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Política Externa
O papel do Poder Legislativo na Política Externa Brasileira: o caso dos acordos
referentes ao Centro de Lançamentos de Alcântara (CLA)
Cristina Alexandre*
Introdução
Nesse sentido, o presente trabalho irá analisar o papel do Legislativo na política externa
brasileira com base em perspectiva institucionalista liberal, no período após a
redemocratização. Serão destacados os casos referentes ao uso comercial do Centro de
Lançamento de Alcântara (CLA): dois acordos de salvaguardas tecnológicas para o uso
do CLA, assinados com os EUA e a Ucrânia, em 18/04/2000 e 16/01/2002,
respectivamente, e o tratado celebrado com a Ucrânia em 21/10/2003 a respeito de
utilização do veículo de lançamento ucraniano Cyclone-4 a partir do CLA.
Os três atos internacionais sob análise tiveram diferentes recepções no nível doméstico:
o acordo com os EUA nunca saiu do Congresso e encontra-se, até hoje, “engavetado” na
Câmara dos Deputados; o acordo com a Ucrânia sobre salvaguardas foi aprovado com
cláusulas interpretativas; e o tratado referente ao Cyclone-4 foi ratificado pelo
Congresso sem restrições.
Premissas teóricas
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O presente estudo terá por base uma perspectiva institucionalista liberal de análise de
política externa, tendo em vista que as explicações para as políticas referentes ao CLA
passam necessariamente por uma análise do nível doméstico e do papel do Legislativo.
Com efeito, nos casos sob análise, as explicações sistêmicas realistas levariam a crer em
um maior sucesso do acordo de salvaguardas assinado com os EUA do que dos acordos
assinados com a Ucrânia. Isso porque não só o poder de influência sobre o Brasil da
potência hegemônica mundial – ou, ao menos, regional – é muito maior do que o da
Ucrânia, como também o seu poder econômico se mostra de especial relevância, visto
que as empresas norte-americanas dominam cerca de 80% do mercado mundial de
satélites (Silva Filho, 1999). Assim, segundo uma perspectiva realista sistêmica, o
acordo com os EUA teria sido mais provável do que com a Ucrânia e estaríamos frente
a uma anomalia empírica. Essa pode ser explicada de modo mais satisfatório por meio
de uma análise da interação complexa entre política doméstica e negociações
internacionais, para a qual o modelo de Putnam (1988) pode ser usado.
De acordo com a metáfora putnamiana, o processo de negociação internacional deve ser
analisado como um jogo que tem lugar em dois níveis ao mesmo tempo. Assim, o
negociador de um Estado atua simultaneamente em um nível internacional e um
nacional. Neste, os grupos domésticos buscam alcançar os seus interesses por meio de
pressões sobre o governo para que este adote as políticas que lhes são favoráveis,
enquanto os atores políticos buscam alcançar poder por meio de formação de coalizões
com esses grupos. Já no nível internacional, os governos nacionais tentam maximizar
suas capacidades de satisfazer as pressões domésticas e, ao mesmo tempo, minimizar as
conseqüências adversas no plano exterior.
Desse modo, o processo de política externa possui basicamente dois estágios: (i) nível I,
onde ocorre a barganha entre os negociadores para tentar alcançar um acordo; e (ii)
nível II, compreendido como o nível de discussões entre os diferentes grupos políticos
(eleitorado), dentro de cada Estado negociador no nível I, sobre a ratificação ou não do
acordo. Assim, analisa-se a formulação da política externa a partir da interação entre
fatores domésticos e internacionais, e para isso torna-se fundamental a definição do
win-set (ou “conjunto vencedor”) de uma determinada configuração do nível II, ou seja,
o conjunto de todos os possíveis acordos no nível I que poderão ser ratificados no nível
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Pode-se então perceber na análise de Putnam a aplicação da lei das reações antecipadas
desenvolvida por Carl Friedrich1, visto que muito do que o Executivo negocia
internacionalmente já leva em conta a existência do nível II, ou seja, da necessidade de
aprovação e implementação de seus atos. Assim, mesmo uma situação reiterada de
aprovação pelo Legislativo dos acordos internacionais assinados pelo Executivo não
implica necessariamente a falta de influência daquele Poder no processo decisório de
política externa. Ao contrário, ao longo desse processo, o Executivo leva em conta a
necessidade de aprovação pelo Legislativo e dele pode sofrer forte influência.
Tais estudos partem da premissa de que o Estado não é um ator unitário, daí a
importância da política doméstica, na qual não há propriamente uma situação de
“hierarquia pura”, com um decisor central unitário. Em seu lugar, tem-se uma estrutura
de poliarquia, composta por atores políticos com diferentes preferências e que
compartilham poderes no processo decisório de política externa (Milner, 1997, p. 11).
1
A lei de reações antecipadas determina que quando as ações de X são sujeitas à revisão de Y, o qual é
capaz de recompensar as boas ações e/ou punir as ruins, então X irá provavelmente se antecipar e levar
em consideração o que interessa a Y (Friedrich, 1963, apud Cox & Morgenstern, 2002, p. 447).
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Assim, pode-se reconhecer que por conta dos problemas de complexidade e alto grau de
especialização da política externa há uma delegação do Legislativo ao Executivo. Para
que tal relação não se transforme em abdicação, é o preciso que o mandante da
delegação (principal) guarde consigo mecanismos de controle sobre o mandatário
(agent). Este controle pode ser tanto centralizado, ativo e direto, do tipo “patrulha
policial” – extremamente custoso aos legisladores –, como também do tipo “alarme de
incêndio”2, o qual é menos centralizado, ativo e direto e requer menos tempo e
informação, sendo, portanto, também menos custoso do que o primeiro tipo
(McCubbins & Schwartz, 1993, p. 427-29). No caso do controle por alarme de incêndio,
há delegação dos congressistas ao Executivo, e os primeiros irão dirigir sua atenção
apenas aos temas que sejam “ativados” por esse mecanismo de alarme, ou seja, que
tenham repercussão junto à opinião pública. Nesse sentido:
Sometimes Congress appears to do little, leaving important policy decisions to the executive or
judicial branch. But appearances can deceive. A perfectly reasonable way for Congress to pursue
its objectives is by ensuring that fire alarms will be sounded enabling courts, administrative
agencies, and ultimately Congress itself to step in, whenever executive compliance with
congressional objectives is called in question (McCubbins & Schwartz, 1993, p. 437).
2
A expressão “alarme de incêndio” foi utilizada pela primeira vez por Mathew D. McCubbins e Thomas
Schwartz, no artigo “Congressional Oversight Overlooked: Police Patrol versus Fire Alarms”, publicado
no American Journal of Political Science, em 1984, e reimpresso em McCubbins & Sullivan, 1993, p.
426-440.
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No Brasil, tem-se como exemplo histórico o caso dos Acordos de Roboré, firmados entre Brasil e
Bolívia, em 1958, sob a forma de notas reversais, para escapar da necessidade de aprovação pelo
Legislativo, prevista pela Constituição nos casos de tratados internacionais. Cf. Cervo & Bueno, 2002, p.
301-03. A tentativa, no entanto, corrobora a hipótese da influência e não da evasão, na medida em que
houve uma grande reação de parlamentares contra as notas assinadas por JK – sendo claro o uso político
da questão – e os acordos acabaram sendo submetidos ao Congresso em 1961, já no governo Goulart
(Conduru, 2001).
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Medeiros (1995); Mazzuoli (2001); Rezek (2005); Rodas (1991), entre inúmeros outros.
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Cf. arts. 62 e 64, §1º, da CF/88.
6
É possível identificar um número crescente de audiências públicas referentes à política externa nas
Comissões de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados (CRE-CD) e do Senado (CRE-SF), desde
1985. Na CRE-CD, entre 1985 e 2005, foram realizados uma média anual de dez audiências públicas,
comparecimento de ministros, debates e seminários. Considerado apenas o período entre 1999 e 2005, a
média sobe para cerca de 19 eventos por ano.
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Durante o ano de 2005, por exemplo, a CRE-CD recebeu a visita dos embaixadores da Coréia, Ucrânia,
Japão, Síria, Coréia do Norte, Israel, Itália, Hungria e Polônia; de delegações dos governos do Vietnã,
Líbano, China, Timor Leste, Kuwait e Ucrânia, e de integrantes do Congresso dos EUA, parlamentares do
Quênia e da Suíça, além do presidente do Parlamento Europeu. No mesmo ano, deputados brasileiros
visitaram o Congresso norte-americano em missão oficial, e também os Parlamentos da Rússia, Bielo-
Rússia e Ucrânia.
15
A aprovação legislativa não deve confundir-se com ratificação, ato próprio do chefe Estado, de
acordo com o Direito Internacional Público. A ratificação, como a adesão, representa a “forma de
expressão definitiva do consentimento do Estado em relação ao tratado internacional” (Rezek, 2005, p.
85). A adesão difere-se da ratificação na medida em que esta é o ato de confirmação do Estado que já
havia assinado determinado acordo internacional e então, normalmente após o procedimento interno de
aprovação legislativa, ratifica a sua intenção de participar de tal acordo. Já a adesão ocorre quando, em se
tratando de acordos multilaterais, o Estado manifesta seu propósito de aderir a determinado acordo já
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negociado e ainda não previamente assinado. No Brasil, tanto a adesão como a ratificação de acordos
internacionais exigem a prévia aprovação legislativa.
16
Como lembrado anteriormente, por meio da diplomacia parlamentar, existe hoje alguma relativização
dessa competência exclusiva do chefe do Executivo em manter relações com os demais Estados.
17
De acordo com a prática diplomática brasileira, são autorizados para assinar tratados em nome do
Brasil, além do chefe do Executivo: o ministro de Estado das Relações Exteriores; os embaixadores
brasileiros, mediante instrução do MRE, em todos os domínios de interesse das relações do Brasil com o
Estado no qual se encontra acreditado; e qualquer outra pessoa dotada de carta de plenos poderes pelo
presidente da República. Trata-se de prática que não está regulamentada constitucionalmente. O texto
constitucional não avançou no tema na velocidade da dinâmica das relações externas do Brasil e segue
prevendo a competência privativa do presidente da República para celebrar tratados, sem dispor sobre a
possibilidade de delegação (art. 84, VIII, CF/88).
18
Exceção a essa discricionariedade do presidente da República é prevista com relação às Convenções
Internacionais do Trabalho, concluídas no âmbito da OIT, cujo tratado constitutivo (art. 19, V, b) obriga
sua submissão à aprovação parlamentar (Mazzuoli, 2003, p. 101).
19
O Aviso da Casa Civil da Presidência da República n. 1872, de 27/10/1999, determinou que todos os
atos internacionais celebrados pelo Brasil deveriam ser objeto de parecer da Consultoria Jurídica (CJ) do
MRE. Até então, submetia-se a parecer apenas os atos que suscitassem dúvidas ou controvérsias com
relação à sua incorporação ao direito interno. De acordo com o atual consultor jurídico, Antônio Paulo
Cachapuz de Medeiros, tal norma aumentou significativamente o volume de trabalho do órgão, que
atualmente prepara mais de mil pareceres por ano. Implicando ainda maior lentidão no trâmite, desde
2003, início da gestão de Samuel Pinheiro Guimarães como secretário-geral, todos os pedidos de parecer
à CJ necessitam passar pela Secretaria-Geral (Medeiros, 2006).
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A preparação da MSC ao Congresso e da EM ocorre no MRE, passando pela divisão competente pela
matéria, pela Divisão de Atos Internacionais (DAI) e pela Secretaria-Geral.
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21
Cf. art. 64, da CF/88.
22
A CRE-CD foi criada pela Resolução n. 15/1996 (art. 1º) que alterou o art. 32 do Regimento Interno da
Câmara dos Deputados (RICD). A primeira comissão parlamentar permanente da Câmara dos Deputados
destinada a temas de política externa foi criada em 1829, com a denominação de Comissão de
Diplomacia; em 1891, passou a chamar-se Comissão de Tratados e Diplomacia e logo em seguida, em
1893, Comissão de Diplomacia e Tratados. Em 1947, sua designação voltou a ser simplesmente Comissão
de Diplomacia e, de 1957 a 1996, o órgão denominou-se Comissão de Relações Exteriores (Brusco, [s.d.],
p. 222). No Senado, a denominação Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional é usada desde
1989; antes disso, era apenas Comissão de Relações Exteriores.
23
Cf. art. 32, XV, c, do RICD. Quando em regime de tramitação ordinária, a proposição deverá ser
analisada pela Comissão no prazo máximo de 40 sessões (art. 52, III, do RICD). Se o regime for de
urgência, o prazo cai para cinco sessões. Independentemente de tais prazos, poderá a CRE-CD, “mediante
requerimento de um terço de seus membros, aprovado pela maioria absoluta da respectiva composição
plenária, incluir a matéria na Ordem do Dia para apreciação imediata” (art. 52, §5º, do RICD). Uma vez
transformada a mensagem em projeto de decreto legislativo, ela tramita em regime de urgência (art. 151,
I, j, do RICD).
24
Cf. art. 53, I, do RICD. No caso de o acordo tratar de matéria de competência de mais de três
comissões, pode-se, por iniciativa do presidente da Câmara dos Deputados, a requerimento de líder ou de
presidente de comissão interessada, criar uma Comissão especial para emitir o parecer (art. 34, II, do
RICD).
25
Cf. art. 32, IV, a, do RICD.
26
Art. 47, da CF/88, e art. 183, do RICD.
27
Cf. arts. 184 a 187, do RICD.
28
Interessante notar que o inciso primeiro art. 376 do RISF estabelece que o projeto de decreto legislativo
“só terá iniciado o seu curso se estiver acompanhado de cópia autenticada do texto, em português, do ato
internacional respectivo, bem como da mensagem de encaminhamento e da exposição de motivos”.
29
Interessante notar que, à falta de regulamentação legal do processo de aprovação de tratados
internacionais pelo Congresso, o RISF, no inciso III, do art. 376, prevê expressamente a possibilidade de
apresentação de emendas pelos senadores ao projeto de decreto legislativo aprovado na Câmara dos
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findo o qual a Comissão terá quinze dias úteis, prorrogáveis por igual período, para
opinar sobre a matéria, com base em parecer preparado por um de seus integrantes30.
Aprovado o parecer, a matéria é incluída na Ordem do Dia para votação, nos mesmos
termos em que ocorre na Câmara31. Depois de aprovado, o decreto legislativo é
promulgado pelo presidente do Senado e publicado no Diário Oficial da União (DOU) e
no Diário do Senado Federal (DSF). Enviam-se mensagem ao presidente da República e
ofícios ao primeiro-secretário da Câmara dos Deputados e ao ministro das Relações
Exteriores, comunicando a aprovação32.
Uma vez aprovado pelo Congresso, não existe obrigação do presidente da República em
ratificar o acordo internacional33. Desejando fazê-lo, o chefe do Executivo deverá
promover a ratificação do Estado brasileiro ao acordo, se já assinado, ou solicitar a sua
adesão, no caso de acordo multilateral já existente e não assinado pelo país. Concluído o
procedimento de confirmação do consentimento no plano externo, o Executivo necessita
promulgar o ato internacional e publicá-lo de modo a assegurar sua eficácia interna34.
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Outra possível comparação com as MPs diz respeito ao número também reduzido de rejeições. Entre
1992 e 1995, nenhuma MP foi rejeitada pelo Congresso brasileiro (Figueiredo & Limongi, 1999, p. 149).
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Em 1994, a MECB foi substituída pelo Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE) com a
instituição da Política Nacional de Desenvolvimento das Atividades Espaciais (PNDAE), que estabeleceu
os novos objetivos e diretrizes dos programas e projetos nacionais relativos à área espacial. A partir da
aprovação da Lei n° 9.994, de 24/07/2000, o PNAE conta também com os recursos provenientes do
Programa de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Setor Espacial (Fundo Espacial).
37
Até hoje, porém, o Brasil não desenvolveu essa missão e os únicos países capazes de construir e operar
veículos lançadores de satélite são: EUA, Rússia, China, França, Itália, Japão, Ucrânia, Índia, Israel e
Paquistão.
38
Pode-se destacar três fatores que colocavam, nesse momento, o CLA em posição vantajosa frente às
demais bases de uso comercial: (i) economia – a base se encontra a 2o18’ ao sul da Linha do Equador, o
que pode representar uma diminuição nos custos de lançamento de até 30%; (ii) segurança – o local
dispõe de condições climáticas favoráveis, estabilidade geológica e baixa densidade demográfica ao seu
redor, o que reduz os eventuais riscos do empreendimento; e (iii) disponibilidade – o CLA ainda era
subutilizado pelo Brasil e apresentava grande disponibilidade aos eventuais interessados em usá-lo. Desde
22/08/2003, entretanto, o centro está sem operar por conta de um acidente com o Veículo Lançador de
Satélites (VLS 1/V3).
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Assim, o passo inicial para a garantia da propriedade intelectual aos eventuais parceiros
comerciais do Brasil no CLA foi dado em 18 de abril 2000, com a assinatura, em
Brasília, do “Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo
dos Estados Unidos da América sobre salvaguardas tecnológicas relacionadas à
participação dos EUA nos lançamentos a partir do Centro de Lançamento de Alcântara”
(doravante, AST Brasil-EUA). O acordo foi encaminhado pelo presidente Cardoso para
a aprovação do Congresso quase um ano depois. Antes disto, porém, o assunto entrou
na agenda política e manifestações contrárias ao acordo, por conta de suposta ofensa à
soberania nacional, surgiram em diversos campos: mídia, comunidade científica, ONGs,
integrantes das Forças Armadas e partidos de esquerda.
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Os requerimentos datam de 20/03/2001 e 20/06/2000, respectivamente.
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(iv) art. 3o, § 1-F (prevê que o Brasil assinará acordos equivalentes ao então celebrado
com os outros Estados que venham usar o CLA ou cujas empresas participem de
atividades no CLA); e (v) art. 3o, § 3º (afirma a intenção do governo dos EUA em
aprovar as licenças de exportação necessárias para as atividades no CLA de acordo com
suas leis, regulamentos e políticas oficiais). Os cinco dispositivos que sofreram emendas
foram: (i) art. 4o, § 3; (ii) art. 6o, § 2o; (iii) art. 6o, § 5o; (iv) art. 7o, § 1-B; e (v) art. 8o, §
3-B, os quais passaram a possibilitar a presença de autoridades brasileiras, juntamente
às norte-americanas, para o controle das áreas restritas e a inspeção aduaneira, por
autoridades brasileiras, dos equipamentos a serem utilizados no CLA. Por fim, o
relatório sugeriu a inclusão de um §4o ao art. 5o, prevendo a divulgação pelos norte-
americanos de informações de eventuais substâncias danosas ao meio-ambiente ou à
saúde humana contidas nos seus equipamentos, bem como referentes ao objetivo do
lançamento e da rota a ser seguida. Este parecer foi aprovado na CRE-CD, com um
único voto contrário, apresentado pelo deputado Jair Bolsonaro (PTB-RJ).
Foi nesse contexto de aprovação parcial, com ressalvas e emendas, do AST Brasil-EUA
que o governo Cardoso negociou o “Acordo sobre salvaguardas tecnológicas
relacionadas à participação da Ucrânia em lançamentos a partir do Centro de
Lançamento de Alcântara” (AST Brasil-Ucrânia). Tal acordo foi celebrado no dia 16 de
janeiro de 2002, em Kiev, pelo ministro da Ciência e Tecnologia, Ronaldo Sardenberg,
e por seu homólogo ucraniano. O texto assinado, posto que tivesse o mesmo objetivo do
acordo firmado com os EUA, qual seja, evitar o acesso ou a transferência não
autorizados de tecnologias relacionadas a lançamentos efetuados a partir do CLA, não
continha nenhum dos dispositivos considerados abusivos e suprimidos do AST Brasil-
EUA pela CRE-CD, em um exemplo de antecipação do Executivo, antevendo a
necessidade de aprovação do documento pelo Congresso.
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modificativas, tal como presentes no acordo com os EUA. Nesse sentido, vale destacar
os argumentos levantados pelo deputado Pires:
O que motivou a elaboração das emendas [pela CRE-CD] foi a constatação de que, embora o
acordo com a Ucrânia fosse consideravelmente mais adequado ao princípio da soberania
nacional do que o acordo firmado entre o Brasil e os Estados Unidos da América, ele ainda
continha algumas cláusulas que poderiam dar margem a práticas potencialmente ofensivas à
soberania nacional. Assim sendo, resolvemos apresentar, em nome da Comissão de Ciência e
Tecnologia, Comunicação e Informática, e com pleno aval do Ministério da Ciência e
Tecnologia e da Controladoria Geral da União, um substitutivo ao Projeto de Decreto
Legislativo n. 2.226, de 2003, no qual as emendas propostas na Comissão de Relações Exteriores
são transformadas em declarações que, se bem não alterem o próprio texto do Acordo,
consubstanciam na ordem jurídica interna e no processo legislativo o entendimento político
alcançado entre Brasil e Ucrânia na aplicação diferenciada dos poucos dispositivos potencialmente
ofensivos à soberania nacional do ato internacional em comento. Dessa maneira, a soberania
nacional ficaria inteiramente preservada, ao mesmo tempo em que as atividades de cooperação
42
poderiam prosseguir sem obstáculos e tratos desnecessários [grifou-se].
40
Waldir Pires (PT-BA), voto em separado com relação ao AST Brasil-Ucrânia, apresentado em 12 de
junho de 2002, na CRE-CD.
41
Cf. redação do art. 2o do DLG n. 766, de 16/10/2003.
42
Jorge Bittar (PT-RJ), em parecer sobre o AST Brasil-Ucrânia, pela CCTCI, apresentado no plenário da
Câmara dos Deputados, em 22/07/2003.
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Por fim, o terceiro documento internacional referente ao CLA assinado pelo Brasil foi o
“Tratado entre Brasil e Ucrânia sobre Cooperação de Longo Prazo na Utilização de
Veículo de Lançamento Cyclone-4 no Centro de Lançamento de Alcântara” (doravante,
Tratado Cyclone). O texto firmado em Brasília, em 21 de outubro de 2003, decorre do
Memorando de Entendimento assinado entre a AEB e a Agência Espacial Nacional da
Ucrânia em janeiro de 2002 e tem por objetivo a cooperação de longo prazo entre os
dois países no desenvolvimento da instalação e infra-estrutura necessárias para
lançamentos do foguete ucraniano Cyclone-4 a partir do CLA, seja a serviço de
programas nacionais dos dois Estados, seja para clientes comerciais. Assim, o Tratado
Cyclone prevê a criação da Alcântara Cyclone Space, uma joint venture binacional que
será responsável pelo desenvolvimento e operação das atividades de lançamento do
Cyclone-4 no CLA. Ainda que toque em questões tão relevantes para a soberania
nacional e para o programa espacial brasileiro quanto os dois acordos de salvaguarda
anteriores, o Tratado Cyclone foi aprovado, sem emendas nem cláusulas interpretativas,
43
Fizeram parte da comitiva os deputados Andre Zazharow – presidente do Grupo Parlamentar Brasil-
Ucrânia; Gonzaga Patriota – membro do Grupo Parlamentar Brasil-Ucrânia; e o senador Ney Suassuna –
membro do Grupo Parlamentar Brasil-Ucrânia.
44
Parecer da senadora Roseana Sarney sobre o AST Brasil-Ucrânia, apresentado em 17/09/2003, na
CRE-SF. O parecer foi favorável ao projeto de decreto legislativo e manteve as seis cláusulas
interpretativas tal como existentes no projeto vindo da Câmara dos Deputados.
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11 meses após sua assinatura, permanecendo por apenas quatro meses em tramitação no
Congresso.
Conclusão
45
A Comissão Especial era composta pelas comissões de: Relações Exteriores e de Defesa Nacional;
Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio; Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática;
Finanças e Tributação e Constituição e Justiça e de Cidadania. A Comissão Especial é constituída sempre
que, como no caso do Tratado Cyclone, o projeto tenha que tramitar por mais de três Comissões para
análise de mérito, além da CCJC (cf. art. 34, do RICD).
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Nesse sentido, não se confirmou o argumento desenvolvido por Cesar (2002) que
sustenta a hipótese de delegação ou abdicação do Legislativo em função da matéria sob
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Neste caso, poderíamos ver o acordo aprovado com ressalvas e emendas como uma forma de mandato
negociador (figura que não é institucionalmente prevista no Brasil).
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O estudo do caso da política brasileira com relação ao uso comercial do CLA demonstra
que, ainda que o Legislativo brasileiro não domine o processo de política externa, nem
tenha um histórico de intensa participação, o Executivo não pode ignorar, em sede de
assuntos internacionais, as restrições sofridas pela participação do Congresso Nacional.
47
Cf. art. 1º, da CF/88: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como
fundamentos: I – a soberania; [...]”.
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esse projeto nacional. Nessa démarche, o uso comercial do CLA, tal como defendido
pelo Legislativo, deve buscar primordialmente parcerias que tragam a possibilidade de
intercâmbios tecnológicos bem como atrair recursos que sejam aplicáveis ao programa
espacial brasileiro.
Percebe-se, logo, que o Congresso não possui interesse em manifestar-se sobre toda
questão de segurança e defesa nacional. A instituição segue uma lógica racional de
atuação que faz com que, ao menos com relação aos casos aqui apresentados, manifeste-
se apenas quando não concorda com o entendimento proposto pelo Executivo. É preciso
lembrar, porém, que diante do grande número de tratados que são submetidos aos
parlamentares todos os anos, seria impossível que estes dispusessem de um controle
total sobre tais atos internacionais, como na idéia de uma “patrulha policial”. Uma
atividade de controle desse nível lhes seria extremamente custosa no que diz respeito ao
tempo e ao conhecimento exigidos em questões de política externa.
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Com efeito, a leitura ampliada de suas competências vem permitindo uma atuação
crescente do Legislativo na aprovação de tratados internacionais, pois vem sendo, na
maioria das vezes, respeitada pelo Executivo. Desde 2000, com base no Parecer da
Consultoria Jurídica do MRE n. 031, de 05/04/2000, elaborado por Cachapuz de
Medeiros, foi assegurada a necessidade de inclusão, no decreto de promulgação pelo
Executivo, dos dispositivos legais acrescidos pelo Congresso no decreto legislativo de
aprovação de tratados.
48
Para o entendimento do MRE sobre tal questão cf. Medeiros (2006) e Lessa (2006).
49
Cf. Parecer do deputado José Thomaz Nonô à Consulta n. 07, de 1993, da Presidência da Câmara dos
Deputados solicitando o pronunciamento da CCJC “sobre a possibilidade de o Congresso Nacional, na
sua competência de referendar tratados internacionais celebrados pelo presidente da República, fazê-lo
parcialmente”. O parecer favorável à aprovação parcial foi aprovado por unanimidade.
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É interessante notar ainda que quatro dos projetos que buscavam regulamentar a atuação
do Legislativo em matéria de aprovação de tratados admitiram a possibilidade dos
acordos executivos. Nesse sentido, eles apenas ilustram, como no caso dos projetos
referentes ao poder de emenda, a tentativa de consolidar a prática atual em matéria de
política externa, evidenciando a concordância dos parlamentares com o uso de acordos
executivos. Nas justificativas de tais propostas, foi reconhecida a impossibilidade de
submissão de todos os atos internacionais assinados pelo Executivo ao Congresso,
hipótese que prejudicaria tanto a rotina diplomática como a prática legislativa. Três
desses projetos ainda permitem aos legisladores o poder de, em discordando dos
critérios adotados para a dispensa de aprovação legislativa de determinado acordo,
declarar a necessidade de apreciação pelo Congresso. Nada obstante, tal como nos
projetos referentes a comércio exterior, nenhuma das propostas foi até hoje aprovada –
sete já se encontram arquivadas e as demais tramitam lentamente.
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Referências Bibliográficas
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