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UNIVERSIDADE

0,4% 0,8% 1,6% 2%

1. ARGENTINA 1. 1,076

2. AUSTRÁLIA 2. 0,769

3. ÁUSTRIA 3. 1,633

4. BÉLGICA 4. 1,223

5. BRASIL 5. 0,959

6. CANADÁ 6. 1,201

7. CHILE 7. 0,812

8. COLÔMBIA 8. 0,798

9. COSTA RICA 9. 1,634

10. REPÚBLICA TCHECA 10. 0,756

11. DINAMARCA 11. 1,562

12. ESTÔNIA 12. 1,259

13. FINLÂNDIA 13. 1,606

14. FRANÇA 14. 1,140

15. ALEMANHA 15. 1,012

16. GRÉCIA 16. 0,725

17. HUNGRIA 17. 0,556

18. ISLÂNDIA 18. 1,145

19. INDONÉSIA 19. 0,514

PARA QUÊ?
20. IRLANDA 20. 0,603

21. ISRAEL 21. 0,858

22. ITÁLIA 22. 0,570

23. JAPÃO 23. 0,450

24. COREIA DO SUL 24. 0,656

25. LETÔNIA 25. 1,094

26. LITUÂNIA 26. 1,078

27. LUXEMBURGO 27. 0,487

28. MÉXICO 28. 1,003

29. PAÍSES BAIXOS 29. 1,165

30. NOVA ZELÂNDIA 30. 0,906

31. NORUEGA 31. 1,669

32. POLÔNIA 32. 1,086

33. PORTUGAL 33. 0,749

34. RÚSSIA 34. 0,734

35. ESLOVÁQUIA 35. 1,240

36. ESLOVÊNIA Alvo de 36. 0,863

37. ÁFRICA DO SUL críticas 37. 0,588

38. ESPANHA e cortes, 38. 0,850

39. SUÉCIA ensino superior 39. 1,372

40. SUÍÇA tem a difícil 40. 1,276

41. TURQUIA missão de repensar 41. 1,236

42. REINO UNIDO seu futuro 42. 0,467

43. ESTADOS UNIDOS 43. 0,907

O gráfico mostra o percentual do Produto Interno Bruto (PIB) investido por cada país na educação superior. Fonte: Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), 2019

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REPORTAGEM Camila Almeida EDIÇÃO Giuliana de Toledo DESIGN May Tanferri ILUSTRAÇÃO Ricardo Davino

UNI-

ram reverter os cortes e, ao todo, cerca de 3,5 mil dias. Em 15 de maio, a greve do setor levou cen- como se fossem ineficientes. Conflito político com
bolsas foram cortadas. Em junho, os programas tenas de milhares de manifestantes às ruas em o MEC não é novidade; novidade é o MEC fazer
avaliados com duas notas 3 consecutivas, ou que mais de 200 municípios. Em 30 de maio, um guerra com as universidades. Novidade é contingen-
foram rebaixados do conceito 4 para 3 na últi- novo protesto. Mais de cem municípios tive- ciamento vir com uma declaração de guerra”, diz.
ma avaliação, sofreram novos cortes, e perderam ram atos em defesa da educação. No Twitter,

O
mais de 2,7 mil bolsas. Os programas com nota a hashtag #MinhaPesquisaMinhaBalbúrdia fez
4 devem ser os afetados em julho. pesquisadores compartilharem seus estudos e
A educação superior é um dos setores mais os resultados que já alcançaram.
pressionados no governo Bolsonaro. O primeiro A mobilização também tem ocorrido dentro do
ministro a assumir a pasta, Ricardo Vélez, deixou Congresso Nacional. A Frente Parlamentar pela
o cargo após adotar uma série de posturas polê- Valorização das Universidades Federais, criada em
micas, dentre elas a de afirmar que “as universi- 2013, foi reativada neste ano. Conta com a parti-
dades deveriam ficar restritas a uma elite inte- cipação de cerca de 200 parlamentares, das mais O pesquisador Pedro Mazza, 26 anos, doutoran-

VERSIDADES
lectual”. Weintraub, que assumiu em 8 de abril, diversas bancadas. Uma das integrantes é a depu- do em Zootecnia na UFBA, é um dos afetados
não é menos polêmico. Primeiro, o presidente tada federal Margarida Salomão (PT-MG), linguista pelos cortes. A partir de janeiro do ano que vem,
Jair Bolsonaro afirmou, em seu perfil no Twitter, e professora universitária que já foi reitora da Uni- vai fazer estudos in vitro na Universidade de Ne-
que “o ministro da Educação @abrahamWeinT versidade Federal de Juiz de Fora. Segundo ela, os vada (EUA) para verificar como o organismo de
estuda descentralizar investimento em faculda- conflitos políticos sempre foram uma constante na ruminantes se comporta quando submetido a
des de filosofia e sociologia (humanas)”, e que história das universidades — nos governos Lula e uma dieta com menos proteínas. Sua hipótese
que, em vez de procurar melhorar o desempe- “o objetivo é focar em áreas que gerem retorno Dilma, por exemplo, houve inúmeras greves. Mas de pesquisa é a de que a alimentação do gado
nho acadêmico, estiverem fazendo balbúrdia, te- imediato ao contribuinte, como: veterinária, en- ela aponta algumas diferenças nas disputas que o brasileiro, por tomar como parâmetro normas
rão verbas reduzidas.” A afirmação do ministro da genharia e medicina”. Logo depois, vieram as setor precisa enfrentar hoje. “As universidades são internacionais, é mais rica em proteínas do que
Educação, Abraham Weintraub, em 30 de abril, alegações de balbúrdia e o contingenciamento. espaços de insurgência, a crítica é um traço funda- o necessário — e esse é um dos componentes
veio acompanhada de retaliação: Universidade de A trincheira da educação está mais acirrada mental na história delas. Fui reitora quando o Paulo que mais encarecem a ração. “Eu dependo desse
Brasília (UnB), Universidade Federal Fluminense do que qualquer outra. Dois protestos tomaram Renato era ministro [de Fernando Henrique Cardo- intercâmbio para fazer minha pesquisa. Aqui no
(UFF) e Universidade Federal da Bahia (UFBA) as ruas do país em um intervalo de apenas 15 so], e era difícil, ele sempre tratou as universidades Brasil, deveria estar fazendo as análises em cam-
tiveram 30% do orçamento previsto para o ano po desde janeiro, mas até agora a Fundação de
bloqueado para despesas consideradas não obri- Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb)
gatórias, que vão do pagamento de bolsas a con- não liberou as verbas previstas para aquisição
tas de luz. Segundo o ministro, as universidades dos animais e dos materiais necessários”, conta.

4 mitos que andam espalhando por aí


mencionadas promoveram eventos políticos, ma- Mazza tinha conseguido aprovação para passar
nifestações partidárias ou festas inadequadas. De- 12 meses nos EUA, mas, com os cortes no pro-
pois da repercussão negativa da medida, que mo- grama de internacionalização Capes PrInt, tudo
Fake news rondam as universidades públicas brasileiras. Conheça algumas verdades sobre o funcionamento do nosso ensino superior
tivou uma ação civil pública do Ministério Público mudou. Dos 96 alunos selecionados da UFBA, al-
Federal pelos danos causados à honra, à imagem guns precisariam ser eliminados. Para evitar a ex-
pública e à liberdade de expressão de professores clusão, porém, os estudantes chegaram a uma so-
e estudantes, Weintraub estendeu o contingencia- lução com a pró-reitoria de pós-graduação: cada
mento a todos os institutos e universidades fede- um vai passar menos tempo no exterior para que

*Estudo intitulado Research in Brazil, realizado a pedido da Capes


rais do país. A redução chega a R$ 2,5 bilhões. todos possam fazer o intercâmbio. Agora, Maz-
No início de maio, a Coordenação de Aperfei- za terá nove meses nos Estados Unidos. “Nesse
çoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) tempo, não consigo nem acompanhar a lactação
— fundação do Ministério da Educação que atua DIVERSIDADE já é uma realidade nas INOVAÇÃO no Brasil é um quesito O CUSTO da universidade é alto? O PESQUISA é uma área que depende inteira de uma vaca. Eu poderia entrar com re-
na expansão e consolidação da pós-graduação no universidades. Apesar de ser usual a totalmente dependente da produção Brasil investe US$ 14,3 mil por ano muito das universidades públicas. curso, mas preferi abrir mão de um trimestre de
Brasil — anunciou o corte de quase 5 mil bolsas afirmação de que a graduação é um acadêmica. É comum que se diga por estudante, perto dos US$ 15,7 Comenta-se que elas são pouco pesquisa pensando no coletivo”, diz.
de pesquisa, alegando que estavam “ociosas” no privilégio das elites, pesquisa mostra que as universidades brasileiras são mil gastos em países desenvolvidos. produtivas, mas, na verdade, somos A pesquisa de Mazza tem sido feita a trancos
mês de abril. A medida foi criticada pelas uni- que 70% dos estudantes de universi- pouco inovadoras, mas são elas as Isso com um ensino superior em o 13º país que mais publica artigos e barrancos desde o começo. Ele foi o primeiro
versidades, uma vez que as bolsas eram de estu- dades federais têm renda familiar de maiores responsáveis pelo pedido de expansão, que oferece serviços como científicos no mundo, de acordo colocado na seleção do programa, mas precisou
dantes que tinham defendido suas dissertações e 1,5 salário mínimo per capita. Mais da patentes no país. Das dez instituições hospitais universitários e museus. Na com um levantamento realizado fazer os dez meses iniciais da pesquisa sem bol-
teses recentemente, e seriam repassadas para as metade dos alunos são negros e 60% brasileiras que mais fazem pedidos, educação básica, investimos muito em 2018 pela empresa Clarivate sa, porque não havia nenhuma disponível. “Eu só
novas turmas selecionadas. Os programas com cursaram o ensino médio em escolas nove são universidades públicas (leia pouco: cerca de US$ 3,8 mil por aluno, Analytics*. Foram mais de 250 mil consegui me manter pesquisando porque moro
conceito Capes 6 e 7 (nota máxima) consegui- públicas (veja os gráficos na p. 30). entrevista sobre inovação na p. 32). menos da metade da média da OCDE. papers publicados entre 2011 e 2016. na casa dos meus pais [em Salvador]. Se não

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vivem nas cidades onde estudam, por exemplo,

Juventude diplomada nasceu em 2008. Já em 2012, foi criada a Lei de


Cotas para o Ensino Superior, que exigiu a reser-
Compare o percentual de pessoas entre 24 e 35 anos de idade que têm formação superior em diferentes países va de 50% das vagas em universidades federais
para alunos de escolas públicas.
Para o presidente da Andifes, Reinaldo Cento-
100% ducatte, reitor da Universidade Federal do Espí-
rito Santo, todo esse esforço envolvido teve — e
terá — um impacto significativo no desenvolvi-
mento nacional. “Talvez ainda não estejamos co-
lhendo os frutos de maneira tão perceptível hoje,
mas, em breve, vamos reconhecer a mobilidade
social que essas políticas proporcionaram. Es-
ses estudantes que estão hoje no ensino supe-
rior serão promotores de uma nova era em suas
próprias famílias e, no futuro, teremos outro es-
pectro de composição social em função da mobi-

Fonte: OCDE, 2019


lidade proporcionada”, diz. Em nome da Andifes,
o reitor tem participado de diversas negociações
em Brasília para tentar garantir recursos para as
0%
universidades. “O contingenciamento tem sido
uma constante desde 2015, e sempre temos de
argumentar para garantir que o orçamento apro-
vado seja repassado para as universidades. Tive-
mos uma reunião no início de junho com o mi-
tivesse esse suporte, teria desistido”, afirma. que contam com uma renda mensal de R$ 1.400 nistro Weintraub e ele afirmou que foi firmado
Ele também trabalha com um grupo de pesqui- per capita, segundo o Instituto Brasileiro de Geo- um acordo junto à Comissão Mista de Orçamen-
sadores no Laboratório de Análise de Nutrição grafia e Estatística (IBGE). to e que não vai faltar dinheiro para a educação.”

0 BRASIL É O
Animal da UFBA. Sem remuneração. A cor da universidade também não é mais a

N
13º
mesma. De acordo com a pesquisa da Andifes,

A
51,2% dos estudantes são pretos ou pardos e
43,3% são brancos. Cerca de metade dos alunos
também já é de cotistas, e mais de 60% cursa-
ram integralmente o ensino médio em escolas
públicas (veja gráficos na próxima página).
A expansão das universidades federais nos úl-
timos anos foi acelerada. Segundo o levantamen- No Brasil, 18% dos jovens entre 18 e 24 anos es-
Ainda é comum a percepção de que a universida- to da Andifes, em 2002 havia 148 campi univer- tão no ensino superior, de acordo com a Pesquisa
de pública é um ambiente de elite. Mas, na ver- sitários federais no país; em 2017, eram 408, Nacional por Amostra de Domicílios. A meta, no
dade, o perfil socioeconômico dos estudantes um aumento de 175% em 15 anos. A evolução no Plano Nacional de Educação, é de que o país che-
mudou radicalmente nos últimos anos. A 5ª Pes- número de matrículas também é expressiva. Em gue a 2024 com 33% dos jovens matriculados em
quisa do Perfil Socioeconômico dos Graduandos 2002, 500 mil pessoas faziam cursos de gradua- uma graduação — para isso, há uma longa estrada

PAÍS QUE MAIS


das Universidades Federais, realizada pela Asso- ção em universidades federais. Hoje, são mais de pela frente. Na Organização para a Cooperação e
ciação Nacional dos Dirigentes das Instituições 1,1 milhão. Uma transformação dessa magnitude Desenvolvimento Econômico (OCDE), formada,
Federais de Ensino Superior (Andifes) e divulga- só foi possível graças a um aumento significati- em sua maioria, por países desenvolvidos, a mé-

PUBLICA ARTIGOS
da neste ano, mostrou que, em 2018, 70% dos vo do investimento e à criação de políticas para dia de pessoas entre 24 e 35 anos com formação
alunos de graduação em universidades federais acesso mais igualitário. O Programa Nacional superior é de 45%. A nossa é de 16%. Para atin-
vinham de famílias cuja renda é de, no máximo, de Assistência Estudantil (PNAES), responsável gir esse patamar, seria necessário ampliar os in-
um salário mínimo e meio per capita (menos de pela aplicação de recursos para o que se chama vestimentos. Hoje, o Brasil investe US$ 14,3 mil
R$ 1.500 por mês, por pessoa). Essa realidade é de “permanência”, com o pagamento de auxílio- por ano por estudante, valor próximo dos US$
equivalente à da média das famílias brasileiras, -moradia para estudantes de baixa renda que não 15,7 mil gastos pelos países da OCDE.

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Conheça o perfil dos estudantes dos
institutos e universidades federais De onde vêm? Com quanto dinheiro vivem?

QUEM SÃO
Onde os graduandos estudaram no ensino médio Qual é a faixa de renda per capita do grupo familiar a que os alunos pertencem

ELES
100%

62,5

60,4
60,1
26,6 | até meio SM*

55,2
44,8

39,6
26,9 | mais de ½ a 1 SM

39,8
37,5
16,6 | mais de 1 a 1 e ½ SM

16,7 | mais de 1 e ½ SM

5,9 | mais de 3 a 5 SM

2,8 | mais de 5 a 7 SM

0,8 | mais de 7 a 10 SM
0%
0,6 | mais de 10 a 20 SM
2003 2010 2014 2018
0,1 | mais de 20 SM

Fizeram ensino médio somente em escola pública 3 | não responderam


Fizeram EM em escola particular (em parte ou no todo) 0% 50%

Fonte: Pesquisa Nacional de Perfil Socioeconômico e Cultural dos Graduandos das Ifes Fonte: Pesquisa Nacional de Perfil Socioeconômico e Cultural dos Graduandos das Ifes (2018) / *Salário mínimo

2003 2010 2014 2018


Qual é a cor
ou raça dos
estudantes? 0,9%

A largura das faixas representa


a proporção de alunos de cada
grupo no período indicado
1,3% 0,6%
47,6% 43,3%
p re
ta 9,8% pretos
INDÍGENA 2% 37,8% pardos 0,9%
2,3%
NEGRA 34,2%
53,9%
2,5%
São consideradas NEGRAS 5,9% pretos
pessoas autoidentificadas como 28,3% pardos par
da 3,1%
pretas ou pardas.
3,8%

AMARELA 4,5%

PRETA, em 2018, corresponde à soma 40,8%


2,1%
das categorias “Pretos não quilombolas” 8,7% pretos
e “Pretos quilombolas”. 32,1% pardos

BRANCA 59,3% 51,2%


45,7% 12% pretos
INDÍGENA, em 2018, corresponde à soma SEM DECLARAÇÃO 39,2% pardos
0%
das categorias “Indígenas não aldeados” / OUTRA

e “Indígenas aldeados”.

Fontes: Fonaprace/Andifes (2004, 2011, 2016) e

5ª Pesquisa Nacional de Perfil Socioeconômico e

Cultural dos Graduandos das Ifes (2018)

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A diferença é que esses países já têm uma importante também colocar nossa trajetória em
estrutura consolidada — tanto pública quanto As universidades brasileiras engatinham em perspectiva quando nos comparamos com outros
privada —, enquanto a nossa está em expansão. uma área em que as norte-americanas, por países. “É claro que podemos melhorar nesses
Já no Brasil, a importância das universidades exemplo, já são referência: a inovação rankings, mas isso não quer dizer que estamos
públicas para o desenvolvimento científico e tec- mal. Ali estamos concorrendo com universida-

9 ENTRE OS 10
nológico do país é indiscutível. Um levantamento Para entender como o Brasil pode melhorar nesse quesito, des seculares. O ensino superior do Brasil ain-
feito neste ano pelo diretor científico da Funda- entrevistamos Mariza Costa Almeida, professora da Univer- da está engatinhando.”
ção de Amparo à Pesquisa de São Paulo (Fapesp), sidade Federal do Estado do Rio de Janeiro e vice-presidente

LOCAIS QUE MAIS


A
Carlos Henrique Brito, revelou que, dos estudos da Triple Helix Association, criada em 1996 pelos pesquisa-
publicados pelas cem instituições de ensino su- dores Henry Etzkowitz e Loet Leydesdorff para estudar a
perior do país nos últimos cinco anos, mais de relação entre universidade, indústria e governo.

PEDEM PATENTE
95% eram de universidades públicas. A partici-
pação delas na inovação também é extremamen- A Triple Helix Association tem como pi-
te relevante: de acordo com o Instituto Nacional lar o tripé universidade-empresa-go-

NO BRASIL SÃO
da Propriedade Industrial (INPI), das dez orga- verno. No que consiste esse modelo?
nizações brasileiras que mais depositaram pedi- É um modelo teórico que se propõe a estudar como acon- A crise não atinge somente as universidades pú-
dos de patentes de invenção em 2018, nove eram tece a inovação tecnológica. Ele considera que são as uni- blicas. No Brasil, as instituições de ensino particu-

UNIVERSIDADES
universidades. Em comparação com outras na- versidades a chave do processo porque estão mais perto da lares abarcam 71% dos 6,5 milhões de matricula-
ções, o Brasil também não vai mal: somos o 13º produção de conhecimento. E a melhor maneira de produzir dos em cursos de graduação presenciais, de acordo
país com mais publicações no mundo — à frente inovação é por meio da interação desses três grupos, cada com o último censo realizado pelo Instituto Na-
de países como a Rússia e logo atrás da Coreia cional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aní-
do Sul —, tendo adicionado, entre 2011 e 2016, sio Teixeira (Inep) do MEC. Quando o assunto é
mais de 250 mil artigos publicados em periódi- educação a distância, esse número sobe: ao todo,
cos à plataforma Web of Science — referência na dos 8,3 milhões de alunos de graduação no país,
catalogação e divulgação de pesquisas em todo
o mundo por contar com mais de 20 mil revistas “Ciência e tecnologia são as bases 6,2 milhões estão estudando em particulares. E
o setor tem suas dificuldades. Entre 2015 e 2017,
científicas em seu catálogo.
Já em rankings internacionais que medem a do desenvolvimento econômico e social” o mercado particular perdeu 175,5 mil matrículas
presenciais, conforme relatório da Associação Bra-
qualidade do ensino superior, o Brasil não figura sileira de Mantenedoras de Ensino Superior (AB-
tão bem. Na avaliação de 2019 do Times Higher MES). Para conseguir continuar crescendo, o seg-
Education, a instituição nacional mais bem co- mento investiu na expansão do ensino a distância
locada é a Universidade de São Paulo (USP), fi- um com um papel: a universidade com o conhecimento, ocorre quando pesquisadores e empresas possuem um — que, no mesmo período, ganhou quase 325 mil
gurando entre as 250 e 300 universidades mais o governo com a regulação do mercado e das transações projeto com objetivos comuns, que queiram conduzir matrículas. Essa mudança de abordagem conseguiu
bem avaliadas do mundo. Segundo a pesquisa- econômicas e as empresas com o processo produtivo. em conjunto. Em geral é a empresa que procura a uni- garantir tanto um respiro para as empresas do se-
dora e professora da Universidade Estadual de versidade para resolver um problema específico ou uma tor quanto o acesso de muitos estudantes ao en-
Campinas (Unicamp), Sabine Righetti, que tam- O modelo se baseia nas práticas dos necessidade existente na atividade produtiva. sino superior, que não poderiam chegar a esse ní-
bém é coordenadora acadêmica do Ranking Uni- EUA. Qual a aplicabilidade no Brasil? vel de formação sem uma opção mais em conta.
versitário Folha, esses rankings não conseguem Lá existe uma forte interação entre as universidades e as Os cortes no orçamento põem em ris- No EAD, 90% dos estudantes pagam mensalidade
refletir a qualidade das universidades brasileiras. empresas no desenvolvimento de projetos de pesquisa. Isso co esse processo? de até R$ 200. Nos cursos presenciais, os alunos
“Os critérios favorecem muito os anglo-saxões; tem se adaptado bem ao Brasil, mas é recente. O modelo de Quando falamos sobre produção de conhecimento, as pagam bem mais: 22% pagam entre R$ 200 e R$
quem não publica tanto em inglês, não vai ser tão incubadora de empresas, um dos principais instrumentos universidades públicas é que estão indo bem nesse quesi- 800; 53% pagam de R$ 800 a R$ 1.600.
bem avaliado em termos de impacto porque, con- da universidade empreendedora, foi criado nos EUA e tra- to, não as privadas. A estrondosa maioria das pesquisas é Somada à crise econômica e ao desemprego que
sequentemente, vai conseguir menos citações. zido ao Brasil por professores que fizeram aperfeiçoamento feita pelas universidades públicas, enquanto as privadas acomete os brasileiros está também a maior dificul-
A internacionalização também é um critério de por lá. Quando uma universidade tem uma incubadora ela se restringem à formação de mão de obra. A situação dade de acesso ao Fundo de Financiamento Estu-
avaliação, e é claro que universidades que têm consegue, de um lado, formar pessoas, do outro, formar em- das universidades está ficando muito grave consideran- dantil (Fies), que foi reformulado em 2018. “Com
oferta de cursos em língua inglesa vão receber presas com alto potencial de impacto econômico e social. do-se a manutenção. Se eu precisar de um computador, as mudanças no Fies, o programa perdeu muito seu
mais estudantes de fora. Além disso, nós temos não posso contar com a universidade, preciso tirar do caráter social, porque virou um financiamento ban-
outros problemas para atrair intercambistas que Essa abordagem não afeta o pensa- meu salário ou de um projeto de apoio recebido de uma cário. No seu auge, ele permitiu uma inclusão feno-
nada têm a ver com a universidade, como os altos mento científico independente? agência de fomento. Ciência e tecnologia são as bases do menal. Das 100 mil vagas que são oferecidas com
índices de violência e de pobreza, que são fatores As empresas não interferem no conjunto das pesquisas, desenvolvimento econômico e social. Deixar de formar juro zero, apenas 38 mil estão preenchidas. Os cri-
de repulsa”, diz Righetti. Para a pesquisadora, é a autonomia da universidade não é rompida. A interação mestres e doutores é uma ameaça ao futuro. térios estão muito mais rigorosos”, diz o diretor-

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-presidente da ABMES, Celso Niskier. “Como
solução, muitas instituições particulares estão crian-
do formas próprias de financiamento, oferecendo al- Ciência à mostra
ternativas mais acessíveis para jovens que estão no De onde vêm os artigos publicados por brasileiros de 2014 a 2018
momento crítico da vida, em que têm altíssimo po-
tencial, mas não converteram isso em renda ainda.” 100%
E essa não é uma dura realidade apenas no Bra- 96,24%
sil. Nos Estados Unidos, os jovens estão completa-

Fonte: Clarivate, Incites, levantamento de Carlos Henrique Brito


mente afogados em dívidas de financiamentos es-
tudantis. De acordo com levantamento do College
Board, cada recém-formado norte-americano deve,
em média, R$ 112 mil — e o montante de dívidas no
país chega a R$ 6 trilhões.
3,76%

S
0%

INSTITUIÇÕES INSTITUIÇÕES
PRIVADAS PÚBLICAS

Número de publicações por instituições privadas: 14.815


Número de publicações por instituições públicas: 379.419
Se antigamente ter um diploma de ensino superior
era sinônimo de colocação no mercado de traba-
lho e futuro brilhante, agora, sem dúvidas, as taxas
de empregabilidade já começam a afetar a forma
como a população jovem se relaciona com o ensi- ligência artificial vão exigir competências cada vez
no superior. Uma pesquisa de 2018 do Instituto mais sofisticadas. Formar as pessoas apenas com a
de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostrou educação básica não é mais suficiente”, diz.
que 44,2% dos jovens que concluíram o ensino Preparar a população para esse futuro não exige
superior não estão trabalhando em suas áreas de nada de outro mundo. Um estudo publicado pela
formação porque faltam vagas para receber essa Economist Intelligence Unit, intitulado Worldwide
mão de obra qualificada. Resultado: essas pessoas Educating for the Future Index 2018, mostrou que
estão ganhando salários incompatíveis com sua as bases para o sucesso são: formação continuada
formação. Hoje, um trabalhador que atua na área dos professores; flexibilidade para adaptar os cur-
ganha, em média, R$ 5.700 por mês; o salário do rículos; manutenção de valores como diversidade
que não atua cai para R$ 3.200. Não à toa, como e tolerância. A base é aproximar a vivência univer-
revela o 8º Mapa do Ensino Superior, o índice de sitária do que o mundo exige na prática.
evasão na rede privada chegou a 30% no ano pas- Para Costin, alguns países têm experiências in-
sado; na pública, foi de 18,5%. teressantes nesse aspecto. “No Brasil, não temos
O problema, definitivamente, não é o número ex- uma política forte de primeiro emprego. A Alema-
cessivo de graduandos, e sim a falta de capacidade nha, por exemplo, tem um modelo dual de educa-
do país de gerar empregos. Segundo a professora ção. Quando os estudantes fazem um ensino médio
Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência técnico, passam parte do dia na escola, parte do dia
e Inovação em Políticas Educacionais (Ceipe) da em uma empresa. Isso aumenta não só a emprega-
Fundação Getúlio Vargas (FGV), o Brasil está mui- bilidade mas a capacidade de formar profissionais
to atrasado no ensino superior quando levamos em que atendam melhor às demandas do mercado de
conta o tamanho da economia do país e as perspec- trabalho.” Ela ressalta que, no Brasil, também não
tivas de futuro. “O Brasil é a nona maior economia faltam exemplos de sucesso. “O que precisamos é
do mundo. É urgente aumentar a população uni- aprender a dar escala a essas experiências. Educa-
versitária, especialmente no contexto dessa quarta ção exige esforço, ação coordenada, equipe técnica.
revolução industrial, em que a automação e a inte- Não dá para jogar para a plateia.”

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