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UNIVERSIDADE VALE DO ACARAÚ - UVA

Disciplina: Empreendedorismo
Professora: Socorro Braun
Data: Agosto/2002

Texto: A ERA DOS CONSUMIDORES


Jonas Ridderstrale

Bem-vindo ao estranho e selvagem mundo tecnológico

“O planeta está em transformação. Quem vende já não controla. O poder está nas
mãos do consumidor. Em “Creating the Future”*, “Jonas Ridderstrale” apresenta uma nova
visão do mundo. Ficam aqui alguns excertos do primeiro capítulo do mais recente livro em
que participa.

As mudanças na tecnologia, conceitos e valores estão a levar à formação de uma


estranha e selvagem economia. Nos tops, bem que o Ronan Keating pode cantar que a vida
é uma montanha russa (“life is a roller coaster...”), mas para alguns capitalistas de risco e
empreendedores envolvidos em negócios relacionados com a Internet esta metáfora
transformou-se numa realidade assustadora. É certo que as novas tecnologias de informação
podem ser uma boa oportunidade de negócio. No entanto, sob o nosso ponto de vista, estas
(a Net em particular) podem tornar-se no maior impedimento à obtenção de lucros. As atuais
tendências para a digitalização, globalização e desregularização estão a afetar grandemente
o equilíbrio de poder entre compradores e vendedores assim como entre investidores de
capital e trabalhadores. Num meio em que quem controla são os compradores bem como os
próprios funcionários, torna-se cada vez mais difícil para as firmas obter lucros. Assim,
quanto mais a empresa for fundamentada na Internet e quanto mais dependente estiver do
conhecimento e talento dos responsáveis, mais escassas serão as hipótese de os
investidores puramente financeiros arrecadarem grandes dividendos. Sugerimos então que
as empresas bem sucedidas tentem atrair cada vez mais o poder dos consumidores, por um
lado, assim como reduzir o dos funcionários responsáveis, por outro.
Clientes ao poder

Durante o último século, a combinação do desenvolvimento de uma rede de


transportes cada vez mais eficiente, a desregularização dos mercados e a crescente
digitalização levaram à formação de uma economia de mercado progressivamente mais
global. Por exemplo, durante 1980 e 1996 os custos de transporte no Oceano Pacífico para
uma determinada mercadoria com uma tonelada de peso diminuíram em cerca de 70 por
cento. Também os custos das comunicações baixaram significativamente. Em 1930, uma
chamada de três minutos de Nova York para Londres custava aproximadamente 250 dólares
(cerca de 223 euros). Trinta anos mais tarde, o custo da mesma chamada baixou para 50
dólares (cerca de 45 euros).

Agora, aproximamo-nos, cada vez mais, do custo zero. Enviar um documento de 40


páginas por fax de Los Angeles para Washington custa aproximadamente nove dólares
(cerca de oito euros). Por uma companhia de transporte urgente (Fedex, por exemplo) fica
em 16 dólares (cerca de 14 euros). Por correio são três dólares (cerca de três euros). E por
email custa 0,09 dólares (cerca de 0,08euros).

Um número crescente de pessoas em todo o mundo tem acesso a cada vez mais
informação. Como conseqüência, a comunidade empresarial, as suas organizações e líderes
estão a tornar-se cada vez mais transparentes.

E o que é que as pessoas fazem com toda a informação a que têm acesso? Pensem
nas crianças. Conforme elas vão crescendo e aprendendo começam a questionar as regras
impostas. Os adultos fazem exatamente o mesmo. Como clientes e como funcionários.
Atualmente, as pessoas com acesso a informação relevante estão a começar a desafiar
qualquer tipo de autoridade (que há pouco tempo era baseada no monopólio de informação
específica). Assim como as crianças desafiam os pais, os cidadãos desafiam os políticos e
os trabalhadores desafiam os patrões. No entanto, há que ter em atenção o reverso da
medalha de toda esta “transparência”. É que também nós nos estamos a tornar cada vez
mais “transparentes”. Cada vez que surfamos na Net, usamos o nosso cartão de crédito ou
fazemos uma chamada telefônica estamos a deixar um rasto. Rasto esse que se mantém por
muito tempo.
As leis e a ordem do “Novo Mundo”

Para entender este novo sistema, é necessário combinar as duas leis que levaram a
tal desenvolvimento. Em primeiro lugar, temos a Lei de Moore. Esta consiste numa previsão
do fundador da Intel, Gordon Moore, que afirma que em cada 18 meses a densidade dos
chips existentes (assim como o poder dos computadores) se deveria duplicar, enquanto que
os custos se manteriam inalteráveis. Depois, temos a Lei de Metcalfe. Segundo Robert
Metcalfe, fundador da 3Com Corporation, as vantagens de pertencer a uma rede de trabalho
eletrônico aumentam proporcionalmente ao número de utilizadores.

Como resultado, as alterações causadas pelas novas tecnologias de informação


aconteceram não só devido à nova relação custos-performance, mas também devido ao
poder dos elementos das redes de trabalho que se têm mostrado capazes de proporcionar
um aumento dos lucros. Assim, o número (e o poder) de pessoas ativas nestas redes de
trabalho tem vindo a aumentar inimaginavelmente.

Estudos mostram que em Janeiro de 2001 cerca de 170 milhões de pessoas surfavam
na Net. Em 1999 havia mais de 470 milhões de utilizadores de telemóveis, mais 50 por cento
do que no ano anterior. Todos estes dados podem ser muito interessantes, mas para
entendermos o seu impacto no mundo dos negócios é necessário conhecer a terceira lei: a
Lei de Coase. Em 1937, um advogado tornado economista, Ronald Coase, escreveu um
artigo muito influente – “The Nature of the Firm” – que mais tarde lhe valeria o prêmio Nobel.
O principal argumento de Coase é que as empresas devem superar os mercados em termos
de minimização de custos das transações. Estes custos são geralmente causados por falta
de informação ou pelo fato de a mesma estar mal distribuída. Quando a informação é
escassa, as altas hierarquias tendem a dominar os mercados. Mas a Internet proporciona
custos de transação nulos. Assim, na era da informação gerada pelos efeitos combinados
das Leis de Moore e de Metcalfe, o mercado tem vindo a derrubar as hierarquias. O mercado
vive de informação.

Mercadomania

Atualmente, vemos cada vez mais mercados para um número crescente de produtos,
abrangendo uma área geográfica cada vez maior. Na viragem do século XX apenas cerca de
10 a 15 por cento da população mundial vivia num sistema de mercado único. Na década de
70 cerca de 40 por cento dos indivíduos viviam sob tal sistema. Os mercados de hoje em dia
não estão de modo nenhum restringidos por limitações geográficas. Sites de Internet, como
por exemplo o yet2.com, já permitem às empresas comprar e vender propriedade intelectual.
Mas ainda nem todas as áreas de mercado estão globalizadas. Por exemplo, apenas 1,5 por
cento dos trabalhadores exerce a sua profissão fora da sua terra natal. Na União Européia o
valor representa dois por cento. Podemos assim concluir que o capital ainda circula mais
livremente do que as pessoas. A um nível mais prático, verificamos que a crescente
mercantilização teve pelo menos três diferentes conseqüências facilmente identificáveis.

Em primeiro lugar, vejamos que à medida que vão surgindo mais mercados para cada
vez mais produtos, as dificuldades na obtenção de capital e pessoas qualificadas, que
anteriormente eram vistas como barreiras intransponíveis, tornam-se agora pequenos
obstáculos facilmente ultrapassáveis. Se a este dado juntarmos a crescente globalização,
verificamos que o número de competidores no mercado é cada vez maior. O resultado é que,
por norma, no mundo (pós)-industrializado a oferta é superior à procura. O excesso de
produção é regra em muitas áreas: 40 por cento nos automóveis, 100 por cento em produtos
químicos, 50 por cento em aço e 140 por cento em computadores.

Em segundo lugar, há que constatar que apesar de haver cada vez mais produtos e
serviços disponíveis nesta economia de excessos, maior quantidade não significa mais
variedade. Pelo contrário, os bens e serviços estão cada vez mais similares. Por vezes, seria
necessário quase que analisá-los à lupa para nos apercebermos das diferenças. Estamos
numa era de abundância em que os produtos são cada vez mais idênticos. O mercado está
cada vez mais homogêneo. Em terceiro lugar, podemos afirmar que estamos numa era de
comodidade. Num mundo incrivelmente transparente, os custos para encontrar um bom
negócio estão a descer dramaticamente. A Internet permite-nos visualizar os mercados do
mundo inteiro. Armados com motores de busca, os consumidores já não estão limitados às
ofertas especiais da sua rua. A CompareNet, por exemplo, oferece informação detalhada
sobre mais de 100 000 produtos. O fluxo cada vez mais livre de informação torna a pesquisa
para compras numa simples brincadeira.

Combinando todos estes fatores: crescente mercantilização + homogeneidade dos


produtos + capacidade de produção em expansão + informação a custos muito baixos =
competição perfeita. Perante tais condições, as empresas arriscam-se a ter que vender a
sua produção aos preços que lhes são impostos. Os lucros serão marginais, mas também os
custos serão cada vez mais baixos. Estão reunidos todos os requisitos para que o poder seja
transferido daqueles que vendem para aqueles que compram. O novo consumidor é um
autêntico ditador.

No entanto, há alguns fatores que podem travar este desenvolvimento. Em primeiro


lugar, as pessoas têm que começar a comportar-se de modo mais racional, como o “homo
economicus” tão familiar aos economistas. Em segundo, uma maior percentagem de
consumidores terá que ter acesso à Internet para se tornar alfabetizada informaticamente.
Em terceiro, os compradores precisam de estar conscientes do poder que detêm. Em último
lugar, precisam de ter os recursos financeiros necessários para entrar no jogo. Com o
crescente desequilíbrio na distribuição desses mesmos recursos, este último ponto não é de
negligenciar. Assim, a longo prazo, a nossa previsão é que o cliente humilde, desinformado e
fiel que chegava a ser mal tratado pelas empresas, num mundo em que a procura excedia
largamente a oferta, irá com certeza desaparecer”.

Faça uma análise e identifique quais as CCE’s que você encontra no texto.

Bibliografia
Idéias & Negócios, 2001
“Creating de Future - an exploration of “The New Economy”, inclui um capítulo de Jonas Ridderstrale. Uma obra editada
por Ingalill Holmberg, Miriam Salzer-Morling e Lars Stannegard. Edição da BookHousePublishing.
Tradução Vera Ribeiro

Jonas Ridderstrale tem 35 anos e é já um dos mais conceituados gurus económicos da Europa. Professor assistente no
Centre for Advanced Studies in Leadership, da Stockholm School of Economics, possui um doutoramento e um MBA dessa
mesma escola. É co-autor do livro “Funky Business”, traduzido para mais de 25 línguas.

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