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Registro: 2021.

0000078186

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº


0011172-95.2020.8.26.0564, da Comarca de São Bernardo do Campo, em
que é apelante D. DE C. V. A., é apelado P. DE J. V. DA I. E J. DE S. B.
DO C..

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da Câmara Especial


do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram
provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator,
que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores LUIS


SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE) (Presidente sem voto),
MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E
DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 9 de fevereiro de 2021.

GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL)


Relator
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

VOTO Nº 48.611
APELAÇÃO Nº 0011172-95.2020.8.26.0564
Comarca: São Bernardo do Campo (Processo de Apuração de Ato Infracional nº
0011172-95.2020.8.26.0564)
Juízo de Origem: Vara da Infância e Juventude
Apelante: D. DE C. V. A.
Apelada: JUSTIÇA PÚBLICA

APELAÇÃO Infância e Juventude Atos infracionais equiparados


ao crime de roubo duplamente majorado Recurso defensivo
Pedido de substituição da intervenção socioeducativa de internação por
liberdade assistida Desarrazoabilidade Imprescindibilidade da
medida extrema como forma de viabilizar o processo de ressocialização
e reeducação do adolescente Sentença mantida Apelo não provido.

VISTOS.

D. DE C. V. A., parcialmente
inconformado com a r. sentença (fls. 104/109) que
julgou procedente a representação formulada e
aplicou-lhe a medida socioeducativa de internação,
por prazo indeterminado, em virtude da prática, por
cinco vezes (em concurso formal), de atos
infracionais equiparados ao crime previsto no artigo
157, § 2º, inciso II, e § 2º-A, inciso I, do Código
Penal, apela (fls. 127/129) postulando, apenas e tão-
somente, “seja aplicada medida socioeducativa de

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liberdade assistida” (fls. 129).

Contra-arrazoado o apelo (fls.


139/143) e mantida a r. sentença (fls. 145), em seu
parecer a douta Procuradoria-Geral de Justiça
opinou pelo improvimento do recurso (fls. 181/188).

É o relatório.

Inicialmente, faz-se mister anotar que


a prova colhida sob o crivo do contraditório mostrou-
se plenamente apta a embasar a r. sentença de fls.
104/109, pois comprovadas a materialidade e a
autoria dos atos infracionais.
Pelo presente recurso, busca-se,
apenas e tão-somente, a substituição da medida
socioeducativa de internação por liberdade
assistida.
Porém, razão não assiste à combativa
defensoria.
Ocorre que, na espécie, a medida de
internação afigura-se justa e adequada, diante das
peculiaridades do caso concreto, em que vieram a

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ser praticados atos infracionais de extrema


gravidade (análogos ao crime de roubo duplamente
majorado cabendo anotar, inclusive, que o
apelante, munido de um revólver, “apontou a arma
para um bebê com onze meses de vida, no momento
da subtração da bolsa dessa criança” fls. 108).
Logo, indubitavelmente, as especificidades do caso
concreto indicam possuir o adolescente desvio de
personalidade e recomendam maior atenção no
tocante ao seu processo de desenvolvimento
interpessoal, ressocialização e reeducação, tudo a
demonstrar a insuficiência, dadas as especificidades
da hipótese sub judice, da pretendida adoção de
medida socioeducativa mais branda.
Não bastasse isto, tem-se ainda que os
atos infracionais cometidos pelo recorrente
encontram-se inseridos no rol taxativo previsto no
artigo 122, caput, inciso I, da Lei nº 8.069/90,
segundo o qual será cabível a medida socioeducativa
de internação quando se tratar “de ato infracional
cometido mediante grave ameaça ou violência a
pessoa”.
A propósito:
“HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO

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ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO


CRIME DE ROUBO CIRCUNSTANCIADO. ATO
COMETIDO COM VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA À
PESSOA. ART. 122, INCISO I, DO ESTATUTO DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. MEDIDA SÓCIO-
EDUCATIVA DE INTERNAÇÃO POR PRAZO
INDETERMINADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO
CONFIGURADO. ORDEM DENEGADA. 1. Configurada
uma das hipóteses elencadas no rol taxativo do
art. 122 da Lei nº 8.069/90 é possível a aplicação
da medida socioeducativa de internação. 2. O ato
infracional equiparado ao delito de roubo é
praticado com violência ou grave ameaça, o que
autoriza a aplicação da medida extrema. 3.
Ordem denegada” (HC 95352/SP, 6ª Turma, Rel.
MIN. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJe
08/06/2009).

E, a esta altura, convém destacar que,


a despeito de ter o representado admitido a prática
das ações que ora lhe são atribuídas, não se afigura
viável o reconhecimento do instituto da confissão
espontânea, haja vista que, como é consabido, as
medidas socioeducativas não ostentam natureza
jurídica de pena.
Neste sentido:
“a aplicação da circunstância atenuante de
confissão, prevista no art. 65, III, 'd', do Código
Penal, é impossível em sede de procedimento

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relativo a ato infracional submetido ao Estatuto


da Criança e do Adolescente, uma vez que a
medida socioeducativa não tem natureza de pena”
(HC nº 354.973/SC, Rel. MIN. NEFI CORDEIRO, 6ª
Turma, j. 09/08/2016, DJe 22/08/2016).

Ademais, não há, nos presentes autos,


qualquer elemento de convicção tendente a
demonstrar, de modo seguro, a suficiência de
eventual medida socioeducativa mais branda para
afastar o apelante do pernicioso meio infracional e
fortalecer seus vínculos familiares e comunitários,
de molde a fomentar a gradual reinserção social
dele.
Noutro vértice, observo que o
Relatório de Diagnóstico Polidimensional (fls.
79/83), conquanto não tenha sido explicitamente
favorável à aplicação ao adolescente da medida
socioeducativa de internação, indicou a necessidade
de um acompanhamento mais incisivo por parte do
Estado, explicitando, inclusive, que o recorrente
“iniciou uso de maconha aos 15 anos de idade
fazendo uso diário” (fls. 80).
Portanto, ao menos neste instante,
verifica-se que a medida socioeducativa de

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internação realmente desponta como a forma mais


profícua à consecução do desiderato de, a um só
tempo, afastar o representado do pernicioso meio
infracional e fortalecer seus vínculos familiares e
comunitários, de molde a fomentar a sua gradual
reinserção social.
E mais. Imperioso registrar não se
encontrar, o apelante, inserido em qualquer das
situações previstas no Provimento CSM nº
2565/2020.
Ressalte-se que o artigo 7º, § 1º, do
Provimento CSM nº 2565/2020 determina a
liberação dos adolescentes que cumprem medida
socioeducativa de internação apenas quando não
tenham praticado ato infracional equiparado a crime
com violência ou grave ameaça (recordando-se que a
medida de internação foi aplicada, in casu, pelo
cometimento de condutas assemelhadas a delito de
roubo duplamente majorado) e sejam portadores de
doenças que possam ser agravadas com a COVID-19
(não havendo nos autos prova alguma neste
sentido).
Noutro vértice, muito embora o artigo
3º, inciso I, da Recomendação nº 62/20 do Conselho

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Nacional de Justiça sugira “a reavaliação de


medidas socioeducativas de internação e
semiliberdade, para fins de eventual substituição
por medida em meio aberto, suspensão ou
remissão”, e o artigo 10, caput, inciso III, de
supradito ato normativo recomende, para os casos
suspeitos ou confirmados de COVID-19 no âmbito do
sistema socioeducativo, a avaliação acerca da
possibilidade de “substituição da (...) medida
socioeducativa de meio fechado por medida não
privativa de liberdade, particularmente na
ausência de espaço de isolamento adequado ou de
equipe de saúde”, fato é que, na espécie, sobretudo
diante da gravidade concreta da hipótese em tela
em que, como já mencionado, o adolescente
praticou ato infracional análogo ao crime de roubo
duplamente majorado (e, vale repetir, munido de um
revólver, “apontou a arma para um bebê com onze
meses de vida, no momento da subtração da bolsa
dessa criança” fls. 108) , tal substituição não se
afigura, ao menos por ora, adequada.
Em suma, diante de tudo o quanto foi
exposto linhas acima, conclui-se que a aplicação da
medida socioeducativa de internação, além de justa

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e proporcional, mostra-se consonante com todos os


princípios e diretrizes socioeducativas aplicáveis à
espécie, de modo que nada há a ser reparado.

Diante do exposto, nego provimento ao


apelo.

GUILHERME G. STRENGER
Presidente da Seção de Direito Criminal
Relator

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