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do poeta. À primeira vista, deve-se considerar o fato de que a carta consiste em uma resposta
a questionamentos do olhar pretensioso do crítico literário que primeiro escrevera a Fernando
Pessoa. Adolfo Casais Monteiro questiona primeiramente sobre uma possível ambição de
publicação de novas obras do poeta; a segunda, quanto à gênese de seus heterônimos; a
terceira, quanto ao ocultismo oblíquo à poesia pessoana.
O poeta deixa nítido que a origem de seus heterônimos é definida como uma tendência à
simulação. Ao criar Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos cria, na verdade, uma
espécie de encontro entre realidades completas e singulares. O poeta realiza uma
personalização absoluta dos heterônimos literários, uma vez que eles são descritos
minuciosamente até mesmo em suas histórias pessoais .
A ironia no texto não se apresenta somente como figura de linguagem, mas faz parte da
visão de mundo do poeta. Ele ironiza com a possibilidade de ganhar o prêmio Nobel de
uma obra ainda não publicada.
Na carta, Pessoa formula uma espécie de exórdio, no qual apresenta a primeira
caracterização de sua imagem autoral: pede desculpas ao destinatário e evoca a
precariedade do meio sobre o qual a escrita irá se desenvolver. Para entender a
caracterização do sujeito projetado, ou seja, a imagem que faz de si no discurso, é
necessário que se recorra ao conceito de ethos. Segundo a concepção aristotélica, o
ethos é a imagem que o orador projeta de si mesmo no discurso, e que desempenha
importante papel na persuasão 1.
1Aristóteles, Retórica, trad. Manuel Alexandre Junior, Paulo Farmnhouse Alberto e Abel do Nascimento Pena,
Lisboa, Impressa Nacional – Casa da Moeda, 2006, p. 49.