Você está na página 1de 13

REFLEXÕES SOBRE AMBIENTE INFORMATIZADO E CURRÍCULO

Deise Juliana Francisco, Universidade Federal de Alagoas

As tecnologias relacionam-se com a sociedade e com seus modos de existência


(LÉVY, 1999). Em diferentes sociedades convivem tecnologias de várias épocas,
convivem a memória, a escrita, a comunicação via e-mail Da mesma forma, na escola,
convivem diferentes tecnologias (orais, escritas, informáticas) com agentes (estudantes,
docentes, pesquisadores/as, funcionários/as, comunidade, e outros) e culturas (escrita,
oral, informática, popular, escolarizada, etc.). Elas se articulam com o sistema
cognitivo, adentram e engendram modos de conhecer, modos de ser, de conviver em um
determinado contexto.
Na história da educação, as tecnologias são presença constante, desde o uso da
linguagem, do quadro, giz, rádio, televisão, computador e internet. Com relação aos
computadores, sua incorporação no cotidiano escolar e seu uso pedagógico tornou-se
mais recorrente a partir a década de 1980, como efeito de políticas públicas no campo
da informática na educação. Tal ocorrência se deu, por um lado, pelo desenvolvimento
das tecnologias informáticas (custos mais baixos e tamanho reduzido das máquinas) e,
por outro, pelo incentivo governamental na busca de responder às “demandas
socioprodutivas” da sociedade e a “modernização” das escolas (AREA, 2006).
No Brasil, houve diversos projetos de implantação do uso de informática na
educação, tais como EDUCOM, EUREKA, GÊNESE, PROINFO. Moraes (2002)
realiza uma análise de tais projetos e chega à conclusão de que, apesar das iniciativas,
há falta de integração das tecnologias ao currículo e à gestão democrática:

Apesar de apresentarem microcomputadores de capacidade técnica arcaica


à realidade atual, o grande problema evidenciado em pesquisas nesses
ambientes é a desarticulação no uso dessas tecnologias (ARAÚJO &
MORAES, 2006, 2007; MOREIRA & MORAES, 2007). Apesar de ser
atribuição dos NTE atender à capacitação dos técnicos, treinamento de
professores e manutenção dos equipamentos, o que se observou foi um
distanciamento desses núcleos até os laboratórios – resultando em
sucateamento precoce de equipamentos, uso inapropriado da ferramenta e
processos de ensino-aprendizagem desprovidos de integração com
currículo e se resumindo ao entendimento do professor sobre o uso da
tecnologia (ARAÚJO e MORAIS, s/d, p. 10).
Assim, na perspectiva de gestão democrática e de articulação entre tecnologias
digitais e o currículo vivenciamos um período incipente. Isso porque a inserção da
informática educativa em escolas tem sido efetivada através de estratégias de promoção
de reformulações do ensino, de seus métodos e objetivos, mas sem impacto sobre as
formas de gestão escolares. Este fenômeno parece ser recorrente no campo educacional
não só no Brasil, mas no mundo (AREA, 2006; SACRISTÁN, 1986).
Sacristán discute que a perspectiva neoliberal está subjacente a algumas destas
“inovações”, trazendo uma concepção de individualidade e a impossibilidade de se
organizarem projetos amplos de reformas educacionais. Neste sentido, a subsistência de
tais programas deve-se à carência de análise das condições das escolas, do ensino, dos
docentes, da cultura, dentre outras questões, por não contemplarem no planejamento
questões do cotidiano escolar. Isso porque a proposição de tais projetos é reiteradamente
utilizada como uma possível resolução para o ensino devido ao fracasso de planos
anteriores em atingir as metas preconizadas.
Na década de 1990, a implantação de núcleos de informática se dava de forma
isolada na escola, sem articulação com o planejamento mais amplo (GIRAFFA, 1991).
Com processos de implantação de informática educativa autoritários, discussões
segmentarizadas - nas quais a escola como um todo não foi envolvida nas discussões
preliminares (OLIVEIRA, 1997), houve dificuldades na integração do projeto ao
currículo escolar, aliado à precária participação do poder público na manutenção do
projeto de informática nas escolas.
Assim, as tecnologias devem ser integradas no cotidiano escolar permitindo a
gestão do processo pela própria escola, de forma significativa (PRATA, 2002). Se o
processo for vertical, “de cima para baixo” - sem envolvimento dos atores educacionais
(gestores, professores, funcionários, pais, alunos) -, ou se adotar uma visão de
tecnologia como redentora dos problemas escolares, poderá seguir o caminho de várias
reformas – fracasso.
O currículo é aqui entendido enquanto uma construção social que organiza as
práticas educativas em instituições de ensino (SACRISTÁN, 2000), não é apenas a
grade ou a listagem de conteúdos a serem ministrados em determinada disciplina. Ele
articula formas de trabalhar e de ensinar, aproximando-se ou afastando-se de certas
práticas e espaços nos quais as mesmas são atualizadas, como ambiente informatizado,
biblioteca, etc.
A proposta de uso das tecnologias digitais na escola ancora-se na educação
cidadã e em pressupostos pedagógicos que visam o uso das tecnologias para educar e
não reproduzir modelos de escola transmissora de informações apenas. Portanto, no
encontro da escola com as tecnologias digitais, aposta-se no tensionamento de
currículos estruturados como grades que prendem os conteúdos. Não porque a
tecnologia teria “em si” esta propriedade, mas sim porque seu uso articula-se com
propostas educacionais inovadoras.Nesta mesma perspectiva, a articulação das
tecnologias com a gestão escolar é fundamental.
O presente artigo é um extrato de uma pesquisa mais ampla (XXX, XX) que
discutia o processo de a implantação de um projeto de Informática Educativa em uma
escola da rede pública do município de XX/XX. Aqui enfoca-se especialmente a
organização do ambiente informatizado e sua relação com o currículo escolar, na
perspectiva de propor uma integração das tecnologias à gestão escolar.

METODOLOGIA:

A abordagem metodológica utilizada foi de cunho qualitativo, procedendo-se a


utilização de análise de conteúdo, sendo os dados interpretados à luz do referencial
teórico proposto. Foram realizadas observações participantes no transcorrer de 08 meses
de forma sistemática na escola e no ambiente informatizado, tanto com a presença de
docentes, coordenadoras do ambiente, estudantes e monitores. Tais observações
constituíram-se em diário de campo, composto por registros do ambiente de trabalho
bem como de apontamentos sobre fatos significativos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO:

De forma balbuciante, os computadores foram se inserindo no cotidiano escolar:


conversas das professoras pelos corredores comentando sobre a aprendizagem que as
crianças efetuam sobre o uso de computadores, de seus gritos eufóricos no fumódromo1
ao lembrarem-se de que “tipo” de estudante aprende mais rapidamente a navegar (o
mais desligado das atividades de aula, ou o que mais brigava, ou menos aprendia,...),
das gargalhadas sobre fatos inusitados ocorridos no ambiente informatizado. Enfim, dos
movimentos balbuciantes, articuladores de incipientes relações, emergência de

1 Ambiente “criado” na sala de professores/as, especificamente na ala em que ficam armários e café,
situado ao lado da janela, junto às plantas, tendo como função alojar as/os fumantes da escola.
conexões, virtualizações, escritas mediadas, realizadas sob forma de hipertexto ou de
garatujas no papel.
Pode-se pensar, a título de metáfora, que o movimento manifesta-se em forma
de “nuvem” circundando um território (escola); “nuvem” esta que vai se dissipando,
descendo, tomando formas através da entrada nos interstícios das formas educacionais
instituídas que se abrem e são embebidas deste “éter”. No mesmo movimento, a
“nuvem” se cristaliza, colorindo-se de diversas cores e de diferentes tonalidades, de
acordo com a matéria que no território encontra. Desta mistura colorida acaba tendo
visualidade uma rede que dantes não existia. Rede composta de antes e depois
transformados em agora, pois que a constituição se dá no encontro. Formas instituintes e
instituídas do estabelecimento fazendo rizoma com as tecnologias digitais na escola.
A instalação do ambiente informatizado ficou reservada para ser efetuada na
semana de inauguração da escola: panóplia de arquitetura dos prédios, arquitetura da
sala de computadores, arquitetura dos computadores, decoração para as festividades,
utilização de novos espaços a serem constituídos lugares.
Inicialmente, conforme relato de agentes escolares, os computadores foram tidos
como elemento decorativo que poderia ser retirado a qualquer momento, tal como um
enfeite de porta, descartável após cumprir suas funções de embelezamento, apesar do
empenho dos agentes implementadores técnicos que, num curto lapso de tempo,
instalaram os computadores.
Assim, os computadores entram em clima de festividade e insegurança. Em
estando instalados, fez-se necessário deliberar sobre quem seria o/a responsável pelo
lugar, as atribuições, os usos, ou seja, sobre a colocação em funcionamento desta
maquinaria na escola.
A “montagem” do ambiente informatizado seguiu as regras gerais da escola para
a elaboração de projetos os quais são aprovados mediante votação pelo coletivo da
escola. Tal forma de escolha aponta um movimento de gestão democrática, na qual as
decisões escolares se dão de forma coletiva, com ampla possibilidade de participação
dos docentes que demonstram interesse em participar de determinadas
atividades/projetos. Foram, assim, elaboradas três propostas para uso do ambiente
informatizado, sendo duas as eleitas: uma para o turno da manhã e outro para o da tarde.
Tive acesso às três propostas quando estavam expostas na escola, no dia da eleição,
porém, detive-me nas duas “vencedoras”, relegando a segundo plano a terceira proposta.
A discussão aqui efetuada, portanto, fixa-se na bi-polarização dos
encaminhamentos possíveis das tecnologias digitais na escola. Com esta informação,
assinalo que outras propostas advieram do meio escolar, não sendo, porém, aqui
contemplados, devido à polarização que também efetuei na discussão dos dados. Ou
seja, foram as duas propostas que vieram a se materializar na escola e a fazer parte de
seu cotidiano, constituíram-se na matéria-prima de análise.
As duas coordenadoras eleitas pelo coletivo da escola, uma para o turno da
manhã e outra para o turno da tarde, montaram sua própria proposta de utilização do
ambiente, tanto em nível administrativo quanto pedagógico. Desta forma, construindo
proposta sobre quem faria uso do ambiente informatizado (todos docentes, apenas os
interessados, os que tivessem projetos, os que tivessem noções de utilização de
microcomputadores prévia, os que não as tivessem, ou qualquer um deles, dentre outras
questões), horários de funcionamento do ambiente (seguiria ou não o horário da escola)
ou como proceder com relação à formação dos docentes.
Na leitura das propostas inscritas para a eleição da coordenação do ambiente
informatizado, podemos constatar diferentes proposições com relação ao entendimento
sobre a inserção e usos do computador na escola.
A proposta do turno da manhã contempla uma íntima articulação com a
comunidade escolar e local, constituindo-se em proposição aberta, sem definições de
atividades específicas, com links com a comunidade local. Por sua vez, a proposta para
o turno da tarde é sistematizada, contemplando listagem de cursos e de conteúdos para
estes, com enlaçamentos com a preparação de estudantes da escola para o trabalho.
Um exemplo que explicita essa diferenciação relaciona-se à estruturação do
cronograma. O projeto matinal contempla uma fase de sondagem, seguida por
planejamento e utilização do computador com finalidade pedagógica e avaliação do
andamento do trabalho. A proposta da tarde é composta por quatro módulos de ensino
de softwares como MS-DOS, Windows 95 e Word 7.0, além de um módulo de
monitoria. Neste último, o link é feito com alunos/as da escola, com objetivo de
aprofundar conteúdos da linguagem de programação e prestar auxílio para o andamento
das atividades no ambiente informatizado.
Assim, a montagem do ambiente informatizado, de certa forma dividida a partir
de pressupostos diferenciados aponta uma similaridade com os desenvolvimentos
teóricos sobre informática educativa. Valente (1991), por exemplo, propõe uma
categorização de algumas formas de chegada do computador à escola, ou seja, os usos
que são feitos do computador no estabelecimento escolar, a saber: escola de informática,
informática na escola, escola com informática.
No primeiro item acima elencado - escola de informática - o computador
entraria na escola como uma nova disciplina na grade curricular, enquanto ensino de
informática, de softwares, na difusão da alfabetização informática (também denominada
de computer literacy). A preposição - de - indica o uso que é realizado da máquina,
sendo a informática “mais importante” do que a escola, no sentido de que o objetivo é a
informática, assim como existem escolas de culinária, de aviação, de mergulho, em que
a atividade fim do estabelecimento é designada pela partícula que vem após o de
(informática, culinária, aviação, mergulho, ...).
Desta forma, ensinar o manejo de aplicativos, como consta em uma das
propostas da escola, poderia ser alocada nesta categoria, pois implica o uso, o manejo de
um instrumental. Os fins de tal ensino não podem ser determinados aprioristicamente,
porém, usualmente, as justificativas apontam para o caráter instrumental do ensino, no
sentido de preparar o estudante para o trabalho. Assim, este sairia da escola com uma
habilitação e com maiores possibilidades de competir no mercado de trabalho,
aumentando o contingente de trabalhadores com/de informática.
O segundo item - informática na escola - coloca a escola enquanto lugar no qual
vai ser alocada a informática. Assim, o foco está na maneira de tratar com as
informações que a informática cria, sendo realizada a utilização de um suposto
“raciocínio” informático.
Algumas características de tal raciocínio: o método que esta disciplina -
informática - lança mão, a saber, a decomposição de processos complexos em operações
simples, a forma de descrever os elementos e suas relações, bem como sua
classificação; operações essas que podem ser exemplificadas no uso de algoritmos.
Assim, ensinar a programar significa utilizar uma determinada habilidade dentre os
processos cognitivos possíveis. Como coloca uma professora da escola, o uso de
computadores desenvolve o raciocínio lógico de alunos e alunas, servindo, então, para o
entendimento de conteúdos da matemática.
O último item - escola com a informática - refere-se, segundo o mesmo autor
(ibid., p.48) a como organizar a presença do computador para o ensino de todas as
matérias, constituindo, portanto, a utilização didática de tal instrumento agora
escolarizado, aproximando-se, portanto, da proposta do turno da manhã.
Percebe-se que o uso do ambiente informatizado foi amplo no tocante às
possibilidades, aliando atividades que envolviam a Internet e o correio eletrônico.
Pode-se observar que foram se constituindo dois ambientes informatizados na
escola, com diferenciadas características e formas de apropriação pelas professoras, nos
dois turnos de funcionamento da escola por mim acompanhados (manhã e tarde).
Alguns indícios resgatados de falas das professoras da escola sinalizam que a escola tem
funcionamento diferenciado nos turnos (nas reuniões, normalmente eram efetuados
encaminhamentos no turno da manhã para depois serem “apreciados” no turno da
tarde).
Para além disso, a atuação das coordenadoras foi diferente no que diz respeito à
atuação e envolvimento em reuniões pedagógicas, entrosamento com as colegas, dentre
outras questões.
Betty Collis (1996) analisou vários projetos de uso de informática nas escolas e
constatou três níveis de problemas que se repetiram nos ditos projetos. Tais problemas
relacionaram-se com a forma de implementação e com decisões que as coordenadoras
do ambiente informatizado tiveram que tomar quando da construção de seus projetos e
da ativação dos mesmos no cotidiano escolar.
O primeiro nível de problemas refere-se a dificuldades no uso de computadores
por parte da comunidade escolar e envolve: “brigas” com as máquinas e grande
dispêndio de tempo; em termos de máquina, havia falhas no funcionamento de
computadores e de softwares que, além disso, eram de difícil uso e instalação e/ou de
valor muito elevado; número escasso de computadores para utilização e/ou
aprendizagem por parte de alunos e alunas e de docentes das escolas; falta de acesso aos
computadores por estes ficarem isolados em uma sala restrita a poucos/as usuários/as;
inadequação das máquinas - computadores antigos, lentos, com memória limitada; falta
de tempo para aprendizagem dos docentes, dentre outras questões.
O segundo nível de problemas surge quando o primeiro está se esvanecendo,
seja por iniciativa de professores e/ou do estabelecimento escolar e/ou mantenedora
deste. Diz respeito à dificuldade de integração do computador ao ensino. Nesta “etapa”,
o software é tido enquanto não eficiente ou apropriado para os objetivos do ensino.
Posteriormente, alguns resultados positivos são descritos na prática, porém são
limitados a lições (tarefas educativas) individuais, bem como a professores/as e/ou
estudantes. Assim, acaba havendo uma relação entre “bons” professores e professoras e
o uso de computadores, tornando-se uma experiência isolada da escola como um todo e
imputada a características pessoais, sem ampliação e disseminação para outros/as
docentes.
A partir de observações realizadas na escola desde o início do trabalho das
coordenadoras, foram estabelecidas algumas categorias. Elas ressaltam diferentes
funcionamentos na interface humano-máquina. Assim, pode-se perceber, não é a
simples presença da máquina que demarca modos de experimentar e de usar, mas sim os
agenciamentos que constituem modos de relação (ALMEIDA, 2003).
As diferenças acabam por configurar funcionamentos próprios para cada turno e
são postas sob forma de categorias para sua melhor visualização. Essas categorias foram
estabelecidas a partir da tendência predominante de ação do grupo de professoras. Faz-
se necessário esclarecer que tais tendências não são exclusivas de um turno da escola,
mas sim predominantes em um ou outro deles. Elas estão organizadas no quadro a
seguir:

CATEGORIAS TURNO MANHÃ TURNO TARDE

Tipo de atividades Projetos vinculados a Utilização pontual, sem


desenvolvidas conteúdos de sala de aula perspectiva de
desenvolvimento de
projetos

Planejamento das Antecipado e colaborativo Isolado, preestabelecido


atividades ou sugerido pela
coordenadora no
momento de uso do
ambiente informatizado

Papel de articulação da Dentro e fora do espaço Espaços oficiais de


coordenadora oficial de reunião e entre reunião
professores

Apropriação pela Assumindo seu papel de Delegando


docente da proposta de professora no ambiente responsabilidade
Informática na informatizado
Educação
Quadro 1: Ambiente informatizado

A fim de explicar pormenorizadamente cada uma das categorias, suas


peculiaridades são elencadas:
1. Tipo de atividade desenvolvida no ambiente informatizado: refere-se à forma
como os recursos informáticos vêm sendo utilizados ao longo do tempo e de como estes
se articulam ou não com conteúdos desenvolvidos em sala de aula. Temos dois
direcionamentos, basicamente:
a) as professoras estão estabelecendo atividades cada vez mais estruturadas, e
muitas estão se encaminhando para projetos vinculados a conteúdos de sala de aula;
b) as professoras que utilizam computadores em sua prática pedagógica o fazem
de maneira pontual, sem perspectivas de desenvolvimento da atividade para
estabelecimento de um projeto.
2. Planejamento das atividades: refere-se à forma como as atividades são
concebidas e qual é o nível de colaboração entre coordenadoras e professoras na
elaboração destas:
a) professoras procuram a coordenadora para planejamento antecipado e
colaborativo das atividades que irão ser desenvolvidas;
b) professoras já vem com atividade preestabelecida (planejamento isolado), ou
perguntam à coordenadora o que é possível fazer no momento em que estão com os
alunos e alunas na sala.
3. Papel de articulação da coordenadora: aqui assinala-se de que forma e em que
espaços são feitos os contatos com as professoras na mediação entre o trabalho de sala
de aula e o ambiente informatizado:
a) professoras são procurados pela coordenadora, que faz papel de articulação
(inclusive entre professoras das diversas áreas do conhecimento) dentro e fora do
espaço oficial de reunião;
b) professoras só são procurados pela coordenadora nos espaços oficiais de
reunião para questões organizativas e propostas de uso delineadas pela própria
coordenadora.
4. Apropriação pelo professor de tecnologias digitais: refere-se ao engajamento
em relação à utilização dos recursos informáticos por parte dos professores em sua
prática pedagógica:
a) gradativamente as professoras estão assumindo seu papel de coordenadores da
atividade a ser desenvolvida, com apoio da coordenadora do ambiente informatizado;
b) professoras delegam a responsabilidade da atividade desenvolvida à
coordenadora do ambiente informatizado.
O quadro ilustrativo e as explicitações pormenorizadas apontam que uma das
coordenadoras preocupa-se com a aprendizagem dos alunos e alunas no sentido amplo
(desenvolvimento cognitivo, social, afetivo, etc.) e em interagir com professoras e
professores. A outra se preocupa com a aprendizagem com relação à apropriação da
tecnologia e questões formais (ortografia); sua interação é pontual e limitada somente à
atividade desenvolvida naquele período pela professora.
A primeira tem uma postura que encaminha para a autonomia das professoras
que fazem uso do ambiente informatizado e para a eliminação de seu próprio cargo;
enquanto isso, a coordenadora do turno da tarde demonstrou uma postura voltada para a
dependência das professoras em relação à pessoa que “sabe de informática”; isto no leva
a pensar sobre o próprio lugar da coordenação e suas “funções”.
Analisando as tendências de cada turno, marcadamente diferenciadas, pergunto-
me sobre os possíveis fatores que conduziram a esse fenômeno. A questão dos lugares -
instituído e instituinte - parece indicar uma das possibilidades explicativas.
Nessa perspectiva, a questão não é apontar quais habilidades e talentos das
respectivas coordenadoras teriam levado a tal ou qual encaminhamento. Dispo-me,
assim, de intenções meritocráticas expressas pelo uso de categorias como características
de personalidade, relações pessoais, dentre outras. Por isso, interessa-me discutir a
possibilidade explicativa de que o desempenho das coordenadoras é efeito também de
modos de sua própria institucionalização no papel. Uma delas, colocada inicialmente
em um não-lugar, aparentemente desprovido de legitimidade, lugar situado no entre,
porque não definido ainda pela força de sua nomeação/indicação oficial. Outra,
instituída antes de experimentar, legitimada antes de se tornar legítima, sintonizada com
o modo pedagógico instituído, nomeado, definido, num lugar que, por ter sido nomeado,
oficializado, instituído, também tornou-se sintônico com outros modos institucionais.
Entretanto, tais movimentos não são inflexíveis ou lineares, nem a ocupação de um
destes lugares pelas coordenadoras é de “posse vitalícia”. O apontamento aqui
demarcado refere-se à freqüência na ocupação de tais lugares observada durante a coleta
de dados nesta pesquisa.
Percebe-se que a forma de relação proposta entre o uso do ambiente
informatizado e o fazer pedagógico articula-se com concepções de currículo e de
informática. Ou seja, se a informática é um conhecimento necessário ela pode se tornar
uma disciplina do currículo ou funcionar efetivamente como isso; se é uma tecnologia a
ser operada em função das ações pedagógicas do docente, ela é uma atividade que
transversaliza a grade curricular.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir da análise e discussão dos dados, pode-se afirmar que a inovação
pedagógica necessita ser pensada e articulada levando-se em consideração vários
elementos do acontecer institucional escolar. Quando Área (2003) discrimina tais
elementos necessários, chama a atenção para a construção de um projeto institucional
que insira as tecnologias informáticas operativamente na ação da inovação educativa.
Para tanto, são necessários recursos e infra-estrutura adequados, formação de
professores e disponibilidade de recursos pedagógicos digitais e equipes de apoio a
professores e escola.
Nos projetos desenvolvidos pelas coordenadoras do ambiente informatizado da
escola percebemos que a infra-estrutura é necessária, porém não direciona os usos
possíveis, até porque os recursos disponibilizados eram os mesmos para os turnos de
funcionamento escolar. A articulação com o corpo docente e o currículo são peças
fundamentais para que a inovação na escola possa acontecer articulada com as
tecnologias digitais. Assim, reforça-se a necessidade de que o uso das tecnologias seja
um desejo do coletivo escolar e que se articule com as políticas curriculares
(MOREIRA e KRAMER, 2007).
Num primeiro momento, a cultura escolar de fragmentação, isolamento,
individualidade e dificuldade no compartilhamento das experiências pedagógicas (Área,
2003) pode direcionar alguns rumos da incorporação das tecnologias digitais,
transformando as tecnologias em algo escolarizado, ou seja, em elemento que segue a
lógica escolar. Porém, no embate entre o uso pedagógico das tecnologias digitais e a
organização escolar, pode haver brechas para que a escola se insira em outro patamar
educacional. Um patamar que envolve compartilhamento dos espaços escolares e não
escolares, incluindo aqui o ambiente informatizado e integração entre práticas de
diversas disciplinas escolares (SANTOS e BORGES, 2009).
A opção pela construção de ambientes informatizados nas escolas pode ser
pensado como um resquício da lógica escolar que separa ambientes e práticas
curriculares. Se a proposta é de integração pedagógica das tecnologias digitais enquanto
inovação pedagógica, a própria existência de uma sala para computadores pode ser
problematizada. Uma prática inovadora necessita de um ambiente informatizado? Ou
poderíamos utilizar os recursos articulados com as necessidades dos projetos
desenvolvidos na escola? A sala de aula pode ser um local adequado para instalação de
computadores?
Finalizo o artigo trazendo estas reflexões que articulam currículo, espaços
escolares e tecnologias digitais.

REFERÊNCIAS:

ALMEIDA, M. Tecnologia e gestão do conhecimento na escola. IN: VIEIRA, A.;


ALMEIDA, M.; ALONSO, M. (orgs.). Gestão educacional e tecnologia. São Paulo:
AVERCAMP, 2003.

ARAUJO, R; MORAES, R. Informática educativa e gestão democrática – uma história


de incongruências. Disponível em: <
http://www.histedbr.fae.unicamp.br/acer_histedbr/seminario/seminario8/_files/DRhYPJ
kt.pdf>, data de acesso: 10/09/2009.

AREA, M. Vinte anos de políticas institucionais para incorporar as tecnologias da


informação e comunicação ao sistema escolar. In: SANCHO, J.; HERNÁNDEZ, F.
(org.). Tecnologias para transformar a educação. Porto Alegre: Artmed, 2006, p.
153-175.

COLLIS, B. The Internet as an educational innovatio : lessons from experience with


computer implementation. Educational Technology, v. 36, n. 6, p. 21-30, 1996.

GIRAFFA, Lucia Maria Martins. Reflexões sobre o computador na escola. Porto


Alegre : PUC/FE, 1991. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Educação, Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 1991.

LÉVY, P. As tecnologias da inteligência : o futuro do pensamento na era da


informática. Rio de Janeiro : Ed. 34, 1999.

MORAES, R. Rumos da Informática Educativa no Brasil. Brasília: Plano, 2002.

MOREIRA, A.; KRAMER, S. Contemporaneidade, educação e tecnologia. Educação e


Sociedade, Campinas, vol. 28, n. 100 - Especial, p. 1037-1057, out. 2007. Disponível
em http://www.cedes.unicamp.br

OLIVEIRA, R. Informática educativa : dos planos e discursos à sala de aula.


Campinas : Papirus, 1997. (Coleção Magistério: Formação e Trabalho Pedagógico).

PRATA, C. Gestão escolar e as novas tecnologias. IN: ALONSO, M. et. al. Formação
de gestores escolares : para a utilizaação de tecnologias de informação e comunicação.
São Paulo, 2002.

SACRISTÁN, J. Reformas educacionais: utopia, retórica e prática.. In : GENTILI, P.;


SILVA, T. (Orgs.) Escola S.A : quem ganha e quem perde no mercado educacional do
neoliberalismo. Brasília : CNTE, 1996, p. 50 74.

SACRISTÁN, J. O currículo: uma reflexão sobre a prática. 3 ed. Porto Alegre:


ArtMed, 2000.
SANTOS, M. dos; BORGES, M. Alterações no cotidiano escolar decorrentes da
implantação de laptops educacionais. Revista E-Curriculum, São Paulo, v. 4, n. 2,
junho. 2009.Disponível em: <http://www.pucsp.br/ecurriculum>

VALENTE, J. Liberando a Mente: Computadores na Educação Especial. Gráfica da


UNICAMP, Campinas, São Paulo, 1991.

XXX, XX.

Você também pode gostar