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O sistema retórico

A retórica decompõe-se em quatro partes,


que representam as quatro fases pelas quais
passa quem compõe um discurso.

1 – Invenção – busca dos argumentos e de todos os


meios de persuasão relativos ao tema do discurso;
2 - Disposição – ordenação desses argumentos,
donde resultará a organização interna do discurso, o
seu plano;
3 – Elocução – redação escrita do discurso, onde
entram as famosas figuras de estilo;
4 – Ação – a enunciação efetiva do discurso, com
tudo o que ele pode implicar em termos de efeitos
de voz, mímicas e gestos.
No fundo, estas quatro partes correspondem
a quatro “tarefas” que o orador deve
cumprir, caso contrário o seu discurso poderá
resultar deficiente.

Assim, todos nós, quando preparamos uma


exposição, passamos sucessivamente por
estas quatro fases:

- Compreender o assunto e reunir todos os


argumentos que se adeqúem (invenção);
-pô-los em ordem (disposição);
- redigir o discurso o melhor possível
(elocução);
- exercitar-se, proferindo-o (ação).
Invenção

Antes de empreender um discurso, é


preciso perguntarmo-nos sobre o que ele
deve versar, portanto sobre o tipo de
discurso, o género que convém ao
assunto.
Os três géneros do discurso

• judicial;

• deliberativo;

• epidítico.
Porquê três géneros diferentes?

Porque também diferem:

-o auditório;

- a função;

- o tempo;

- os valores;

- o tipo de argumentação.
Funções

O discurso judicial acusa (acusação) ou


defende (defesa);

O deliberativo aconselha ou desaconselha


em todas as questões referentes à cidade:
paz ou guerra, defesa, impostos…;

O epidítico censura e, na maioria das vezes,


louva ora um homem ou uma categoria de
homens, como os mortos na guerra, ora
uma cidade, ora seres lendários...
Auditório

Adaptamos o nosso discurso mediante o


auditório que tivermos à nossa frente.

O discurso judicial tem como auditório o


tribunal;

O deliberativo, a Assembleia (Senado);

O epidítico, todos os espectadores que


assistem a discursos elogiosos.
Tempo

O discurso judicial refere-se ao passado,


pois são factos passados que cumpre
esclarecer, qualificar e julgar;

O deliberativo refere-se ao futuro, pois


inspira decisões e projetos;

O epidítico refere-se ao presente, pois o


orador propõe-se à admiração dos
espectadores, ainda que extraia
argumentos do passado e do futuro.
Valores

O discurso judicial diz respeito ao justo e ao


injusto;

O deliberativo diz respeito ao útil e ao


nocivo;

O epidítico diz respeito ao nobre e ao vil.


Tipo de
argumentação

O discurso judicial, que dispõe de leis e se


dirige a um auditório especializado, utiliza de
preferência raciocínios silogísticos
(entinemas);

O deliberativo, dirigindo-se a um público mais


móvel e menos culto, prefere argumentar pelo
exemplo;

O epidítico recorre sobretudo à amplificação,


pois os factos são conhecidos pelo público, e
cumpre ao orador dar-lhes valor, mostrando a
sua importância e nobreza.
Os três tipos de argumento

• ethos;

• pathos;

• logos.
Ethos – é o caráter que o orador deve
assumir para inspirar confiança no
auditório, pois sem esta confiança de
nada valem os argumentos.

Pathos – é o conjunto de emoções,


paixões e sentimentos que o orador deve
suscitar no auditório com o seu discurso.
Se o ethos diz respeito ao orador e o
pathos ao auditório, o logos diz respeito à
argumentação propriamente dita do
discurso. É o aspeto dialético da retórica.

Os argumentos são de dois tipos: o


entinema, ou silogismo baseado em
premissas prováveis, que é dedutivo, e o
exemplo, que a partir de factos passados
conclui para os futuros, e que é indutivo.
Os dois tipos de provas

O orador dispõe de provas extra-retóricas


e de provas intra-retóricas – extrínsecas e
intrínsecas.

As provas extrínsecas são as


apresentadas antes da invenção:
testemunhas, confissões, leis, contratos…

As provas intrínsecas são as criadas pelo


orador; dependem, pois, do seu método
e do seu talento pessoal.
Disposição

Trata-se de um plano-tipo ao qual se


recorre para construir o discurso.
Os autores propuseram diversos planos-
tipo, que iam de duas a sete partes.
Ficaremos com o mais clássico, em quatro
partes: exórdio, narração, confirmação e
peroração.
Exórdio (proémio)

É a parte que inicia o discurso e a sua


função é essencialmente fática: tornar o
auditório dócil, atento e benevolente.

O género deliberativo quase não


necessita de exórdio, uma vez que o
auditório já sabe do que se trata.
Narração

É a exposição dos factos referentes à


causa. É na narração que o logos supera
o ethos e o pathos. Para ser eficaz, deve
ter três qualidades: clareza, brevidade e
credibilidade.
Como ser claro? Através dos termos
empregues e da organização do texto.

Como ser breve? Eliminando tudo o que


seja inútil.

Como ser credível? Enunciando o facto e


as suas causas, sobretudo se o facto não
for verosímil.
Confirmação

Parte nitidamente mais longa, onde se


elencam as provas, seguidas de uma
refutação, que destrói os argumentos
adversários.
Digressão e peroração (epílogo)

Narrativa ou descrição viva, a digressão tem


como função distrair o auditório, mas também
apiedá-lo ou indigná-lo.

A peroração é o que se põe no fim do discurso.


Aliás, pode ser bastante longa e dividir-se em
várias partes. Mencionemos as principais:
- amplificação;
- paixão;
- recapitulação.
Note-se que a peroração é o momento por
excelência em que a afetividade se une à
argumentação, o que constitui a alma da
retórica.
Elocução

Em sentido técnico, é a redação do


discurso. Das quatro partes da retórica,
diz-nos Cícero que esta é a mais própria
do orador, aquela em que ele se exprime
como tal.
É o ponto em que a retórica se encontra com a
literatura.

- Correção linguística.

O melhor estilo, ou seja, o mais eficaz, é aquele


que se adapta ao discurso. Isso significa que ele
mudará consoante o assunto.

- Clareza – é relativa (deve-se adaptar


igualmente ao auditório).
O próprio orador deve mostrar-se em pessoa no
seu discurso, ser colorido, dinâmico, imprevisível,
engraçado ou caloroso, numa palavra: vivaz.

A vivacidade é capital para o ethos, pois torna o


discurso marcante, agradável e cativante. O
verdadeiro estilo é o discurso onde se pode
encontrar o seu autor.

Figuras de estilo.
Ação

A ação é o remate do trabalho retórico, a


enunciação do discurso. É essencial
porque, sem ela, o discurso não atingiria o
público.

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