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FRONTEIRAS DA JUSTIÇA
"
DEFICIENCIA, NACIONALIDADE,
' I
PERTENCIMENTO A ESPECIE
Esta obra foi publicada originalmente em ingl~s com o tftulo
FRONTIERS OF JUSTICE
por Harvard University Press
Copyright© 2006 by the President and Fellows of Harvard College
Publicado por acordo com Harvard University Press
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por escrito do Editor.
Copyright © 2013 , Editora WMF Martins Fontes Ltda.,
São Paulo, para a presente edição.
1! edição 2013
2! tiragem 2020
CDD-320.11
13-05665
*. Nesta ediç~o nã~ co~~ta o ín~ice remissivo que faz parte da edição ori .nal: Fron-
tters of Justice: D,sab1!11y, Nat,onality, Species Membership Cambrid 8'. H d
Umvers,ty Press, 2006. ' ge. arvar
, Trad. bras.: São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009.
XVIII. FRONTEIRAS DA JUSTIÇA
tência ou cuidado; 2. saúde física: ser capaz de ter uma boa saúde,
inclusive saúde reprodutiva; alimentar-se adequadamente; ter
proteção adequada; 3. integridade física: não ser vítima de violên-
cia, poder circular livremente pelos lugares, ter oportunidade de
satisfação sexual e liberdade de escolha em assuntos reproduti-
vos; 4. sentidos, imaginação e pensamento: ser capaz de usar os
sentidos, imaginar, pensar e raciocinar - e de fazer essas coisas de
uma maneira "verdadeiramente humana': uma maneira informa-
da ,e c_ultivada por uma educação adequada; ser capaz de usar a
propnaNmente de modo protegido pelas garantias de liberdade de
expressao com relação t t d.
e liberdad d , . an o a iscurso artístico quanto político,
e e exerc1c10 religioso· 5 ..
quem nos am ' · emoçoes: ser capaz de amar
a e se preocupa con . ..
volvimento emocio 1 . . . osco, nao ter o próprio desen-
, na preJudicado p .
angustia; 6. razão pr, t. or sentimentos de medo e
b a Ica: ser capaz de ti
em para si mesmo e de .t1 . ormar uma concepção de
to d , . re .ettr criticame t b
apropria vida; 7. afilia ã . n e so re o planejamen-
ç o. a. ser capaz d .
· e viver com outros e
APRESENTAÇÃO À EDIÇÃO BRASILEI RA • XXI
propriedade.
Seu descolamento de um eixo de preocupação exclusivamen-
te relacionado à filosofia antiga e sua aproximação maior. de te-
máticas da filosofia política fez que Nussbaum se sentisse obriga-
da, na redação do prefácio à segunda edição do A fragilidade, a
redimensionar sua posição com relação à ética aristotélica e ao
papel das emoções para a ética. Aristóteles acreditava que a polí-
tica deveria incentivar o funcionamento das capacidades de acor-
do com uma concepção abrangente do que seria uma vida huma-
na boa. Nussbaum, entretanto, defende que a política deve se
restringir a promover as capacidades, e não o seu funcionamento,
pois cabe a cada qual optar pelo emprego ou não de suas capaci-
dades. Além disso, a política não deveria adotar uma concepção
abrangente de boa vida, pois isso afetaria a diversidade e plurali-
dade de concepções religiosas e afins. Como afirma, o seu aristo-
telismo seria uma forma de "liberalismo político': Confessa que o
seu aristotelismo foi sendo influenciado cada vez mais pelas
ideias de John Rawls e de Immanuel Kant. Um dos pontos princi-
pais do A fragilidade havia sido mostrar o papel importante que
as emoções possuem em nos informar sobre a relevância ética de
certos assuntos e situações. Seguindo Aristóteles, Nussbaum
mostra nesse livro o papel cognitivo das emoções, mas diz pouco
sobre o que são as emoções. Em suas pesquisas subsequentes,
como relata no prefácio, a investigação das emoções ocupou um
papel central. O estudo das escolas helenistas e do estoicismo an,
XXll • FRONTEIRAS DA JUSTIÇA
dos instintos, ele pode ter controle sobre sua própria vida. Mas
um ser humano faminto, por exemplo, não pode usufruir do pra-
zer da alimentação, assim como um ser humano doente tem afe-
tado o seu bem-estar, e um ser humano agredido conStantemente
perde o senso de autorrespeito. De maneira geral, cada uma das
capacidades possui características tanto físicas quanto psicológi-
cas. Ter uma dessas capacidades e não querer usá-la é diferente de
não tê-las simplesmente porque alguém não vê você como um in-
divíduo autônomo, mas sim como alguém destinado a ser um
meio para a sua própria satisfação.
Outra característica do feminismo liberal proposto por Nuss-
baum é o internacionalismo. Apoiando-se na sua longa experiên-
cia com os coletivos de mulheres na fndia, e seu estudo in loco da
situação das mulheres nesse país, Nussbaum convoca as feminis-
tas norte-americanas a saírem de seu universo exclusivamente
pequeno-burguês de preocupações e incluírem em suas agendas
de discussão a análise dos problemas de mulheres de outras partes
do mundo, tais como as mulheres na fndia que enfrentam proble-
mas como casamento infantil, dote, proibição de trabalho, iletra-
mento etc. Nussbaum alerta para o fato de que alguns desses pro-
blemas possam inclusive ser problemas de mulheres socialmente
desfavorecidas dentro dos Estados Unidos. No bojo dessa posição
também está a crítica ao feminismo multiculturalista, defensor da
incomensurabilidade entre culturas. Segundo ele, não seria possí-
vel exigir um compromisso das mulheres de sociedades tradicio-
nais com as mesmas reivindicações das mulheres de países não
tradicionais. Contra essa visão, Nussbaum afirma que as socie-
dades e suas tradições não são estáticas, mas sim dinâmicas, ou
seja, haveria sim nelas espaço para discussão e alteração de tradi-
ções opressivas. A lista das capacidades vale da mesma forma que
os direitos humanos para todos os seres humanos. Nussbawn de-
fende aqui um universalismo historicamente construído.
APRBSBNTAÇÃO À EDIÇÃO BRASILBIRA , XXVII
2. Fronteiras da justiça
As primeiras teorias ocidentais sobre a justiça política e social
em um Estado de Direito fizeram uso da metáfora de um estado
de natureza fictício para ilustrar uma igualdade e liberdade natu-
ral pré-política, não convencional, entre os homens. Essa foi a es-
tratégia encontrada entre os teóricos modernos do século XVII
para refutar as bases desiguais da justiça entre os homens das mo-
narquias absolutistas europeias. O indivíduo aceitaria abrir mão
de sua liberdade total no estado de natureza, apenas na medida
em que lhe parecesse que a vida em uma comunidade civil, de di-
reito, lhe fosse mais vantajosa. Assim, a legitimidade da autoridade
política do governante supremo emanaria diretamente do povo.
Este outorgaria ao governante a autoridade para legislar em prol
do bem público. A ação de outorgar autoridade ao governante e
consentir em participar de uma comunidade civil é descrita como
um pacto ou contrato social. Ao optar por participar da comuni-
dade, o indivíduo livre torna-se cidadão de um Estado nacional e
passa a usufruir tanto dos seus benefícios, como proteção e segu-
rança de sua propriedade e de sua vida, quanto do seu ônus, como
a submissão às regras comuns. No cômputo geral, seria mais van-
tajoso para o indivíduo participar da comunidade do que ficar
fora dela, já que a submissão a uma autoridade geral garantiria o
princípio do respeito e reciprocidade entre os homens. Por outro
lado, o poder do governante não seria irrevogável. Caso descui-
dasse do bem comum ou ameaçasse o direito fundamental à pre-
servação da vida, haveria uma cláusula no contrato que autoriza-
ria sua destituição do poder. A legitimidade da justiça política e
do poder do governante dependeria sempre do cumprimento da
obrigação geral de preservação da vida e proteção dos interesses
comuns.
XXVIII' FRONTBIR.AS DA JUSTIÇA
REFEtiNCIAS: