Você está na página 1de 100

ESCOLA DE ARTES

VISUAIS DO SÃO
BENTO
OU: ESTUDOS DE UM
CAMINHO PARA O
RESTABELECIMENTO
ARQUITETÔNICO DOS
ENDEREÇOS 26 E 28 DA
AV. SETE DE SETEMBRO

JOÃO VITOR GUIMARÃES SANTOS


Trabalho final de graduação submetido ao curso de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da
Bahia como requisito parcial para titulação do grau de
Arquiteto e Urbanista.

Orientador: Márcio Correia Campos

Banca examinadora : Carlos Alberto A. Bomfim


Eugênio de A. Lins
Lídia Q. Viana

Salvador, Bahia. 2020


4 | Escola de Artes do São Bento
Agradecimentos.

A conclusão do curso de Arquitetura


e Urbanismo não seria factível para
mim, sobretudo num ano como o de
2020, não fosse o esforço de outras
pessoas que me acompanharam em
todos os instantes dessa jornada. Dedico
essa página, portanto, para agradecê-
las. Primeiramente, como não poderia
deixar de ser, destaco o admirável
apoio, paciência e zelo dos meus pais
— Dona Cátia e Seu Orlando — que não
me deixaram esmorecer nem por um
segundo. Essa conquista também é deles.
Ao meu irmão Pedro, à minha prima Ana
e aos queridos familiares devo também o
meu mais profundo agradecimento até
aqui.

Dos amigos queridos não esquecerei


jamais os gestos de apoio e carinho.
Aqueles que eu conheci na faculdade
ou fora dela, levarei todos comigo para
vida toda. Cito, em especial, os que
descobriram o fascínio, as possibilidades
e os sacrifícios da arquitetura junto
comigo: Thiago Moreira, Eduardo Salles,
Laís Cerqueira e Kaíque Amorim. Cada
um deles me inspira e me ensina de uma
forma diferente. Os quatro, sem dúvidas,
fazem parte disso tudo. Agradeço
também aos grandes amigos, colegas e
estimados companheiros que fiz na UFBA
durante os 5 últimos anos de aprendizado
e amadurecimento.

Obrigado ao amor da minha vida,


Vanessa Miranda, por ser quem ela é e
estar ao meu lado nas horas mais difíceis.
Ela me faz acreditar!

E obrigado a Márcio, o orientador


desse trabalho, embora ele sempre recuse
agradecimentos e me relembre que está
apenas "fazendo o seu trabalho". Trabalho
muito bem feito, mestre. Você é uma
referência como educador e arquiteto.

Espero que esse produto esteja à altura


de todos vocês.

Escola de Artes do São Bento | 5


“[...] É um discurso sobre a possibilidade
do que fazer e, portanto, ser. A nossa
existência é coisa alguma a não ser o que
fazemos. Uma construção não pretende
superar nada, simplesmente é como se
disséssemos : 'Vamos ver de novo o
quanto é belo aquilo'."

Paulo Mendes da Rocha, (Revista Techne,


1998, p.18-23 apud Maira Francisco Rios,
2013, p. 81)

Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

6 | Escola de Artes do São Bento


Escola de Artes do São Bento | 7
Introdução
Salvador, século XXI. Cascos vazios nada mais objetivo que ocupar o que já existe e
se acumulam a olhos vistos na cidade, conferir serventia outra vez. Mas não é razoável
perdendo dia a dia toda e qualquer resumir a isso, afinal, boa arquitetura não se aparta
substância residual que lhes assinale da subjetividade. E é sob esse norte que se baseia
como algo que noutro tempo teve vida a proposta explicitada a seguir, espacializada no
urbana decente. Carcaças de pedra e cal, Largo de São Bento, em Salvador, Bahia, mais
concreto e aço, sub ou inutilizadas, que precisamente na ocupação de duas de suas até
presenciam o tempo e suas vicissitudes então lacunas: a casa 28, conhecida como “Casa
escamotearem as próprias justificativas do Esperanto”, e seu anexo, a casa 26, antiga sede
como produto arquitetônico-intelectual da Biblioteca Anísio Teixeira.
válido. É memória e conhecimento
dirimidos pelo distrato unilateral entre O projeto decorre alicerçado na herança de usos
o envelhecer e o cuidar deste, decerto. das casas e exprime dela uma nova exploração
Todavia, não cabe apontar o irrefreável comungada com a análise das suas questões
transcorrer dos anos como culpado. idiossincráticas. É um ensaio de redescoberta,
Melhor colocando, então: É o efeito do investigação técnica e reposicionamento do
tempo potentemente catalisado pelo conjunto eclético como um destino aos habitantes
exercício automático de desimportância, e visitantes da capital, partindo da sua identidade.
de não declarada renúncia à tentativa de É como conceber um itinerário paralelo onde o
manutenção da cultura. Quando não tem prédio seja, de novo, uma integridade, um sistema
mais propósito de Arquitetura, ainda o é? completo, e não fóssil do que ali havia, sem se
predispor a fazer pastiche, dissimulação estilística
Diferentemente da natureza, em ou especulação do passado. Creio que tal objetivo
que as ossadas se decompõem, viram tenha sido alcançado nas páginas que se seguem.
matéria orgânica e nutrem o solo, num
encadeamento cíclico, harmônico e
perfeito, na realidade do lugar humano as
“ossadas edificadas”, por assim dizer, são
mais que um estorvo, consistem em puro
agravante de stress social. A "Teoria das
janelas quebradas”, de James Q. Wilson,
atesta que há sempre uma causalidade
entre o abandono e a ilicitude. A primeira
janela quebrada torna o ato de quebrar a
seguinte mais natural, e assim por diante,
até normalizar-se a ruína inteira. E essa
lógica da destruição retroalimentada
permeia os vazios erguidos num conjunto
de pontos nulos na superfície disposta,
servindo a nada e a ninguém. São nulos,
contudo, numerosos. E todos, associados
a um contexto contemporâneo de
conturbações da polis, passam a
representar farto campo para práticas fora
da civilidade estabelecida.

Resgatar um bem arquitetônico


deteriorado, logo, não é somente vontade
de valorar de novo a historicidade
esquecida e seus signos, mas é, acima
de tudo, efetuar racionalização espacial,
construtiva e de planejamento. É pensar
a paisagem antrópica na sua completude,
sem bloqueios, na profundidade
verdadeira onde ela se radica. Se se quer
adotar o pragmatismo, pois vamos a ele:

8 | Escola de Artes do São Bento


Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

Escola de Artes do São Bento | 9


Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

10 | Escola de Artes do São Bento


Escola de Artes do São Bento | 11
Índice:
1. Contextualização
1.1. Construir no construído: Práticas de reavivamento da arquitetura vacante 14
1.2. O urbano do Centro Antigo 20
1.3. O São Bento 26
2. Introdução à preexistência
2.1. O conjunto 36

3. Orientações e argumento
3.1. Justificativa 42
4. Estudo do tema
4.1. O tema 48
4.2. Referências 55

5. A proposta
5.1. Linha teórica da intervenção 64
5.2. Partido arquitetônico 66
5.3. Programa 68
5.4. Análise Climática 70
5.5. Desenhos 74

12 | Escola de Artes do São Bento


Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

Escola de Artes do São Bento | 13


1.Contextualização
1. Contextualização

1.Construir no construído:
Práticas de reavivamento
da arquitetura vacante
1.1 Visão geral

A reabilitação de vazios construídos é veis à — se abstendo de reivindicar ser “à prova


um ato fundamentalmente necessário de de” — vacância, em permitir outro caráter em certa
fazer arquitetura na contemporaneidade. altura (“‘A’ que se transforma em ‘B’)’, criar um
Passado o peremptório ânimo caráter momentâneo (“ Uma oportunidade entre
modernista na busca pelo Zeitgeist que ‘A’ e ‘B’”) ou abarcar caráter de multiplicidade de
obliterava o prévio sem margem a tantas tempos possíveis (“Todos os tempos em 'A’”).
considerações, o ofício do construtor se
inclina a um acordo pactuado com o que O termo que intitula o tópico é firmado por
há de assentado, graças, num primeiro Francisco de Gracia na publicação “Construir en
momento, a superação geracional da cisma lo construído: La arquitetura como modificación”,
comum com a precedência e, também, ao de 1992, e arremata bem a condição intermitente
esperável decréscimo da disponibilidade da arquitetura enquanto objeto e processo
de grandes parcelamentos inalterados em aberto pertencente a um espécime em constante
face da densificação construtiva global. O trânsito, que é a cidade. Não se ensimesma pois é
radicalismo dos ousados planos dá lugar, um ente associativo com sua membrana urbana,
nesse encaminhamento, a uma dialética de por definição. O autor espanhol rechaça o que
heterocronia arquitetônica (PROCHNOW, chama por “hipertrofia do valor da antiguidade”,
2015), por tratar o construído como via de cuja ação futura é restringida a embalsamar a
solução dos seus próprios problemas. obra que ali havia para a posteridade. Avançando
sobre o léxico do tema, se destaca o neologismo
Ao longo dos anos, alguns “Re-arquitetura”, cunhado por José Arthur D’Aló
equipamentos, outrora bem justificados Frota, que traz a compreensão da produção que
e úteis à dinâmica local no contexto refaz a cidade como “collage”, particionada em
histórico em que foram concebidos, classificações de tempo e tipo, ao passo que se
acabam por perder a capacidade de amarra como conjunto, rejeitando o unitarismo
responder às demandas originais de uso, e a construção como encerramento absoluto
renovadas numa volatilidade cada vez ou como “peça museológica” intocável. O autor
mais acentuada, sobretudo a partir da qualifica o sentido por:
Revolução Industrial, que põe as cidades
a confrontar a absorção dos inéditos “[...]prática arquitetônica que resgata a história
programas fabris com muitas de suas enquanto manifestação que somente poderá ser
preexistências edificadas. No entanto, compreendida plenamente se incorporada ao
a adaptação de uso em construções é presente [...] onde a recuperação histórica é parte
documentada desde a conversão de do problema, nunca seu objetivo final.”
templos pagãos em igrejas cristãs na Roma (FROTA, 2004, p.110)
proto monoteísta. O Panteão, epítome
milenar do que é readaptação, foi, em sua
origem, homenagem a todos os deuses
(Pan = “todos”, théos = “deus”), antes de se
tornar diaconia e Basílica de Santa Maria e
os Mártires. É um dos instrutivos exemplos
de sucessão de relações de obsolescência
versus reutilização dilatadas e reajustadas
eras a fio. Hoje, tomam vulto propostas
idealizadas através da autoconsciência
de rearranjo no tempo, modelos de Figura 1 – O escritório neerlandês Zeec Architecten adaptou a capela
gótica de St. Jakobus edificada em 1870 para uma residência unifamiliar
“arquitetura do entremeio” (GUARDIET, contemporânea, em Dresden, Países baixos. A única imposição para os
2018), pensadas de maneira que sejam, arquitetos era a de manter a feição externa da construção inalterada.
Desde 1970 foram fechadas mais de 1000 igrejas católicas no país, que
por si só, reconstruíveis e menos suscetí- possui cada vez menos fiéis. [FIGURA]. Foto de Frank Hanswijk, 2011.

14 | Escola de Artes do São Bento


Figura 2 – Reforma realizada no Castelo
Moritzburg, em Halle, Alemanha. O projeto , de
autoria do escritório Nieto Sobejano, adaptou a
fortaleza gótica do séc. XV num amplo espaço de
exposições.
[FIGURA]
Foto de Laurian Ghinitoiu, 2008.

Não obstante a necessidade de algum grau


de monitoramento diretricional que vise
prezar por bons métodos de reavaliação
da malha consolidada, como enfatizam
Gracia e Frota, essa vigilância faria por bem
não suplantar tentativas de resgate de
propriedades em situação-limite. À vista
disso, o gesto de revisitação à arquitetura
prescrita tensiona, invariavelmente, os
ditames do afã patrimonial por questionar
a monumentalidade caso a caso, uma
vez que, se os limites institucionalizados
quanto às estratégias de atualização
esbarram a mínima possibilidade de
formatação do prédio aos anseios do
presente, para o mesmo resta à função de
ícone tumular distanciado do maquinário
urbano contemporâneo, um estranho
ao seu tempo — “tempo” tido aqui
como nada antes ou após do agora,
comum a qualquer coisa que ainda exista
materialmente —, isso quando resiste à
espera de outra investida mais protocolar
e não sucumbe por completo. Destarte,
a caducidade do construído não se dá
quando apenas pela pátina, e sim pela
dissolução eutanasiada deste para com
seu meio.

Algo que se esclarece, tanto nas posições


dos autores citados como na reflexão
crítica geral estabelecida pelos principais
arquitetos que escreveram sobre a matéria,
é que não há axiomas seguros o bastante
para se apoiar quando se fala em intervir no
já existente. Só o que segue como consenso
é que se requer, impreterivelmente, uma
grande apreensão do edifício para que
se siga ação técnica que o altere com
coesão. É básico entender que, seja ela
qual for, arquitetura nenhuma é elástica
(RODRIGUES, 2015) e apresentará nós
que desafiarão o arquiteto a negociar sua
autoralidade no desenlace destes.

Escola de Artes do São Bento | 15


1.2. Recorte local
1. Contextualização

Em razão da complexidade vinculada das e subutilizadas. A cartografia a seguir sinaliza


ao processo de recompor em certa forma as ocupações informais de Salvador em 2012 e
uma arquitetura passada, propostas de corrobora essas informações, apesar da defasagem
intervenção para os edifícios tombados amostral de quase uma década.
necessitam passar pelo crivo das agências
mantenedoras desses conjuntos. No
Brasil, o IPHAN (Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional) é a
autarquia federal responsável pela
preservação da memorabilia arquitetônica
erguida e a anuência de projetos junto ao
órgão está submetida ao atendimento
de diversos critérios técnicos. Contudo,
embora haja forte rigor por parte dos
órgãos de proteção das obras listadas
como de interesse cultural quanto aos
planos de readequação, o que se percebe
nas grandes metrópoles brasileiras é
uma grande inoperância com relação à 5 km
conservação desses prédios — ou, em
Figura 3 – Mapa das ocupações informais em Salvador em no ano de
muitos casos, a ruína deles —, o que torna, 2012. [FIGURA].
com os anos, mais difícil a aplicabilidade Fonte: “Práticas coletivas e o direito à cidade em Salvador, Bahia. ”,
2016. Peça gráfica por João Vitor Guimarães, 2020, com base no Mapa
de técnicas reabilitadoras. 01 do PDDU de Salvador, 2016.

Um levantamento da Controladoria Para efeito de amplitude na leitura do


Geral da União (CGU) divulgado e m 2018 problema: A cidade de São Paulo possuía, em
constatou que 14 dos 24 bens imobiliários 2019, 907 imóveis sem uso nenhum, e desses,
de responsabilidade do IPHAN na Bahia 50 se encontravam localizados no Centro, de
estavam em crítico estado de degradação. acordo com a Secretaria Municipal de Urbanismo
Mas o problema vai para além dos edifícios e Licenciamento. Além de interferir diretamente
históricos. A gerência do poder público no déficit habitacional nesses e outros municípios,
sobre os vazios edificados de um modo prédios despovoados são enorme preocupação
geral é comprovadamente deficiente em sanitária e de segurança pública. O abandono
grande parte do território nacional, e o ocasiona a formação de focos de doenças, já
resultado dessa problemática é um sem- que favorece o acúmulo de entulho e fertiliza a
número de prédios abandonados em proliferação dos vetores transmissores. Em 2020,
descumprimento de sua função social na cidade de Campo Grande–MS, foram eliminados
prevista em lei compondo a paisagem 24 criadouros ativos de dengue encontrados em
das cidades brasileiras. Uma quantificação 53 imóveis vazios durante a inspeção de um só
de 2019 divulgada pela Superintendência dia, além de removidos potenciais reservatórios do
do Patrimônio da União da Bahia (SPU/ mosquito em todos os endereços, conforme dados
BA) afirma que existiam, em Salvador, da Secretaria de Saúde local. Não bastasse o risco
58 prédios totalmente desativados epidemiológico, esses locais servem, ademais, de
pertencentes à união, ou seja, sem registro esconderijo e depósito para atividades criminosas.
particular e que prescindiriam a burocracia Enfim, ao ponto da ruína estrutural, ameaça o
dos trâmites da desapropriação, facilitando desmoronamento, exigindo iniciativas paliativas
a tomada de ações, em tese. que protelem o colapso do edifício e evite outros
desastres.
O Centro Antigo de Salvador (CAS)
sofre como o principal território municipal Isto posto, faz-se indispensável lançar mão
sob essas circunstâncias, segundo dados do preenchimento dos vazios construídos
do Instituto IDEAS – Assessoria Popular como um dos recursos para solucionar o
de 2018. À época, o instituto apurou quadro de decaimento da qualidade urbana
pouco mais de 1.500 edificações que não doméstica, especialmente nos sucatados centros
atendiam ao seu papel legal apenas no metropolitanos brasileiros. É, outrossim, artifício
trecho, incluindo construções desocupa- para devolver a significância de construções de a-

16 | Escola de Artes do São Bento


tribuído valor histórico, quando existe — não cua que a original, tais quais as intervenções
sendo um imperativo, entretanto —, ainda que de Lina Bo Bardi no último século. O que
descontinuado o uso anterior à desativação. não se deve dispensar é o bem físico,
Como discorre Ana Carolina Pellegrini no artigo “O perecível, e cuja presença depende de
patrimônio projetado”, são várias as experiências algum desígnio para ser legítima.
onde a proposição de nova vertente para o edifício
reconfigurado atinou uma função até mais profí-

10 km

Figuras 4 e 5– Acima à esquerda, mapa com a distribuição


das regiões com maior risco de contração da dengue
na cidade de São Paulo no ano de 2016. À direita, mapa
com a espacialização da incidência de vazios construídos
por subprefeitura regional em 2018. Não por acaso, a
Subprefeitura da Sé (em destaque), com mais de 700 imóveis
ociosos na época, apresentava um dos maiores índices de
infestação, chegando ao mesmo nível dos bairros periféricos,
que tem um número geralmente maior devido à ausência de
saneamento básico.
[FIGURAS]
Fonte: Elaborado por Editoria de Arte/Folhapress com
base nos dados da Secretaria Municipal da Saúde e
Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento,
respectivamente. Editado por João Vitor Guimarães, 2020.

Figura 6 – Casa nº 3007, edifício


abandonado de dois pavimentos
situado na Avenida do Estado,
ex-zona ceralista do centro de
São Paulo.
[FIGURA]
Foto de Douglas Nascimento,
2012.

Escola de Artes do São Bento | 17


1.3. Motivação - Os porquês do São Bento
e das casas 26 e 28

A escolha do perímetro de análise e, em pelo caos da pichação sobre a arquitetura


seguida, dos imóveis a servirem de estudo desmantelada em ruído com a aparente placidez
para o exercício de projeto, teve gênese do espaço e da Basílica plantou uma inquietação
na constatação da comprovada existência particular à medida que aquele espaço era
majoritária de vazios construídos no Centro experimentado, sentido, temido, se tornando,
Antigo dentro do recorte soteropolitano, assim, uma motivação genuína. A decisão que
como foi mostrado. Portanto, numa viria a seguir era qual dos dois conjuntos de vazio
visão macro, é indicada, a princípio, essa naquele lugar se apresentava como a opção mais
extensão da cidade como a que mais urge adequada para uma intervenção hipotética — o
por proposição de soluções efetivas de antigo Hotel São Bento ou as casas 26 e 28.
salvaguarda arquitetônica.
As antigas casas são elegidas, sobretudo,
O São Bento despontou, então, como devido ao entendimento das suas potencialidades
uma localidade assaz ilustrativa desse e vantagens únicas ali. O primeiro motivo é o
cenário na Salvador do Centro. O principal fato do casario eclético estar implantado numa
fator que estipula a região é uma percepção favorável condição de esquina (Avenida Sete
empírica pessoal como espectador de Setembro com Largo de São Bento) e com
passante da crescente dicotomia estética sua fachada mais extensa voltada para o largo,
gerada pelo mosteiro comparado aos um evidente qualificador urbano da região. A
decadentes edifícios contíguos no largo, segunda grande vantagem é a oportunidade de
mais esmiuçado à frente. Não há como ampliação construtiva dentro do lote que a casa
ignorar que a mesmerização provocada 28, principalmente, oferecia graças ao jardim late-

Figura 7 - Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

18 | Escola de Artes do São Bento


1.4. O Devir e o projetar - Compreensão
temporal do estudo

ral, elemento tipológico não tão recorrente Antes de prosseguir com a análise do
na área. Outra questão de interesse marcado, lugar e do projeto arquitetônico realizado
também ligada à sua tipologia, é a existência a partir dela, se faz imprescindível
do quintal. Esses dois respiros do conjunto com a contextualização temporal do
relação ao limite do terreno poderiam ser objetos desenvolvimento desse trabalho.
de grande valia nos desdobramentos de partido Toda a análise em campo, incluindo o
numa reconfiguração. levantamento fotográfico e anotações, foi
feita entre os meses de julho e dezembro
O quarto critério que reafirma a decisão pelo de 2019. No início de fevereiro de 2020,
sobrado e seu anexo é a interessante situação de já durante o curso da elaboração do
conforto ambiental na qual se encontram. A fachada Trabalho Final de Graduação, é realizada
frontal está protegida do insolejamento por conta no São Bento a tapumação de todo o
da combinação da corpulenta massa vegetal que limite do casario para limpeza e posterior
circunda o edifício com os altos prédios vizinhos. implementação das obras da nova
Essa boa inserção, melhor esmiuçada adiante, será Biblioteca Anísio Teixeira, coordenada
aliada nas estratégias de adequação climática da pelo IPHAN-BA e executada pela Mehlen
proposição. Construções Ltda. O projeto de arquitetura
é de autoria da Domo Projetos e o serviço
O quinto e último critério que indica e determina segue em andamento até a redação desse
a escolha pelos imóveis é reversibilidade do texto.
arruinamento através do reuso estrutural da sua
arquitetura. Ainda que estivesse nítido o estado Dessa maneira, é preciso explicar
depletado da materialidade do conjunto, não se que o panorama qualitativo do espaço
tratava de uma mera reminiscência na paisagem. construído apresentado aqui, assim
Logo, o fato de se ter, mesmo após anos de como cada aspecto da leitura ilustrada
abandono, a possibilidade de recuperação com as fotografias e desenhos do bem
arquitetural sem resumir a preexistência ao papel arruinado, se referencia tão somente aos
de casca ou embalagem, é uma razão de suma dados coletados durante o intervalo de
importância na escolha dos imóveis. Essa leitura, tempo citado anteriormente. O casarão,
inclusive, só foi possível por causa da não vedação o largo e o Centro Antigo com os quais
da entrada lateral da casa 28 no momento de a intervenção se relaciona são aqueles
prospecção, o que permitiu assimilar o espaço compreendidos até esse momento. A
para além dos cadastros e plantas consultadas. reforma atual não foi considerada como
um impeditivo da já iniciada construção
do exercício e nem tem com ele qualquer
conexão que não seja o objeto tratado.

Figura 8 - Atual do coroamento da Basílica de


São Sebastião do Mosteiro de São Bento.
[FIGURA]
Fonte: Patrimomioespiritual.org

Escola de Artes do São Bento | 19


2. O urbano do Centro Antigo
1. Contextualização

2.1. Diretrizes do PDDU e LOUOS

Segundo as normativas do Plano dos seus aspectos identitários, paisagísticos e


Diretor de Desenvolvimento Urbano de ambientais. Entre essas está a APR, demarcação por
Salvador (PDDU) e do zoneamento da inteira tombada que abrange o Centro Histórico de
Lei de Ordenamento e Uso e Ocupação Salvador e imediações, a qual o São Bento integra.
do Solo (LOUOS), ambos sancionados Todo imóvel situado dentro da poligonal da APR,
em 2016, o Largo e Ladeira de São Bento tombado individualmente ou não, deverá atender
estão regulados pelos dispositivos de às restrições do Art. 117 da LOUOS promulgada
delimitação urbana da Área de Proteção em 1972, transcrito abaixo:
Rigorosa (APR), faixa contida dentro da
Área de Proteção Cultural e Paisagística “Art. 117 - Com objetivo de manter rigorosamente
(APCP) atualmente regulamentada e a visibilidade, a tipologia e as demais características
que atende a jurisprudência da chamada originais das primitivas edificações, todas as
Zona de Centralidade Metropolitana do intervenções efetuadas nos imóveis tombados
Centro Antigo (ZCMe-CA). Começando isoladamente, áreas tombadas e nas Áreas de
dessa última, as diretrizes gerais estão Preservação Rigorosa estão sujeitas às limitações
definidas no Art. 175 do documento quanto: Ver tópico (1 documento)
e, particularmente, vale sublinhar duas
dessas orientações pois lidam com a) à determinação de recuo, afastamento, gabarito
qualquer implementação proposta: e volumetria;

O inciso primeiro dialoga com a b) ao tratamento das fachadas e da cobertura;


importância cultural do CAS e do teor das
estratégias a serem adotadas: c) à abertura ou fechamento de envasaduras e a
proporção de cheios e vazios;
“I - Fortalecimento como espaço de
centralidade metropolitana, tanto do ponto d) às soluções de ordem estrutural e/ou espacial;
de vista simbólico quanto do cultural,
político e econômico, mediante o resgate e e) às soluções e ao tratamento dos elementos
incorporação de novas funções capazes de internos;
integrá-lo plenamente à vida urbana e ao
desenvolvimento do Município.” f) às soluções de tratamento exterior, sobretudo os
referentes à iluminação, mobiliário, arborização,
Já a primeira e segunda alíneas do engenhos publicitários e sinalização;
inciso três reforçam o estímulo de práticas
de readequação: g) à fixação de taxa de ocupação.

“III. revitalização da ZCMe-CA – Centro Parágrafo Único - As normas referidas no presente


Antigo, contemplando entre outras artigo serão estabelecidas pela
medidas: SPHAN, IPAC e Prefeitura.”
a) recuperação de áreas degradadas
e/ou ociosas, requalificando-as para Embora estejam elencados os critérios avaliados,
novos usos voltados à atividades culturais, o documento não fornece parâmetros gerais de
comerciais e de serviços, com destaque modificação, atribuindo a apreciação e licença das
para aquelas destinadas ao lazer e turismo, intervenções ao IPHAN, vide trecho complementar
e também para a moradia; sobre a ZCMe-CA, do PDDU em vigência:
b) recuperação por meio de retrofit
de imóveis tombados ou não destinados “Parágrafo único. Na Área de Proteção Rigorosa
a revitalização da área destinados a usos (APR) a que se refere a Lei Municipal nº 3.289/83,
públicos ou privados. [...]” que inclui o Centro Histórico tombado pelo IPHAN,
na ampliação, reconstrução de edificações, o
Parte do Sistema de Áreas de Valor coeficiente de aproveitamento será resultante da
Ambiental e Cultural (SAVAM), as APCP’s volumetria permitida pelo IPHAN.”
são áreas que logram de parâmetros
próprios no que se refere à manutenção Sendo assim, os ordenamentos do Plano Diretor,

20 | Escola de Artes do São Bento


somados aos instrumentos auxiliares fixados para tre outras consequências, numa estabilização
a evolução dos bairros e subdistritos do Centro das atividades urbanas, pouco transformadas em
Antigo da cidade, seguem a lógica de perpetuidade termos de uso do solo comparativamente à outras
do cunho sociocultural e espacial conhecido, regiões da capital — isto é, convertidas de um uso
baseado na estimação de sua compleição física. O ativo para outro uso ativo, excetuando-se os já
vigor desse aparato legal sobre a área resulta, en- falados esvaziamentos.
Figura 9 – Mapa do SAVAM, em Salvador.
Em laranja, estão as APCPS .
[FIGURA]
Fonte: Plano Diretor de Desenvolvimento
Urbano de Salvador, Mapa 07 - Sistemas de
Áreas de Valor Ambiental e Cultural. 2016.
Editado por João Vitor Guimarães, 2020.

São Bento

2 km

APR (Área de proteção rigorosa) 2.2. Permissões de gabarito


51 m
45m
30m A partir da trazida orientação urbanística
24m
18m
no tocante às restrições de interferência
12m na paisagem patrimoniada do Centro,
9m
6m
definiu-se o teto de gabarito permitido
Encostas em cada um dos trechos. Naturalmente,
a limitação se flexibiliza à medida que
avança para o continente, reservando
para a borda — à exceção do Comércio —
os gabaritos mais baixos. A área de APR
não apresenta, expressa ou tacitamente,
nenhuma restrição convencionada, já que,
como posto, cada nova alteração está
sujeita a critérios próprios a depender do
São Bento sítio ou do edifício reformado. Ao lado,
um mapa do Anexo dois do PDDU de
2016 ilustra as diferentes possibilidades
de altura máxima do CAS.

Figura 10 – Indicação das permissões de altura máxima nas


construções do Centro Antigo e arredores.
[FIGURA]
Fonte: Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de
500 m Salvador, Mapa 03 – Gabarito de altura máxima das
edificações na ABM. 2016. Peça gráfica por João Vitor
Guimarães, 2020.

Escola de Artes do São Bento | 21


2.3. Atividades urbanas
1. Contextualização

Comércio

Uso misto

Residencial

Serviço

Administrativo

Religioso

Institucional

Cultural

Hoteleiro

Vazio construído

Construção
subaproveitada

São Bento

100 m
Figura 11 – Situação identificada do uso do solo na poligonal de estudo,
que engloba os bairros de 2 de julho, Gamboa, Barris e parte de Nazaré.
Os vazios e os subaproveitamentos prejudicam fortemente o dinamismo
da área.
[FIGURA]
Fonte: Elaborado por João Vitor Guimarães, 2020.

Figura 12 – Entorno do São Bento [FIGURA]. Fonte: Página


Salvador-Antiga.

22 | Escola de Artes do São Bento


No que concerne à distribuição de aplicações
urbanas, a centralidade de Salvador é uma
zona extremamente diversa, porém intrincada.
O mapa ao lado ilustra a gama de classes de
logradouro presentes na poligonal que envolve
o reduto do São Bento e se, por um lado, é
intuitivo notar que todo o quadrante dispõe
de uma natureza de fato heterogênea, fruto
de sua cartela de diferentes equipamentos
urbanos, por outro, essa estrutura não sustenta
— por mais contrassenso que se mostre — uma
interoperabilidade que aqueça a área, pelo
menos sob o ponto de vista econômico, efeito
do deslocamento do polo de negócios sentido
norte da capital pós década de 1960, hoje
arraigado na Av. Antônio Carlos Magalhães,
Stiep e proximidades.

Pouco após o término do horário comercial,


fica nítido o ar inóspito que emerge nas ruas
locais. Contudo, ainda há certa pulsão nos
períodos da manhã e da tarde, e as causas mais
prevalecentes para essa sobrevida são três: o
forte uso misto, que dá o tom de comércio e
serviço térreo da Av. Sete de Setembro a partir Figura 13 – Fotografia da região da Pça. Castro Alves. Ao
do Campo Grande em direção à Praça da Sé centro o Edifício Sulacap, importante exemplar modernista
do fim da década de 1940. Seu volume segue o traçado
e do maior trecho da Rua Carlos Gomes; as angulado do lote entre a Ladeira de São Bento e a Rua Calos
vendas informais, abarrotando as calçadas e as Gomes.
[FIGURA]
margens da caixa de rolamento; e a presença de Fonte: Portal Bem Bahia, editado por João Vitor Guimarães,
um dinâmico ponto de distribuição modal, que 2020.
é a Estação da Lapa.

Outro ponto que se observa na organização


funcional do Centro é a manutenção
quadrissecular da presença do núcleo
administrativo do município, reunindo as sedes
do poder executivo e legislativo de Salvador,
ambas situadas na Pça. Thomé de Souza,
matriz governamental da cidade e do Estado
até a inauguração do Centro Administrativo da
Bahia (CAB). Importantes secretarias também se
localizam na região, como a Secretaria Municipal
da Fazenda (SEFAZ), endereçada na Rua das
Vassouras, e as Secretarias municipais da Saúde
(SMS) e Sustentabilidade, Inovação e Resiliência
(SECIS), no Comércio. Inclusive, a mudança
de cerca de 80% das centrais de órgãos da
prefeitura para o bairro, prevista para 2021, é
colocada como uma estratégia de revitalização
do entorno por parte do poder público.

Escola de Artes do São Bento | 23


Barroquinha

Estação da
Elevador

Terminal da
Lacerda

Lapa
1. Contextualização

Espaço Casa de
Angola
Cine Glauber Rocha
Teatro Gregório de
Mattos
Espaço Cultural
da Barroquinha

Museu de Arte
Sacra
Mosteiro de São
Bento
Caixa Cultural

Museu de Arte
Moderna

São Bento

Espaço Casa
Rosada
100 m
Figura 14 – Principais espaços culturais e pontos de acesso ao redor do
Centro. [FIGURA]. Elaborado por João Vitor Guimarães, 2020.

2.4. Equipamentos culturais e pontos de


acesso

A cartografia acima situa os principais


espaços e equipamentos culturais ao
redor da poligonal de estudo, assim como
os pontos de acesso de maior importância
para a região, que são a Estação da
Lapa, o Elevador Lacerda e o Terminal da
Barroquinha, sendo esse último o mais
próximo aos imóveis do São Bento.

De acordo também com o que foi


mostrado no mapa anterior, a característica
cultural do CAS é um dos seus traços mais
definidores. Grande parte dos museus de
Salvador se concentram nessa faixa da
cidade, como é o caso do Museu de Arte
Moderna e do Museu de Arte Sacra da
Bahia. Mesmo os espaços de menor porte,
como a Casa Rosada e o Espaço Casa
de Angola, são prolíficos catalisadores
culturais do trecho.

24 | Escola de Artes do São Bento


2.5. Situação Infraestrutural – Infovia e cobertura
de dados Figura 15 – Mapeamento do plano de extensão da rede
pública de fibra ótica, executado em 2017. Em branco, estão
as redes a serem criadas na época.
Mesmo num cenário de descompasso [FIGURA]
Fonte: Divulgação/Correio.
tecnológico ao mirar outros centros, a rede de
infovia (infraestrutura de rede óptica) dentro
do território de Salvador vem se espraiando 2 km

e ganhando volume nos últimos cinco anos.


A diminuição dos custos das instalações com
fibra permitiu uma maior acessibilidade ao
serviço, agora prestado por todas as empresas
de telecomunicação do país, embora ainda seja
significativamente mais dispendioso do que o
cabeamento por cobre trançado, mais comum. O
CAS é guarnecido quase em sua totalidade pelo
novo sistema, salvo uma ou outra prestadora que
não abrange todos os bairros até o momento.
Em 2017, o projeto “Salvador inteligente”, da
prefeitura, implantou uma expansão da rede
pública de internet existente, contendo o primeiro
ponto de wi-fi aberto, no Pelourinho.

Falando da cobertura de dados, pode-se dizer A velocidade mínima no Centro, de


que é, em linhas gerais, instável quanto à latência acordo com a mensuração, é algo na faixa
no centro da cidade. Os mapeamentos à frente, dos 15 Mbps (Megabits por segundo),
disponíveis em tempo real no site nperf.com, enquanto a máxima vai até por volta de
informam a velocidade de conexão e o raio do 50 Mbps, analisando os três serviços. Isso
sinal das três maiores operadoras do mercado. dá a média de 32.5Mbps, pouco abaixo da
Os dados são obtidos por meio de aparelhos com média nacional da velocidade de banda
o aplicativo da plataforma e ajudam a entender larga em 2019, que é de 33.5, segundo
como o tráfego se dá. registro da companhia Ookla.

Oi Mobile São Bento

100m

Tim Mobile

Vivo Mobile

Figuras 16, 17 e 18 – Latência do sinal de internet


das três maiores operadoras do mercado.
[FIGURAS]
Fonte: site nperf.cm

Escola de Artes do São Bento | 25


3. O São Bento
1. Contextualização

3.1. Dinâmicas de apropriação pública do


espaço

As questões tratadas anteriormente No coração do Centro “emérito” de Salvador —


sobre as características zonais do Centro longe do policentrismo howardiano, na acepção
Histórico ficam mais palpáveis quando se de várias autossuficiências —, o enclave estudado
reduz a abrangência da lente analítica para transmite uma vacuidade que se estende
entender uma situação específica, onde externamente aos equipamentos desativados: uma
as variáveis examinadas se concretizam vacuidade urbana, totalizante. Os guardadores
na escala métrica do quarteirão e se de carro são as sentinelas do espaço (cujo leito
corporificam em dinâmicas contidas em asfaltado, diga-se, serve como estacionamento), e,
si. Fazem-se, logo, pelo colóquio entre o não fossem eles circulando ali, a sensação de perigo
frugal do cotidiano e o espaço construído, eminente seria ainda mais intensa. Durante a etapa
fora da envergadura das ordenações de registro de imagens in situ, as recomendações
prognosticadoras. O São Bento — ladeira para guardar a câmera vinham dos comerciantes,
e largo — encapsula nas suas relações dos flanelinhas, dos curiosos, de quem quer que
de rua muito do que é do seu entorno. estivesse. Era unânime dar ao simples ato da
A informalidade, os vazios, a insegurança, fotografia da arquitetura local ares de temeridade
está tudo representado. Não é uma e ostentação provocativa. “Faça o que tem de
exclusividade, sem dúvida. Quaisquer fazer, não demore muito e vá embora.” O lugar,
ruas do CAS e dos bairros satélites sofrem e, por seguimento, seus agentes, sugestionavam
em menor ou maior nível com essas isso assim que se chega. A calmaria farsesca tende
adversidades. a desaparecer ao primeiro sinal de alerta.

Figura 19 – Foto da esquina do da Avenida


Sete com o Largo de São Bento.
[FIGURA]
Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

26 | Escola de Artes do São Bento


Isso, ironicamente, contrasta com o potencial
de permanência. A região mais arborizada
entre o São Pedro e a Pça. Da Sé, de microclima
aprazível, não convida a delongar-se mais que o
mínimo. Seria uma perfeita trégua frente ao calor
e abafamento soteropolitano, com boa oferta de
massa vegetal e vistas de contemplação, mas falta
o que se contemple além do santuário. Ausentam-
se meios de ativação regular do espaço, relegado,
até então, a oferecer vagas sombreadas para
automóvel. Na época do Carnaval, essa sensação de
intranquilidade aumenta ainda mais. A tapumação
no acesso da Basílica cria uma cercadura no início
do largo, que bloqueia o contato visual entre o
interior do espaço e a Avenida Sete, afugentando
os usuários menos corajosos.
Figuras 20 e 21 – Abaixo, imagem aérea do São
Bento e à direita, foto tirada do interior do antigo
jardim da casa 28. [FIGURA]. Fonte: Odebrecht e foto
por João Vitor Guimarães, 2019, respectivamente.

Numa sistematização das apropriações


espontâneas da área, pode-se dividi-las em
dois filos urbanos: as testemunhadas e as não
testemunhadas. O primeiro categorizaria os usos à
luz do dia, em sua maioria relativos à informalidade
ou à fruição esporádica, sem o anonimato e disfarce
das ações. Tirando a produção de lixo, esses não
deixam rastros tão detectáveis na espacialidade a
curto prazo.

O segundo já reúne os comportamentos


furtivos e marginais, que, mesmo que aconteçam
quando não há observadores explícitos, deixam
marcas na paisagem — às vezes assumidamente,
tal como o pixo, por outras, de modo mais soturno,
como um colchão ou cachimbo que é deixado nas
dependências de um dos edifícios abandonados.
Ambas as apropriações interagem na produção das
sensações do lugar e são propelidas pela imensa
disfuncionalidade ocupacional no endereço e em
sua periferia.

Escola de Artes do São Bento | 27


3.2. Histórico e evolução
1. Contextualização

É condição sine qua non para acessar O incremento do urbanismo na região é


os meandros históricos do São Bento reforçado na segunda metade do século XIX,
uma associação direta com a história do decorrente do processo de efetivação das redes
Mosteiro de São Bento, primeira instituição primárias de transporte público, saneamento e
beneditina das Américas fundada em 1582 abastecimento, demandada pelo investimento
pelo frei Pedro de São Bento Ferraz, sendo, no comércio interno da cidade, que se prolonga
num momento posterior, reconhecida até a transição para o regime republicano (1890)
como Abadia e elevada à condição de e segue até o início do séc. XX. A abertura da
Basílica Menor de São Sebastião pelo Papa Avenida Sete de Setembro, em 1915 — que,
João Paulo II em 1982. O Arquicenóbio do inclusive, elimina apenas parte do adro no
Brasil, como é também honorado, detém mosteiro após forte resistência dos clérigos e da
o maior acervo particular de obras de opinião pública, diferentemente da Igreja de São
arte e o segundo maior acervo de livros Pedro Velho e do Convento das Mercês, demolidos
raros do país. É, naturalmente, influente por inteiro na empreitada —, é uma das ações
fonte de referência para batizar quase mais representativas dessa sanha modernizante
tudo que foi erguido ao redor após a sua na capital. A nova artéria tinha ambições ainda
implantação. A morfologia arquitetural da maiores, prevendo conectar o Farol da Barra com
área hoje é, como mencionado, corolário Água de Meninos, sob um discurso tecnicista
de consecutivas benfeitorias nas antigas bastante inspirado nos estirões parisienses de
glebas doadas pela cúpula da ordem nos Haussman.
trópicos àqueles que prestaram serviços
no período de construção do complexo A situação do largo é caracterizada pelos
eclesiástico. estreitos caminhos enladeirados das ruas Visconde
de Ouro Preto e Ladeira das Hortas, conectores
Além do mosteiro e seus anexos, que dão no terminal da Barroquinha, e pelo ladear
completam o conjunto de prédios nos da Avenida Sete, que, nesse ponto, reduz a largura
arrabaldes atuais do largo hoje o Hotel de sua caixa de via em 3 metros, justamente
São Bento e as casas 26 e 28, como mostra para evitar um maior rasgo na volumetria do
o esquema abaixo. equipamento religioso.
Figura 22 – Situação de vizinhança atual do Largo
de São Bento.
[FIGURA]
Elaborado por João Vitor Guimarães, 2020.

o
et
Pr
casa 26 ro
Ou
. de
isc
casa 28 R.
V
Hotel São Bento
Av. Sete de Se

das
eira
Largo de S. Bento Lad ortas
H
tembro

Biblioteca

Mosteiro de S. Bento

10 m

28 | Escola de Artes do São Bento


O boom econômico teve reflexos na arquitetura Passou-se o apogeu da região e, com
da região, como era de se esperar. O perfil ele, outras mudanças foram ocorrendo na
aristocrático da fidalguia que passa a habitar o área. O Ideal Cinema, construído em 1913,
trecho se manifestava também em suas suntuosas é derrubado em menos de uma década,
moradias. Os jardins residenciais localizados já em 1922. O Hotel Paris, um dos mais
no São Bento, por exemplo, foram os primeiros sofisticados da época, desaba em 1935.
existentes em Salvador, assim como elementos Pouco tempo depois, em 1939, outro hotel
ornamentais de fachada que denotavam outros desaparece da paisagem, o Sulamericano,
arroubos de vanguarda estilística para a época — no mesmo lugar onde é erguido o Edf.
claro, replicadas da Europa. Isso muito se devia Sul América. Essa derrocada vai culminar,
ao requinte de se avizinhar a um grande edifício após algumas décadas, no que viria a ser a
religioso, ao centro, sinal estabelecido de nobreza decadência da área e o arruinamento dos
e pertencimento inegável ao extrato social mais edifícios que ainda se mantiveram, como é
abastado da população. o caso do conjunto 26 e 28, apresentando
o que se vê na atualidade. Abaixo,
representações da ocupação urbana no
fim do séc. XIX no São Bento, com alguns
desses equipamentos indicados, e de
meados dos anos 30 do período, já se
iniciando o declínio urbano da área.

Figuras 23 e 24 – Vistas antigas da ladeira de São Bento. Acima, o


conjunto eclético em primeiro plano, da direita para a esquerda. A foto
data do início do funcionamento dos bondes elétricos em Salvador, em
meados da década de 1890. Abaixo , imagem da ladeira enquadrando
também a praça Castro Alves e o Forte de São Marcelo.
[FIGURAS]
Fontes: Página Salvador-Antiga na Internet.
editado por João Vitor Guimarães, 2020, e página no Facebook da Figura 25 – Entorno imediato do Largo de São
Prefeitura de Salvador, respectivamente. Bento em 1894, destacado.
[FIGURA]
Fonte: Planta da Cidade de São Salvador, por
Morales de los Rios. Editado por João Vitor
Guimarães, 2020.

Mosteiro de S.
Bento

Hotel S. Bento

Casas 26-28

Figura 26 – Imagem aérea do Ladeira de São Bento


em meados da década de 1930. Em destaque, as casas
26 e 28, nessa época de uso residencial.
[FIGURA]
Fonte: revista Illustração Brasileira (N.2, ano XII),
editora O Malho. Editado por João Vitor Guimarães,
2020.

Escola de Artes do São Bento | 29


1. Contextualização

Figuras 27 e 28 – Acima, Jasmins-do-Caribé compõe o paisagismo


3.3. Paisagismo e massa vegetal do largo. Em seguida, imagem de uma muda de Cordyline
Fruticosa. [FIGURA]. Fotos de João Vitor Guimarães e Spring
Colours, 2020, respectivamente.
Desenvolvendo a análise acerca dos
elementos vegetais do São Bento, a
presença mais perceptível no largo e na
ladeira, hoje, é a dos oitizeiros octogenários
de grande copa cujo plantio remonta as
primeiras iniciativas de embelezamento
da área com o pensamento de conferir
a mesma um feitio europeu, como
era moda no período. No entanto, a
variedade botânica da região pode passar
despercebida ao fixar a observação
apenas nas grandes espécies. O traçado
do largo intercala áreas permeáveis e
impermeáveis, mantendo uma faixa Figura 29 – Grandes árvores frondosas recobrem
de gramíneas e plantas de pequeno quase toda a área do Largo de São Bento. Na
e médio porte separando o muro do imagem, Rhipsalis pulchra que cresceu naturalmente
no tronco de um dos exemplares existentes. Essa
mosteiro o início da área pública. Entre as espécie filamentosa é um tipo de cacto que se
vegetações de menor tamanho é possível desenvolve na estrutura de outras plantas maiores e
é bastante comum nas áreas de mata atlântica.
identificar coloridas mudas de Cordyline [FIGURA]
fruticosa (popularmente conhecida como Foto de João Vitor Guimarães, 2020.
Coqueiro-de-Vênus), com por volta de
1 metro de altura, além Hortelã e outras
pequenas espécies da família Lamiaceae.

Os indivíduos de médio porte próximos


a esses pertencem à espécie Plumeria
pudica (Jasmim-do-Caribe), arbusto da
família Apocynaceae muito usado como
ornamento. Os exemplares mais altos
presentes no São Bento chegam à faixa
dos 3 metros e apresentam flores brancas
em formato de buquê e folhas no formato
de colher.

30 | Escola de Artes do São Bento


Figura 30 – Massa vegetal
do Largo e da Ladeira
de S. Bento. Não foram
inclusas vegetações de
área privada. Juntamente
com o Corredor da
Vitória, esse é um dos
trechos mais arborizados
m es da Avenida Sete de

Lade
Setembro.
Go

[FIGURA]
s

ira d
rlo

Fonte: Google Earth.


a

Editado por João Vitor


R. C

e S.
Guimarães, 2020.
Bent
o

Largo de S. Bento
Av. Sete de Setembro

10 m

Figura 31– Jasmim-do-caribe. As mais altas e frondejantes árvores que


[FIGURA] sombreiam o trajeto de quem anda pelo
Foto de João Vitor Guimarães, 2020.
trecho foram plantadas durante a primeira
metade do século XX, e representavam
uma quantidade ainda mais numerosa
nesse tempo em relação a massa mantida
hoje. Os sombreiros se faziam presentes
também na continuidade da calçada
sentido Praça Castro Alves e Ladeira da
Montanha, como mostra a foto abaixo.

Figura 32 – A área era ainda mais arborizada


na década de 1950, como mostra a imagem.
[FIGURA]
Fonte: Guia Geográfico - Salvador Antiga.
Escola de Artes do São Bento | 31
3.4. Tipologia arquitetônica e relações
1. Contextualização

escalares - Ladeira de São Bento

O conjunto arquitetônico da ladeira de A preponderância do uso misto, como já


São Bento é uma das ricas interseções de foi apontada em outros momentos, é o pleno
temporalidades e linguagens tipológicas denominador em toda a arquitetura presente. Em
que pincela a paisagem do Centro Antigo cada um dos prédios o pavimento térreo é utilizado
da cidade. O esquema gráfico do lado para fins comerciais e/ou de serviço a preço
par do trecho compreendido entre o popular, em sua grande parte. O Edf. Oxumaré,
largo e a Praça Castro Alves ilustra a que corresponde atualmente ao de maior gabarito
conformação física e os perfilamentos ao lado do Edf. Executivo, é o único do conjunto a
de fachada dos edifícios com seus possuir loja e sobreloja, similaridade que só ocorre
respectivos avizinhamentos ao longo de na calçada oposta, no Edf. Portal de São Bento.
pouco mais de 100 metros, variando 13 O prédio modernista de nove andares colado aos
metros em altimetria entre o ponto mais casarios tomados para a intervenção aqui proposta
alto e o mais baixo. As onze construções possui 126 salas comerciais, enquanto o Executivo
exprimem — cada uma a sua maneira — dispõe capacidade de 144.
o transcorrer do urbanismo realizado nos
dois últimos séculos na área, que interpôs No meio dos dois maiores volumes se mantém
drásticas modificações e adaptações de incólume e discreto um dos modelos ecléticos
menor impacto na malha construída. Por que integram a fachada da ladeira. Os traços
conta dessa heterogeneidade, não há neocoloniais do sobrado branco e amarelo
como traçar um protótipo generalista que combinam o estreitamento da largura e o
fidedigno, embora seja possível detectar prolongamento no eixo z se evidenciam para o
certas tendências. caminhante pelo recuo lateral do corpo superior

casa 14
Metros

Ocupação:
40 Parcial;
Uso: Loja
37,5
Antigo Centro de artigos
de Estudos variados no
Antônio Carlos térreo;
35 Magalhães. casa 8 casa 10 Estado de
casa 4 conservação:
Ocupação: Parcial; Ocupação: Ocupação: Total; ▲▲▲▲▲
32,5 Uso: Residencial Ocupação: Total; Parcial; Uso: Loja de
Estado de Uso: Loja de artigos casa 6 Uso: Loja de artigos variados
conservação: variados no térreo artigos variados no térreo e
30 ▲▲▲▲▲ e restaurante no 1º Ocupação: Parcial; no térreo; residências nos
andar; Uso: Loja de Estado de pavimentos
27,5 Estado de artigos variados conservação: acima;
conservação: no térreo; ▲▲▲▲▲ Estado de casa 49
▲▲▲▲▲ Estado de conservação:
25 conservação: ▲▲▲▲▲ Ocupação:
▲▲▲▲▲ Parcial;
Uso: Loja
22,5 de artigos
variados no
térreo;
20 Estado de
conservação:
▲▲▲▲▲
17,5

15

12,5

10

7,5

2,5

32 | Escola de Artes do São Bento


do Edf. Oxumaré, desfazendo a enganada
interpretação de baixa área construída gerada
apenas pela elevação voltada à avenida,
característica tal que se replica em outros casarões
do conjunto e das ocupações prévias dessa
região. Quanto aos recuos de lado — ou melhor, à
inexistência deles —, é interessante notar que não
chegam a criar uma sensação de continuidade
rítmica dada a diferença das construções em
altura, cor e estética. Em todos os edifícios existe
um afastamento dianteiro, ocupado em alguns
casos com apropriações informais do comércio.

Exceto as casas 26 e 28, nenhuma das demais


construções se encontrava totalmente ociosa até
então, ainda que exista subaproveitamento de
algumas nos pavimentos acima.
Edf. Oxumaré
Edf. Executivo
Ocupação: Parcial;
Ocupação: Total; Uso: Loja de artigos
Uso: Comércio e casa 77 variados no térreo;
serviço no térreo e Estado de
salas de escritórios Ocupação: Parcial; conservação:
nos demais Uso: Loja de joias e ▲▲▲▲▲
pavimentos; bijuterias no térreo;
Estado de Estado de
conservação: conservação:
▲▲▲▲▲ ▲▲▲▲▲

Conjunto
escolhido para a
proposta
Largo de S. Bento

Figura 33 – Esquema de elevações do lado par da Ladeira de


São Bento. A observação quanto ao estado de conservação se
ateve somente ás fachadas frontais de cada um dos edifícios.
[FIGURA]
Elaborado por João Vitor Guimarães, 2020.

Escola de Artes do São Bento | 33


Figura 34 – Perfil aberto do Largo de São Bento
1. Contextualização

no momento de prospecção, com os edifícios


que o cerca.
[FIGURA] Antigo Hotel S.
Elaborado por João Vitor Guimarães, 2020. Bento
Estado de
conservação:
▲▲▲▲▲
casa 28
Estado de
conservação:
▲▲▲▲▲

R. Visconde de Ouro Preto

R. Ladeira das Hortas


Av. Sete de Setembro

flexão da
Ponto de

vista
3.5. Arquitetura do largo

O perfil aberto do largo, com as aquele edifício foi num momento anterior. Pela
três fachadas enfileiradas, realça o sequência, tem-se a Biblioteca do Mosteiro,
personalismo do conjunto edilício ali separada do Hotel São Bento pela Rua Ladeira das
presente. Começando da elevação Hortas. É onde são guardadas as versões físicas dos
sul da casa 28, o solavanco visual já documentos, tomos e registros da ordem católica,
arrebata a atenção do observador incluindo tratados teológicos únicos do mundo.
mais desacostumado logo de cara. A O acesso se dá pelo portão principal da Basílica,
parede grafitada de fora a fora junto à distante alguns metros da portada rematada por
indiscreta vegetação que brotou e cresceu frontão de pedra que separa a área externa do
espontaneamente por entre os volumes interior da biblioteca.
da construção se superpõe ao tom
brando e já desbotado da pintura original, Por fim, ainda no largo, é possível enxergar
informando pela hierarquia cromática o parte da fachada norte do mosteiro e a Basílica
que de fato predomina. de São Sebastião, a grande protagonista do
entorno e do Largo de São Bento. Sua arquitetura
A poucos metros, tem-se o antigo se difere das abadias da ordem no Brasil, tendo
Hotel São Bento, análogo à casa 28 pela “aparência maneirista e conteúdo barroco”,
escancarada decrepitude material, só não como adjetiva ARRUDA (2007, p. 51). Atrás do
mais avançada devido ao fechamento de frontispício se agiganta uma enorme abóbada de
todas as aberturas. O estilo déco na sua berço, construída em concreto armado no ano de
linguagem tipológica já sequer é notado 1933, pensada no início para ser de berço abatido
visto a fuligem de 26 anos de desuso — com lunetas e arcos dobrados, como destaca o
o hotel foi fechado em 1994. Além desse, autor. Embora a cúpula formada pelo cruzamento
outros dois pontos de distinção conferem das capelas laterais e a abóboda só venham a ser
ao ex-equipamento de hospedagem de construídas no fim do séc. XIX e segundo quarto
três níveis um caráter particular na área: A do séc. XX — respectivamente — elas já estavam
composição assimétrica que acompanha previstas no projeto desenvolvido pelo Frei Macário
o traçado das ruas que o ladeiam e a de São João para a reconstrução do mosteiro após
fachada fletida á 110º individualizam o o saque e ocupação dos holandeses, em 1624.
edifício no contexto do largo. O letreiro
na esquina ainda resiste e indica o que Essa diferença entre cada um dos edifícios dá

34 | Escola de Artes do São Bento


Basílica de São
Sebastião
Estado de
conservação:
▲▲▲▲▲

Mosteiro de S.
Bento
Estado de
Biblioteca do conservação:
Mosteiro ▲▲▲▲▲
Estado de

Av. Sete de Setembro


conservação:
▲▲▲▲▲
flexão da
Ponto de

vista

5m

traços de imparidade ao Largo de São Bento.


É interessante como a espacialidade do lugar
se moldou em ritmos irregulares até hoje por
agrupar arquiteturas que assumem sujeições
dissemelhantes às novidades do tempo. A
degradação que acometeu e recrudesceu por
décadas só não foi sentida pelo magnânimo
conjunto monástico, logicamente por pertencer
à um gênero de uso único, mais sólido diante
de transformações socioespaciais do que uma
arquitetura laica, como a dos dois outros vizinhos.
Isso dá á quem está no largo duas visões afastadas
das consequências físicas desses efeitos e de como
o construído se metamorfoseia perante a eles.

Figura 35 – Placa em memória aos


embates ocorridos no mosteiro durante
a invasão holandesa de 1964. O objeto
se encontra atualmente no Nártex da
Basílica.
[FIGURA]
Fonte: Disponível em Sanctuaria.net.

Escola de Artes do São Bento | 35


2preexistência
2. Introdução à preexistência

.Introdução à
1. O conjunto
1.1. Antecedentes dos objetos

As casas 26 e 28 estão implantadas na uso do pavimento mais abaixo da sua residência


primeira área cedida ao Mosteiro de São como seu consultório particular. Para melhor
Bento em 1681 por Francisco Afonso, exercer os futuros serviços clínicos, os ambientes
o Condestável, como se encontra no sofreram pequenas mudanças por obra das
1º livro do tombo da congregação. As instalações do novo programa, que consistia em
construções hoje existentes não foram as salas de espera, gabinete pessoal, setor cirúrgico,
primeiras a serem edificadas na porção de laboratório e biblioteca. Contudo, não foram
terra, embora não existam informações realizadas grandes reformas ou modificações fixas
disponíveis sobre quais eram as ocupações na planta da casa para acomodar esse uso misto,
anteriores. que permaneceu até a troca de posse na década
de 1950.
O primeiro registro em cartório dos
imóveis atuais consta de 1893, de início A seguir, plantas baixas do nível térreo e
com uso estritamente habitacional do andar superior do casarão, com o duplo
unifamiliar. O solar de duas alturas e funcionamento residencial e clínico. As pesquisas
o apêndice térreo eram de posse do não conseguiram apontar com precisão histórica
médico Bernardino da Costa Viana, que, a configuração espacial da casa 26 nessa mesma
no começo do último século, passa a fazer época.

Térreo:
Casa 26
12 1 - Gabinete médico
22
16 24 2 - Saguão
23 3 - Jardim lateral
6 7 10
1 20
21 4 - Recepção
5
18 5 - Circulação
11 19 6 - Sala de cirurgia
17 7 - Sala de cirurgia
4 13 15
2 8 9 8 - Sala de espera
9 - Sala de repouso
10 - Laboratório
14 11 - Biblioteca
3 12 - Sanitário
13 - Varanda
14 - Entrada de serviço
15 - Circulação de serviço
16 - Quintal
17 - Cozinha
18 - Circulação
19 - Despensa
20 - Dormitório
21 - Dormitório
22 - Hall
23 - Sanitário
28 30 24 - Depósito
31

25 27 Pavimento superior:
33
26 25 - Salão nobre
29 35
32 26 - Dormitório
27 - Circulação
28 - Quarto do Santo
34
29 - Dormitório
30 - Dormitório
31 - Dormitório
5m 32 - Dormitório
33 - Sala de jantar
Figuras 36 e 37 – Plantas baixas dos dois pavimentos do casarão com o uso misto. 34 - Varanda
[FIGURA] 35 - Circulação de serviço
Fonte: LINS, Eugênio de Ávila. Restauração da Casa do Esperanto. Trabalho
apresentado para titulo de Especialização em Conservação e Restauração de
Monumentos Históricos, Faculdade de Arquitetura da UFBA. 1982. Peças gráficas
adaptadas por João Vitor Guimarães, 2019.

36 | Escola de Artes do São Bento


Figura 38 – Gravura da ladeira de São Bento em 1925,
com o Mosteiro ao centro e as casas 26 e 28 em
destaque. Os dois casarões compunham a borda do
trecho mais importante da cidade na época. [FIGURA]
Fonte: Guia geográfico - Salvador Antiga. Editado por
João Vitor Guimarães, 2020.

O uso do piso de menor cota até as


aparelhagens médicas não pode ser precisado
com absoluta convicção, mas é possível inferir que
essa modificação não tenha afetado as dinâmicas
da vida familiar. Segundo REIS FILHO (1973
apud LINS, 1982), era comum que os cômodos “
térreos permanecessem quase sempre vazios ou
subaproveitados, uma vez que os dormitórios, Primeiro – Deixa ao Estado da Bahia a
sala de refeições e demais espaços sociais se sua casa de morada, de número vinte e
encontrassem no andar acima, como era o caso do oito (28), e a vizinha, de número vinte e seis
solar em questão. Nele, além dos quartos, existia(26), - uma e outra na antiga Ladeira de
também um “quarto do santo”, típico das casas de São Bento, hoje Avenida Sete de Setembro
elevado padrão do período. Os dois níveis eram desta cidade, com a condição de nelas
conectados por uma escada de madeira, em “L”. instalar o legatário uma ou mais escolas de
ensino gratuito – primário, secundário/ ou
A planta do casario de 683 m² de área ocupada superior, de cultura literária, profissional
obedece ao tradicional partido dos sobrados ou mixta.”
brasileiros da época, com corredor central e
distribuição simétrica dos ambientes. A ligação “
entre o torso principal — com o consultório e
os espaços domésticos no piso superior — e o Fonte: Testamento de Adriano Rodrigues
secundário, composto pela cozinha, dispensa, Viana, transcrito por LINS (1982).
depósito e quartos de empregados, se dava pela
varanda marcada pela arcaria que separava o
espaço interno da área descoberta. Um elemento
de forte indício da nobreza do edifício e seus
ocupantes é o jardim lateral, pouco comum na
arquitetura de Salvador naquele tempo, como
destacado. As duas casas foram doados ao Estado
da Bahia em 1954 pelos herdeiros em testamento
que condicionava o futuro uso. Dizia a primeira
cláusula do documento:

Escola de Artes do São Bento | 37


2. Introdução à preexistência

A partir dessa época, nas duas modelo em virtude do acervo literário que
construções fronteiriças passam a possuía e as atividades comunitárias realizadas
funcionar novos usos, indo ao encontro no espaço, que permaneceu ali sediado até 2003,
das solicitações do testamento deixado. ano no qual se dá início ao período de inatividade
Nas dependências do solar é aberta a que perdurou até então e, com ele, a completa
Escola Mariana Pereira da Silva Vianna, degradação física do equipamento. Também na
voltada para as etapas iniciais do ensino década de 80 do século passado a casa 28 retorna
fundamental básico nos períodos matutino às mãos do poder do Estado por meio de doação
e vespertino, e, pela noite, a sede da ABE da ABE, e a mesma fica sob sua gerência até 2013,
(Associação Bahiana de Esperanto), grupo quando é cedida ao Instituto Genealógico da Bahia
formado por intelectuais, filólogos e e posteriormente devolvida ao poder público.
estudiosos da língua Esperantista, dialeto
que mescla características do latim e Nesse ínterim, surge uma ação governamental
elementos anglo-saxões inventado por em 2006 para recuperar os bens através do
Ludwig Zamenhof, em 1887 para servir projeto de autoria da arquiteta Etelvina Rebouças,
como o segundo idioma universal. que previa o refuncionamento da Biblioteca
Anísio Teixeira na casa 26 e a alocação de arquivos
O criador foi homenageado em públicos na casa 28. A proposta foi desenvolvida
1971 no Largo de São Bento com a e entregue dentro do PRODETUR/NE II (Programa
inauguração do busto até hoje presente de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste)
entre a fachada frontal da basílica e a em parceria com o IPAC (Instituto do Patrimônio
“Casa do Esperanto”, como passou a ser Artístico e Cultural). O projeto executivo foi
referenciado popularmente o casarão. terceirizado e delegado para a construtora PCL,
Paralelamente, em 1956, o volume mas não chega a ser realizado na época. Só no
adjacente se torna a Biblioteca Central de primeiro semestre de 2020, como já foi dito, é
Educação, recebendo, em 1985, o nome que um projeto de recuperação sai finalmente do
de Biblioteca Anysio Teixeira e se tornando papel, agora a cargo do IPHAN.

Figura 39 – Fotografia da Casa 28 já como escola


primária e centro de estudos do Esperanto.
[FIGURA]
Foto de Eugênio de Ávila Lins, 1982.

38 | Escola de Artes do São Bento


1.2. Traços externos

O caráter estilístico dos edifícios reparado hoje, Com esses e outros pequenos
com um sobressalente ar eclético pós-neoclássico, acréscimos e retiradas, as casas 26 e
não equivale à aparência original dos mesmos. 28 obtém a plástica que as caracteriza
No começo do último século é realizada a única hoje. Numa leitura atenta, enxerga-se a
grande reforma planejada pelo proprietário que se iconografia dos elementos escultóricos
tem registro. A mesma foi voltada essencialmente do conjunto como acentuadores da
à aparência exterior do casario, sendo que a únicas expressão arquitetônica como um todo,
alterações internas foram as pinturas decorativas trilhando a tônica classicista pretendida.
que se supõe pertencer à Preciliano Silva. Outra No frontão adornado da casa 28 com
mudança relevante, essa em decorrência das as tradicionais folhas de acanto, além
alterações das fachadas, foi no telhado, que passou do cálice que tangencia o ponto mais
de três para duas águas depois da construção das alto do arco, existem dois acrotérios
platibandas. As outras modificações se restringem representando a imagem da Virgem Maria.
às paredes e elementos externos, sendo as mais As mísulas e modilhões abaixo das cornijas
significativas: se somam aos medalhões do térreo e do
topo na exuberância da rica construção na
• Emolduramento em alto relevo dos vãos, adjacência do maior mosteiro da região.
encimados por cornijas; Na casa 26, a platibanda se difere das
• Remoção dos parapeitos sacados da fachada demais do entorno, exibindo acrotérios
principal; em forma de volutas sustentando cada um
• Inserção do coroamento com platibanda e uma palma, símbolo bastante empregado
acrotérios, também na fachada principal; na decoração europeia, além da cornija
- Marcações nas pilastras embutidas e nos cunhais. com telhamento em cerâmica.

Figura 40 – Portão frontal da casa 28. Na imagem estão, ao


fundo, as interfaces de mísulas, cimalhas e molduras dos
vãos. Uma das mudanças mais significativas na reforma
foi a remoção dos parapeitos, presentes nas aberturas do
primeiro pavimento.
[FIGURA]
Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

Escola de Artes do São Bento | 39


2. Introdução à preexistência

1.3. Processo de deterioração

O memorável passado do conjunto Todas as aberturas térreas foram fechadas durante


eclético em nada se relaciona com a esse tempo com alvenaria chapiscada, numa
circunstância de perecimento cada dia tentativa inútil de impedir o acesso interno —
mais avançado que acometeu a fisicalidade expediente bastante comum em casos similares,
do lugar por anos. A documentação tal como é visto no Hotel São Bento e em tantos
desse processo foi sendo feita através edifícios abandonados no centro e demais partes
de trabalhos acadêmicos, matérias da cidade.
jornalísticas e registros dos mais diversos
que ajudam a retratar o desgaste gradual Outro aspecto sintomático é o encobrimento
das duas casas. Abaixo, fotos de junho e perda de vários detalhes arquitetônicos,
de 2013 e dezembro de 2019 ilustram acarretados tanto pelo desmazelo público
como, em um intervalo de seis anos, a quanto pelas ações trôpegas de obstrução das
substância material sucumbe quando não fenestrações. O emassamento dessas tampou
há preservação da mesma. Mais alguns cimalhas, molduras, cornijas e demais ornamentos
pares de década nessa toada e o arrasado no conjunto. Assim, além de sujeita às intempéries
conjunto se configuraria definitivamente fisiográficas e ao vandalismo, o casarão e o anexo
como uma ruína, no puro significado do sobrevivem também à medidas desorientadas que
termo. aumentam a dificuldade de restabelecimento.

Figuras 41 e 42 – À direita, fotografia


da Casa 26 antes dos fechamentos e à
esquerda, depois deles.
[FIGURAS]
Fotos de Dimitri Ganzelevitch, 2013 e João
Vitor Guimarães, 2019, respectivamente.

Um trecho da análise de Eugênio de Ávila Lins


com base no estado material da Casa nº 28 em
janeiro de 1982 já dava indícios da má conservação
e do que estaria por vir:

"Observando a edificação externamente, o seu


estado geral não é muito precário, mas o seu interior
está bastante comprometido. A Sec. de Educação e
Cultura até esta data realizou pequenos serviços de
manutenção, a saber: Pintura interna em trechos e
substituição de algumas peças do telhado."
(LINS, 1982)

Figura 43 – Fotografia da fachada sul da Casa 28.


[FIGURA]
Foto de Jorge Santori, 2013.

40 | Escola de Artes do São Bento


Figura 44 – Acesso pelo Largo de São Bento [FIGURA]
Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

Dentre as patologias observadas durante as


visitas à ruína, as mais recorrentes eram:

• Perda de elementos construtivos em diversos


pontos, incluindo platibanda, cunhais, cercaduras,
balaustrada, entre outros;
• Perda de embrechamento nas alvenarias, sendo
a mais perceptível na entrada do casarão pelo
Largo de São Bento (foto acima);
• Agressivo crescimento de vegetação, sobretudo
nos fundos do casario;
• Perda de revestimento.

Apesar desse quadro, as alvenarias estruturais não


apresentavam, até então, qualquer desaprumo,
indicando ainda a sua capacidade de resistência
à carga.

Figuras 45 e 46 – Imagem interna da casa 28


(esquerda) e raízes da árvore que cresceu ao
longo do muro externo (direita)[FIGURAS]
Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

Escola de Artes do São Bento | 41


3e argumento
3. Orientações e argumento

.Orientações Figura 47 – Busto de Ludwig Zamenhof,


criador do idioma Esperanto. [FIGURA], Foto
de João Vitor Guimarães, 2019.

1. Justificativa
1.1. Embasamento analítico

Feita a análise da inserção urbana do largo. Tal resguardo denota que o teor desse
conjunto trabalhado, da sua carga passado embebido da servidão ao ensino e à
histórica e das condicionantes espaciais, transmissão do conhecimento dispõe de alguma
volumétricas e estilísticas que o constitui, relevância em meio ao contexto do ambiente
ponderou-se a criterização que elencaria construído, logo, um dos motes da proposição
as diretrizes adotadas, isto é, os pontos estabelecida é se reapropriar do conceito que
cardeais que antecedem a reflexão sobre balizou sua cadeia sucessória e criou a sua áurea,
o uso proposto, partindo do estado o seu “Gênio do lugar”;
do antigo sobrado no momento da
catalogação inicial e registro fotográfico. • As insuficiências da poligonal: Tal como visto
As questões consideradas para se ter mais nos tópicos anteriores, o Centro Antigo de Salvador
clara a real ação sobre as casas 26 e 28 da detém uma vasta gama de oferta de serviços
Av. Sete de Setembro foram: e usos que se espalham ao longo da região.
Porém, também é exposta a ineficácia dessa rede
• A matéria histórica e o Genius Loci: de equipamentos urbanos na produção de uma
A pesquisa elaborada indicou que os perenidade que permita impulsionar a dinâmica
edifícios, a despeito de não terem sido do Centro e renová-lo através de usos que sejam
ainda submetidos a um tombamento capazes de amplificar o perfil de usuários, atrair
específico, detêm uma expressiva carga diferentes públicos e proporcionar cenários,
hereditária originada de sua concepção experiências e situações até então inexploradas
e implantação no lugar, relacionada no perímetro, como indica e recomenda o Plano
à difusão de estudos nos campos da Diretor vigente. Portanto, a hipótese de novo
aprendizagem e cultura. Passado esse emprego para os vazios se ampara no exame de
em certo grau que se mantém, se não presenças e ausências de situações urbanísticas no
na arquitetura combalida, no simbolismo local. O novo usufruto deve, assim, agregar outras
representado pela estátua ao centro do possibilidades além das que já se percebe.

42 | Escola de Artes do São Bento


• E, por fim, juntamente com os dois
direcionamentos anteriores, tem-se em vista a
capacidade e limitações arquitetônicas das
edificações onde a ideia irá ser incorporada. O
movimento de projeto aqui é conduzido pela
absoluta noção das restrições físicas, legais, e
programáticas do objeto estudado. Aspectos
esses imprescindíveis para que o ato interventor se
atente aos limites dos próprios imóveis, sem que
isso seja um empecilho para as decisões relativas
ao mesmo.

Com esse entendimento consolidado, foi possível


traçar um possível novo uso para as casas 26 e 28.

Figura 48 – Foto da fachada frontal do conjunto.


[FIGURA]
Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

Escola de Artes do São Bento | 43


3. Orientações e argumento

1.2. Diagnóstico e direcionamento


programático

Propõe-se, então, como forma de A educação e a arte gráfica como temas


reconfigurar o casario e devolver utilidade nucleares da proposta se comunicam com os
urbana ao mesmo, a Escola de Artes três usos anteriores e, por consequência, com
Visuais do São Bento, um espaço a compatibilidade de programa aninhado na
de ensino artístico com enfoque na preexistência. É, dessa forma, uma perspectiva
formação teórico-prática, especialização contemporânea para a mesma válida finalidade
e aperfeiçoamento em diferentes campos de integração coletiva pelo saber e pelo
criativos dentro de uma metodologia desenvolvimento intelectual coletivo, agora pela
profissionalizante atualizada com a ação formativa através da arte. Uma escola desse
produção internacional corrente. Assimila- gênero também seria responsável por revigorar as
se que um centro de ensino nesses relações de fruição na ladeira de São Bento, quase
moldes oferte o potencial de assumir puramente dedicado ao comércio e ao serviço,
outro tratamento conceitual do propósito apresentando um novo elemento no sítio, além
pedagógico que o conjunto prestou em de ser capaz de atrair mais um contingente de
diferentes momentos da sua história — usuários, - desenhistas, programadores, pintores,
como educandário, biblioteca e centro de estilistas e designers – além de toda sorte de
estudos de Esperanto — estabelecendo a entusiastas do ramo para a região, caracterizando
expressão artística como quarto encargo essa altura da Avenida Sete também como
do solar e seu anexo, agora em um uso um endereço turístico e único na paisagem de
único e integrado. Salvador.

Figura 49 – Hall de acesso do conjunto.


[FIGURA]
Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

44 | Escola de Artes do São Bento


Figura 50 – Fundos da Casa 28.
[FIGURA]
Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

Constata-se, além disso, que exemplares desse


tipo de arquitetura num raio metropolitano médio
com origem no centro da cidade não existem,
salvo as escolas universitárias, pequenos ateliês
de reduzida capacidade, como os liceus do
Centro Histórico e cursos de design gráfico. A
proposição visa, dessa forma, aumentar a gama
de oferta de serviços a partir de uma categoria
urbana historicamente rarefeita na metrópole,
disponibilizando um ambiente que consiga
difundir a arte através do ensino em maior escala.

Ainda, a destinação como academia artística


constrói uma conexão direta com a vocação do
seu entorno. A começar pelo ilustre vizinho do
casario, o Mosteiro de São Bento, reconhecido
também pela promoção de eventos ligados
às belas artes, principalmente à manifestação
sacra mas não somente à essa, tendo também
recebido bienais de Arte Moderna e expressões
contemporâneas. No Museu de São Bento,
instalado nas galerias superiores da Basílica,
estão expostas duas mil peças, entre quadros,
porcelanas, cristais, ourivesaria, mobílias, além de Figura 51 – Cartaz de divulgação da 3ª edição da Bienal de
mais de 200 unidades de imaginária. São obras Arte da Bahia, realizada em 2014. A mostra “A Reencenação”,
de artistas anônimos e conhecidos, como José de curadoria de Fernando Oliva, teve sua abertura no Mosteiro
de São Bento.
Joaquim da Rocha, fundador da Escola Baiana [FIGURA]
de Pintura. Algumas peças são de autoria de Fonte: Divulgação.

membros da própria igreja, como Frei Agostinho


da Piedade, Frei Ricardo do Pilar, Frei Agostinho
de Jesus, dentre outros.

Escola de Artes do São Bento | 45


3. Orientações e argumento

Outro ponto de concordância é o fato do


sobrado e seu anexo estarem próximos
ao “Quarteirão das Artes”, complexo de
espaços culturais que abriga o Espaço
Cultural da Barroquinha, o Teatro Gregório
de Mattos, o Espaço Itaú de Cinema
Glauber Rocha, a Fundação Gregório de
Mattos, o Espaço Cultural Boca de Brasa
e o Café Teatro Nilda Spencer, todos
localizados na ladeira da Barroquinha a
cerca de 100m do Largo de São Bento.

Em suma, a partir de todas as


considerações expostas, julgou-se que
a Escola de Artes Visuais do São Bento
se apresenta como uma coerente e
justificada resposta de preenchimento
perante o vazio existente. O uso proposto Figura 52 – Card de inauguração
está em consonância com o passado do do Quarteirão das Artes na Rua
do Couro, Barroquinha.
casario ao mesmo tempo que se lança à [FIGURA]
frente e se mantém dentro das orientações Fonte: Divulgação.
estabelecidas de uso, complementando o
perfil cultural da circunvizinhança local.

Figura 53– Fachada sul.


[FIGURA]
Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

46 | Escola de Artes do São Bento


Figura 54 - Parede de cantaria.
[FIGURA]
Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

Escola de Artes do São Bento | 47


4.Estudo do tema
4. Estudo do tema

1. O tema
1.1. A Arte necessária

A Arte é um assunto que desperta o O progresso intelectual humano é acompanhado


fascínio da humanidade desde todo o da complexificação do seu autorretrato como
período que precede alguma definição espécie e do caminhar deste até a condição do
etimológica que a palpabilizasse. Seu “homem que sabe que sabe" (homo sapiens
surgimento data do desconhecido instante sapiens). Passa a gravar nas tábuas, tecidos e
em que certo indivíduo pré-histórico metais a sua disposição, ícones, marcas e cores
tomou a sabedoria de que os episódios que reportem sua própria singularidade. Dessa
que atravessam sua existência podiam ser forma, a ludicidade da Arte assume texturas e
registrados com o movimento de fricção pigmentos que não os da sua aparência a partir
da pedra ou graveto queimado numa de contornos políticos dotados de referenciação
rocha. É o início do instintivo e replicado simbólica. Surge, dessa maneira, ligado aos recém-
ato voluntário da eternização imagética sedimentados signos identitários coletivos, um
do homo sapiens e, ao mesmo tempo, do novo espectro da figuração gráfica e entalhada
estabelecimento da relação criativa pelo correlacionada à sentidos culturais tais como
atrito entre o marcador e a superfície, poder, hierarquia e sacralidade, que se solidificam
ação que permitiu aos hominídeos mais desde as versões ancestrais até resultar nas
capazes evolutivamente de instaurarem representações que conhecemos hoje.
seu reconhecimento primal como sujeito,
grupo e sociedade. O pensar artístico Houve na história, no entanto, os que defendiam
entrelaça-se, assim, com a afirmação de maneira enfática a dissociação da Arte com
inconsciente do ser humano como força tudo que ultrapassasse suas intenções estéticas,
inventiva no mundo. como os pensadores do movimento “ars gratia
artis”, no século XVIII, irredutíveis promotores
Desse modo, a urgência em se de uma postura artística propositalmente alheia
manifestar para além dos recursos ao externo, a subtextos sociais quaisquer, na
mundanos e imediatos só é sanada pela qual apenas a lapidação extenuante do “belo”
Arte. A expressão que transcende as importava. O raciocínio esteticista rebate no
nossas explicações limitadas sobre os Romantismo europeu e chega a designar a beleza
fenômenos, as regras intransponíveis da como um contraponto inexorável à utilidade, lema
física, do tempo e da realidade germina que também dialogava com a escola parnasiana
da subversão da criatura inteligente que ultra antiutilitarista.
se predispõe também ela a ser criadora,
fazedora de cosmos de outras realidades A que pese a gigantesca contribuição artística
múltiplas, sob a necessidade de ordem dos literários e pintores dessa época, a Arte, como
cromossômica em externalizar o produto conceito, é inefável e não possui pressupostos. Sua
etéreo das infinitas operações elétricas validade não depende de entrelinhas, de normas,
em profusão no seu cérebro. Sabida a nem se submete à excessiva padronização. A
sua notada relevância na construção do liberdade é a única e soberana ressalva, em todos
fundamento do homem como ocorrência os casos. Escolho aqui duas significantes criações
fatídica no universo, a compreensão para certificar tal condição.
filosófica aos poucos pauta a Arte como
um ponto de debate recorrente. Na “Monumento a los espanoles muertos por
escala metafísica colocada por Platão, Francia”, de Pablo Picasso, lamenta num pesar
importante marco teórico do tema, é não fúnebre a morte dos combatentes espanhóis na
mais que pura mimetização do simulacro, resistência de Paris em um dos tristes episódios
de toda coisa material percebida no plano da 2° grande guerra.“Gran Cairo”, de Frank Stella,
cópia que alude à uma idealização perfeita transita ortogonal, solene e tétrico no minimalismo
e é, dessa forma, antípoda à verdade. A da paleta de cores que lhe era característico no
Arte sob o aspecto de imitação perdura início da carreira. Dois exemplos diametralmente
até a teorização desta, ainda pelos pré- distantes de autos artísticos imortalizados na
socráticos, por criação que completa nosso antologia plástica da era moderna que demonstram
processamento sensorial da natureza. até onde as variantes da subjetividade individual

48 | Escola de Artes do São Bento


permite alcançar. Sintetizam como as composições
de linhas e cores são magníficos avatares de
porções interiores expelidas na catarse da criação,
decodificadas no momento sublime onde as
manchas, - ou os padrões quadrangulares – se
tornam muito mais do que aparentam ser, mesmo
quando nada sejam.

Figuras 55, 56 e 57 – Na sua série intitulada MIMIC, o designer


paquistanês Omar Aqil experimentou recriar obras de Picasso através
de ferramentas digitais como Photoshop, Illustrator, Cinema 4D e
Octane, adicionando profundidade aos elementos existentes. Da
esquerda para a direita: Tela original de Pablo Picasso "Monumento a
los espanoles muertos por Francia", 1945; Recriação 3D da tela ainda
sem aplicação de cores e texturas e a releitura finalizada.
[FIGURAS]
Fotos de Omar Aqil, 2017.

Figura 58 – Pablo Picasso Figura 59 – O artista digital


com 74 anos. Omar Aqil.
[FIGURA] [FIGURA]
Foto de George Stroud, Disponível em
1955. wethemakers.club.

Figura 61 – Tela original do


“Gran Cairo”, exposta no
Figura 60 – Frank Stella aos Modern Art Museum of Fort
seus 83 anos. Worth, no Texas, Estados
[FIGURA] Unidos.
Foto de Christopher [FIGURA]
Gregory, 2019. Foto de Ron Amstutz, 2019.

Escola de Artes do São Bento | 49


1.2. O ensino das artes visuais –
Metodologias no século XXI.
4. Estudo do tema

Por se tratar de um campo de bam como atender às especificidades dos futuros


estudo multidirecional e, por lógica, aprendizes. Dessa forma, a filtragem criteriosa visa
sem regramentos, as metodologias garantir o melhor potencial discente disponível.
contemporâneas de ensino no espectro
das artes gráficas ao redor do mundo são Em relação à grade de ensino, as clássicas
as mais variadas. A intersecção entre cada academias centenárias mantêm, em sua maioria,
uma delas, contudo, é o forte enfoque na um andamento mais sequenciado, como a Royal
experiência ativa dos seus alunos com o Academy School (RA), de Londres, condicionando
intuito de aguçar a criticidade e o apuro a oferta de disciplinas de acordo com a progressão
técnico dos mesmos. Em todos os casos, curricular, enquanto outras dão maior liberdade
os exercícios práticos representam a na montagem do conjunto de tópicos, como o
porcentagem mais expressiva da carga exemplo da Western University, do Canadá,
horária. São recorrentes as oficinas, que exige a conclusão de 15 a 20 módulos para
workshops e exposições, ainda que o a obtenção do título de bacharel nos cursos,
arcabouço teórico também seja bastante porém sem determinar quais matérias e em que
valorizado para a devida formação ordem devam ser cursadas. O Eastern Institute of
intelectual do estudante. A maior parte Technology, outro interessante paralelo, possui o
dos processos seletivos, hoje em dia, curso de Bacharelado de Artes Visuais e Design
exige a apresentação de portfólio ou no campus de Hawke’s Bay, na Nova Zelândia,
testes de aptidão, de modo que as escolas que pode ser completado em período integral ao
possam selecionar os interessados a partir longo de 1 ano e 6 meses ou em meio período,
da produção pregressa de cada um e sai- com três anos de duração.

Figura 62 – Pátio interno da Royal Academy School,


em Londres. [FIGURA]. Foto de Mike Peel, 2019.

50 | Escola de Artes do São Bento


Certamente, um dos maiores elementos
de impacto na orientação metodológica
contemporânea da educação artística e gráfica
reside no uso da tecnologia digital e no mercado
do entretenimento. A noção do Entertainment
Design é estruturante em muitos desses espaços
formativos e um notável paradigma da comunhão
desses conceitos é o Art Center College of Design
(ACCD), de Pasadena, Califórnia. A escola perpassa
por todos os vértices das artes visuais, indo desde
o debate reflexivo da estética e estudos abstratos
da forma até o desenho automotivo, para citar
uma ramificação. A faculdade conta atualmente Figura 63 – Entre as ferramentas
mais utilizados na produção da
com dois cursos voltados especificamente para a arte digitalizada, está o CINTIQ, da
indústria dos filmes, games, teatro e televisão. Estes WACOM Eletrõnica.
[FIGURA]
são o “Illustration”, com foco em “Entertainment Foto de Jeroen van Rossum, 2019.
Arts” e “Entertainment”, com ênfase em “Concept”.
Os profissionais que enveredam por esse nicho
adquirem um know-how que os permite explorar
a nuance dos seus trabalhos em diversas mídias
e formatos. Abaixo, arte digital de um dos
profissionais de destaque formados na escola,
James Puick, e à direita, ilustração com o CINTIQ,
principal ferramenta eletrônica atual com esse fim.

Figura 64 – Arte digital de James Puick, um dos


célebres artistas gráficos formados na Art Center.
[FIGURA]
Fonte: James Puick/Divulgação.

Escola de Artes do São Bento | 51


4. Estudo do tema

Figura 65 – Exposição nas dependências da Art Center


Mais um ponto que vale ser destacado College of Design, em Pasadena, Califórnia.
e que abrange todos os eixos de [FIGURA]
Disponível em visitpasadena.com
representação gráfica nos grandes
núcleos de ensino hoje é a constante
interdisciplinaridade. Os alunos de
diferentes departamentos vivenciam os
encontros uns dos outros, em diferentes
momentos dos seus cursos. Além de
promover a interconectividade e o olhar
sensível dos artistas para com aspectos
menos trabalhados por eles em suas
ementas, a dinâmica de circulação dos
indivíduos para além dos ambientes
costumeiros de sala enriquece o repertório,
a percepção e dá perícia aos mesmos
para refinarem a sua obra. Esse é um dos
lemas da iArts, em Maastricht, Holanda.
Os maiores projetos semestrais realizados
contam com equipes heterogêneas
e multidisciplinares, orientados por
professores também de mais de uma área.

Figura 66 – Aula ministrada na iArts.


[FIGURA]
Disponível em iartsmaastricht.com

52 | Escola de Artes do São Bento


1.3. Indústria criativa – A validade do equipamento
na dimensão econômico-cultural brasileira

Entende-se que a proposição, além das •Cultura (patrimônio e artes, música,


fundamentais motivações urbanísticas e artes cênicas e expressões culturais);
arquitetônicas já pormenorizadas que a compõe, •Tecnologia (pesquisa &
requeira também um embasamento econômico, desenvolvimento, biotecnologia
uma breve contextualização em meio à conjuntura e Tecnologias da Informação e
financeira do seu campo de correspondência, Comunicação).
nesse caso, as artes visuais. Isso não significa, de
maneira alguma, assumir o trato mercadológico A academia projetada possui direta
como orientação primordial do ensino artístico, afinidade com os filões do Consumo,—
mas apontar o potencial deste dentro da cadeia uma vez que abarca o Design entre os
industrial, quando for essa a aspiração do aluno núcleos de interesses, — das Mídias, tanto
da academia. as editoriais impressas quanto as visuais
(jogos e animações), e claro, da Cultura,
A dita Indústria criativa , segundo categorização o segmento balizador da escola e que
do SEBRAE, é o setor de negócios baseados no permeia todos os demais.
capital intelectual e cultural e na criatividade
que produz valor econômico, atividades essas A participação do PIB Criativo na
distribuídas em quatro grandes áreas: produção de riquezas do Brasil vem num
ritmo de crescimento desde o início da
• Consumo (design, arquitetura, moda e década passada, como mostra o quadro
publicidade); abaixo, comparando os índices de 2004 á
• Mídias (editorial e audiovisual); 2017.

Figura 67 – índices do percentual de


participação PIB Criativo ao longo 13 anos na
economia brasileiro.
[FIGURA]
Fonte: FIRJAN/SENAI (2019).

No período compreendido entre 2015 e 2017,


mesmo com a retração na taxa de empregos
formais de 4,2%, o Consumo se manteve como
principal motor desse campo econômico em escala
nacional. Já a Cultura, embora tenha tido a menor
fatia de contribuição ao todo, possui um percentual
relativamente elevado de trabalhadores da esfera
criativa atuando no campo nas regiões Norte e
Nordeste, segundo a última tabulação realizada
até então. A Bahia possuía, em 2017, 13,3% dos
profissionais dessa indústria trabalhando em
empregos homólogos às atividades culturais,
sendo o terceiro Estado com maior participação,
como mostra o próximo quadro:

Escola de Artes do São Bento | 53


4. Estudo do tema

Figura 68 – índices de participação dos agentes da


Cultura no PIB Criativo em cada Estado.
[FIGURA]
Fonte: FIRJAN/SENAI (2019).

Apesar da Indústria criativa ainda ser


bastante dependente de editais, fundos
setoriais e forte financiamento público,
aos poucos se adquire certa autonomia
em determinadas áreas. Os estúdios e
profissionais de animação, por exemplo,
têm encontrado outros meios de produzir
para além dos instrumentos de incentivo.
Segundo dados de 2019 da Anima
Mundi, 52% dos produtores possuem sua
principal fonte de receita na venda direta,
enquanto a fonte de 5% ainda é baseada
em sua maior parte na lei de audiovisual.

À vista desses indicativos, a Escola de


Artes Visuais do São Bento pretende
não ignorar as possibilidades profissionais
advindas das práxis artísticas no mercado
profissional, aliando o interesse dos que
enxergam a arte apenas como escape e
dos que pretendem viver prossionalmente
dela. Concomitantemente, vai ao encontro
das tendências de oxigenação do ramo
criativo no âmbito nacional e do perfil
econômico do Estado.

54 | Escola de Artes do São Bento


2. Referências
• Visual Arts School Miraflores

A primeira referência trazida para a composição ótica dentro da escola. A nova


do quadro de inspirações que desaguaram nas materialidade contrasta intensamente
decisões projetivas da Escola de Artes Visuais do com a antiga, sinalizando a verdade
São Bento é a Visual Arts School de Miraflores, histórica do conjunto.
no Peru. Trata-se de uma intervenção em
preexistência elaborada pelos arquitetos Sandra
Barclay e Jean Pierre Crousse com o objetivo de
converter uma antiga construção em estilo neo
pré-hispânico projetada por Emilio Harth Terré
datada de meados do séc. XX em uma moderna
escola de artes gráficas. O principal desafio foi o
de comportar o programa na metragem original
do prédio em dois níveis, superado através da
verticalização.
Autores: Barclay&Crousse Architecture
A solução estrutural em Light Steel Frame foi Ano: 2012
adotada para acelerar o implemento da reforma e Localização: Miraflores, Peru
aproveita uma modificação anterior de 1999 para Área construída: 2.280 m²
suportá-la. O partido se vale do pátio interno para Conceitos-chave: Manutenção da
espacializar os ateliês ao redor do eixo central, preexistência; Estrutura em aço leve;
que permite a iluminação zenital e a comunicação Extensão volumétrica.

Figura 69 – Esquina do Visual Arts School Miraflores.


[FIGURA]
Foto de Jean-Pierre Crousse, 2019.

Escola de Artes do São Bento | 55


• École de Condé Marseille - Axe Sud
4. Estudo do tema

O projeto do duo Place e Reynaud natural que ali havia, ainda que pouca. O desafio
em parceria com Jean Lorin consiste na era, portanto, compatibilizar um novo programa
conversão de um antigo edifício de três simultaneamente com a recuperação da situação
pavimentos num dinâmico centro de artes original do equipamento. O contratante foi a escola
gráficas em Marselha, França. O primeiro Axe Sud, reconhecida academia de artes na Europa
grande obstáculo na recuperação e com campus espalhados nos principais regiões da
posterior destinação do objeto foi França, tais como Paris, Bordeaux e Toulouse. A
reverter os danos causados pelas ideia para o novo campus é concretizada através
sucessivas reformas no interior do prédio, da sociedade desta com a École Condé, outro
principalmente com relação à iluminação importante núcleo de ensino artístico da região.

O prédio localizado na Rue Fauchier, segundo


distrito da cidade, foi, no passado, a sede da
empresa de calças jeans Etablissments Escarguel,
que ao mudar de endereço, desativa o imóvel até
o novo uso. Após a intervenção, o espaço passa a
contar com os seguintes espaços:

• 8 oficinas de design;
• 3 oficinas de artes visuais;
• 1 sala de educação geral
• 1 sala de informática;
• 1 estúdio fotográfico;
• 1 espaço estudantil;
• 1 área de exposições;
• 1 biblioteca.

Nenhuma grande mudança exterior foi realizada


no edifício, já que o mesmo mantinha um relativo
estado de conservação nas suas fachadas.

Arquitetos: Matthieu Place, Thomas


Reynaud e Jean Lorin
Ano: 2012
Figuras 70 e 71 – Fotografias da fachada principal da escol. Localização: Marselha, França
É interessante notar que o grafismo original da pintura que
encima o portal foi mantido inalterado na reforma.
Área construída: 5.400 m²
[FIGURA] Conceitos-chave: Manutenção da
Fonte: ecoles-conde.com preexistência; Reforma.

56 | Escola de Artes do São Bento


Arquiteto: Francisco Mangado
Ano: 2014
Localização: Oviedo, Espanha
Área construída: 11.142 m²
Conceitos-chave: Uso misto; Estrutura Figura 72 – Esquina da Plaza de Alfonso II com a Calle
metálica; Ultrapassagem do novo de la Rúa. O Palacio de Velarde é um dos edifícios
volume acima do gabarito existente; apropriados para a expansão do museu.
[FIGURA]
Sobreposição de fachadas. Foto de Pedro Pegenaute, 2014.

• Museo de Bellas Artes de Asturias

Outra interessante intervenção contemporânea


em preexistência a partir de uso cultural na
Europa, o projeto de expansão do Museo de
Bellas Artes de Asturias, concluído em 2014, se
valeu da apropriação de três edifícios históricos
para abarcar um novo e maior acervo artístico. A
proposta de Francisco Mangado foi a vencedora
de um concurso aberto em 2007 e manteve os
imóveis do Palacio de Velarde (foto) e da Casa
Oviedo-Portal como endereços do museu ao
passo que previu o amembramento de dois
outros edifícios vizinhos, grandes reconfigurações
internas e a inserção de novos volumes, como pode
ser visto nos pavimentos superiores do conjunto.
A cobertura de zinco e o alumínio destacam a
novidade da proposição.

A independência dos planos de fachada no


Palacio de Velarde também reforça a intenção do
arquiteto em acentuar as diferenças de tempo
no prédio. As chapas metálicas escovadas se
distinguem ainda mais da parede de cantaria
ao assumirem uma orientação própria como a
endoderme da versão atualizada do museu. Figura 73 – Planos desalinhados na nova fachada.
[FIGURA]
Foto de Marcelo Pedro Pegenaute, 2014.

Escola de Artes do São Bento | 57


• Volland General Store
4. Estudo do tema

Também como exemplo de adequação


de arquitetura atual num invólucro já
existente, o escritório el dorado recupera
uma antiga construção em tijolo cerâmico
de 1913 no centro da pequena cidade de
Volland, no Kansas, e converte em ateliê
particular de artes o que antes era mercado
municipal e correios. O uso original
foi descontinuado durante a Grande
Depressão, juntamente com a emigração
da cidade, tendo sua materialidade
revisitada somente em 2015, ano em que
se realiza a intervenção.

Também como método de compor a


nova ambientação, um sistema de vigas Figura 74 – Fachada frontal da antiga construção após
a intervenção. [FIGURA]. Foto de Mike Sinclair, 2015.
e pilares metálicos foi instalado faceando
a alvenaria centenária, permitindo a
construção de um mezanino aos fundos
do edifício sem exigir esforços da estrutura
anterior. O pé-direito duplo foi mantido,
reservando um amplo espaço na entrada
para exposições.
Autores: el dorado architects
Ano: 2015
Localização: Volland, Kansas
Figura 75 – Imagem interior da Área construída: 1.371 m²
edificação após as modificações
do projeto.[FIGURA] Foto de Mike
Conceitos-chave: Pé direto duplo;
Sinclair, 2015. Estrutura metálica.

58 | Escola de Artes do São Bento


• Escola Panamericana de Arte & Design -
Unidade Angélica

Trazidos mais como menções de disposição do A unidade abriga 21 ateliês nos três
programa do que como paralelos construtivos, as andares acima da cota de acesso principal,
duas derradeiras referências se tratam de edifícios estúdios de arte e fotografia do primeiro
puramente contemporâneos, desenhados com ao terceiro subsolo, além de espaços
o intuito de serem de fato núcleos de atividade de convivência, área de exposições e
artística e formação especializada. estacionamento.

Começando do segundo campus da Escola


Panamericana de Artes & Design em São Paulo
projetado pelo arquiteto paulistano Ziegbert
Zanettini — o primeiro está localizado no Jardim
Paulista — a Unidade Angélica foi construída no
fim da década de 90 para suprir as demandas de
matrícula nos cursos ofertados pela EPA. O novo
endereço passa a atender 2 mil alunos distribuindo
os espaços por meio de seis pavimentos,
sendo três deles subsolo. Assim como a sede
“Groelândia”, inaugurada poucos anos antes, o
prédio de Higienópolis explora em seu partido a
translucidez junto ao aço na revelação estrutural
Figura 76 – EPA.
do conjunto, o que marca um diálogo inteligível [FIGURA]
com a linguagem plástica do anterior. A tipologia Fonte: escolapanamericana.com.br
high-tech também se traduz na caixa de circulação
vertical externa com elevadores panorâmicos.

Figura 77 - Foto do primeiro andar da EPA


Angélica. A disposição de salas ao redor de um
eixo permite a circulação mais fluida e aproveita o
ambiente externo ás salas para criar uma área de
exposições de cima á baixo, em todos os pisos.
[FIGURA]
Foto de Eduardo Takashi, 2018.

Autor: Ziegbert Zanettini


Ano: 1998
Localização: São Paulo, SP
Área construída: 5.300 m²
Conceitos-chave: Arquitetura High-Tech;
Estrutura metálica.

Escola de Artes do São Bento | 59


4. Estudo do tema

• LAB 1404 / Escola Britânica de Artes Figura 78 - Algumas salas não possuem divisórias
entre si. A confluência de espaços é um dos
Criativas conceitos do projeto.
[FIGURA]
Foto de Sara de Santis, 2018.
A Escola Britânica de Artes Criativas
(EBAC) é uma filial brasileira da
Hertfordshire University sediada na
Rua Mourato Coelho, no bairro de Vila
Madelana, São Paulo, desde 2016. A escola
sucursal da instituição inglesa oferece
cursos de graduação em diversos campos
artísticos com diplomas válidos tanto no
Brasil como na União Europeia e Estados
Unidos, tendo suas aulas todas ministradas
em inglês. O projeto arquitetônico ficou
na incumbência de Isay Weinfeld e as
etapas executivas tiveram a participação
da Leonetti Piemonte Arquitetura e do
escritório russo FORM BUREAU.

A escola aluga inicialmente pelo período


de 10 anos o uso da edificação escalonada
de seis níveis para ser a sede das suas
instalações numa das regiões de maior
efervescência cultural da capital paulista.
Logo, era uma requisição do cliente de
que a construção não se fechasse pra si. O
sítio e o gabarito adotado favorecem essa
comunicação visual com o entorno em
360º, que, aliada a um posicionamento
desagregado dos cheios e vazios na
sua fachada frontal através de recuos,
confere ao LAB 1404 um caráter misto de
unicidade e integração no bairro.

60 | Escola de Artes do São Bento


Figura 79 - Acesso principal da EBAC.
[FIGURA]
Fonte: IdeaZarvos.

Escola de Artes do São Bento | 61


Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

62 | Escola de Artes do São Bento


Escola de Artes do São Bento | 63
5.A proposta
1. Interpretação da
5. A proposta

preexistência
1.1. Linha teórica da intervenção

A postura assumida diante do desafio Essa perspectiva invalida o determinismo cerceador


da compartimentação do programa nos quando implica a Arquitetura enquanto campo de
endereços 26 e 28 da Avenida Sete se estudo sob juízo da renovação que se desvencilha
respalda num acordo de concessões que das amarras dogmáticas em vigência na busca
põe na mesa a revinda da memória e a de suscitar novas observações. Trago uma frase
necessidade de novos pareceres. Fazendo de Banham, do auge da discussão modernista
coro ao que averba ZONNO (2016) — que em 1962, não por sua radicalização e proposital
casa com o que já foi falado no compêndio cizânia com o antigo (o que inclusive desmentiria
— a preexistência não pode ser tida como os argumentos anteriores e todo o trabalho), mas
limitadora da criação e reinvenção do como consciência do próprio tempo e lugar:
lugar. O diálogo entre o antigo e o novo
precisa ser lidado como oportunidade de “Se não é moderno hoje em dia, não é mais
enriquecer a experiência da paisagem. arquitetura, mas arqueologia, covardia ou fantasia.”
Desse modo, a intervenção é tão mais (BANHAM,1962 apud GANNON, 2017, p. 5,
bem-sucedida quanto melhor puder tradução livre)
imprimir no objeto outras leituras sem se
furtar a manifestar o contemporâneo nem Figura 80 - Foto de João Vitor Guimarães, 2019.
promover uma abordagem soberba que
privilegie a diferenciação em detrimento
da compatibilidade, o que SEMES (2009
apud ANDRADE JUNIOR, 2016) nomina
como “Oposição intencional”. Não se
pretende, portanto, no projeto aqui
apresentado, o choque plástico gratuito,
a ruptura pela ruptura, mas orquestrar o
manejo construtivo contextualizado com
a linguagem do vindouro programa em
seu receptáculo.

A própria semântica da palavra


“intervenção”, como traz WEISSHEIMER
(2015) a partir do raciocínio de SOLÀ-
MORALES (2006), carrega o sentido
de interpretação. O arquiteto catalão
estabelece o “sistema particular” do
edifício como ente soberano que abriga
a relação de justaposição das diferenças
e semelhanças no processo de construção
do novo significado por exercício
inalienável de abstração, coletando como
insumo simbólico tudo aquilo que é de
posse material e imaterial da obra original
na feitura do que a mesma virá a se tornar.
A harmonia — no sentido de integridade
dentro de uma série de componentes
vinculados — é, pois, alcançada quando
há o acréscimo à substância sobrevivente
de dispositivos que atualizem e realcem
sua energia essencial, ou o que Norberg-
Schulz trata por “fenomenologia do lugar”.

64 | Escola de Artes do São Bento


Embora seja quase incôngruo citar Reyner
Banham num exercício de diálogo com o anterior, é
o “agora”, o absoluto senso de momento presente
na sentença versada pelo autor britânico que se
comunica com o tópico. Um ponto fundamental
que guia a linha propositiva é, nessa marcha,
tomar distância ao máximo de anacronismos.
A não dissimulação cronológica do partido do
novo uso é um serviço à historicidade factual do
ambiente, é respeito ao ciclo verdadeiro do tempo
e suas fatalidades. Qualquer movimento noutro
sentido constitui em taxidermizar culturalmente o
registro físico das épocas passadas, reduzindo-o
à arquétipo de forma inerte e vazia. Passaria ao
largo do decorum vitruviano e também não se
atreveria à insubordinação conceitual — que, na
pior das hipóteses, serve ao menos para acalorar
o debate. Seria tão somente falsear a percepção
geral do espaço com um artifício inócuo.

Assim, condicionar uma outra formatação do


tempo de maneira honesta num bem patrimoniado
profundamente afetado pela ação autóctone
e desenfreada do mesmo, como no conjunto
eclético do São Bento, intui apreender e reformular
o efeito do sequenciamento dos instantes num
contexto o qual se empregue as benesses do
amadurecimento tecnológico frente a arquitetura
que fenece. De certo modo, o contemporâneo
já se encontra incorporado no conjunto, quer
queira, quer não, se classificar a visceralidade
do estado de abandono que não foi aplacado
como uma categoria fortuita do presente. Faz-
se crucial, então, declarar por quais meios seguir
para propor aos imóveis arruinados — ou ao lote,
na recusa de recuperação, não cogitada aqui —
uma solução contemporânea de resgate urbano.
Por conseguinte, a intervenção não mais possuía a
reserva “se”, mas apenas “como” e “quando”.

À seguir, vou enfim ao projeto, pautado nas


premissas até então detalhadas. Figura 81 - Foto de João Vitor Guimarães, 2019.

Escola de Artes do São Bento | 65



Circulação
vertical 2. Partido arquitetônico
2.1. Volumetria e setorização
5. A proposta

A decisão de maior importância na concepção


do partido da Escola de Artes Visuais do São
Bento emerge da intenção do amálgama e
orbita em torno de duas balizas: A unicidade do
conjunto edificado e a conexão deste com o seu

a
int
entorno. A começar da compreensão do casario,
et

ia
te
os novos volumes que se desenvolvem acima da

log
Ar

no
preexistência reinterpretam a relação de separação
ec
et
gerada pelas marcações que indicam o fim de
te

al
Ar

uma casa e o início de outra. Surge daí uma forma


ion
uc

de entremeio ao estabelecer a transição linear


tit
Ins

das duas arquiteturas sob o acréscimo proposto


através do nível comum do piso do primeiro
pavimento. Os recuos laterais ganhos propiciam a
abertura de varandas nos três níveis e possibilitam
a iluminação zenital no térreo.

A proporção de escalas da testada é rebatida


na expansão cúbica com o aumento equivalente
de gabarito nos dois endereços, sendo a maior
cota de toda intervenção condicionada pela
Diagrama de demolições referenciação da crista do frontão da casa 28.
e manutenções da
preexistência Dessa forma, o corpo acoplado ao prédio se
encerra verticalmente até o que estava posto,
respeitando a primazia do porte do antigo solar.

No que toca ao entorno imediato, os


afastamentos cumprem um papel fundamental
para engendrar a conexão do interior com o
exterior. A varanda da fachada Oeste potencializa
o contato do usuário com a Av. Sete de Setembro.
Por sua vez, o último nível se caracteriza pela
vedação vítrea que percorre todo o perímetro
da casa 28 e se abre para a luz e vista do Largo
de São Bento na fachada Sul. Também como
estratégia de maximizar a relação do objeto e
seu sítio, a ocupação de parte do antigo jardim
Paredes estruturais é acompanhada da ampliação da varanda do
reativadas para a primeiro pavimento. A ideia de jardim, dessa forma,
ampliação
passa a estar ligada à massa de oitizeiros do largo,
ainda que o projeto se atenha à manutenção de
uma faixa verde dentro do lote.

A articulação interna entre as duas casas é


amplificada para a implementação do programa
de necessidades, melhor dissecado adiante. Três
dos vãos de janela da Fachada Norte têm o peitoril
demolido e são convertidos em vãos de passagem,
acomodando a área técnica e o laboratório no
primeiro pavimento. O rebaixo do peitoril também
é aplicado para viabilizar o elevador aos fundos
da construção. O quintal, nesse arranjo, mantém
um ar doméstico dentro da escola, abrigando o a
área de convivência.

66 | Escola de Artes do São Bento


As demolições seguem o critério de abertura
do edifício para a sua vizinhança: A antiga caixa de
escada em ruínas é removida de modo a diminuir
a fronteira visual entre o público e o privado, e a
entrada lateral pela fachada Sul, então suprimida
pelo enraizamento das árvores, é aumentada,
declarando uma outra relação do prédio com a Figura 82 - As especulações de
intervenção no conjunto foram as mais
rua. variadas no decorrer do processo. Na
página, estudos de interface e volume
[FIGURA]
2.2. Estudos e especulações de partido à mão livre Material de João Vitor Guimarães, 2020.

Escola de Artes do São Bento | 67


3. Programa
3.1. Ementa
5. A proposta

Como mencionado anteriormente em Os cursos ofertados são:


outros tópicos, o projeto da Escola de
Artes Visuais do São Bento (EAVSB) • Game Design e Modelling;
consiste em um centro educacional de • Métodos de Storyboard e Narrativa Gráfica;
pequeno porte voltado à formação e • Edição de Quadrinhos;
capacitação de artistas juvenis e adultos • Animação 3D;
de diferentes segmentos gráficos. Para • Efeitos Visuais (VFX);
tal, o espaço dispõe tanto de ambientes • Fotografia;
pensados para atender às demandas da • Design gráfico;
produção digitalizada como também • Teoria Geral e História da Arte;
salas direcionadas para as práticas • Ilustração;
manuais tradicionais. Serão, ao todo, 4 • Composição e teoria cromática;
salas equipadas para aulas de técnicas • Técnicas de pintura (Aquarela, Óleo, Pastel Seco
digitais e outras 4 salas planejadas para e Guache);
o lecionamento de métodos à mão livre, • Anatomia;
além dos laboratórios, estúdios e outras • Moda;
áreas complementares que comportarão • Xilogravura;
63 alunos por turno na sua capacidade • Arte final;
máxima. As salas de edição, além de • Desenho automotivo;
formatar o conteúdo das aulas, também • Desenho técnico.
serão elas mesmas espaços para a
experimentação dos estudantes. A multidisciplinaridade e a intersecção entre os
alunos de cada um dos cursos é um dos motes
Os cursos disponibilizados na EAVSB do espaço proposto. As áreas de exposição,
permearão o que vem sendo estudado portanto, servem bem à esse propósito, de exibir a
e produzido nas principais academias do produção que está sendo realizada nos diferentes
gênero, aliando holisticamente o resgate campos para o público externo ao mesmo tempo
de processos clássicos com o que as que aproxima os artistas de áreas distintas com
tecnologias em voga oferecem. seus pares.

Figura 83 - [FIGURA]
Elaborado por João Vitor Guimarães, 2020.

68 | Escola de Artes do São Bento


3.2. Programa de necessidades.

Em virtude da demanda de espaço e estrutura


dos cursos ofertados, a distribuição do programa
segue a seguinte organização:
Ambiente Área
Diretoria 7 m²
Coordenação 7 m²
Sala de reuniões 14 m²
Impressão e plotagem 13 m²
Biblioteca 82 m²
Depósito térreo 5 m²
T´érreo

Área de exposições 142 m²


Manutenção e T.I 17 m²
Área técnica térreo 4 m²
Enfermaria 9 m²
Loja de materiais artísticos 22 m²
Pátio 174 m²
Recepção 32 m²
Hall de exposições 28 m²
Contemplação 88 m²
Ateliê digital I 43 m²
1º pavimento

Ateliê digital II 61m²


Estúdio de fotografia 39 m²
Estúdio de VFX 18 m²
Sala de edição 11m²
Varanda 16 m²
Sala de conferência 42 m²
Área técnica 1º pavimento 5 m²
Ateliê manual I 61 m²
2º pavimento

Ateliê manual II 62 m²
Ateliê manual III 14 m²
Ateliê manual IV 42 m²
Depósito 9 m²
Área técnica 2º pavimento 6 m²

3.3. Índices e áreas


Área do terreno: Área ocupada: Área construída: Área permeável:
871 m² 568 m² 1.362 m² 79 m²
Índice de Ocupação (IO):
0,65
Índice de
Permeabilidade (IP):
0,09
Coeficiente de
Aproveitamento (CA):
1,56

Escola de Artes do São Bento | 69


Figura 84 – Diagrama
com sobreposição dos
percursos do sol durante
um ano e a frequência
dos ventos de acordo
com a direção.
5. A proposta

[FIGURA]
Elaborado por João Constância
Vitor Guimarães, 2020, do vento
com o uso do software
Revit Architecture e a
plataforma Windfinder. mín. máx.

R. Viscon
de de Ou

Hort das
as
ira
Lade
ro Preto

4. Análise climática
4.1. Análise de insolejamento e ventilação
natural

A fachada frontal do casario se que maximiza a sensação de conforto. Assim,


encontra inclinada 98º a Oeste, o que a combinação dos fatores urbanísticos e
torna o eixo longitudinal da construção geográficos do sítio resulta numa arquitetura que
quase perpendicular ao Norte. Embora facilita a proposição de estratégias de equilíbrio
essa implantação, isoladamente, sugerisse de temperatura uma vez que a mesma já se
a suscetibilidade de desconforto térmico encontra protegida das situações mais prejudiciais
causado pelo poente, o volume das nesse sentido. O diagrama acima representa essa
edificações à frente do conjunto, circunstância, localizando o conjunto estudado
sobretudo do Edf. Itaípe e do Edf. Bahia sob as ações de sol e vento.
de Todos os Santos, impede a penetração
dos raios solares após o meio-dia. Se soma Ao lado, estão os diagramas representando, de
a essa boa situação a presença do grande cima pra baixo, o Solstício de Verão, o Equinócio
oitizeiro de larga copa na calçada lideira de Outono, o Solstício de Inverno e o Equinócio
ao imóvel, proporcionando relevante de Primavera, destacando o volume construído ao
oferta de sombra e reduzindo ainda mais a redor do casario e a sombra incidente ao horário
absortância de calor no conjunto. Quanto do meio-dia.
à ventilação natural, a maior constância
chega do sentido Sudeste com pico de
intensidade ao Leste, onde se encontram
justamente as ruas em declive que servem
de cânion para o deslocamento das
correntes predominantes de ar.

O traçado das relações lote-rua no


trecho estreita a passagem do vento, o

70 | Escola de Artes do São Bento


Figura 85 – Sombras
incidentes nos Solstícios
e Equinócios.
[FIGURA]
Elaborado por João Vitor
Guimarães, 2020,
Solstício de Verão

Equinócio de
Outono

Solstício de Inverno

Equinócio de
Primavera

Escola de Artes do São Bento | 71


5. A proposta

72 | Escola de Artes do São Bento


Escola de Artes do São Bento | 73
5. Desenhos
5.1. Cobertura
5. A proposta

74 | Escola de Artes do São Bento


Escola de Artes do São Bento | 75
5.2. Térreo

A antiga entrada secundária pelo Largo


5. A proposta

de São Bento sofre uma ampliação para


se tornar o acesso principal da EAVSB.
A porta da casa 28 orientada para a
Av. Sete de Setembro é adaptada para
permitir a acessibilidade e fica destinada,
preferencialmente, aos funcionários da
área administrativa e da plotagem, assim
como o acesso externo da casa 26, também
voltado para o corpo de colaboradores.

Paredes demolidas

76 | Escola de Artes do São Bento


A árvore aos fundos é mantida
para sombrear o espaço de
convivência descoberto próximo
à recepção e à caixa de circulação
vertical.

Abaixo e acima, fotos tiradas


da preexistência durante as visitas
e localizadas na planta.

Escola de Artes do São Bento | 77


5.3. Primeiro pavimento
5. A proposta

Paredes demolidas

78 | Escola de Artes do São Bento


O pé-direito duplo gerado pelo vazio
aberto entre o hall de exposição e a ala
dos estúdios e ateliês digitais no primeiro
pavimento amplifica a ventilação no
respectivo andar e também no nível
inferior. No que diz respeito à circulação
entre as casas 26 e 28, ela é viabilizada
pelo rebaixo do peitoril das antigas janelas
orientadas para o Norte.

Escola de Artes do São Bento | 79


5.4. Segundo pavimento
5. A proposta

Paredes demolidas

Conforme foi estipulado, o segundo pavimento


reúne os espaços planejados para o ensino de
técnicas manuais de desenho e pintura. Para
fazer o controle da incidência solar nas salas,
a Fachada Sul é protegida externamente por
persianas horizontais. Já as fachadas Oeste e Norte
dispensam a aplicação do sistema uma vez que se
encontram protegidos pela massa vegetal e pelo
volume construído no entorno.

80 | Escola de Artes do São Bento


Escola de Artes do São Bento | 81
5.5. Corte AA
5. A proposta

Paredes demolidas

5.6. Corte BB

Paredes demolidas

82 | Escola de Artes do São Bento


Escola de Artes do São Bento | 83
5.7. Corte CC
5. A proposta

Paredes demolidas

5.8. Corte DD

DET

DET DET

Paredes demolidas

84 | Escola de Artes do São Bento


5.9. Corte EE

Escola de Artes do São Bento | 85


5.10. Fachada Sul
5. A proposta

5.11. Fachada Oeste

A materialidade do novo
se fusiona com o antigo pelo
complemento e contraste. A
solidez das espessas paredes
centenárias é realçada
pela translucidez do vidro
que se homogeniza no
desenvolvimento do volume
contemporâneo e transmite
visualmente a solução
estrutural em aço CA-50.

86 | Escola de Artes do São Bento


As marcações do casario
são definidas como eixos de
localização para a subdivisão
dos montantes da parede
cortina que percorre o
acréscimo. Assim, embora
a proposta traga consigo
outra expressão de forma,
o ritmo das fachadas não é
rompido.

Escola de Artes do São Bento | 87


5.12. Fachada Oeste
5. A proposta

5.13. Fachada Leste

88 | Escola de Artes do São Bento


A torre de elevador inserida aos fundos
emoldura a fachada leste da edificação e
aproveita a descontinuidade da platibanda
para possibilitar a conexão.

Escola de Artes do São Bento | 89


5.14. Detalhes
5. A proposta

PERSIANA HORIZONTAL DE
ALUMÍNIO BANDALUX® 25MM

TELA METÁLICA FIO 14 MALHA


50MM GALVANIZADA

ESQUADRIA EM ALUMÍNIO
ANODIZADO NA COR PRETA

PERFIL STRUGAL S80B

TELA METÁLICA FIO 14 MALHA


50MM GALVANIZADA

PERDA DE EMBRECHAMENTO
PREENCHIDA COM CONCRETO.

PERDA DA CERCADURA
PREENCHIDA COM CONCRETO.

TRECHO DA BALAUSTRADA
DEMOLIDO PARA NIVELAR O
ACESSO

1m
90 | Escola de Artes do São Bento
RUFO PINGADEIRA COM ABA
ESTENDIDA PERFIL C28

ARREMATE PARA INSTALAÇÃO


DO RUFO
TELHA TRAPEZOIDAL TR40 AÇO
GALVANIZADO I=9%

TESOURA METÁLICA

LAJE TRELIÇADA UNIDIRECIONAL


DE EPS COM CAPEAMENTO DE
CONCRETO
VIGA DE AÇO CA-5 PERFIL W 250
X 28,4 (H)

PAINEL DE VIDRO MODELO


STOREFRONT® SERIES 450SF

PERSIANA HORIZONTAL DE
ALUMÍNIO BANDALUX® 25MM

CALHA METÁLICA PERFIL U


PERFIL TUBULAR RETANGULAR
1200MM

PISO LAMINADO DURAFLOOR®


E=20MM
VIGA DE AÇO CA-50 PERFIL W
310 X 52,0
TRECHO DEMOLIDO PARA
FIXAÇÃO DO VIGAMENTO
CANTONEIRA PARAFUSADA NA
MESA DA VIGA

TIRANTE RÍGIDO COM ELO

REGULADOR DE FORRO PERFIL


F530
LONGARINA
FORRO DE GESSO STANDARD
(ST) PALETIZAÇÃO 600X600MM
E=12,5MM PLACO DO BRASIL
OU SIMILAR

1m

Escola de Artes do São Bento | 91


5. A proposta

ESQUADRIA DE VIDRO
COM CAIXILHO DE
ALUMÍNIO

PISO DALLAS BOLD


GRANULADO CINZA
61X61CM

PEDESTAL AJUSTÁVEL
ETERNOIVICA
IMPERMEABILIZAÇÃO
CAIMENTO 1%
VIGA DE AÇO CA-50
PERFIL W 310 X 52,0
CANTONEIRA
PARAFUSADA NA ALMA
DA VIGA
PARAFUSO DE
ANCORAGEM
SUPORTE
METÁLICO
PARAFUSADO

92 | Escola de Artes do São Bento


PERFIL STRUGAL S80B
PASSAMÃO TUBO
CIRCULAR AÇO INOX
ESCOVADO Ø=50MM

TUBO INOX Ø=30MM

TELA METÁLICA FIO


14 MALHA 50MM
GALVANIZADA

SOLDA FILETE
CONTÍNUO E=5MM

FLANGE CHAPA 5MM


CONECTOR

CALHA METÁLICA
MODELO SCHLÜTER®-
BARIN

VIGA DE AÇO CA-50 PERFIL U


LAMINADO 305 x 77,0

PAINEL DE VIDRO MODELO


STOREFRONT® SERIES 450SF

1m

Escola de Artes do São Bento | 93


5.15. Sistema hidráulico e ar-condicionado
A alimentação do sistema hidráulico
5. A proposta

do edifício se dá por meio de distribuição


ascendente com o uso de bombeamento
no reservatório subterrâneo. A caixa
d'água possui capacidade de 14.400L,
valor dimensionado com base no consumo
diário de 4.750L.

O fornecimento de ar-condicionado
é viabilizado com a instalação de três
equipamentos do tipo Chiller em cada um
dos três níveis. O modelo especificado foi
o 23TR FBH 30, da Trocalor.

Reservatório subterrâneo
com bombeamento
hidráulico C=14.400L

5.16. Sistema estrutural


O conjunto de vigas e pilares da
ampliação se associa com preexistência
para possibilitar o quadro estrutural
complementar. As paredes de cantaria
mista voltam a atender como apoios, dessa
vez do vigamento metálico que sustenta as
lajes treliçadas em poliestireno espansível,
mais leve que a solução tradicional com
vigotas e tavelas cerâmicas. Já a laje de
cobertura se apoia nas colunas em perfil
"H" que nascem nas vigas. O vão máximo
é de 5 metros e o mesmo sistema se
desenvolve nos dois volumes.

94 | Escola de Artes do São Bento


Ar Condicionado
Chiller 23TR Percurso da água
modelo FBH 30
Trocalor

Capa de concreto

Armadura

Laje treliçada com


blocos de EPS

Escola de Artes do São Bento | 95


5. A proposta

96 | Escola de Artes do São Bento


Escola de Artes do São Bento | 97
5. A proposta

98 | Escola de Artes do São Bento


Escola de Artes do São Bento | 99

Você também pode gostar