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1( )1)OS OS DIREITOS RESERVADOS. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio
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q11,dq111, p,,rté desta obra em qualquer sistema de processamenro de da(los_ .Essas proibições aplicam-se
1.1111h,: 111 ,Is c-a mctcristicas gráficas da obra e à sua eclitoração. A violaçã o dos direitos au torais é punive l quartierlatin@quartierlatin.art.br
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1nd1·n11.,11·1'\es diversas (arts. 101 a ll0 da Lei 9.610, de 19.02.1998, Lei dos Direitos Autorais).
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196 ■ PAULO CESAR CONRADO
112 Para ~ue se ve'.ifique, necessário seria mais do que a só atuação estatal: a
sugestivêJ de Benve11 utti" (Do lançamento: teoria geral do ato, do procedi-
atuaç~o do proprio _contribu_inte. Aí, reforce-se, o porquê de o processo
mento e do processo tributário, p. 278-9). tributaria_ adm1n1strat1vo ter sido desde o início definido como modalidade
Definição de Seabra Fagu ndes para a atividade administrativa (O controle
111 ant1exac1onal.
dos atos administrativos pelo Poder Judiciário, p. 2-3).
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198 ■ PAULO CESAR CONRADO
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ra das proposições que lançamos : execução fiscal não é meio Por opção genericamente firmada no direito positivo pro-
processual que tende a realizar a obrigação tributária 114 • cessual (art. 583 do Código de Processo Civil) 11 5 , toda execu-
ção (inclusive a fiscal) assentar-se-á em título executivo, assim
entendido o documento que espelha, por presunção, a existên-
9. 3 .1.1. 3. 0 PROBLEMA DO "PRESSUPOSTO"
cia de uma obrigação.
Alinhamos, pouco antes, que a execução fiscal, como figura Se é certo que lançamento e "autolançamento" realizam, em
processual exacional, guarda a constituição da obrigação tribu- princípio, o conceito adrede posto (à medida que se apresentam
tária como pressuposto. como documentos que retratam, por presunção, a existência da
Genérica, tal proposição também merece reparos. obrigação tributária), não é menos certo, porém, que o sistema
Já assentamos, quando descrevíamos o ciclo de positivação do do direito positivo opera com um adicional elemento de defini-
direito tributário (Capítulos 3 e 4), que a constituição da obrigação ção: título executivo é documento que espelha, por presunção, a
tributária se dá ou pela via do lançamento ou pela do "auto- existência de uma obrigação e que, como tal (como título execu-
lançamento" , expressões de normatividade individual e concreta. tivo), foi taxativamente previsto em lei. Donde tiramos: para que
seja considerado título executivo, um certo documento, ademais de
Cruzando tal afirmação com a precedente, teríamos: o pressu-
atestar a existência de uma relação jurídica (com o apontamento,
posto da execução fiscal é o lançamento ou o "autolançamento" - sinali-
via de consequência, de todos os seus elementos constitutivos),
za-se, já aí, a efetiva necessidade de reparos em nosso raciocínio.
'li deve ter sido pelo sistema do direito positivo como tal tratado 116 .
Pois é aí, como sugerido, que se aloja o problema da afirma-
Em primeiro lugar, é preciso determinar o que se quer fazer, definir o
resultado que se pretende obter. Este é o trabalho da própria Política, no ção de que o pressuposto da execução fiscal é a constituição da
seu sentido pleno de arte de governar, inspirada pela Economia, pela obrigação tributária: lançamento ou "autolançamento", pores-
Ciência das Finanças, pela Sociologia e pela observação dos fatos que
podem, ou que devem, influenciar a orientação governamental, até mes- tipulação legal (ou ausência dela), não são títulos executivos,
mo o aspecto ético. Só depois de definido o objetivo da ação é que se cumprindo tal papel , para os casos de execução fiscal, a deno-
procuram os meios para conseguir esse resultado. E a função do Direito é,
simplesmente, a de fornecer aqueles meios de atuação para obtenção de minada Certidão de Dívida Ativa, documento cuja produção por
um resultado predeterminado que não é, por si mesmo, jurídico',
Depois de investigar e analisar experiências sociais, o homem concebeu
certo supõe aqueloutros (lançamento ou "autolançamento"),
construir este instrumento de ação social: a regra jurídica . mas que com eles não se confunde.
A regra jurídica é a utilização da linguagem (oral ou escrita) como estimulante
(excitante) condicionador que provoca, na atitude mental do homem, um Nessa trilha, temos, ao final, que a constituição da obrigação
reflexo condicionado à incidência daquela regra jurídica sobre sua hipótese de tributária (e assim os respectivos veículos, lançamento e
incidência" (Teoria geral do direito tributário, Alfredo Augusto Becker, p. 64).
114 Analisando nossa própria ativi dade, a judicatu ra, passamos a compreender,
então, que a tutela jurisdicional que nos é requerida em nível de execução
fiscal enfeixa-se nas diversas normas (individuais e concretas) que produzi-
mos nos respectivos autos: ordem de penhora, alienação judicial do 115 "Art. 583. Toda e xec ução tem por ba se título e xecutivo judicial ou
patrimônio penhorado, etc., nada tendo com as eventuais repercussões extrajudicial. "
verificadas no domínio socia l - repercussões essas que, embora desejáveis 116 Documento que atesta a existência de uma relação jurídica, mas que não
(a bem da ideia de efetividade social do direito), não são determinantes da é pela lei tratado como título executivo perfaz, em tese, o conceito de
noção, dogmática, de jurisd ição. título monitório, habilitando a propositura de um'outra cl asse processual.
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"autolançamento") é, deveras, pressuposto da execução fiscal, não Regras: (i) para fins tributários, exigibilidade não se confunde
se apresentando, todavia, como uma sua elementar suficiente. com exequibilidade (executabilidade); (ii) nem toda obrigação
Conclusão: mais do que constituir a obrigação tributária (via tributária é exequível, embora todas sejam, em princípio,
lançamento) ou de vê-la constituída pelo contribuinte (via exigíveis 119 ; (iii) para fins tributários, a exigibilidade é condição
"autolançamento"), o Estado-fisco, para que possa se pretender necessária, embora não suficiente, ao aparelhamento de execu-
ção fiscal; (iv) para fins tributários, a executabilidade é condição
agente provocador do Judiciário em nível de execução, deve, 1
necessária e suficiente ao aparelhamento de execução fiscal' 2º.
precedentemente, constituir o correlato título executivo, fazen-
do-o mediante específico procedimento administrativo (falamos
aqui, repare-se, em procedimento, porque ausente a ideia de 9.3.1.2. MEDIDA CAUTELAR FISCAL
conflituosidade nessa fase) de inscrição do crédito tributário no
respectivo Livro de Dívida Ativa 117 • Genericamente considerado, o processo cautelar assim se de-
:
1 fine em razão de sua instrumentalidade em segundo grau: (i)
1
Com isso, a obrigação, desde antes exigível (tanto que o
todo processo é relação instrumental (1.1) (premissa a); (ii) o pro-
Estado-fisco, em sede de lançamento, notifica o contribuin-
cesso cautelar é, de ordinário, instrumento de outro processo
te, sem prejuízo da possibilidade de impugnação, para pa-
(7.11.1) (premissa b); (iii) o processo cautelar é instrumento do ins-
l gar), avança para o plano da exequibilidade (executabilidade),
trumento: é instrumental em segundo grau (conclusão).
essa sim condição necessária e suficiente para a instauração
Consoante assentado em 7.11.2., duas seriam as formas pro-
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dos executivos fiscais 11 8 •
cessuais cautelares fundamentais: (i) de um lado, encontramos as
cautelares concebidas com foros de especificidade (as nominadas,
1 valendo, para elas, a ideia segundo a qual, tendo sido pré-concebi-
117 "A inscrição da dívida ativa pertence à ' fase íntegrativa da eficácia' por
1 revestir a função de um ato de controle preventivo, necessário para que o da a forma de atuação jurisdicional cautelar, específicos seriam,
ato de lançamento assuma plena força de útulo executivo. Como adiante também, os respectivos requisitos); (ii) de outro, as genéricas
1 melhor se verá, a inscrição da dívida ativa situa-se na fronteira entre o
procedimento administrativo de lançamento (a cuja fase integrativa da (inominadas, expressão do denominado poder geral de cautela, cuja
1
eficácia ainda pertence) e o processo judicial de execução (da qual é outorga depende da ausência de remédio cautelar específico, bem
pressuposto necessário)" (Alberto Xavier, Do lançamento: teoria geral do
ato, do procedimento e do processo tributário, p. 196). como do preenchimento dos requisitos gerais, famus boni juris e
118 Ensina Araken de Assis, a propósito do tema: "Cuida-se [a prévia exigibilidade periculum in mora).
da obrigação (tributária) estampada na Certidão de Dívida Ativa] de mais
uma característica peculiar ao título executivo exibido pelo Fisco. Nos de-
mais títulos extrajudiciais, recorda José Afonso da Silva, o crédito se constitui
e a exigibilidade ou é a ele coeva, ou dela se origina, mas jamais precede· o 119 Falamos, aqui, que toda obrigação tributária é exigível, partin do da premi ssa
próprio título, como sucede na hipótese da certidão da dívida ativa. de que só há obrigação quando produzida (e operativa) a respectiva norma
Por óbvio, a circunstância de a exigibilidade preceder à certidão da individual e concreta. Excepcionalmente, nas hipóteses do art . 151 do Código
dfvida ativa não a elim ina nes.ta classe ele riw lo, reafirmando, pois, o Tributário Nacional, é possível imaginar obrigação tributária co nstituída, mas 1
ar1. 586, caput. O contribuinte poderá cumprtr a obrigação depois da não operativa; por isso, inexigível.
in crição, extinguindo-a. De outra banda, nula se mostrará a inscrição de 120 Tais regras aplicar-se-ão, também, aos casos de "autolançamento", nota.damente
crédito tributário ou não-tributJrio antes do implemento do respectivo ter- porque o reconhecemos, desde antes, como norma individual e concreta
mo" (IV/a nual do processo de execução, p. 734). apta a constituir fato e relação jurídico-tributários.
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Falar de medida cautelar fiscal, frente a tal quadro de possibili- Assim é, com efeito, nem tanto pelo conteúdo de tais dis-
dades, significa explorar precisamente uma das variáveis espedfi- positivos, senão por obra do que prescreve o parágrafo único
cas do fenômeno da cautelaridade. Significa dizer: colocamo-nos do art. 1° da mesma lei:
diante de modalidade processual que (i) visa à emissão de especí-
fica providência acauteladora, (ii) sendo governada, portanto, por "O requerimento da medida cautelar, na hipótese dos incisos V,
condições também específicas. alínea b, e VII, do art. 2~ independe da prévia constituição do
crédito tribután·o."
Pois é fundamentalmente disso que se ocupa a Lei nº 8.397 /
92, diploma instituidor da referida categoria: fixa, de um lado, o
Referido preceito, ao que se vê, não apenas excepciona a regra
conceito específico de medida cautelar fiscal (art. 4º)121 , prescre-
do art. 1º, caput (" O procedimento cautelar fiscal poderá ser instaurado
vendo, de outro, os requisitos cuja presença impõem sua conces-
após a constituição do crédito, inclusive no curso da execução judicial
são (arts. 2º e 3º, inciso 1) 122 , dos quais dois, em particular, mere-
1 da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Muni-
cem análise detida - os inscritos nos incisos, V, alínea b, e VII.
1
cípios e respectivas autarquias"), chegando a criar ficção verdadei-
ramente autolítica: medida cautelar fiscal é providência de
121 "Art. 4º. A decretação da medida cautelar fiscal produzirá, de imediato, a indisponibilização patrimonial que, nos termos do art. 4°, ocor-
li indisponibilidade dos bens do requerido, até o limite da satisfação da obrigação (...)."
122 "Art, 2°, A medida cautelar fiscal poderá ser requerida contra o sujeito passivo
rerá "até o limite da satisfação da obrigação" - se essa é a providên-
li de crédito tributário ou não tributário, quando o devedor: cia e seu limite, como outorgá-la sem conhecer-se a obrigação
I, ! I - sem domicílio certo, intenta ausentar-se ou alienar bens que possui ou
deixa de pagar a obrigação no prazo fixado; tributária? Mais: como conhecê-la (a obrigação tributária) sem
li - tendo domicílio certo, ausenta-se ou tenta ausentar-se, visando a elidir constituí-la? Impossível, assim nos parece, restando inviável,
o adimplemento da obrigação;
1/1 - caindo em insolvência, aliena ou tenta alienar bens; por isso mesmo, a outorga do provimento específico do qual
IV - contrai ou tenta contrair dívidas que comprometam a liquidez do seu tratamos na forma do retro-transcrito parágrafo único, ou seja,
patrimônio;
V - notificado pela Fazenda Pública para que proceda ao recolhimento do à revelia de prévia constituição da obrigação tributária.
crédito fiscal:
a) deixa de pagá-lo no prazo legal, salvo se suspensa sua exigibilidade;
b) põe ou tenta por seus bens em nome de terceiros;
VI - possui débitos inscritos ou não em Dívida Ativa, que somados ultrapas-
sem trinta por cento do seu patrimônio conhecido;
9.3.1.3. EXECUÇÃO FISCAL E MEDIDA CAUTELAR FISCAL: O TEMPO
VII - aliena bens ou direitos sem proceder à devida comunicação ao órgão DA COBRANÇA TRIBUTÁRIA
da Fazenda Pública competente, quando exigível em virtude de lei;
VIII - tem sua inscrição no cadastro de contribuintes declarada inapta, pelo
órgão fazendário; Por ocasião do item 4.4., deixamos assentado que a pro-
IX - pratica outros atos que dificultem ou impeçam a satisfação do crédifo." cessualidade exacional opera-se no particular campo da "juris-
"Art. 3º. Para a concessão da medida cautelar fiscal é essencial: ··
I - prova literal da constituição do crédito fiscal" . dição judicial", repelindo-se, nesse campo, a formação da cha-
Também na especial sede da medida cautelar fiscal, vê-se presente oposi- mada "jurisdição administrativa".
ção semelhante àquela que lançamos quando analisávamos o art. 156 do
Código Tributário Nacional: "causa" versus "veículo". Com efeito, o art. 2° E assim é não por outro motivo senão porque à Adminis-
da Lei nº 8.397/92 arrola, de sua parte, as "causas" que incitam a concessão
da medida em pauta (desde que associadas ao requ isito do inciso I do art. 3°), tração não é dado conduzir processo (administrativo) ·por ela
enquanto o art. 3°, inciso li, prescreve o veículo introdutor, no un iverso própria ativado: (i) o titular de pretensão, à guisa de realizá-la,
jurídico, daquelas mesmas causas.
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derrubando resistência que reputa indevida (representada pela (prescrição), pena de se o "perder" (aquele direito). Mais: o
inatividade do contribuinte, reitere-se), ou a formula (a preten- sistema faz disponível o direito de ação, para assim realizar o valor
são) ao próprio órgão do qual a resistência emana (assim faz o da estabilidade (segurança jurídica).
contribuinte, em nível de processo administrativo), ou a terceiro Não obstante claras, reiteramos que tais proposições derivam
(caso do processo judicial); (ii) se a dirigisse a si mesmo, não de um "olhar processual", ao lado do qual repousa urn'outra
seria titular de "pretensão", não pelo menos juridicamente, eis visão: frente à inatividade do contribuinte, que não impugna o
que restaria ela (suposta "pretensão") insusceptível de controle; crédito tributário nem o quita, à Administração não sobra outra
(iii) "pretensão" é vocábulo que, quando extravasa as barreiras alternativa senão dar seguimento à cadeira de positivação do
da linguagem ordinária e invade o direito, supõe controlabilidade, direito tributário, provocando o Estado-juiz via petição inicial
o que, por sua vez, supõe oponibilidade a sujeito diverso daquele executiva fiscal.
que a possui (a pretensão). Por outra: sob a óptica do direito administrativo, a atividade
Pois bem, quer isso significar, reafirmando-se o que lá, naquela processual do Fisco é imperativa, já não mais dispositiva; "deve"
passagem, se consignou, que, conquanto "auto-suficiente" no que ocorrer, não se retendo ao campo das meras "possibilidades".
1
diz com a produção da norma individual e concreta constitutiva da Do cotejo dessas duas ordens, ter-se-ia, então, um aparente
li obrigação tributária, a Administração assim não se põe quando paradoxo, a ser resolvido pela interveniência da noção de res-
o terna é litigiosidade defluente da inércia do contribuinte. ponsabilidade funcional: se a cobrança do crédito tributário
1
Nesse sentido, as execuções fiscais não seriam representati- "deve" ocorrer e assim não se põe, sendo colhida, por exemplo,
vas de um modelo exacional de processualidade tributária, mas pela prescrição, em face dos agentes administrativos de cuja
sim a própria encarnação de tal categoria - por isso falamos, atividade dependia referida cobrança deve ser dirigida paralela
pouco antes, em univocidade. investigação tendente a apurar eventual responsabilidade, úni-
ca forma de fazer verdadeira a premissa segundo a qual a co-
Disso tiramos: tal categoria processual não pode ser avalia-
brança do crédito tributário deve, e não simplesmente pode, ocorrer.
da ao sabor, único, do direito processual, devendo sê-lo, tam-
bém (e principalmente), sob a óptica do direito administrativo. Pois é exatamente nesse contexto que intercede a figura da
medida cautelar fiscal, instrumento já de antes aventado e que
Explicamos: vista pelos olhos do direito processual, execu-
pode e deve ser visto nesse contexto que aqui abrimos.
1 ção fiscal seria representação, em última razão, do denomina-
do direito de ação, contraface do conceito de jurisdição; cómo Com efeito, corno variável do fenômeno da cautelaridade, a
tal, vinculada estaria aos vetores da inércia e da disponibilidade, espécie em questão visaria à emissão de providência protetiva
princípios textualizados pelos arts. 2° e 262 do Código de Pro- do resultado prático do processo de execução fiscal - a saber,
cesso Civil e cujos efeitos explicam, sob certa coloração, os reitere-se, a indisponibilização patrimonial. Agora, note-se: se o
conceitos de prescrição e de segurança jurídica. Nesse sentido, processo de execução fiscal, sob a óptica administrativa, não é
mera contingência, senão urna imposição, e, mais, se a cautelar
dir-se-ia: subsu?-1-ido que está ao conceito de direito de ação, o
processo executivo fiscal deve ser manejado no tempo próprio fiscal vem à luz para aquele (o processo de execução fiscal) prote-
208 ■ PAULO CESAR CONRADO PROCESSO TRJBUTÁRJO ■ 209
ger, o que se há de concluir não é outra coisa, senão que tal Cientes de que toda investigação pragmática é, em direito,
modelo processual acessório, firmados os respectivos requisi- das mais árduas, induzindo temerários (porque precoces) juízos
tos, é tão imperativo como o respectivo principal (execução de "verdade/falsidade", não desejamos, aqui, outra coisa, se-
fiscal), repudiando-se, aqui, a aplicação de expressões não reduzir em linguagem pelo menos um dado, justamente o
caracterizadoras de pretensa discricionariedade. Por outra: (i) à ,1 que, como a pergunta antes formulada, apresenta-se óbvio: a
Administração não seria dado nenhum juízo de conveniência cobrança tributária é cronologicamente descompassada, à me-
ou oportunidade sobre a efetiva cobrança do crédito tributário, dida que se refere a créditos remotamente constituídos. Não sem
1, 1
devendo promovê-la; (ii) de igual modo, à Administração não razão: olhada sob a óptica processual, a cobrança tributária é,
é dado nenhum juízo de conveniência ou oportunidade sobre o como já visto, corolário do direito de ação, exercitando-se se-
aparelhamento das providências acauteladoras necessárias à gundo as noções de "direito de ação" /"prescrição": tendo cin-
proteção do crédito em vias de cobrança. co anos para cobrar, o Fisco assim o faz - cobra no tempo do
1 Nessa linha de ideias, mais do que criar um modelo proces- direito, mas muitas vezes fora do tempo da viabilidade factual, cir-
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sual, a Lei nº 8.397 /92 institui um dever (mais um!) para a cunstância que, ainda no campo da facticidade, amesquinha o
1
Administração: de permanente vigilância e apuração, junto a potencial prático da execução fiscal.
cada contribuinte, de eventual causa geradora de pedido cautelar
É bem certo, admitamos, que problemas jurídicos no direito
1
fiscal, pena de permitir o indesejável desencadeamento de tais
se resolvem. Destarte, se a cobrança no tempo do direito é cobran-
eventos e, com isso, a igualmente indesejável perturbação da
ça juridicamente viável, nada há a opor-se, em princípio, quan-
eficácia prática do processo de execução fiscal.
to à conduta do agente administrativo que nesses termos pro-
1
E assim ressurge, à evidência lógica, a mesma conclusão adre- cede. Sem prejuízo disso, desejável que o problema seja enca-
1 de lançada: se a cobrança do crédito tributário "deve" ocorrer e, rado sob o viés sistêmico: é elemento integrante do conceito
não obstante isso, a mesma se frustra pela verificação de evento geral com o qual vimos operando ("cobrança tributária") a
1
que poderia ter sido evitado à luz de uma medida cautelar fiscal,
1 decantada cautelar fiscal; dela, portanto, não podemos descurar
em face dos agentes administrativos de cuja atividade dependia
e, por isso, nela devemos nos concentrar à guisa de resolver o
referido processo deve ser dirigida paralela investigação tenden-
precitado confronto - direito (teoria) e prática.
te a apurar eventual responsabilidade, única forma, mais uma
vez, de fazer verdadeira a premissa segundo a qual a cobrança do Assim caminhando, devemos assentir que a cobrança efetua-
crédito tributário deve, e não simplesmente pode, ocorrer - daí porque da no tempo que o direito proclama só é juridicamente viável
1
afirmamos, linhas antes, que o tema da cautelar fiscal sobrele_va- acaso a hipótese com a qual se estiver operando não seja daque-
-se no exato momento em que olhamos o processo de execução las que enseje a formulação de pedido cautelar. Reitere-se: quan-
fiscal sob o prisma administrativo. do o sistema introduz, em seu ventre, a figura da cautelar fiscal,
cria para a Administração o encargo de apurar, junto a cada con-
A par de tudo isso, acorre, agora, o dado prático, no qual
penetramos por meio de uma singela indagação: a quantas anda tribuinte, eventual causa geradora de prejuízo para a eficácia prá-
a cobrança tributária? tica do processo de execução fiscal.
210 ■ PAULO CESAR CONRADO
PROCESSO TRIBUTÁRIO ■ 211
Se é certo, assim, que o Fisco dispõe de "tempo jurídico" ra- Não é esse, sabemos, o tratamento ordinariamente atribuí-
zoavelmente largo para exercitar o direito de ação de execução do ao tema: identifica-se na prescrição, de regra, uma causa de
fiscal, não é menos correto que a gestão de tal tempo é de ser extinção do direito de ação, incapaz de fulminar o direito de
criteriosa, orientando-se pelos mesmos vetores que, no direito fundo (material).
positivo, funcionam como requisitos para a concessão da medida Seja como for, reitere-se: a matéria, em nível tributário, é des-
cautelar fiscal. Virtuosa, tal providência, retira-nos do sempre tinatária de tratamento próprio, o que nos autoriza a concluir,
desquerido campo das subjetividades, permitindo que a cobrança ratificando a proposição inicial, que prescrição e decadência,
tributária oriente-se, cronologicamente, não apenas pelo tempo no específico setor em foco, constituem modalidades que ope-
absoluto da prescrição, mas também pelo tempo relativo do ris- ram num mesmo nível.
co de lesão à efetividade da pretensão executiva.
Por outra: prescrição e decadência - conceitos que, em ní-
Ao final, o que concluímos é que a medida cautelar fiscal, ins- vel teórico geral, são por sua eficácia diferençados - em direito
trumento de ínfima aplicação prática, deveria, no mínimo, balizar tributário têm o mesmo tônus.
a conduta do agente administrativo responsável pela cobrança tri-
Indevida, por isso, a tomada, sem qualquer reparo, do regi-
butária, servindo os respectivos requisitos como objetivo critério
me jurídico geral da prescrição se o que se quer é aplicá-la no
de definição do momento mais adequado para a deflagração da particular campo tributário.
cobrança tributária: conquanto juridicamente viável, a execução
Já daí impor-se-ia, assim temos, a negativa da tese-base se-
fiscal proposta no prazo prescricional pode, do ponto de vista prá-
gundo a qual prescrição (tributária) não se decreta ex officio 123 :
tico, quedar comprometida pelo descuido em relação à verifica-
recuperada a premissa de que, sob a óptica eficacial, análogas
ção das condições que habilitavam a paralela formulação de pedi-
apresentam-se prescrição (tributária) e decadência (igualmente
do de medida cautelar fiscal, reaflorando, assim e mesmo que no
tributária) - operando, ambas, como causas de extinção dos cré-
tempo do direito se esteja, a questão atinente à responsabilidade
ditos daquele jaez -, imperativo admitir o atingimento, nos dois
funcional dos que gerenciam a indigitada atividade de cobrança.
casos, do direito de fundo, circunstância que justifica sua de-
cretação ex officio, numa e noutra situação, pela autoridade para
9.3.1.4. DECRETABILIDADE EX OFFICIO DA PRESCRIÇÃO EM NÍVEL DE tanto competente 124 •
EXECUÇÃO FISCAL
Natural que assim seja, com efeito. Execução é, em nosso ' Profligamos, com tudo isso, a tese de que a prescrição
sistema, a única forma processual cuja tutela não se constitui intercorrente é fenômeno inerente à natureza dos processos exe-
como fim (do ponto de vista cronológico) do processo, senão cutivos, funcionando como corolário inexorável da noção de
1
como ato intercorrente: confere-se-a no decorrer do processo, segurança jurídica para tais modalidades - assim como o é o
1 mediante uma série de atos, no mais das vezes canalizados à conceito de prescrição (propriamente dita) para todos os de-
expropriação do patrimônio do devedor. Como ato final do pro- mais tipos processuais.
j
cesso (de execução), o que se vê, portanto, não é a tutela exe- Conclusão disso: seu reconhecimento independe da exis-
cutiva propriamente dita, senão um ato (sentença) de conteú- tência de enunciado prescritivo que a preveja com foros de
do puramente homologatório, tendente a encerrar, e tão ape- especificidade, bastando, antes disso, que o correspondente fato
nas encerrar, a cadeia processual. implicador se verifique, a saber, a inércia do interessando
Ocorre que a tutela executiva (cuja outorga se dá, repita-se, (exequente), por tempo igual ou superior ao da prescrição (pro-
intercorrentemente) tem a sua concessão subordinada a duas priamente dita) , no que diz com a prestação, em favor do Esta-
condições inexoráveis: primeiro, a preliminar citação do deve- do-juiz, dos elementos-informações necessários à consecução dos
dor; segundo, a localização de patrimônio de possível expropria- atos executivos indispensáveis ao aperfeiçoamento da respectiva
1 ção. À falta de uma e/ ou outra de tais condições, frustrada res- tutela (citação/penhora).
tará a outorga da tutela executiva (intercorrente), ficando preju-
Outra conclusão: prescrição intercorrente é causa de
dicada, ademais, a produção do ato finalizador do processo (sen-
extinção da obrigação tributária cuja decretação se põe desde
tença chancelando a satisfação do credor). Aí está, precisamen-
sempre viável independentemente de provocação do interes-
te, a base lógica da ideia de prescrição intercorrente: no plano
sado. Submete-se, usando outro falar, ao mesmíssimo regime
das execuções, o Estado-juiz tem que ser provocado no prazo
aplicável à prescrição propriamente dita (do quê tratamos no
por lei estabelecido (prescrição propriamente dita); mas não só:
item imediatamente anterior, de número 9.3.1.4.).
em tal plano, as condições necessárias à outorga da correlata 1
•