇÕES DE DEXAMETASONA

Dissertação apresentada à Universidade Vila


Velha, como pré-requisito do Programa de
Pós-graduação em Ciência Animal, para
obtenção do grau Mestre em Ciência Animal

DARIELE DOS SANTOS VIEIRA GONÇALVES

VILA VELHA-ES
MAIO/ 2020
ESTE TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO FOI ELABORADO SEGUNDO AS NORMAS DA
REVISTA GENETICS AND MOLECULAR RESEARCH
DARIELE DOS SANTOS VIEIRA GONÇALVES

AVALIAÇÃO IN VITRO DA PROLIFERAÇÃO, APOPTOSE E ESTRESSE


OXIDATIVO DE CÉLULAS TRONCO MESENQUIMAL SOB DIFERENTES
CONCENTRAÇÕES DE DEXAMETASONA

Dissertação apresentada à Universidade Vila


Velha, como pré-requisito do Programa de Pós-
graduação em Ciência Animal, para obtenção do
grau Mestre em Ciência Animal

Aprovada em: ______/_______/__________.

Banca Examinadora:

_____________________________________________________________
Cristiane dos Santos Honsho (UVV)

_____________________________________________________________
Napoleão Martins Argôlo Neto (UVV)

___________________________________________________________________________

Betânia Souza Monteiro (UVV)

(orientador)

ii
Dedicatória

Dedico este trabalho a minha familia, por todo apoio


e estímulo ao longo desta trajetória.

iii
Agradecimentos

A Universidade Vila Velha, pela infraestrutura, segurança no campus e por ter me


recebido, juntamente com o governo, com a bolsa Prosup Capes.

Aos meus pais, Antônio e Daniela, por todo amor, carinho e compreensão ao logo
dos anos, por terem me proporcionado a melhor educação deste o princípio,
apoiando cada sonho e acreditando no meu potencial, vocês sempre foram minhas
inspirações de pessoas.

A Betânia Monteiro, que me acompanha como orientadora desde a graduação e me


deu a oportunidade de conhecer um pouco mais sobre a veterinária e a pesquisa
científica, obrigada pelos conhecimentos transmitidos e por ser uma inspiração
profissional.

Ao Laboratório de Células Tronco e Terapia Celular, pelo acolhimento,


ensinamentos transmitidos ao longo dos anos e pela ajuda no desenvolvimento
desse trabalho.

Aos meus professores, técnicos e colegas de laboratório que tive a honra de


conhecer e aprender.

A minha avó Cecília, que me acompanha há 26 anos, acompanha toda a minha


trajetória e foi a maior incentivadora para iniciar o mestrado, sou eternamente grata
a Sra.

Ao meu irmão Daniel, que apesar da diferença de idade, sempre me apoiou e teve
paciência comigo.

Aos tios e tias, que me apoiaram e acreditaram em mim e deram o suporte


necessário, obrigada.

Aos meus amigos, por me apoiarem e me ouvirem, obrigada.

Aos meus filhos, Margot por todo o carinho e alegria transmitida, e ao Pretinho que
não está presente, mas que esteve comigo em todos os meus momentos de
estudos, obrigada pelo carinho e amor incondicional.

iv
GONÇALVES, Dariele dos Santos Vieira. M.Sc, Universidade Vila Velha – ES, maio
de 2021. Avaliação in vitro da proliferação, apoptose e estresse oxidativo de
células tronco mesenquimal sob diferentes concentrações de dexametasona.
Orientador: Betânia Souza Monteiro.

Resumo

Em diversas afecções clínicas, como por exemplo em hipoplasias ou aplasias


medulares, sabe-se que pacientes beneficiam-se do uso contínuo de anti-inflamatório
esteroidal, em baixas doses, e que a retirada desses medicamentos pode, às vezes,
comprometer a vida do animal. Sabe-se também que, até o momento, as referências
técnico-científicas disponíveis desaconselham o uso dessa classe farmacológica
associado as células tronco, pela possibilidade da interação inibir os efeitos anti-
inflamatórios e imunossupressores dessas células indiferenciadas. Entretanto, e se
houver a possibilidade de realizar a terapia com células-tronco para essas afecções,
devemos simplesmente cessar o uso do anti-inflamatório e iniciar a infusão de
células? Podemos, inicialmente, associar os tratamentos? Até que ponto a atividade
das células tronco mesenquimal estariam comprometidas num organismo sob a
influência da dexametasona? Na tentativa de obtermos algumas respostas, o presente
estudo teve como objetivo avaliar os efeitos in vitro do anti-inflamatório esteroidal
sobre as culturas de MSC derivadas de tecido adiposo, sob diferentes concentrações
de dexametasona comercial, veterinária (0,2%) e humana (0,4%), avaliando a
proliferação celular, apoptose e estresse oxidativo. Para experimentação in vitro, e
teste do efeito dos medicamentos sobre linhagem de célula tronco, foram utilizadas
placas de 24 poços nos quais foram ser semeadas 5,0 x 104 células MSC por poço
nos seus respectivos experimentos, em um volume final de 1mL de meio DMEM
suplementado e acrescentado as concentrações de 16,0 µg/mL, 31,0 µg/mL, 62,5
µg/mL, 125,0 µg/mL e 250,0 µg/mL de dexametasona. Constatou-se que nas
concentrações mais altas de Dexametasona veterinária houve maiores danos às
células, aumentando o estresse oxidativo e apoptose, enquanto na Dexametasona
humana as taxas de proliferação, apoptose e ROS similares ao encontrados no grupo
controle. Observou-se nessa pesquisa um comportamento divergente entre os dois
produtos comerciais vinculados ao princípio Dexametasona. A Dexametasona
veterinária gerou os resultados compatíveis com as referências técnicas publicadas
em artigos, como diminuição de proliferação, aumento de apoptose e aumento na
produção de ROS, fato que, contra-indica a associação terapêutica clínica desse
fármaco com as células tronco. Todavia, os dados obtidos nos abrem perspectivas
futuras para a realização de estudos clínicos utilizando a Dexametasona humana e
terapia com células tronco, potencializando as possibilidades terapêuticas para
diversas afecções.

Palavras-chave: sinalização celular, terapia celular, imunomodulação, doença


infectocontagiosa.

v
GONÇALVES, Dariele dos Santos Vieira. M.Sc, University of Vila Velha – ES, may of
2021. In vitro effects of steroidal anti-inflammatory on mesenchymal stem cell
evaluating cell proliferation, apoptosis and oxidative stress. Advisor: Betânia
Souza Monteiro.

Abstract

In several clinical conditions, such as spinal aplasia or hypoplasia, it is known that


patients benefit from the continued use of steroidal anti-inflammatory drugs, in low
doses, and that the withdrawal of these medications can sometimes compromise the
life of the animal. It is also known that, so far, the available technical-scientific
references advise against the use of this pharmacological class in association with
stem cells, due to the possibility of inhibition of the anti-inflammatory and
immunosuppressive effects caused by these undifferentiated cells. However, and if
there is a possibility of using stem cell therapy for these diseases, should we simply
stop using the anti-inflammatory and start infusing only the cells? Can we initially
associate treatments? To which extent would the activity of the mesenchymal stem
cells be compromised in an organism under the influence of dexamethasone? In an
attempt to obtain some answers, the present study aimed to evaluate the in vitro effects
of steroidal anti-inflammatory on MSC cultures derived from adipose tissue, under
different concentrations of commercial, veterinary (0.2%) and human dexamethasone
(0.4%), evaluating cell proliferation, apoptosis and oxidative stress. For in vitro
experimentation, and testing the effect of drugs on stem cell lineage, 24-well cell
culture plates were used, in which 5.0 x 104 MSC cells were seeded per well in their
respective experiments, in a final volume of 1mL of supplemented DMEM medium and
added concentrations of 16.0 µg/mL, 31.0 µg/mL, 62.5 µg/mL, 125.0 µg/mL and 250.0
µg/mL of dexamethasone. It was found that at higher concentrations of veterinary
Dexamethasone there was greater damage to cells, increased oxidative stress and
apoptosis, while with human Dexamethasone the rates of proliferation, apoptosis and
ROS were similar to those found in the control group. In this research, a divergent
behavior was observed between the two commercial products linked to the active
ingredient of Dexamethasone. Veterinary Dexamethasone generated results
compatible with the technical references published in articles, such as decreased
proliferation, increased apoptosis and increased ROS production, a fact that
contraindicates the clinical therapeutic association of this drug with stem cells.
However, the data obtained open up future perspectives for clinical studies using
human Dexamethasone and stem cell therapy, enhancing the therapeutic possibilities
for several conditions.

Key words: cell signaling, cell therapy, immunomodulation, infectious-contagious


disease

vi
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO GERAL 1

1.1 Células tronco 1


1.2 Anti-inflamatório 5
2. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 9
3. ARTIGO CIENTÍFICO 13

Resumo 13
Introdução 13

Material e Métodos 15

Cultivo de Células tronco 15

Fármacos anti inflamatórios 16

Exposição in vitro da linhagem de células tronco às amostras de


medicamentos 16

Análise de proliferação celular 16

Ensaios de viabilidade celular


Avaliação de níveis de estresse oxidativo 17

Resultados 18
Discussão 22
Conclusão 24
Referências bibliográficas 25

ii
INTRODUÇÃO GERAL

1.1 CÉLULAS - TRONCO

As células tronco (CT) são células indiferenciadas, tendo como principal


característica sua capacidade de autorrenovação, pois se multiplicam mantendo seu
status indiferenciado, o que proporciona uma reposição ativa de sua população de
maneira uniforme nos tecidos, além da possibilidade de se diferenciarem em diversos
tipos celulares (BYDLOWSKI et al., 2009).

Essa classe celular é caracterizada de acordo com seu potencial e a sua


origem. Quanto ao potencial, são divididas em totipotentes, pluripotentes,
multipotentes e unipotentes. As totipotentes são células indiferenciadas que podem
dar origem a qualquer tecido e gametas, estando presente nas blastocele do embrião
(DE SOUZA et al., 2003; DEL CARLO et al., 2009), as pluripotentes podem originar
qualquer tecido, e as multipontentes, que estão presentes no indivíduo adulto, são
aquelas com capacidade limitada de originar alguns tecidos (DE SOUZA et al., 2003).

Quanto as suas origens classificam-se como Células tronco Embrionárias


(CTE), Células tronco Somáticas (CTS) (CLARKE et al., 2000; MORSCZECK et al.,
2008) e células tronco pluripotentes induzidas (IPscell) (NAKAGAWA et al., 2008).

Na linhagem CTS, existem as Células tronco Hematopoiéticas (CTH), que


formam todos os tipos de células sanguíneas, e as Células tronco Mesenquimais
(MSC) (NARDI, 2007; DEL CARLO et al., 2009). As MSC são uma linhagem de
células-tronco somáticas presentes em pequenas quantidades em regiões
perivasculares de todos os tecidos adultos (MEIRELLES et al., 2008; PINTO FILHO
et al., 2013). São células multipotentes capazes de se diferenciar e produzir qualquer
tipo celular necessário num processo de reparação (PITTENGER et al.,1999;
ABDALLAH E KASSEM, 2008; SARUKHAN et al., 2015); manter a capacidade de
autorrenovação (BYDLOWSKI et al., 2009; HODGKISS-GEERE et al., 2012) e
apresentarem maior plasticidade, originando tecidos mesodermais e não
mesodermais (DEL CARLO et al., 2009; SARUKHAN et al., 2015).

Em condições adequadas de cultivo, apresentam morfologia fibroblastóide


(MONTEIRO et al., 2009). Como não há marcadores específicos para as MSC, suas
características são definidas por 3 critérios: adesão da cultura em material plástico,
1
capacidade de se diferenciar em diferentes tecidos e expressão de marcadores de
antígeno de superfície, como CD44, STRO-1, CD73, CD90, CD105 e ausência de
expressão de CD14, CD34 e CD45 (HODGKISS-GEERE et al., 2012). Além disso,
devido à baixa expressão do MHC-I e à falta de expressão do MHC-II juntamente com
moléculas coestimuladoras, como CD80, CD40 e CD86, as MSC são incapazes de
causar alorreatividade substancial, assim protegendo-as da lise das células natural
killer (NK) (RASMUSSON et al., 2003).

Acredita-se que as MSC exerçam seus efeitos regenerativos por meio da


diferenciação e modulação da resposta inflamatória (CHEN et al., 2014), por meio da
expressão de um grande número de moléculas bioativas, como as citocinas, proteínas
de matriz extracelular, moléculas de adesão e os receptores para fatores de
crescimento, permitindo interações com demais células (HUSS, 2000). Essas
moléculas atuam modulando a resposta inflamatória, angiogênese e mitose das
células envolvidas no processo de reparação tecidual, o que as tornam de grande
importância terapêutica pelo seu potencial imunomodulatório (WAN et al., 2008).

Em um indivíduo saudável, o organismo é capaz de se proteger contra


agressões com receptores de patógenos por meio do sistema imunológico próprio
(ENGLISH et al., 2013). O processo inflamatório envolve um conjunto complexo de
mecanismos de defesa que atuam para restaurar o equilíbrio homeostático nos
organismos após danos ou invasão de patógenos. Esta resposta imune consiste na
atividade de várias células do sistema imunológico de uma maneira altamente
complexa.

A sequência dos eventos é caracterizada pelas fases vascular e celular, as


quais ocorrem simultaneamente (BECKER, 2013), e há diferentes etapas da reação
inflamatória, que são bem definidas (ABBAS, 2015).

O processo inflamatório agudo é caracterizado pela curta duração e


apresentação dos sinais cardeais da inflamação: dor, calor, rubor e tumor, além da
perda de função (TASAKA, 2017), e a forma que o organismo encontra de lidar com
as infecções e lesões teciduais é disparando uma cascata de sinalização, aumentando
a concentração de proteínas plasmáticas, leucócitos, fluido derivado do sangue
(ABBAS, 2015) e promovendo a liberação de citocinas, quimiocinas e macrófagos
(ENGLISH et al., 2013; NATHAN et al., 2002). O processo inflamatório crônico

2
permanece por tempo indeterminado e varia de acordo com os mediadores humorais
e celulares (TASAKA, 2017).

As primeiras reações ocorrem com ajuda de células residentes como


macrófagos e células dendríticas (NATHAN et al., 2002; ABBAS, 2015), secretando
citocinas pró-inflamatórias, como interleucina-8 (IL-8) (LIDDIARD et al., 2011), fator
de necrose tumoral (TNF-α), (LIDDIARD et al., 2011; ABBAS, 2015), interleucina -1
(IL-1), que tem ação similar ao TNF, e interleucina-6 (IL-6), que possui um papel
importante com efeitos locais e sistêmicos. Com o recrutamento de leucócitos para a
área afetada, haverá grande número de neutrófilos, monócitos (ABBAS, 2015),
fibroblastos e células endoteliais. Macrófagos são recrutados para o local e o sistema
complemento é concomitantemente ativado (LIDDIARD et al., 2011).

A fase seguinte da inflamação aguda é de resolução por agentes anti-


inflamatórios, como esteróides, IL-10, óxido nítrico, TGF-b ou células T reguladoras
(LIDDIARD et al., 2011). Durante esse processo, o componente exsudativo do
sangue, imunoglobulinas ou fibrinas contendo plasma fluem para o local inflamado
causando edema. Este inchaço do tecido causa a evacuação do sistema linfático,
através do qual os antígenos são reconhecidos pelas células T e B do sistema
adaptativo (SERHAN et al., 2007). A agudização da reação pode ser seguida pela
cronificação com base na dinâmica de resolução do processo inflamatório.

A inflamação crônica é perigosa para os tecidos devido seu envolvimento no


estabelecimento ou progressão de distúrbios neurodegenerativos, doenças
cardiovasculares e autoimunes, câncer e várias doenças metabólicas (DE NARDO &
LATZ, 2011). Portanto, a regulação da resposta inflamatória é de extrema importância
para a restauração da integridade do tecido e sua homeostase.

Estudos in vitro fornecem informações sobre os efeitos das MSC na resposta


inata e adaptativa (ENGLISH et al., 2013), sendo elas capazes de interferir na resposta
inata por meio de interações com o sistema complemento, macrófagos, células
dendríticas, neutrófilos e células NK.

A interferência na resposta imune adaptativa se dá por meio de interações com


as células T regulatórias (ENGLISH et al., 2013; NAUTA & FIBBE, 2007). Pouco se
sabe sobre as interações com as células B, mas alguns estudos sugerem que as MSC
podem modular sua proliferação e função (ENGLISH et al., 2013). Na presença de

3
IFN-y, as células tronco são capazes de reduzir a proliferação das células B, pela ação
da enzima idoleamina 2,3-dioxigenase (IDO), suprimindo a resposta proliferativa de
células efetoras (NAUTA & FIBBE, 2007).

A capacidade imunomoduladora das MSC parece estar relacionada à sua


interação com as células T-CD4 e T-CD8 e seus mediadores pró-inflamatórios. Essa
classe de células-tronco modula o sinal inflamatório por meio da regulação negativa
dos mediadores secretados e da ativação de citocinas anti-inflamatórias (SINGER et
al., 2011). A capacidade de inibir a proliferação de células T estimuladas in vitro tem
sido bem descrita para as MSC em um grande número de espécies (KANG et al.,
2008; NAUTA & FIBBE, 2007).

Em cães, as MSC foram capazes de aumentar a IL-6 e o fator de


transformação do crescimento beta (TGF-β) e diminuir TNF-α (KANG et al., 2008).

A supressão realizada pelas MSC é mediada pela produção de uma variedade


de fatores solúveis (WANG et al., 2012), entre as quais estão; a presença de interferon
gama (IFN-g), TNF- α, interleceucina-1b (IL-1b), por regulação positiva na expressão
de óxido nítrico induzível (iNOS) em roedores (CHEN et al., 2014) ou IDO em humanos
(CHEN et al., 2014; NAUTA & FIBBE, 2007), além da presença de IL-10, fator de
crescimento de hepatócitos (HGF) e prostaglandina (PGE 2) (WANG et al.,2012).

As células dendríticas (CD) desempenham um papel fundamental na indução


de imunidade e tolerância, dependendo da ativação e estágio de maturação, por meio
de citocinas nos locais de inflamação; as MSC interferem na diferenciação, maturação
e função dessas células, dificultando sua capacidade de induzir a ativação de células
T, diminuindo a produção de citocinas pró-inflamatórias como TNF-α, INF-y e IL-12 e
aumentando a produção de citocinas anti-inflamatórias IL-10, resultando na formação
de CD imaturas que exibem um fenótipo supressor ou inibitório (NAUTA & FIBBE,
2007).

Sugere-se que as MSC suprimem a proliferação e produção de células NK, que


são responsáveis por atividade citolítica, induzida por IL-12 ou IL-15 e a produção de
INF-y. O efeito inibitório das MSC na citotoxicidade das células NK requer um contato
célula-célula. A via de secreção de PGE2 pela MSC afeta em parte a proliferação de
células NK, enquanto a ativação de TGF-b a recupera parcialmente. O bloqueio de
ambos restaura completamente a capacidade de proliferação, sugerindo que há

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diferentes mecanismos para a supressão da atividade proliferativa das células NK.
(NAUTA & FIBBE, 2007).

A capacidade das células tronco de modificar a resposta imune tem sido a base
para diversos estudos clínicos e em uma variedade de condições. Os avanços obtidos
pelas pesquisas com células tronco vêm impulsionando as terapias para tratamento
de várias afecções na medicina veterinária. Cabe salientar que os modelos de
pesquisas utilizando as terapias em animais, quando bem fundamentados, podem ser
aplicados a pacientes humanos, atingindo, assim, uma importância social mais
impactante na sociedade (MONTEIRO et al., 2009; MUNIR et al., 2018).

Apesar de haver muitos estudos comprovando os benefícios da terapia celular


com células tronco em doenças inflamatórias, sabe-se que há distúrbios em que é
necessário o uso prolongado de anti-inflamatórios não esteroidais ou esteroidais, e há
a recomendação de não se utilizar as MSC em conjunto com essas medicações, pois
pode inibir o efeito anti-inflamatório das células (CHEN et al., 2014).

2. ANTI-INFLAMATÓRIOS

Quando um processo inflamatório se encontra exacerbado, substâncias devem


ser utilizadas para modelar essa resposta, tais como os anti-inflamatórios, podendo
estes serem esteroidais e não esteroidais (TASAKA, 2017).

2.1 ANTI-INFLAMATÓRIOS ESTEROIDAIS

Os glicocorticóides apresentam atividade anti-inflamatória e imunossupressora,


não sendo possível separar essas duas características dos seus efeitos. Nos
glicocorticóides sintéticos essas atividades foram ampliadas e a atividade
mineraloreguladora foi diminuída ou abolida, obtendo-se os anti-inflamatórios
esteroidais (JÉRICO & MARCO, 2017).

Capazes de bloquear as manifestações mais precoces do processo


inflamatório, como dor, calor e rubor, até as tardias como proliferação tecidual e
reparação, os anti-inflamatórios esteroidais exercem suas funções atuando em vários

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aspectos da resposta orgânica às lesões, influenciando eventos celulares, vasculares
e o metabolismo de mediadores pró-inflamatórios (JÉRICO & MARCO, 2017)

O efeito imunossupressor dos corticosteróides é dose-dependente (GILES et


al., 2018) e atua através da inibição da função dos leucócitos (BECKER, 2013),
impedindo o acesso destes ao local de inflamação, interferindo ainda em sua função
e na função de fibroblastos e células endoteliais, suprimindo assim a produção e os
efeitos dos fatores humorais (BOUMPAS et al.,1993), e ao mesmo tempo estimulando
sua liberação pela medula óssea.

A capacidade de eliminar organismos invasores por metabolismo oxidativo é


inibida pelo uso de anti-inflamatórios esteroidais (JÉRICO & MARCO,2017), e o
mesmo ocorre com os macrófagos, que também são afetados pela ação dos
esteróides (CLAMAN,1975; SWARTZ & DLUHY, 1978), que inibem a aderência
endotelial de leucócitos e diapedese através da parede capilar (SWARTZ & DLUHY,
1978).

Os corticosteroides também são capazes de afetar a imunidade de origem


celular, pois interferem na apresentação dos antígenos aos receptores de membrana
dos monócitos fagocitários (SWARTZ & DLUHY, 1978).

Causadores de linfopenia profunda (CLAMAN,1975) os corticosteroides


promovem a redistribuição dos linfócitos do compartimento intravascular para outros
compartimentos linfóides, particularmente a medula óssea (BOUMPAS et al.,1993;
CLAMAN,1975). Essa redução no número de linfócitos diminui também sua
participação nas reações imunológicas e inflamatórias (JÉRICO & MARCO, 2017).

Os linfócitos T são os mais afetados. Os corticoides exógenos são tóxicos para


as células T imaturas, suprimindo a proliferação destas mediadas por IL-12 e, ainda,
a produção de citocinas (GILES et al., 2018). Em alguns casos, essas células também
podem ser susceptíveis à lise por apoptose (BOUMPAS et al.,1993).

A modulação dos linfócitos B pode ser direta ou indireta, mediada pelos efeitos
sobre a população de monócitos e linfócitos T (JÉRICO & MARCO, 2017).

Os eventos vasculares incluem a estabilização da integridade microvascular,


por meio de eventos indiretos como a supressão das ações dos polimorfonucleares e

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das sínteses de mediadores pró-inflamatórios como as prostaglandinas, e de agentes
vasoativos ou trombogênicos (JÉRICO & MARCO, 2017).

A inflamação se dá por meio da atuação dos metabolismos dos mediadores


imunoestimulantes e pró-inflamatórios, aumentando a transição de genes de
citocinas, quimiocinas, fatores de crescimento, moléculas de adesão celular, fatores
de complemento, imunorreceptores e enzimas importantes como a COX-2, e ainda o
ácido araquidônico, se caracterizando por uma série de eventos desencadeados a
partir da ocorrência de uma lesão na membrana celular, cujos os produtos finais são
as prostaglandinas (PG-2), leucotrienos e os tromboxanos. Os glicocorticóides agem
de forma a inibir a ação de enzimas como a fofolipase A-2 e a COX (JÉRICO &
MARCO, 2017)

A expressão da COX-2 pode ser inibida por glicocorticóides, IL-4, IL-10 e IL-14
(HILÁRIO, 2006). Inibem ainda a síntese de IL-1 alfa e do TNF alfa (MARCHIONNI,
2006).

A dexametasona (Dexa) é um importante glicocorticóide sintético que atua


como imunossupressor (WANG et al., 2012) e anti-inflamatório, apresentando maior
ação quando comparada aos outros esteróides como metilprednisolona e
prednisolona. É muito utilizada para tratamentos de doenças em fase aguda e crônica,
de caráter imunológico e alérgico (HOCHHAUS et al.,2001), e está entre os
glicocorticoides mais comumente descritos para uso sistêmico (GILMAN et al., 2007).

O mecanismo de ação dos glicocorticóides ainda não foi totalmente esclarecido


(CHROUSES,1995). Apresentam biodisponibilidade via oral em torno de 80%, com
uma taxa de ligação à proteína plasmática de 68% e são excretados através da urina
(GILMAN et al. ,2007).

Embora a Dexa seja incorporada a meios de cultivo indutores de diferenciação


celular para induzir a diferenciação das MSC em condroblastos, miócitos e adipócitos
in vitro (WANG et al., 2012; SONG et al., 2009), há poucos relatos sobre os efeitos
desse fármaco sobre a atividade celular nesses meios. Dos estudos realizados, foram
avaliados apenas os efeitos da Dexa na apoptose e proliferação de MSC (SONG et
al., 2009).

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Em doses baixas, a Dexa promove proliferação e inibe a apoptose das MSC
(WANG et al., 2012). Quando utilizadas doses terapêuticas, suprime a proliferação e
interrompe o ciclo celular das MSC na medula óssea, contribuindo para a osteoporose,
osteonecrose, além da influenciar na morte celular (CHANG et al.,2007).

Estudos demonstraram que a utilização da Dexa pode prejudicar a atividade


imunossupressora das MSC, diminuindo a expressão de IFN-y, TNF-a e PGE2
(WANG et al.,2012), e inibindo a proliferação das células T, sob efeito dose
dependente. Pode ainda bloquear a fosforilação de STAT1 nas MSC ativadas por
citocinas inflamatórias e diminuir a expressão de iNOS e IDO, excetos das
quimiocinas, sendo capaz também de recrutar células inflamatórias (CHEN et al.,
2014).

Quando associada a micropartículas intracelular, foi relatado que a


dexametasona produz resultados semelhantes à ação da budesonida em relação à
expressão da IDO, um mediador primário imunomodulador das MSC. A associação
de glicocorticóides, seja budesonida ou dexametasona, em um quadro que apresenta
sinalização inflamatória, pode potencializar à níveis máximos a expressão dessa
enzima (ANKRUM et al., 2014).

Em diversas situações clínicas, sabe-se que pacientes beneficiam-se do uso


contínuo de anti-inflamatório esteroidal em baixas doses e que a retirada desses
medicamentos pode, às vezes, comprometer a vida do animal. Entretanto, e se houver
a possibilidade de realizar a terapia com células-tronco? Devemos simplesmente
cessar o uso do anti-inflamatório e iniciar a infusão de células? Podemos, inicialmente,
associar os tratamentos? Até que ponto a atividade das células tronco mesenquimais
estariam comprometidas num organismo sob a influência da dexametasona?

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2 REFERÊNCIAS

ABBAS A.K. Imunidade Inata. In: ABBAS A.K. Imunologia Celular e Molecular. 8 ed,
Editora Elsevier, 2015, Cap 4,p. 72-79.

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CHANG J.K, LI C.J, WU S.C. Effects of anti-inflammatory drugs on proliferation,


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11
3 OBJETIVOS

3.1 Objetivo geral

Avaliar se as diferentes concentrações de anti-inflamatório esteroidal em culturas de


células tronco mesenquimais interferem proliferação, viabilidade celular (apoptose) e
níveis de estresse oxidativo.

3.2 Objetivos específicos

1. Estabelecer cultura de células tronco mesenquimais derivadas do tecido


adiposo

2. Estabelecer protocolo e avaliar proliferação celular

3. Estabelecer protocolo e avaliar viabilidade celular

4. Estabelecer protocolo e avaliar estresse oxidativo

5. Comparar resultados e encontrar concentração que em se possa utilizar as


células tronco sem perder os efeitos

12
3. ARTIGO CIENTÍFICO

AVALIAÇÃO IN VITRO DA PROLIFERAÇÃO, APOPTOSE E ESTRESSE


OXIDATIVO DE CÉLULAS TRONCO MESENQUIMAL SOB DIFERENTES
CONCENTRAÇÕES DE DEXAMETASONA

D. S. V. Gonçalves1, L.B. Carvaho 1, D. Q. Costa1, F. O .Busato, C. E. Tadokoro 2 e B. S. Monteiro1

1 - Laboratório de Células Tronco e Terapia Animal (LCET), Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal, Universidade Vila Velha
(UVV), Vila Velha, ES, Brasil. CEP 29.102-920.
2 - Curso de Medicina Veterinária, Universidade Vila Velha (UVV), ES, Brasil.

Autor correspondente: B. S. Monteiro


E-mail: betania.monteiro@uvv.br

RESUMO

O presente estudo teve como objetivo avaliar os efeitos in vitro do anti-inflamatório esteroidal
sobre as culturas de MSC derivadas de tecido adiposo, sob diferentes concentrações de
dexametasona comercial, veterinária (0,2%) e humana (0,4%), avaliando a proliferação celular,
apoptose e estresse oxidativo. Para experimentação in vitro, e teste do efeito dos medicamentos
sobre linhagem de célula tronco, foram utilizadas placas de 24 poços nos quais foram ser
semeadas 5,0 x 104 células MSC por poço nos seus respectivos experimentos, em um volume
final de 1mL de meio DMEM suplementado e acrescentado as concentrações de 16,0 µg/mL,
31,0 µg/mL, 62,5 µg/mL, 125,0 µg/mL e 250,0 µg/mL. Constatou-se que nas concentrações
mais altas de Dexametasona veterinária houve maiores danos às células, aumentando o estresse
oxidativo e apoptose, enquanto na Dexametasona humana as taxas de proliferação, apoptose e
ROS similares ao encontrados no grupo controle. Observou-se nessa pesquisa um
comportamento divergente entre os dois produtos comerciais vinculados ao princípio
Dexametasona. A Dexametasona veterinária gerou os resultados compatíveis com as
referências técnicas publicadas em artigos, como diminuição de proliferação, aumento de
apoptose e aumento na produção de ROS, fato que, realmente, contra-indica a associação
terapêutica clínica desse fármaco com as células tronco. Todavia, os dados obtidos nos abrem
perspectivas futuras para a realização de estudos clínicos utilizando a Dexametasona humana e
terapia com células tronco, potencializando as possibilidades terapêuticas para diversas
afecções.

Palavras-chave: sinalização celular, terapia celular, imunomodulação, doença


infectocontagiosa.

INTRODUÇÃO

Os avanços obtidos pelas pesquisas com células tronco, vêm impulsionando as terapias para
tratamento de várias afecções na medicina veterinária.

As células tronco mesenquimal (MSC) são caracterizadas pela capacidade de autorrenovação e


capacidade de se diferenciar em várias linhagens celulares (BYDLOWSKI et al., 2009).

13
Estudos relatam a presença de 100-1000 vezes maior o número de células tronco em tecido
adiposo (ZUK et al., 2002).

Acredita-se que elas exerçam seus efeitos regenerativos por meio da diferenciação e modulação
da resposta inflamatória (CHEN et al., 2014), expressando um grande número de moléculas
bioativas, como as citocinas, proteínas de matriz celular, moléculas de adesão e receptores para
fatores de crescimento, permitindo interações com demais células (HUSS,2000). Além disso,
essas moléculas atuam na angiogênese e mitose das células envolvidas no processo de reparação
tecidual, o que as tornam de grande importância terapêutica pelo seu potencial
imunomodulatório (WAN et al., 2008).

Estudos in vitro fornecem informações sobre os efeitos das MSC na resposta inata e adaptativa
(ENGLISH et al., 2013), sendo elas capazes de interferir na resposta inata por meio de
interações com o sistema complemento, macrófagos, células dendríticas, neutrófilos e células
NK. A interferência na resposta imune adaptativa se dá por meio de interações com células T
regulatórias (ENGLISH et al., 2013; NAUTA & FIBBE, 2007).

Os glicocorticoides apresentam atividades anti-inflamatórias e imunossupressoras (JÉRICO &


MARCO, 2017). O efeito imunossupressor dos corticoides é dose-dependente (GILES et al.,
2018) e grande parte se dá pela inibição da função dos leucócitos (BECKER, 2013). Ocorre
inibição do acesso ao local de inflamação, interferência na função leucocitáriae de fibroblastos
e células endoteliais, supressão da produção e dos efeitos dos fatores humorais (BOUMPAS et
al., 1993) e, ao mesmo tempo, estimulação da liberação pela medula óssea. Num processo
inflamatório, háa atuação do metabolismo dos mediadores imunoestimulantes e pró-
inflamatórios, aumentando a transição de genes de citocinas, quimiocinas, fatores de
crescimento, moléculas de adesão celular, fatores de complemento, imunorreceptores e enzimas
importantes no processo inflamatório (JÉRICO & MARCO, 2017).

A dexametasona (Dexa) é um importante glicocorticóide sintético, atuando como


imunossupressor (WANG et al., 2012) e anti-inflamatório, apresentando maior ação quando
comparado aos outros esteróides. Esse fármaco é usado para tratamentos de doenças em fase
aguda e crônica, imunológicas e alérgicas (HOCHHAUS et al., 2001), sendo o glicocorticóide
mais comumente descrito para uso sistêmico (GILMAN et al., 2007).
Embora seja usada para induzir diferenciação das MSC em condroblastos, miócitos e adipócitos
in vitro (WANG et al., 2012; SONG et al., 2009), há poucos estudos até o momento que
avaliaram os efeitos da Dexa em relação à proliferação, apoptose e estresse oxidativo de MSC
(SONG et al., 2009). Wang et al. (2012) demonstraram que a Dexa prejudicou a atividade
imunossupressora das MSC, e que em doses baixas, promoveu aumento de proliferação e
acarretou a inibição da apoptose das MSC.

Em diversas afecções clínicas, como por exemplo em hipoplasias ou aplasias medulares, sabe-
se que pacientes beneficiam-se do uso contínuo de anti-inflamatório esteroidal em baixas doses
e que a retirada desses medicamentos pode, às vezes, comprometer a vida do animal. Sabe-se
também que, até o momento, as referências técnico-científicas disponíveis desaconselham o
uso dessa classe farmacológica associado as células tronco, pela possibilidade da interação
inibir os efeitos anti-inflamatórios e imunossupressores dessas células indiferenciadas.
Entretanto, e se houver a possibilidade de realizar a terapia com células-tronco para essas
afecções? Devemos simplesmente cessar o uso do anti-inflamatório e iniciar a infusão de
células? Podemos, inicialmente, associar os tratamentos? Até que ponto a atividade das células

14
tronco mesenquimal estariam comprometidas num organismo sob a influência da
dexametasona?

Na tentativa de obtermos algumas respostas, o presente estudo teve como objetivo avaliar os
efeitos in vitro do anti-inflamatório esteroidal sobre as culturas de MSC derivadas de tecido
adiposo, sob diferentes concentrações de dexametasona comercial (0,2% e 0,4%), avaliando a
proliferação celular, apoptose e estresse oxidativo.

MATERIAL E MÉTODOS

Cultivo das células tronco:

As CTM utilizadas durante a pesquisa foram processadas no Laboratório de Células Tronco e


Terapia Celular (LCET) da UVV, de acordo com protocolos pré-estabelecidos pela rotina
laboratorial (MONTEIRO et al., 2015; OLIVEIRA et al., 2018).

Fragmentos de tecido adiposo de aproximadamente 1,0 cm³ (equivalente a 1 grama) foram


coletados da região abdominal, de forma asséptica, de três cadelas jovens que foram submetidas
à ovariohisterectomia eletiva no Hospital Veterinário. As amostras de tecido adiposo foram
armazenadas em Tubo Falcon 50 contendo 20mL de DMEM (Dulbecco’s Modified Eagle’s
Medium – meio de cultura acrescido de antibiótico, antifúngico e soro fetal bovino) completo,
em temperatura ambiente. No LCET, em capela de fluxo, o meio de crescimento foi retirado do
tubo e as amostras de tecido adiposo lavadas com PBS (tampão salina fosfato), para a retirada
de restos de sangue e debris celulares. O tecido adiposo foi fragmentado em pequenos pedaços
e transferidos para um segundo tubo contendo 20mL de solução de colagenase tipo I, sendo
incubado em estufa a 37ºC e 5% CO2 durante 45 minutos.

Transcorrido o tempo de 45 minutos, o tubo retirado da incubadora foi centrifugado durante 10


minutos a 2000rpm, o sobrenadante foi descartado e o pellet celular formado foi ressuspendido
em 10mL de PBS. O tubo foi novamente centrifugado, o sobrenadante descartado e o pelete
celular ressuspendido em 15mL de DMEM completo. Transferiu-se 3mL da solução celular
para uma garrafa de cultura 75 cm2 e acrescentou-se 15mL de DMEM completo por garrafa,
que foram incubadas à 37ºC e 5% CO2. As culturas foram observadas diariamente e quando
atingiam 80% de confluência, eram realizadas etapas de tripsinização.

Para a etapa de tripsinização era realizada a lavagem das garrafas com PBS, sendo descartado
em seguida e tripsina a 0,25% era adicionada, incubando os frascos em estufa de CO2 (5 %), à
37ºC, por cerca de 5 minutos, até que haja desprendimento total das células. Para cessar os
efeitos da tripsina, foi adicionado meio DMEM aos frascos, e as suspensões foram transferidas
para tubos tipo Falcon de 15 mL e centrifugadas centrifugado durante 10 minutos a 2000rpm.
Os sobrenadantes foram retirados e descartados, e as células ressuspensas em meio DMEM
suplementado.

A contagem de células foi feita utilizando câmera de Neubauer, em uma diluição à 1:2 de Azul
de Tripan. Células de terceira passagem foram utilizadas para diferentes etapas de

15
caracterização, como citometria de fluxo e diferenciação osteogênica in vitro e/ou utilizadas
para a terapia celular.

As células utilizadas para cada ensaio de comparação independente durante o projeto foram
derivadas do mesmo doador, a fim de reduzir as variações experimentais.

Fármacos Anti-inflamatórios:

Os fármacos e concentrações utilizadas nas culturas foram as seguintes: dexametasona


comercial de uso veterinário (Azium 0,2%, MSD Salud Animal Brazil; chamada nesta pesquisa
®

de Dexa 2) e de uso humano (Fosfato dissódico de dexametasona 0,4%; chamada de Dexa 4).
Nos poços foram utilizadas as concentrações de 16,0 µg/mL, 31,0 µg/mL, 62,5 µg/mL, 125,0
µg/mL e 250,0 µg/mL, sendo completado com meio para cultivo DMEM (Dulbecco’s Modified
Eagle’s Medium – meio de cultura acrescido de antibiótico, antifúngico e soro fetal bovino)
completo.

Exposição in vitro da linhagem de células tronco às amostras de medicamentos:

Para o teste do efeito dos medicamentos sobre linhagem de célula tronco foram utilizadas placas
de 24 poços (Kasvi Inc., EUA), onde foram ser semeadas 5,0 x 104 células por poço nos seus
respectivos experimentos, em um volume final de 1mL de meio DMEM suplementado.

Estas células foram incubadas em estufa de CO2 (5%) umedecida, 37 ºC, por 24 h, antes da
adição das amostras de medicamentos. Estas semeaduras de células foram feitas em triplicata.
Passadas as primeiras 24 h, foram adicionadas as diferentes concentrações dos medicamentos
(dexametasona 0,2% e 0,4%), para que as culturas sejam incubadas nas concentrações finais de
16,0 µg/mL, 31,0 µg/mL, 62,5 µg/mL, 125,0 µg/mL e 250,0 µg/mL e por 24 h. Como controles
negativo e positivo de morte celular, foram adicionados a alguns poços somente o meio de
cultura (controle negativo) ou 20% de água Milli-Q estéril (controle positivo).

Análise de proliferação celular:

Para a avaliação da proliferação celular, as células utilizadas foram marcadas primeiramente


com CellTrace CFSE Cell Proliferation (Kit Invitrogen; Thermo Fisher Inc. EUA) e incubadas
por 10 minutos a 36,5 °C. Passado a incubação, adicionou-se 10% de Soro Fetal Bovino (FBS)
ao volume de células em PBS. A suspensão de células foi centrifugada por 5 minutos e
ressuspendidas em meio DMEM suplementado, plaqueadas em placas de 24 poços, seguindo a
ordem de exposição.

Após 3 horas seguiu-se o protocolo de exposição com diferentes concentrações de


medicamento, os sobrenadantes foram retirados com 24 horas, descartados e as células retiradas

16
por tripsinização, centrifugadas (5 minutos a 390g) e ressuspensas em PBS, para avaliação por
citometria de fluxo, em citômetro NovoCyte 3000 (ACEA Biosciences Inc. EUA).

Ensaios de viabilidade celular:

As células-tronco foram cultivadas em diferentes concentrações de dexametasona nos poços.


Para os testes de apoptose, 48h após o cultivo, as células foram marcadas com Anexina-V e 7-
aminoactinomicina D (7-AAD), para avaliação das porcentagens de células em apoptose.

As células foram retiradas dos poços pela incubação com tripsina, conforme protocolo de
tripsinização. Após a centrifugação, deve ser adicionado 100 µL de Tampão de Anexina (Hepes
10 mM, NaCl 150 mM, KCl 5 mM, MgCl2.6H20 1 mM, CaCl2.2H20 2 mM, água Milli-Q) em
cada amostra de células. Em seguida, em cada amostra foi adicionado 1 µL de Anexina-V (BD
Biosciences Inc., EUA), seguido de incubação por 10 minutos, temperatura ambiente, ao abrigo
da luz. Passado a incubação, adicionou-se 5 µL de 7-AAD (BD Biosciences Inc., EUA), na
diluição de 1:45, incubado por 10 minutos, em temperatura ambiente, ao abrigo da luz. As
amostras foram centrifugadas por 5 minutos, 390 G, retirando os sobrenadantes, e
ressuspendidas em 200 µL de Tampão de Anexina. As análises foram avaliadas por citometria
de fluxo, em citômetro NovoCyte 3000 (ACEA Biosciences Inc. EUA).

Avaliação de níveis de estresse oxidativo:

Para avaliação do estresse oxidativo, a forma reduzida da fluoresceína, o diacetato 2',7'-dicloro-


dihidro-fluoresceina (H2DCFDA; Thermo Fisher Inc. EUA), foi inicialmente dissolvida em
Dimetilsufóxido (DMSO) (Sigma-Aldrich Inc., EUA), para obtenção de solução estoque. Após
a linhagem de célula tronco passar pelo protocolo de exposição e, após a retirada do
sobrenadante, foi adicionado aos poços H2DCFDA, a 5 µg em PBS, seguido por incubação em
estufa umedecida e a 5% CO2, por 30 minutos. Os controles positivos devem previamente ser
estimulados com forbol 12-miristato 13-acetato (PMA), por 60 minutos, e posteriormente
incubados com H2DCFDA por 30 minutos; nos controles negativos, as células foram marcadas
com o corante. Após a incubação, o PBS contendo H2DCFDA foi descartado, e as células foram
removidas por tripsinização. As amostras obtidas foram centrifugadas (5 minutos a 390G) e
ressuspensas em PBS contendo 2% de FBS para análise por citometria de fluxo, em citômetro
NovoCyte 3000 (ACEA Biosciences Inc. EUA).

Análise de dados:

Para testar a relação entre a proporção de células em apoptose, proliferação e espécies reativas
de oxigênio (ROS) e a concentração de dexametasona in vitro utilizamos o modelo de regressão
linear. Analisamos as curvas de regressão linear considerando o efeito da exposição de dois
tipos de dexametasona. Testamos as diferenças entre os slopes (coeficientes angulares) dos

17
modelos de regressão linear para os diferentes tipos de dexametasona por meio de testes F. Foi
adotado um nível de significância de 5% (p ≤ 0,05). As análises estatísticas foram processadas
com a utilização do programa GraphPad Prism 7.00 (GraphPad Software, 2017).

RESULTADOS

Efeito in vitro das amostras de dexametasona na proliferação das MSC:

Gráfico representativo das quantidades médias de células tronco mesenquimal após exposição
a diferentes concentrações de dexametasona, avaliadas por meio de citometria de fluxo (Figura
1A).

De acordo com os resultados apresentados nas amostras tratadas com Dexa 2 (círculos e linhas
azuis) e Dexa 4 (triângulos e linhas vermelhas) (Figura 1B), os efeitos lesivos da dexametasona
são dependentes da concentração do medicamento presente em cada poço e da concentração
comercial do do fármaco.

Observou-se que nos poços contendo Dexa 4 (Figura 1B), independente da concentração
utilizada, a proliferação celular observada foi similar à obtida no grupo controle. Avaliando-se
os resultados referentes à Dexa 2 (Figura 1B), observou-se que a proliferação das MSC
diminuiu nas concentrações acima de 64 µg/mL, mas tal diminuição não refletiu em dados
estatisticamente relevantes (p <0,177).

18
A Dexa concentration (µg/ml)

16.0 31.1 62.5 125.0 250.0


DEXA 2 mg/ml

PBS

Counts
DEXA 4 mg/ml

CFSE

Figura 1. Representação gráfica da taxa de proliferação apresentado pelas MSC quando expostas ao reagente
CellTrace CFSE Cell Proliferation em diferentes concentrações de dexametasona. (A) Avaliação da citometria
após exposição com diferentes concentrações de dexametasona. (B) Gráfico representativo da análise estatística.

Efeito in vitro das amostras de dexametasona na taxa de apoptose das MSC:

A avaliação do gráfico obtido e representado pela Figura 2A, nos permite dupla informação,
tanto em relação a taxa de apoptose apresentada pelas células, exibidas no quadrante Q2-3,
quanto da taxa de necrose celular exibida no quadrante Q2-2.

Baseando-se nas informações fornecidas pelo quadrante Q2-2, notou-se que a Dexa 2 acarretou
maior taxa de necrose às MSC independentemente de sua concentração, quando comparada a
Dexa 4. Não apresentando uma diferença estatística entre as dexametasonas (p<0,084) e o grupo
controle.

Em relação à apoptose, de acordo com os resultados, as amostras tratadas com Dexa 2 (círculos
e linhas azuis) e Dexa 4 (triângulos e linhas vermelhas) (Figura 2B), observou-se que os efeitos

19
lesivos da dexametasona demonstraram ser dependentes da concentração utilizada nos poços e
da concentração dos fármacos.

Nos poços de MSC com Dexa 4 (Figura 2B), as concentrações não foram capazes de aumentar
a taxa de apoptose, comparando-se ao grupo controle. Observando os poços de Dexa 2 (Figura
2B), verificou-se maiores taxas de apoptose em concentrações superiores a 125µg/mL. Dessa
forma, há diferença entre as dexametasonas, quando comparadas as quantidades de células em
apoptose, ou seja, estatisticamente, as concentrações de 125 µg/mL e de 250 µg/mL de Dexa 2
acarretaram maior taxa de apoptose, tanto comparando-se ao grupo controle quanto
comparando-se ao grupo Dexa 4 (p <0,001).

A Dexa concentration (µg/ml)

16.0 31.1 62.5 125.0 250.0


DEXA 2 mg/ml

PBS

7-AAD
DEXA 4 mg/ml

Annexin-V

Figura 2. Representação gráfica da taxa de apoptose apresentado pelas MSC quando expostas a anexina-V e
7-AAD em diferentes concentrações de dexametasona. (A) Avaliação da citometria após exposição com
diferentes concentrações de dexametasona. (B) Gráfico representativo da análise estatística.

20
Efeito in vitro das amostras de dexametasona no estresse oxidativo das MSC

De acordo com os resultados apresentados, nas amostras tratadas com Dexa 2 (círculos e linhas
azuis) e Dexa 4 (triângulos e linhas vermelhas) (Figura 3B), os efeitos lesivos da dexametasona
são dependentes da concentração de medicamento nos poços e da concentração dos fármacos.

Nos poços com Dexa 4 (Figura 3, B) todos as concentrações foram capazes de manter o estresse
oxidativo próximo ao grupo controle, chegando a diminuir em concentrações mais altas como
125ug/mL. Nos poços contendo Dexa 2 (Figura 3, B), observou-se que o estresse oxidativo
apresentado pelas MSC aumentou em concentrações acima de 125 µg/mL, inclusive exibindo
diferença estatística comparando-se ao grupo controle e Dexa 4 (p >0,001).

A Dexa concentration (ug/ml)

16.0 31.1 62.5 125.0 250.0


DEXA 2 mg/ml

PBS

Counts
DEXA 4 mg/ml

H2DCFDA

Figura 3. Representação gráfica da taxa de estresse oxidativo sofrido pelas MSC quando expostas ao diacetato
2’7’-dicloro-dihidro-fluoresceina (H2DCFDA) em diferentes concentrações de dexametasona. (A) Avaliação
da citometria após exposição com diferentes concentrações de dexametasona. (B) Gráfico representativo da
análise estatística.

21
Para facilitar a comparação e a discussão dos resultados obtidos na presente pesquisa com
outros trabalhos consultados, foi realizada a conversão da unidade µg/mL, das concentrações
de dexametasona (Dexa 2 e Dexa 4) utilizadas nos poços de cultivo, para mol/L, por meio de
cálculos estequiométricos. Os valores convertidos estão apresentados na tabela abaixo (tabela
1):

Tabela 1. Tabela apresentado os valores da concentração de dexametasona (Dexa 2 e Dexa 4) presente nos
poços de cultivo celular, após a conversão das unidades de µg/mL para mol/L

Concentração em µg/mL Concentração em mol/L


16 4,0 x 10-8
31 8,0 x 10-8
62,5 2,0 x 10-7
125 4,0 x 10-7
250 8,0 x10-7

DISCUSSÃO

Existem muitos estudos comprovando os benefícios da terapia celular com células tronco em
doenças inflamatórias, todavia, sabe-se que há afecções em que torna-se necessário o uso
prolongado de fármacos anti-inflamatórios associados, e que, até o momento, não se
recomendaria a utilização de MSC em conjunto com essas medicações anti-inflamatórias, pois
a associação simultânea poderia acarretar em inibição dos efeitos moduladores inflamatórios
realizados pelas células indiferenciadas (CHEN et al., 2014). Apesar da não recomendação
destas terapias associadas, Wang et al. (2018) demonstraram que a dexa não afetou
significantemente a função imunomodulatora iPSC-MSC, apoiando a ideia de uso em conjunto
e a realização desse presente projeto.

Para o presente estudo, antes de iniciarmos os testes in vitro da associação Dexa e MSC, testes
pilotos foram realizados para determinar a quantidade de células seria plaqueada dentro de cada
poço, determinando a concentração ideal de 5,0x104 células como aquela de maior
homogeneidade, melhor confluência celular, além de uma maior taxa de sobrevivência das
células após 48h de cultivo. Tal preocupação baseou-se em conhecimentos sobre a biologia e
comportamento desse grupo celular, considerando que altas concentrações de células em
cultivo acarretando grande número de células por cm são capazes de gerar inibição celular por
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contato e aumentar as taxas de apoptose celular (Song et al., 2009), fato que poderia gerar um
viés nos dados obtidos.

Há várias formas de morte celular, as quais podem ser induzidas por estímulos e condições
fisiológicas. A apoptose, conhecida como morte celular programada, é um processo fisiológico
e rotineiro em um organismo multicelular, pelo qual mantém-se a homeostase e o ciclo celular
funcionando corretamente e, quando ocorre, não provoca resposta inflamatória. A mesma pode
ser desencadeada pela resposta biológica e morte induzida externamente, como, por exemplo,
por produtos químicos e radiação (XU et al., 2019). Em nosso estudo, utilizamos marcação
conjunta com os reagentes Anexina-V e 7-aminoactinomicina D (7-AAD) para a identificação
de células em início e em fase terminal de apoptose. Apenas 48 horas foram necessárias para
avaliar a apoptose dessas células com meios suplementados com dexametasonas comerciais
(0,2% e 0,4%), em diferentes concentrações nos poços. Observou-se que não houve diferença

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entre o grupo controle e a Dexa 4 nas concentrações utilizadas nos poços; no entanto, no grupo
em que foi utilizada a Dexa 2, mesmo com concentrações mais baixas houve aumento da
apoptose comparado ao grupo controle.

Song e colaboradores (2009) descreveram que a dexametasona diminuiu os efeitos da apoptose


nas MSC de acordo com o tempo de cultura celular, nas quais uma exposição mais longa ao
fármaco resultou em um menor número de células apoptóticas. Em um estudo realizado por
Wang et al. (2012), as MSC foram cultivadas por um período de duas semanas com diferentes
concentrações de dexametasona e os autores observaram que as concentrações mais altas de
dexametasona (10-8, 10-7 e 10-6 mol/L) exacerbaram a apoptose, enquanto concentrações mais
baixas, próximo à valores de 10-10 e 10-9 mol/L protegeram as células deste processo. De forma
similar, Ma et al. (2019) também afirmaram que as concentrações de 10-6 mol/L de
dexametasona induziram significativamente a apoptose de MSC em comparação com células
de grupo controle e o tratamento com dexametasona levou a um aumento dose-dependente da
apoptose celular, enquanto que para Mutsaers & Tofighi (2012), a dexametasona não induz a
morte celular por conta própria, sugerindo que há outros fatores envolvidos na morte dessas
células. Considerando os estudos supracitados, observamos que os dados obtidos nesta pesquisa
está em concordância com os autores Song et al. (2009) e Wang et al. (2012), pois constatamos
que em relação a Dexa 2, as maiores taxas de apoptose deu-se em concentrações altas de 10-7
(4,0 x 107 e 8,0 x 107 mol/L).

Em relação à proliferação celular, quando utilizada doses terapêuticas de 10-7mol/L, verificou-


se supressão da proliferação de MSC e o ciclo celular da medula óssea foi interrompido,
influenciando a morte celular (CHANG et al., 2007). Em contraste ao autor supracitado,
observamos que a proliferação das MSC com Dexa 4 manteve-se similar ao obtido no grupo
controle em todas as concentrações utilizadas. Apenas na Dexa 2 observamos que a proliferação
celular diminuiu nas concentrações mais altas nos poços, corroborando o que foi descrito tanto
por Chang et al. (2007) quanto por Wang et al. (2012). Ademais, a dexametasona associada às
células, pode induzir alterações no ciclo celular, ocorrendo um aumento de células em G1 e
uma diminuição em G2, sugerindo que pode haver uma diminuição da proliferação celular
(MUTSAERS & TOFIGHI, 2012).

As espécies reativas de oxigênio (ROS) são como moléculas de sinalização celular para os
processos biológicos (AUTEN et al., 2009) e desempenham papel duplo como espécie deletéria
e benéfica, dependendo de sua concentração nas MSC (YANG et al., 2015). Devido à potente
capacidade de interagir com moléculas implicadas na citotoxicidade e danos mutagênicos, o
excesso de ROS é considerado prejudicial e por isso sua avaliação apresenta relevância na
pesquisa.

Os estresses ambientais, também chamados de oxidativos, são os responsáveis por produzir


excessivamente tal composto, o que desencadeia a senescência celular e diferenciação anormal
das MSC (YANG et al., 2015). Várias vias foram propostas sobre a morte celular induzida por
ROS (AUTEN et al., 2009), como via que afeta o processo de transcrição necessário para a
diferenciação de MSC, os altos níveis de ROS levam à interrupção do ciclo celular das MSCs,
dano celular devido a oxidação e nitração de macromoléculas como DNA, RNA, proteínas e
lipídeos, e por fim a apoptose (ATASHI et al., 2015), por esse motivo nas concentrações que
observamos aumento na taxa de ROS, observamos também a diminuição dos níveis de
proliferação celular e vice-versa.

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Quando associada as células MSC à dexametasona, há o aumento de suscetibilidade ao estresse
oxidativo, sugere-se então que haja modulação a expressão de genes mitocondriais, resultando
em mudanças na função da cadeia respiratória das mitocôndrias (MUTSAERS & TOFIGHI,
2012). No presente estudo, todas as concentrações dos poços com Dexa 4 mantiveram o estresse
oxidativo próximo ao grupo controle, chegando a diminuir em concentrações mais altas;
diferentemente da Dexa 2, que levou ao aumento de ROS em altas concentrações, podendo
resultar no prejuízo das funções nas MSC e levaria à perda da capacidade de diferenciação e
danos ao DNA como descrito por Atashi et al., (2015). Entretanto, o baixo nível de ROS
mantém a proliferação celular, a capacidade de auto-renovação, regulação da diferenciação e
serve como molécula de sinalização intracelular das MSC (YANG et al., 2015).

As MSC, em condição de normalidade, possuem baixos níveis de ROS e altos níveis de


glutationa, que é um antioxidante. Considera-se que as MSC possuem grande capacidade
antioxidante por expressarem enzimas necessárias para controlar o estresse oxidativo, o que as
torna ideais para tratar patologias em que o dano esteja relacionado principalmente ao estresse
oxidativo (ATASHI et al., 2015). Quando tratadas com a dexametasona resulta em diminuição
da expressão genica de enzimas antioxidantes e até uma diminuição das atividades dessas
enzimas (MUTSAERS & TOFIGHI, 2012).

Em estudo realizado por Wang et al. (2012), demonstrou-se que a dexametasona prejudica a
atividade imunossupressora das MSC, diminuindo a expressão de IFN-y, TNF-a e PGE2;
inibindo a proliferação das células T, de forma dose-dependente, bloqueando da fosforilação de
STAT1 nas MSC, a qual é ativada por citocinas inflamatórias, e diminuindo a expressão de
iNOS e IDO, mas não das quimiocinas, ainda sendo capaz de recrutar células responsáveis pelo
processo inflamatório (CHEN et al., 2014). Quando associada a micropartículas intracelulares,
produz resultados semelhantes à ação da budesonida em relação à expressão da IDO, um
mediador primário imunomodulador das MSC. A associação de glicocorticóides, seja
budesonida ou dexametasona, em um quadro em que há sinalização inflamatória, potencializou
a níveis máximos a expressão de tal enzima (ANKRUM et al., 2014).

CONCLUSÃO

Constatou-se que nas concentrações mais altas de Dexametasona veterinária houve maiores
danos às células, aumentando o estresse oxidativo e apoptose, enquanto na Dexametasona
humana as taxas de proliferação, apoptose e ROS similares ao encontrados no grupo controle.
Observou-se nessa pesquisa um comportamento divergente entre os dois produtos comerciais
vinculados ao princípio Dexametasona. A Dexametasona veterinária gerou os resultados
compatíveis com as referências técnicas publicadas em artigos, como diminuição de
proliferação, aumento de apoptose e aumento na produção de ROS, fato que, realmente, contra-
indica a associação terapêutica clínica desse fármaco com as células tronco. Todavia, os dados
obtidos nos abrem perspectivas futuras para a realização de estudos clínicos utilizando a
Dexametasona humana e terapia com células tronco, potencializando as possibilidades
terapêuticas para diversas afecções.

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