Você está na página 1de 31

MECÂNICA DOS SOLOS II - Prof. Paulo César Pinto, MSc.

TENSÕES NOS SOLOS

O conhecimento das tensões atuantes em um maciço de terra sejam elas advindas


do peso próprio ou em decorrência de carregamentos em superfície, ou ainda pelo alívio de
cargas provocado por escavações (Figura 2.1), é de vital importância no entendimento do
comportamento de praticamente todas as obras de engenharia geotécnica. Há uma
necessidade de se conhecer a distribuição de tensões (pressões) nas várias profundidades
abaixo do terreno para a solução dos mais diversos problemas de solos, como de recalques,
empuxo de terra, capacidade de carga no solo, etc.

σ0 = Tensão devida ao peso próprio


∆σ1 = Alívio de tensão devido à escavação
∆σ2 = Tensão induzida pelo carregamento

Figura 2.1 – Tensões atuantes em um maciço de solo

2.1 – Conceito de tensão em um meio particulado

Para o estudo das tensões no solo aplicam-se os conceitos da Mecânica dos Sólidos
Deformáveis aos solos, para tal deve-se partir do Conceito de Tensões.

O solo é um sistema trifásico constituído por sólidos, água e ar. Parte dos esforços é
transmitida pelos grãos e, dependendo das condições de saturação, parte é transmitida pela
água. No caso de solos secos, todos os esforços são transmitidos pelo arcabouço sólido.
Entretanto, a definição do estado de tensões requer não só a definição dos esforços, mas
também da área. Neste caso, a área considerada deveria passar pelos pontos de contato
(Ac), conforme mostra a Figura 2.2. Este tipo de abordagem torna-se inviável face à
variabilidade de tamanhos de grãos e arranjos estruturais. Em contrapartida, a adoção de
um plano horizontal (A) acarreta na existência de regiões sólidas e regiões que passam
pelos vazios. Em qualquer caso, entretanto, a transmissão se faz nos contatos e,
portanto, em áreas muito reduzidas em relação à área total envolvida.

O somatório da área de contato (Ac) é da ordem de 0,03% da área total (A), o que
faz com que o valor da tensão, considerando-se exclusivamente a transmissão dos esforços
pelos contatos, ser significativamente mais alta do que aquela considerada em termos
médios (Gerscovich, 2008).

30
Figura 2.2 – Transmissão de esforços em solos

Apesar do conceito de transmissão através dos contatos entre grãos ser fisicamente
mais correto, não seria possível desenvolver modelos matemáticos que representassem
isoladamente as forças transmitidas. Assim sendo, as tensões normal e cisalhante são
tratadas do ponto de vista macroscópico, considerando a área total (A), definindo-se como:

TENSÃO NORMAL é a somató ria das forças normais ao plano, dividida pela área
total que abrange as partículas em que estes contatos ocorrem.
σ=ΣN
A
TENSÃO CISALHANTE é a somatória das forças tangenciais, dividida pela área.
(componente melhor estudada no Capítulo 04)
τ=ΣT
A

O conceito de tensão definido conduz ao conceito de tensão num meio contínuo. Ao


se fazer assim, não se está cogitando se esse ponto, no sistema particulado, está
materialmente ocupado por um grão ou um vazio (PINTO, 2006).

Na Mecânica dos Solos trata-se eventualmente a tensão atuante no solo como


“pressão”. Entenda-se que, sempre que referirmos para solo a palavra “pressão”, estaremos
expressando tensão, sem prejuízo da conceituação clássica aqui abordada.

2.2 – Tensões verticais devidas ao peso próprio dos solos

Na análise do comportamento dos solos, as tensões devidas ao peso próprio têm


valores consideráveis, e não podem ser desconsideradas. Neste item, serão estudadas as
pressões atuantes na massa de solo, nas diversas profundidades de um maciço, quando
consideramos somente o peso próprio, isto é, apenas sujeito à ação da gravidade, sem
cargas exteriores atuantes.
De acordo com a mecânica do contínuo “O estado de tensão em qualquer plano
passando por um ponto em um meio contínuo é totalmente definido pelas tensões atuantes
em três planos mutuamente ortogonais, passando no ponto”. A Figura 2.3 ilustra o estado
de tensões (componentes) geral em um ponto no interior de uma massa de solo qualquer.
31
Estado de tensão em qualquer Representação matricial das
plano passando por um ponto componentes de tensão
(definidas por 09 parcelas)

Figura 2.3 – Estado de tensões em um ponto no interior de uma massa de solo qualquer

No caso de terrapleno com superfície superior inclinada, teremos:

Seja a superfície superior com uma inclinação i (em relação horizontal), de uma
massa de solo cujo interior se situa o ponto A cotado no plano A (base do prisma) a uma
profundidade Z, como mostra na Figura 2.4 (a), o prisma corresponde à coluna de solo de
comprimento unitário, largura b (na horizontal) e profundidade Z.

Considerando a massa de solo homogêneo no espaço semi-infinito, o terreno está


solicitado só pela ação da gravidade não ocorrendo lençol freático nessa espessura Z. Todo
o prisma de solo a ser considerado terá o material com peso específico p (valor acima do
ponto A).

(a) (b)
Figura 2.4 – (a) Representação do prisma de solo e (b) Representação de uma seção transversal,
para o cálculo das tensões

Admitindo-se que a massa de solo está em repouso absoluto, como ilustrado para
uma seção, Figura 2.4 (b), o solo não se desloca pela ocorrência dos esforços nas faces
laterais do prisma de solo (E1=E‟1) e esforços nas faces frontais do prisma
(E2=E‟2) considerado, sendo Pv o peso do prisma de solo e PA reação do solo pela
continuidade abaixo do plano A.
Estando o prisma em equilíbrio, pode-se calcular a tensão “σv” (“σz”) no ponto A:
32
PV
VA
áreabase

Para o valor do peso Pv, podemos utilizar a sua relação com o valor de peso
específico do solo, sendo Pv = volume do prisma de solo x peso específico aparente natural
devido ao peso próprio de todos os materiais existentes acima do ponto, então:

Pv = VP . P sendo VP = comprimento . largura . altura = 1.b.Z = b.Z

PV PV PV b.Z . P
VA
áreabase SA b b
.1 .1
cos i cos i

VA Z .cos i. P

Observe que o valor de tensão independe da seção do prisma (“coluna” de solo),


pois, quanto maior (menor) sua seção, maior (menor) será a área da base. Logo, o
resultado da divisão será sempre constante.

Caputo (2017) ilustra na Figura 2.5 o problema considerando a inclinação do


terreno como ( ) e destaca que a resultante de tensão atuante em um plano pode ser
substituida pelas correspondentes componentes de tensão normal e cisalhante.

Figura 2.5 - Componentes de tensão em superfície inclinada (CAPUTO, 2017)

No caso de terrapleno com superfície superior coincidente com a horizontal, teremos:

Quando a superfície do terreno é horizontal se aceita intuitivamente que a tensão


atuante em num plano horizontal a certa profundidade seja normal a este plano. De fato, as
componentes das forças tangenciais ocorrentes em cada contato tendem a se contrapor,
anulando a resultante. Estas pressões são denominadas pressões virgens ou geostáticas.

De particular interesse, são as tensões nos planos verticais. Nestes também não
ocorrem tensões de cisalhamento, devido à simetria (Figura 2.6). A tensão normal no plano
vertical depende da constituição do solo e do histórico de tensões a que esteve submetido
anteriormente. Normalmente ela e referida à tensão vertical, sendo a relação entre tensão
33
horizontal e tensão vertical denominada “coeficiente de empuxo em repouso”, indicada
pelo símbolo “k0”. Este assunto melhor será abordado neste curso no Capítulo 06 –
Empuxos de Terra.
Então, tem-se: Tensão Vertical V Z. P (nesse caso, i = 0)
Tensão Horizontal h K0 . V

Estado de tensão em Consideração da superfície do Consideração das


qualquer plano passando por solo horizontal (τ = 0) propriedades do solo não
um ponto variando, ou variando pouco,
na horizontal

Figura 2.6 – Estado de tensões em um ponto em massa de solo com superfície horizontal

Gerscovich (2008) resalta que a condição geostática horizontal se caracteriza por:


- superfície do terreno ser horizontal
- camadas estarem alinhadas na horizontal (espessura constante)
- não existirem tensões cisalhantes atuando nos planos vertical e horizontal

Colocando-se em um sistema cartesiano, teremos o diagrama representativo de


todos os valores de tensão vertical (ou horizontal), ao longo da espessura Z, como mostra a
Figura 2.7. Nota-se tratar de uma “função” linear, dependente apenas de Z, já que é
constante para cada solo homogêneo – tipo y = a.x

Figura 2.7 – Diagrama representativo da distribuição de tensões vertical na espessura Z

No caso de uma seqüência de camadas aproximadamente horizontais, de solos


homogêneos diferentes, considerado o terrapleno horizontal, a tensão vertical resulta do
somatório do efeito das diversas camadas (Figura 2.8).
Isto é, a pressão vertical total da camada 1 se transmite integralmente sobre a
camada 2 e na espessura dessa segunda camada haverá o acréscimo de diagrama devido a
pressão gerada nessa espessura.
34
No caso de n camadas de peso específico pi e espessuras Zi, teremos a expressão:

Pi .Z i
1

Figura 2.8 – Exemplo de distribuição de tensões para uma seqüência de camadas de solos

Análise sobre os materiais ocorrentes nas camadas

Para cada camada homogênea, de espessura Z (h) pode-se considerar que ocorrem
partículas sólidas e água, em diversas situações de peso específico, a saber:

1. Só água = lâmina d’água = P = a ( w) - adotado usualmente igual a 10kN/m3;


2. Só partículas = solo seco = p = s - não ocorre na prática, pode ser utilizado
para correlacinar parâmetros;
3. Partículas com todos os vazios cheios de água, S=100%:
3.a. Solo saturado = quando a água dos vazios não está sujeita a ação da
gravidade (partículas envolvidas pela água);
3.b. Solo submerso = quando a água dos vazios está sujeita à ação da gravidade,
assim, as partículas sólidas estão imersas na água, portanto, as partículas estão
sujeitas ao empuxo que atua sobre as mesmas (Figura 2.9).

Figura 2.9 – Esquemas para exemplificação de solo submerso e saturado


35
4 - Partículas com água ocupando parcialmente os vazios - Solo pacialmente
saturado.
O cálculo do peso específico para qualquer uma das situações poderá ser obtido
a partir da relação de outros índices físicos, obtendo-se o peso específico
aparente natural do solo, pela expressão geral deduzida como segue, função do
peso específico do solo seco e da água (γs, γa) da porosidade (n) e do seu grau de
saturação (S).
Pt
= peso específico aparente natural do solo.
Vt
Pt Ps Pa Ps Pa Pa
s
Vt Vt Vt V t Vt
Pa
Pa = a x Va
Va

Substituindo temos: s a Va
Vt
Dividindo por Vv, numerador e denominador, não altera a fração:
Va
V S
s a v s a s Sn a
Vt 1
Vv n
Logo, pode-se escrever: P S S.n a

A Figura 2.10 apresenta um perfil de solo onde se analisa as faixas de ocorrências


de espessuras homogêneas os seus respectivos valores de peso específicos.

Camada 1

Acima da franja capilar até o NT:


PA = S1 + S1.n1. a

Franja capilar: faixa de saturação onde


ocorre a umidade capilar:
PB = S1 + n1. a = sat1

Faixa de submersão (1) onde ocorre o


lençol freático formado com água livre:
PC = S1 + n1. a = sat1 = sub1 + a

Camada 2

Faixa de submersão (2) onde ocorre o


lençol freático formado com água livre:
PD = S2 + n2 . a = sat2 = sub2 + a

Figura 2.10 – Perfil com dois horizontes de solo e diferentes pesos específicos

36
2.3 – Princípio das tensões efetivas

A importância das forças transmitidas através do esqueleto do solo de uma partícula


para outra foi descoberta em 1923 quando Terzaghi apresentou o principio da tensão
efetiva, uma relação intuitiva baseada em dados experimentais. O princípio se aplica
apenas a solos completamente saturados e relaciona as três tensões a seguir:

1. a tensão normal total (σ) em um plano dentro da massa de solo, que é a força por
unidade de área transmitida na direção normal através do plano, imaginando que o solo
seja um material sólido (fase única);
2. a pressão da água nos poros (u), também chamada de poropressão ou pressão neutra,
que é a pressão da água que preenche os espaços vazios entre as partículas sólidas;
3. a tensão normal efetiva (σ‟ ou σ) no plano, representando a tensão transmitida apenas
através do esqueleto do solo.

A relação é: σ = σ‟ + u

Segundo Craig (2012), o princípio pode ser representado pelo seguinte modelo
físico. Considere um „plano‟ XX em um solo completamente saturado que passa apenas
por pontos de contato entre partículas, conforme mostra a Figura 2.11. Na realidade, o
plano ondulado XX não pode ser distinguido de um plano verdadeiro em termos da massa
de solo devido ao tamanho relativamente pequeno das partículas de solo em si. Uma força
normal P aplicada em uma área A pode ser suportada parcialmente pelas forças entre as
partículas e parcialmente pela pressão da água nos poros. As forças entre as partículas são
muito aleatórias, tanto em magnitude como em direção, ao longo de toda a massa de solo,
mas em todo ponto de contato do plano ondulado elas podem ser decompostas em uma
componente normal e uma componente tangencial à direção do plano verdadeiro ao qual
XX se assemelha; as componentes normal e tangencial são N’ e T’, respectivamente.

Figura 2.11 - Interpretação da tensão efetiva (CRAIG, 2012)

Então, a tensão efetiva é interpretada como a soma de todas as componentes N‟


dentro da área A, dividida pela área A, obtendo-se:

A tensão total é dada por:

37
Se for admitido que o contato entre as partículas ocorre em pontos, a pressão da
água nos poros agirá no plano que engloba toda a área A. Então, para o equilíbrio na
direção normal a XX, tem-se:

Ou

Isto é:

A Pressão de água nos poros que age igualmente em todas as direções agirá em toda
a superfície de qualquer partícula, mas admite-se que o volume da partícula não se
modifica; além disso, a pressão da água nos poros não faz com que as partículas sejam
pressionadas umas contra as outras. O erro inserido ao admitir que o contato entre as
partículas ocorre pontualmente é insignificante em solos, uma vez que a área de contato
normalmente significa algo entre 1 e 3% da área da seção transversal A. Deve-se entender
que σ‟ não representa a tensão verdadeira de contato entre duas partículas, que seria uma
tensão aleatória, porém muito mais alta N’/a, onde a é a área total de contato entre as
partículas (CRAIG, 2012).

2.3.1 – Tensão vertical total

Sendo a estrutura formada de um esqueleto de grãos sólidos (estrutural) e vazios


deixados entre as partículas, podemos dizer de forma genérica para a expressão da tensão
vertical total:
= ‟+u

= pressão vertical total devido ao peso próprio dos solos


‟= parcela da pressão total que se desenvolve no esqueleto granular
pressão efetiva ou pressão grão a grão
u = parcela da pressão total que se desenvolve na água ocorrente nos
vazios pressão neutra ou poropressão.
Ocorre quando a água que enche todos os vazios está sob a ação da
gravidade (ocorrência de água livre - solos submersos) ou está sob pressão
externa que pode ser pressão de percolação ou de adensamento.

Considerando-se agora, a situação de todos os vazios estarem cheios de água, mas a


água não está sujeita a ação da gravidade (e nem está submetida às cargas exteriores), a
pressão vertical total devida ao peso próprio dos solos será:
= ‟ nesse caso, u = 0

2.3.2 – Pressão neutra ou poropressão (u)

Como referido, a ocorrência de pressão neutra ocorre basicamente em três situações


distintas, a saber: a) na condição de submersão dos solos, em que a água preenche todos os
vazios do solo e está sob ação da gravidade, b) a água está em movimento, em regime de
percolação ou c) a água está sob ação de pressões exteriores de adensamento.
38
Observe que neste curso, as três situações para a ocorrência de pressão neutra ou
porropressão estão sendo estudadas, como segue:
* na condição de fluxo ou percolação dos solos, no Capítulo 01
* na condição de submersão dos solos (peso próprio), no Capítulo 02
* na condição de pressões exteriores de adensamento dos solos, no Capítulo 03
(assunto a ser abordado)

a) Condição de Submersão (devida ao peso próprio)

Considerando o maciço submerso, a água que se encontra nos vazios está sujeita a
ação da gravidade e por consequência irá desenvolver pressão.

Experiência
O conceito de pressão neutra ou poropressão pode ser compreendido a partir da
verificação do comportamento dessa pressão, realizada em laboratório com o seguinte
ensaio, como ilustrado na Figura 2.12.

Tomemos um recipiente cuja base é ligada a um piezômetro que nos indicará, no


tubo graduado, as alturas piezométricas ou alturas hidrostáticas (cotas dos NAs)
ocorrentes na estrutura durante a experiência de laboratório.
O recipiente tem a parede graduada com condição de medição precisa de H
(espessura da camada de solo permeável) representada por areia pura colocada no fundo
do recipiente e acomodada para medição inicial após se situar o primeiro nível d'água
NA1. Nessa altura H o solo se encontra com o índice de vazios “e”.

NA2 = Segundo nível de água, controlada pelo ladrão


do recipiente, tendo como decorrência uma
nova leitura piezométrica h2.

NA1 = Nível inicial da água. Corresponde à leitura


piezométrica h1, lida no piezômetro.

H = Altura inicial da camada de areia, indicando


uma arrumação inicial das partículas quando o
nível d‟água é NA1.

Figura 2.12 – Ensaio para verificação do comportamento do solo sob “∆u”

A pressão neutra no ponto A (fundo do recipiente) correspondente à situação


inicial de NA1, será: u1 = a x h1
Levantado o nível d'água para cota NA2 com a colocação cuidadosa de água no
recipiente de maneira que não haja a mínima condição de turbulência no fluido, capaz, de
perturbar a arrumação estrutural da areia, a pressão neutra no ponto A correspondente a
essa segunda situação de NA2, será: u2 = a x h2

Houve um aumento da altura da coluna d'água, logo houve um acréscimo no valor


da pressão neutra, a saber: u2 – u1 = u = a . (h2 – h1) u= a. h
39
Constata-se que após esse acréscimo de pressão neutra, H permaneceu constante,
isto é, não há qualquer variação na arrumação estrutural da areia. O índice de vazios
permaneceu o mesmo o que indica que a estrutura não sofreu nenhuma ação mecânica.

A água, sendo um fluido, transmite aos grãos do esqueleto estrutural, pressões em


todas as direções, dando sobre cada partícula uma resultante nula. Daí chamar-se pressão
neutra, ou seja, aquela que não ocasiona deslocamento de grãos.
Essa resultante nula atuando em cada grão considerado separadamente, não terá
como decorrência possível mudança de posição dos grãos, que poderia afetar sua
arrumação, isto é, alterar o seu índice de vazios.

2.3.2.1 – A ação capilar da água – pressão negativa (“sucção”)

Uma das características da água é o fato dela apresentar um comportamento


diferenciado na superfície em contato com o ar, em virtude da orientação das moléculas
que nela se posicionam, ao contrário do que ocorre no interior da massa, onde as moléculas
estão envoltas por outras moléculas de água em todas as direções. Em consequência, a água
apresenta uma tensão superficial, que é associada, por analogia, a uma tensão de
membrana, pois os seus efeitos são semelhantes (PINTO, 2006).
Um bom exemplo deste efeito abordado é o comportamento da água em tubos
capilares. Quando um tubo é colocado em contato com a superfície livre da água, esta sobe
pelo tubo até atingir uma posição de equilíbrio. A subida da água é resultante do contato
vidro-água-ar e da tensão superficial da água (Figura 2.13).

Figura 2.13 – Altura de ascensão e pressão da água em um tubo capilar


(CAPUTO, 2016 e PINTO, 2006)

Para a altura de ascensão da água em um tubo capilar tem-se:

A altura de ascensão capilar é, portanto, inversamente proporcional ao raio do tubo.


A tensão superficial da água, a 20°C, é de 0,073 N/m². Pela equação acima,
conclui-se que, em tubos com 1 mm de diâmetro, a altura de ascensão é de 3 cm. Para 0,1
mm, 30 cm; para 0,01 mm, 3 metros, etc.
Da mesma forma que nos tubos capilares, a água nos vazios do solo, na faixa acima
do lençol freático, mas com ele comunicada, está sob uma pressão abaixo da pressão
atmosférica. A pressão neutra é negativa, referida como efeito ou pressão de “sucção”.
40
b) Condição de Percolação de Água

Como visto no Capítulo 01, para o caso de haver fluxo permanente ou estacionário
da água em solos, há desenvolvimento de pressão neutra, desenvolvida no interior da massa
de solo em função da diferença de carga total entre dois pontos, o que implica em concluir
que há nesta situação gradiente hidráulico (i) diferente de zero, que motiva o fluxo.
Para o cálculo final da pressão neutra (u) torna-se extremamente conveniente o
traçado da rede de fluxo (linhas de fluxo e linhas equipotenciais), com o maior número de
pontos possíveis (cruzamento das linhas), para facilidade de identificação e cálculo dos
valores nos mais diversos pontos de interesse, como ilustrado na Figura 2.14.

Figura 2.14 – Exemplo de rede de fluxo que permite o cálculo da pressão “u”
nos cruzamentos de linhas

c) Condição de Adensamento de Camadas Argilosas

O fluxo transiente da água nos solos, induzido a partir do acréscimo de pressão


neutra (u) no maciço (caso de solos argilosos), proveniente de um carregamento prévio
aplicado sobre esta camada, implicará também na variação de seu índice de vazios –
decréscimo de volume (“recalque”). Neste caso, ocorre o fenômeno do adensamento, que
será estudado no Capítulo 03, deste curso.

2.3.3 – Tensão efetiva ( ’)

A pressão efetiva ou pressão intergranular corresponde à pressão que se desenvolve


no esqueleto estrutural dos solos pelo “contato grão a grão”.

Experiência
O conceito de tensão efetiva pode ser compreendido a partir da verificação do
comportamento dessa pressão, realizada em laboratório com o seguinte ensaio, como
ilustrado na Figura 2.15.

Da mesma maneira que para a pressão neutra, podemos, com o mesmo ensaio,
comprovar o comportamento e efeitos decorrentes de acréscimo de carga sobre a estrutura
de areia.
Tomemos o mesmo recipiente com a camada de areia anterior (H = altura inicial),
mantendo-se “u” constante (portanto NA=constante) com entrada de água
continuadamente, mas sem ocasionar turbulência. Com o sistema garantido, introduzimos
um tubo cheio de esferas de chumbo (chumbo de caça) de maneira que se possa,
acionando um fio de nylon, por um gatilho, fazer depositar na superfície da areia as
esferas que serão sobrecargas diretamente sobre os grãos de areia.
41
NA = Nível de água controlada pelo ladrão
do recipiente, e mantido constante,
tendo como decorrência uma leitura
piezométrica h.

H= Altura inicial da camada de areia,


indicando uma arrumação inicial das
partículas.

H1 = Altura final da camada de areia,


indicando uma modificação da
arrumação inicial das partículas,
mantido constante o nível do NA.

Figura 2.15 – Ensaio para verificação do comportamento do solo sob ∆σ‟

Em síntese fizemos um acréscimo de tensão (proveniente do peso das esferas) - ’


sobre a areia, mantendo u=cte, acréscimo esse sem queda, mas, depositando as esferinhas
de chumbo sobre os grãos de areia.
Após esse acréscimo verificamos que a altura da areia original H cai para H1, o
que comprova a alteração das características mecânicas da camada ou a acomodação dos
grãos de areia – redução do índice de vazios sem a influência da pressão na água.

Sua variação acarreta alterações nas características mecânicas dos solos (Figura
2.16), portanto é a parcela da tensão vertical total que nos interessa para análise do
comportamento dos maciços granulares porosos, estudado na Mecânica dos Solos.

∆H

Figura 2.16 – Deformação no solo como consequência de deslocamento de partículas


(PINTO, 2006)

Determinação da tensão efetiva

Sendo essa uma tensão de “contato grão a grão”, seu cálculo seria efetivado através
do somatório dos pesos de todos os grãos da estrutura dividido pelo somatório de todas as
áreas de contato entre os grãos. Esse cálculo se torna difícil, mesmo por estimativa, já que
o contato intergranular é de difícil avaliação uma vez que depende de vários fatores.
Para resolver o problema, objetivamente, e dentro dos problemas práticos na
Engenharia de Solos, nos basearemos no cálculo da tensão total e no cálculo da pressão
neutra, facilmente calculável, assim, teremos para a tensão efetiva:

‟= -u
42
Assim, para sistematização de seu cálculo sugere-se:
Calculam-se os valores das tensões verticais totais em cada plano (horizonte)
considerado o p, na condição de ocorrência do material “in situ”;
Verifica-se a ocorrência de pressão neutra no enquadramento em um dos três casos
possíveis, ou seja, submersão, percolação e adensamento e de acordo com o caso
calcula-se seu valor;
Calculam-se os valores das da tensão efetiva aplicando-se o conceito: ’ = - u
(princípio das tensões efetivas de Terzaghi);
Traçam-se, sucessivamente, em cada plano, os diagramas correspondentes (total,
efetiva e neutra) a essas cotas.

Observe-se que, para a condição de solo submerso (e consequentemente saturado),


a tensão vertical total a uma profundidade z é igual ao peso de todo material (sólidos +
água) por unidade de área acima daquela profundidade, isto é, a tensão será, como visto:
σv = γsat z
A pressão da água nos poros a qualquer profundidade será hidrostática:
u = γw z
Assim sendo, a tensão efetiva vertical na profundidade z será:
σv’ = σv – u = (γsat – γw) z = γ’ z

Sendo γ’ é o peso específico submerso do solo.

2.3.3.1 – Tensão efetiva sob efeito de água capilar

Para a condição de capilaridade, em que a água ocupa os vazios do solo na faixa


acima do lençol freático, e com ela está comunicada, tem-se uma pressão abaixo da
pressão atmosférica. A pressão neutra é negativa, referida como efeito de “sucção”.

Recordando-se o conceito de tensão efetiva, nota-se que sendo u negativo, a tensão


efetiva é maior do que a tensão total (Figura 2.17). O fenômeno é associado à tensão
superficial, adsorção de água pelas partículas do solo e capilaridade. Enquanto no solo
saturado a tensão superficial provoca pressão positiva na região não saturada (Figura 2.18,
a), a ação da água adsorvida age como uma "cola”, o que resulta em pressão negativa
(Figura 2.18, b) causando o que se denomina de coesão aparente. A pressão neutra negativa
provoca uma maior força nos contatos dos grãos, aumentando a tensão efetiva que reflete
estas forças (PINTO, 2006).

Figura 2.17 – Tensões no subsolo, considerando as tensões capilares (PINTO, 2006)


43
Figura 2.18 – Distribuição da poropressão e tensão efetiva no solo, em função da profundidade
Adaptado de Lambe & Withman (1979) e Gerscovich (2008)

2.3.3.2 – Tensão efetiva sob efeito de percolação

Adicionalmente ao que foi visto no estudo de pressões neutras para a condição de


fluxo, analisa-se as tensões efetivas desenvolvidas em problemas em que há fluxo
ascendente ou descendente em solos, de especial interesse para a área de barragens, como
melhor será abordado na disciplina de “Obras de Terra”.
Para a ação do fluxo ascendente, como ilustrado na Figura 2.19 (a), ou fluxo
descendente, na Figura 2.19 (b), obtem-se os valores para as tensões totais e neutras ao
longo da profundidade, como indicadas.

(a) (b)
Figura 2.19 – Tensões total e neutra em um solo num permeâmetro com fluxo
(a) ascendente e (b) descendente (PINTO, 2006)

A tensão efetiva varia linearmente com a profundidade e pode escrita como segue:

Fluxo Ascendente
Na face inferior (posição de uma peneira) ela vale:

′=( . w + . sat) - ( . w +L. w +h. w)


′= .( sat – w) - h . w
′= .( sat – w) - L . h . w
L
′= . ’-L.i. w
′ = . ( ’ - j)

44
Sendo: ’ Peso específico submerso
w Peso específico da água
i Gradiente hidráulico
j Força de percolação

Fluxo Descendente
Na face inferior (posição de uma peneira) ela vale:

′=( . w + . sat) - ( . w +L. w -h. w)


′= .( sat– w) + h . w
′= .( sat – w) + L . h . w
L
′= . ’+L.i. w
′ = . ( ’ + j)

Como sabido, a tensão efetiva pode ser calculada pelo produto da altura (L) pelo peso
específico submerso ( ‟), como se observa nas expressões obtidas, exceto pelo fato de que:
* deve-se descontar a força de percolação no caso de haver fluxo ascendente - ′ =
. ( ‟ - j), tensão efetiva é aliviada da força de percolação, que tende a arrastar as
partículas do solo para cima, ou,
* deve-se somar a força de percolação no caso de haver fluxo descendente - ′ =
. ( ‟ + j), tensão efetiva aumenta com a percolação.

Gradiente Hidráulico Crítico


Deste estudo, possibilita-se definir o se entende como “Gradiente Hidráulico Crítico”.
Considere para o caso de fluxo ascendente (Figura 2.19, a) que a carga total agora
aumente progressivamente ...
A tensão efetiva ao longo de toda a espessura irá diminuindo até o momento em
que se torne nula. Nesta situação as forças transmitidas de grão para grão são nulas. Os
grãos permanecem na mesma posição, mas não transmitem forças através dos pontos de
contato.
A ação do peso dos grãos se contrapõe à ação de arrastre por atrito da água que
percola para cima (força de percolação). Como a resistência das areias é proporcional à
tensão efetiva, quando esta se anula, a areia perde completamente sua resistência. A areia
fica em um estado como areia movediça – valor da ordem de “1” (PINTO, 2006).
′= .( ′- )
′ = . ( ′ - . w) = 0
′ - . w = 0, então: crit = ′
w

Conclusão a cerca de tensão efetiva ...


“A tensão efetiva é responsável pelo comportamento mecânico do solo, e só
mediante uma análise através de tensões efetivas se consegue estudar cientificamente os
fenômenos de resistência e deformação dos solos”.
O princípio da tensão efetiva é provavelmente o mais importante na Engenharia
Geotécnica. Para fins práticos, solos granulares, siltes e argilas de baixa plasticidade se
aplicam satisfatoriamente. Em geral, é uma ótima aproximação para o problema.
45
2.4 – Variações do nível d'água

Nesse item verificaremos as variações dos valores das pressões verticais devidas ao
peso próprio dos solos quando, por necessidade de construção ou decorrência dos mesmos,
temos que rebaixar ou elevar o nível estático do lençol freático. Por necessidades
construtivas, às vezes, rebaixamos o lençol freático trazendo o NA a uma cota h abaixo
do normal ou, como no caso de reservatórios de água em hidroelétricas, teremos a elevação
da água numa cota muito acima dos níveis normais dos cursos d‟água.
Essas oscilações do NA trarão reflexos acentuados na estrutura, pois, a faixa de
submersão vai variar e, nessa faixa as partículas sólidas têm seus pesos aliviados pelo
empuxo ocorrente em suas condições de imersão. Logo, se seus pesos vão oscilar para
mais ou para menos, sua contribuição para a tensão efetiva também irá variar. Portanto,
comportamento da estrutura como um todo sofrerá transformações.

i - Rebaixamento do lençol freático

A ocorrência de oscilação mais comum é o rebaixamento do NA que poderá se dar


por drenagens (sistema de drenagem por gravidade) como obras definitivas ou por
bombeamento do lençol para casos provisórios no período de construção.

Para melhor ilustração considere um rebaixamento num terreno permeável para


permitir uma escavação de construção de uma galeria de águas pluviais, ou de esgoto ou de
metrô. Como consequência, faz-se necessário saber os reflexos futuros nas fundações dos
prédios já existentes.

Seja o perfil da Figura 2.20 de uma camada permeável, com o NA1 em


determinada cota “ha” em relação ao NT (nível do terreno), sobrejacente ao plano A, que
pode estar sujeito a variações de tensões por conta desta variação de nível da água, a ser
aqui investigada.

Considere que por questão construtiva


temos necessidade, em um determinado
período de obra, de rebaixar NA1 para a
cota NA2.

Pergunta-se: Qual serão as variações das


pressões verticais devidas ao peso próprio
dos solos no plano A, quando o
rebaixamento ocorrer ?

Plano A
Figura 2.20 – Perfil de solo para rebaixamento do nível d‟água

Para melhor facilidade de cálculo indicaremos os valores diretamente no plano A,


sem considerar planos intermediários e sem traçar os diagramas uma vez que o perfil é
muito simples e as fórmulas são autoexplicativas.
46
Para simplificar ainda mais, consideraremos que, ao se efetuar o rebaixamento, na
espessura h a estrutura ficará nas mesmas condições originárias e em nenhuma das
situações haverá formação de franja capilar.

Tensão vertical total


– Para o nível NA1: = P1 . ha + P2 . h
1A
1A = ( S + S.n. a) . ha + ( S + n. a) . h
1A = S.ha + S.n. a. ha + S.h + n. a.h
– Para o nível NA2: 2A = P1 . (ha + h) + P2 . (h – h)
2A = ( S + S.n. a) . (ha + h) + ( S + n. a) . (h – h)
2A = S.ha + S.n. a. ha + S. h + S.n. a. h + S.h + n. a.h –
n. a. h – s. h
– Variação da tensão: A = 2A – 1A
A = + S.n. a. h – n. a. h
A = (S – 1).n. a. h mas, S – 1 = – A (aeração)

A = - A .n . a. h

Pela expressão, temos que a tensão vertical total diminui de um valor igual à
contribuição da pressão devido a água que enchia os vazios na espessura h (e saiu devido
a ocorrência do rebaixamento). Nota-se que restou alguma água nos vazios, como é natural
de ocorrer, correspondente à aeração A (Grau de Aeração) que limita a condição de não ter
escoado toda a água.

Pressão neutra
– Para o nível NA1: u1A = a . h
– Para o nível NA2: u2A = a . (h – h)
u2A = a.h – a. h
– Variação da pressão: uA = u2A – u1A
uA = a.h – a. h – a.h

uA = – a . h

A pressão neutra diminui de um valor correspondente a eliminação da condição de


submersão na faixa h (deixou de ocorrer).

Tensão efetiva
Como temos as variações ocorrentes nas duas parcelas de cálculo dessa tensão,
efetuaremos seu cálculo a partir desses valores, a saber:
‟A = A – uA
‟A = – A.n. A. h + A. h
’A = (1 – A.n) . a . h

A pressão efetiva aumentou de um valor correspondente ao empuxo que deixou de


agir sobre as partículas (aliviando seus pesos na faixa h), transformando-se em sobrecarga
pelo maior peso desses grãos.
47
ii - Levantamento do lençol freático

No caso do NA oscilar em sentido inverso, isto é, de NA2 para NA1, logicamente as


variações terão seus sinais trocados, isto é:

Aumentará a pressão total A= + A.n. a. h


Aumentará a pressão neutra uA = + a. h
Diminuirá a pressão efetiva ’A = – (1 – A.n). a. h

Isso pode ocorrer com a subida do NA na “época das águas” (período de chuvas)
em relação ao seu nível mais baixo no período de seca. Normalmente essa variação, na
natureza, por conta de chuvas, não é expressiva para causar reflexos no seu comportamento
mecânico. Já quando ocorre forçado pela execução de algum tipo de empreendimento ou
obra é expressiva, podendo causar consequências em seu comportamento.

Análise das variações do NA

Nos casos de rebaixamento do lençol freático são esperadas deformações na massa


de solo (“recalques”), para a região de acréscimo de tensão efetiva e para o caso de
levantamento do lençol freático são esperadas rupturas na massa de solo, para a região de
decréscimo de tensão efetiva.

2.5 – Exercícios de Aplicação

1 – Para o perfil de subsolo apresentado na Figura 2.21 (a), pede-se calcular as tensões
totais, pressões neutras ou poropressões e as tensões efetivas, ao longo do perfil. Trace os
diagramas das tensões calculadas.

(a) (b)
Figura 2.21 – Perfil geotécnico de subsolo
48
Resolução:
Cálculo das tensões:
Por se tratar de cálculo de tensões em subsolo, recomenda-se determinar os valores para
todo o perfil, particularmente os seus valores na base de cada horizonte ou camada.

As tensões totais são:


σ1,50 = 17 x 1,50 = 25,5 kN/m²
σ4,50 = 58,5 + 30,0 = 88,5 kN/m²
σ8,10 = 94,5 + 66,0 = 160,5 kN/m²

As pressões neutras são:


u4,50 = 10 x 3,00 = 30,00 kN/m²
u8,10 = 10 x 6,60 = 66,00 kN/m²

As tensões efetivas são (calculadas aqui diretamente, pelo γ’):


σ’1,50 = 17 x 1,50 = 25,5 kN/m²
σ’4,50 = 25,5 + 11 x 3,00 = 58,5 kN/m²
σ’8,10 = 58,5 + 10 x 3,60 = 94,5 kN/m²

Diagramas de tensões:
O diagrama de tensões totais, pressões neutras ou poropressões e as tensões efetivas estão
apresentadas na Figura 2.21 (b).

2 – Calcular as pressões verticais devidas ao peso próprio dos solos (horizontes I, II e III)
para o perfil da Figura 2.22 (as cotas do perfil são referenciadas a um RN).
a) Nas condições atuais;
b) Após uma drenagem permanente que rebaixará a cota do NA até – 4 m e escavação da
argila orgânica e lançamento de um aterro de extensão infinita até a cota + 3 m com
um material de peso específico aparente natural de 1,8 t/m3 (no aterro).

Horizonte I
3
I = 1,3 g/cm

Horizonte II
eII = 0,75
hII = 28 %
II = 2,67

Horizonte III
3
SIII = 1,1 g/cm
hIII = 45%

Figura 2.22 – Perfil de solo


49
Um trabalho inicial diz respeito ao cálculo dos pesos específicos dos solos, nos três
horizontes, uma vez que os seus valores não foram fornecidos diretamente e sim, foram
fornecidos alguns índices físicos (relações entre índices vistos com ênfase em “Solos I”).

Cálculo prévio dos valores de


1) Argila orgânica: I = sat I = 1,3 g/cm3 = 1,3 t/m3
2) Areia fina:
h II . II 0,28.2,67
S II 0,996 99,6% (podemos considerar 100%)
e II 0,75
II = SII + SII.nII. a, sendo:
e II 0,75
n II 0,43
1 e II 1,75
II . a 2,67 .1
SII 1,53
1 eII 1,75
Substituindo os valores chega-se que: II = 1,53+1.0,43.1 = 1,96 t/m3
3) Argila siltosa:

SIII
III
III SIII . 1 h III 1,1. 1 0,45 C = 1,59 t/m3
1 h III

Cálculo das pressões:


a) Nas condições atuais:
– No plano A: A = IA . HI = 1,3 . 4,0 = 5,2 t/m2
uA = a . HI = 4,0 t/m2
‟A = A – uA = 1,2 t/m2
– No plano B: B = A + IIB . HII = 5,2 + 1,96 . 4,0 = 13,04 t/m
2

uB = uA + a . HII = 4,0 + 4,0 = 8,0 t/m2


‟B = B – uB = 13,04 – 8,0 = 5,04 t/m2
– No plano C: C = B + IIIC . HIII = 13,04 + 1,59 . 6,0 = 22,58 t/m
2
2
uC = uB + a . HIII = 8,0 + 6,0 = 14,0 t/m
‟C = C – uC = 22,58 – 14,0 = 8,58 t/m2

Diagramas (t/m2)

50
b) Após a drenagem (rebaixamento do NA até a cota – 4m), remoção da argila e
lançamento do aterro (Figura 2.23):

Admitindo-se a areia fina acima do NA


com S = 80% (consideração pela falta de
informação)

Na faixa de 1,0 m teremos:

S II .eÍI 0,8.0,75
hII 0,225 =22,5%
II 2,67
g e
II S. . a
1 e 1 e

II = 1,53 + 0,8.0,43.1

II = 1,87 t/m3

Figura 2.23 – Perfil de solo com rebaixamento do nível d‟água

– No plano A: A= 6,0 . 1,8 = 10,8 t/m2


uA = 0
‟A = A – uA = 10,8 t/m2
– No plano B: B = 10,8 + 1,87 . 1,0 = 12,67 t/m
2

uB = 0
‟B = 12,67 t/m2
– No plano C: C = B + 1,96 . 3,0 = 18,55 t/m
2

uC = 1,0 . 3,0 = 3,0 t/m2


‟C = 15,55 t/m2
– No plano D: D = C + 1,59 . 6,0 = 28,09 t/m
2

uD = uC + 1,0 . 6,0 = 9,0 t/m2


‟C = 19,09 t/m2

Avaliação de Rebaixamento do Lençol Freático

Calcula-se, a partir do perfil inicial, qual a variação da pressão vertical quando


efetuarmos o rebaixamento inicialmente até a cota – 3m, que possibilite a escavação da
argila orgânica para fazer o aterro. Inicialmente faz-se necessário determinar o γ para a
camada de argila orgânica na condição rebaixada o NA.
Como o problema não dá maiores detalhes, vamos admitir, para o plano A uma
porosidade de 45% e um grau de saturação após o rebaixamento de 80%.
3
I = 1,3 g/cm I = SI + SI.nI. a na condição inicial
3
nI = 0,45 1,3 = SI + 1.0,45.1 SI = 0,85 g/cm

Para a faixa que houve rebaixamento do NA temos:


3 3
II = SI + SII.nI. a = 0,85 + 0,8.0,45.1 II = 1,21 t/m = 1,21 g/cm

51
– Cálculo das pressões para NA1: AI = I . hI = 1,3 . 4,0 = 5,2 t/m2
(já calculadas anteriormente) uAI = a . hI = 1,0 . 4,0 = 4,0
‟AI = 1,2 t/m2
– Cálculo das pressões para NA2: AII = II . hI = 1,21 . 4,0 = 4,84 t/m
2

uAII = 0
‟AII = 4,84 t/m2
– Variação da pressão: ‟ = ‟AII – ‟AI
‟ = 4,84 – 1,2
’ = 3,64 t/m2

Checando as fórmulas anteriormente deduzidas, e aplicando-às diretamente no


cálculo das variações de pressões ocorridas com o rebaixamento do lençol tem-se:

‟A = (1 – A.n). a. h
A = aeração = 1 – S = 1 – 0,8 = 0,2
‟A = (1 – 0,2.0,45).(1,0).(4,0) ’A = 3,64 t/m2

3 – O Terminal Portuário de Sergipe (1992) apresenta um cais de atracação conectado ao


litoral por uma ponte de 2,4 km. O cais é abrigado da ação das ondas por um quebra-mar
de enrocamento (pedras de grande dimenssão), com 800 m de comprimento (Figura 2.24) e
15,3 m de altura, em que este autor participou de sua obra, com a realização de leituras de
piezômetros da sua instrumentação.

Considerando o perfil geotécnico sob o quebra-mar, apresentado na Figura 2.24, pede-se:

a) Determinar as pressões verticais efetivas geostáticas (análise antes da construção do


quebra-mar) ao longo do perfil e traçar o seu respectivo diagrama.
b) Com base na observação da instalação de um piezômetro no topo da camada de areia,
logo abaixo da base da camada de argila, determinar a pressão para esta situação medida
em campo e explicar o que pode justificar este nível de água não coincidir com o do
local (mar).

Figura 2.24 – Imagem de quebra-mar em Porto de Sergipe e perfil geotécnico do local


52
Resolução:
a) Cálculo das tensões σ‟:
Por se tratar de cálculo de tensões em subsolo, recomenda-se determinar os valores para
todo o perfil, particularmente os seus valores na base de cada horizonte ou camada.
Optando por calcular σ‟ por subtração das tensões “σ” e “u”, tem-se:

TENSOES TOTAIS
σA = γ1 . h1 = 10 . 10 = 100 kN/m²
σB = σA + (γ2 . h2) = 100 + (19 . 4) = 176 kN/m²
σC = σB + (γ3 . h3) = 176 + (16,5 . 8) = 308 kN/m²
PRESSÕES NEUTRAS
uA = (γa . h1) = 10 . 10 = 100 kN/m²
uB = uA + (γa . h2) = 100 + (10 . 4) = 140 kN/m²
uC = uB + (γa . h3) = 140 + (10 . 8) = 220 kN/m²
TENSÕES EFETIVAS
σA‟ = σA – uA = 100 – 100 = 0
σB‟ = σB – uB = 176 - 140 = 36 kN/m²
σC‟ = σC – uC = 308 – 220 = 88 kN/m²

Traçado do diagrama de σ‟ ao longo do perfil geotécnico do subsolo

b) Calculo da pressão “u” no topo da camada de areia:


A pressão neutra em ponto de instalação do piezômetro se obtem, a partir da carga
piezométrica estabelecida no piezômetro:
upiez = (γa . hpiez) = 10 . 22,40 = 224 kN/m²

Explicação sobre o nível de água não coincidir com o do local (mar):

Por se tratar de pressão neutra, ocorre por efeito de submersão (coincidência de níveis do
interior e exterior do piezômetro), percolação (fluxo) ou adensamento (gerada por
acréscimo de sobre carga). Neste caso como não há coincidência de níveis e também não
há acréscimo de carga sobre o perfil, o que justifica esta carga hidráulica diz respeito a uma
movimentação de água nesta camada inferior de areia (fluxo de água no solo).
53
2.6 - Tensões devidas a cargas aplicadas

As cargas aplicadas na superfície de um terreno induzem tensões, com


conseqüentes deformações, no interior de uma massa de solo. Embora as relações entre
tensões induzidas e as deformações resultantes sejam essencialmente não lineares, soluções
baseadas na teoria da elasticidade são comumente adotadas em aplicações práticas,
respeitando-se as equações de equilíbrio e compatibilidade.
As tensões produzidas por cargas aplicadas na superfície de um maciço terroso são
calculadas, ou melhor, avaliadas, na hipótese de um “maciço semi-infinito, elástico,
isótropo e homogêneo”; conceitos que, a rigor, podem não ser verificados.
As cargas transmitidas pelas estruturas se propagam para o interior dos maciços e se
distribuem nas diferentes profundidades, como ilustrado na Figura 2.25, podendo se
verificar experimentalmente.

Figura 2.25 – Distribuição de “tensões” de acordo com a profundidade

Denominan-se isóbaras as curvas ou superfícies obtidas ligando-se os pontos de


mesma tensão vertical (Figura 2.26). Este conjunto de superfícies isóbaras forma o que se
chama bulbo de “tensões”, como indicado nas figuras abaixo para uma carga concentrada.

Figura 2.26 – Bulbo de tensões (linhas de igual valor de “tensão”)

54
Aplicação da Teoria da Elasticidade:

Segundo descreve o Prof. Carlos de Souza Pinto (PINTO, 2000), a teoria da


elasticidade tem sido empregada para a estimativa das tensões atuantes no interior da massa
de solo em virtude de carregamentos na superfície, e mesmo no interior do terreno.
“O emprego de Teoria da elasticidade aos solos é questionável, pois o
comportamento dos solos não satisfaz aos requisitos de material elástico, principalmente
no que se refere a reversibilidade das deformações quando as tensões mudam de sentido.
Entretanto, quando ocorrem somente acréscimos de tensão, justifica-se a aplicação da
teoria. Por outro lado, até determinado nível de tensões, existe uma certa proporcionalidade
entre as tensões e as deformações, de forma que se considera um Módulo de Elasticidade
constante como representativo do material. Mas a maior justificativa para a aplicação da
Teoria de Elasticidade é o fato de não de dispor ainda de melhor alternativa e, também,
porque ela tem apresentado uma avaliação satisfatória das tensões atuantes no solo, pelo
que se depreende da análise de comportamento de obras.

São apresentados os valores de acréscimo de carga no subsolo para os principais


tipos de carregamento (carga), segundo diferentes componentes de tensões.

A) Carga concentrada:

Boussinesq (1885) desenvolveu as equações para cálculo dos acréscimos de tensões


efetivas vertical ( z), radial ( r), tangencial ( t) e de cisalhamento ( rz) (outras
componentes de tensões ainda não estudadas), causadas pela aplicação de uma carga
concentrada pontual agindo perpendicularmente na superfície de um terreno (Figura 2.27),
admitindo constante o módulo de elasticidade do maciço. Por isso, as fórmulas não contêm
o valor deste módulo.

p 3z 3 3p
z cos 5 ,
2 (r 2 z 2 )5 2 2 z 2

p (1 2 ) cos 2
r
2
3 sen 2 cos 3 ,
2 z 1 cos
p cos 2
t 2
(1 2 ) cos 3 ,
2 z 1 cos
p
rz 2
3 sen cos 4 ,
2 z

Figura 2.27 – Carga concentrada aplicada na superfície do terreno: Solução de Boussinesq

3p
Pela fórmula: z 2
cos5 , verifica-se que em cada plano horizontal (Figura
2 z
2.28) há uma distribuição simétrica em forma de sino, com a pressão máxima sob a carga, a
qual decresce com o quadrado da distância do plano considerado à superficie de aplicação
da carga.
55
Figura 2.28 – Distribuição simétrica em forma de sino devido à carga concentrada

B) Carga distribuída ao longo de uma linha:

A tensão vertical induzida z no ponto (A), por uma carga uniformemente


distribuída p ao longo de uma linha na superfície de um semi-espaço foram obtidas por
Melan (Figura 2.29), adotado uma referência, e é dada pela fórmula:

2p
Z . cos 4
.z

Figura 2.29 – Carga distribuída ao longo de uma linha: Solução de Melan

C) Carga uniformemente distribuída numa faixa:

Em se tratando de uma placa retangular em que uma das dimensões é muito maior
que a outra, como por exemplo, no caso de sapatas corridas, os esforços introduzidos na
massa de solo podem ser calculados por meio da formula desenvolvida por Terzaghi e
Carothers. A Figura 2.30 apresenta o esquema de carregamento e o ponto onde se está
calculando o acréscimo de tensão. As tensões num ponto (M) situado a uma profudidade
(Z), com o ângulo em radianos, são dadas pelas fórmulas abaixo.

p
z 2 sen 2 cos 2
p
x 2 sen 2 cos 2
p
xz sen 2 sen 2

Figura 2.30 – Placa retangular de comprimento infinito: Solução de Terzaghi e Carothers


56
Como observado foram informadas outras componentes de tensões (ainda não
estudadas). As tensões principais e a máxima de cisalhamento (a serem estudadas no
Capítulo 04) são dadas por:

p p p
1 .2 sen2 , 3 .2 sen2 e máx .sen 2

A Figura 2.31 apresenta no mesmo gráfico as curvas de igual tensão normal


(tensões verticais) e tangencial (particularmente a cisalhante máxima) segundo Jürgenson,
abaixo de um carregamento retangular.

Figura 2.31 – Curvas de igual tensão normal e tangencial: Solução de Jürgenson

D) Carga distribuída sobre uma placa circular:

Para uma superfície flexível e circular de raio R, carregada uniformemente com


tensão p, o valor da tensão vertical z, abaixo do centro (Figura 2.32) é dado pela fórmula
de Love.

1
Z p. 1 3
2 2
r
1
z

Figura 2.32 – Carregamento circular: Solução de Love


57
Para o cálculo do acréscimo de carga no subsolo, para qualquer posição que se
queira, podemos obter para a área carregada uniformemente com tensão p, o valor da
tensão vertical z fornecida pelo gráfico da figura 2.33.

Figura 2.33 – Bulbo de tensões para o carregamento circular

A figura 2. 34 ilustra, como exemplo, o aspecto da distribuição da intensidade das


tensões verticais que ocorrem no subsolo de um terreno (mostrada a meia seção),
considerando a aplicação na superfície de um carregamento externo de 100kPa.
Neste exemplo ilustrativo foi usado um software de análise de tensões, a partir da
teoria da elasticidade, desenvolvido aplicando a técnica numérica do “Método dos
Elementos Finitos” (M. E. F.). Na análise foram considerados a profundidade de 20,0m e o
afastamento do eixo central da carga circular (com 6,0m de diâmetro) em 12,0m.
Observa-se que os maiores valores ocorrem nas proximidades do carregamento,
região com maiores deformações. Nesta região, devido o nível elevado de tensões, poderá
desenvolver tensões cisalhantes elevadas, podendo levar à ruptura do solo, dependendo da
resistência ao cisalhamento do solo, como será visto nos Capítulos 04 e 05 deste curso.
3m Footing
100 kPa

20

18

16 35
42
28
14
Elevation (metres)

14 21

12

10
7

0
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30
Figura 2. 34 - Aspecto da distribuição das tensões verticais, sob carregamento circular
58
A Figura 2.35 ilustra, em perspectiva, um bulbo de tensões para o carregamento
quadrado, que se aproxima da solução apresentada para o circular. Na figura está destacado
em inglês, “Stress bulb” – bulbo de tensões e “Influence depth (ID)=2B” – profundidade de
influência (ID)=2B, que corresponde aproximadamente a profundidade em que o
acréscimo de tensões corresponde a 10% da tensão na superfice de aplicação.

Figura 2.35 - Bulbo de tensões para o carregamento quadrado, que se aproxima do circular

E) Carga triangular:

Para o caso de um carregamento triangular sobre uma faixa alongada, o bulbo de


tensões, segundo Jürgenson, é o indicado na Figura 3.36, o qual é de grande utilidade na
avaliação dos recalques de um aterro.

Figura 2.36 – Bulbo de tensões para o carregamento triangular: Solução de Jürgenson

Sobreposição de Efeitos (peso próprio e cargas aplicadas):

Em termos de diagrama final de tensões verticais totais, tem-se a sobreposição dos


efeitos (soma) das tensões (c), devidas ao peso próprio dos solos (a) e devidas ao
carregamento aplicado (b), como pode ser visto o seu aspecto na figura 2.37 (considerado
o carregamento da figura anterior, ao londo do eixo z, em uma única camada).
59
Figura 2.37 - Sobreposição dos efeitos (c) das tensões de peso própio (a) e
carregamento externo (b)

Como leitura complementar, apresentam-se algumas considerações a respeito de


tensão efetiva de solos não saturados, assunto de maior complexidade, não comumente
estudado em cursos de graduação.

2.7 – Solos não saturados

No estudo dos solos saturados apenas uma variável, denominada por tensão normal
efetiva (σ‟) (Terzaghi, 1936), é suficiente para definir o estado de tensão e descrever o
omportamento mecânico dos mesmos. O princípio das tensões efetivas para solos na
condição saturada foi discutido e confirmado por diversos autores. Sua equação (σ = σ' +
uw) mostra a relação entre as tensões atuantes no solo e a variável do estado de tensão para
solos saturados.

Porém, quando se analisa o solo em seu estado não saturado, tal princípio torna-se
inválido, principalmente pelo aparecimento de uma pressão negativa nos poros do solo,
denominada sucção. A não saturação faz com que o estado de tensões seja diferente,
devendo, então, ser considerada a influência de outras variáveis no comportamento dos
solos não saturados (Fredlund e Morgenstern, 1977).

A fim de ampliar o uso do conceito de tensão efetiva para a condição não saturada
dos solos, diversos pesquisadores apresentaram diferentes expressões na busca de uma
solução única. Uma das equações propostas, para exemplificar, é a de Bishop (1959):

Onde:
ua = pressão de ar
χ = parâmetro relacionado com o grau de saturação
Para solos saturados χ = 1 e, para solos secos, χ = 0

60

Você também pode gostar