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A ILHA DE DEUS

PRIMEIRA PARTE - EPOCA ATUAL

CAPÍTULO I

ANANDA:

Nascera em uma fazenda, filha do capataz, um homem


forte, autoritário e merecedor de toda a confiança do
patrão. Sua mãe uma bela senhora de quem herdou um ar
misterioso e triste, o que as distinguia das outras mulheres.
A filha do capataz, Ramiro Bastos, crescia entre os peões
da fazenda, um deles tinha um filho, dois anos mais velho
do que Ananda, costumavam brincar juntos, correndo pelo
pátio das casas que ficavam lado a lado. Quando ela tinha
cinco anos, ao brincarem juntos, Ananda sentiu
necessidade de urinar, como as crianças não tem maldade,
simplesmente baixou a calcinha e urinou ali mesmo onde
estavam. O garoto baixou-se e olhou por onde Ananda
estava urinando e disse:
- Tu não tens pingola, tem um talho por onde sai à urina.
Nesse momento eles descobriram que eram diferentes. Ele
lhe apresentou a pingola e ela expôs suas partes para que
ele as examinasse. Ele tocou com o dedo na vagina dela e
ela pegou o seu pinto.
À noite após o jantar Ananda reunida com os pais disse:
- O Pedrinho tem pingola, porque eu não tenho?
Os pais se olharam e não sabiam o que dizer e resolveram
perguntar:
- Como é que tu sabes disso?

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- Eu fui fazer xixi e o Pedrinho olhou por onde saia o xixi
e disse que ele tinha pingola e eu não, tinha apenas um
talho para sair o xixi. Ai ele me mostrou a pingola e quis
ver por onde saia o meu xixi e eu mostrei.
O assunto foi encerrado por ali. O casal resolveu que
Ananda não mais brincaria com o Pedrinho, que guria
devia brincar com guria e não com guri.
No dia seguinte o Pedrinho vai procurar Ananda para
brincar e a mãe de Ananda lhe diz que ela não iria mais
brincar com ele, que passaria a brincar com as meninas e
não mais com meninos. Que ele procurasse brincar com os
outros meninos da fazenda.
Pedrinho saiu chorando e nunca mais procurou Ananda
para brincar.
O tempo foi passando, passando e Ananda chegara à pré-
adolescência, aos seus doze anos, já mostrava sinais de
grande beleza, seus olhos verdes, fundos e tristes,
contrastando com um semblante juvenil, de grande
expressão, onde se via as faces coradas e uma boca bem
formada com lábios carnudos. Pedrinho por sua vez, já
atingira os seus catorze anos. Um menino com a pele
escura, cabelos carapinha, um semblante sereno, corpo
esguio e um par de olhos marcante, de um negro brilhante.
Costumava a ver Ananda de longe, não se ariscava se
aproximar dela. Ela por sua vez o olhava quando tinha
oportunidade o encarava demoradamente.
Foi num dia de marcação de gado, quando ele tinha
dezessete anos e ele quinze, que o destino os uniu mais
uma vez:
Algumas reses ficaram extraviadas, o capataz ordenou que
Pedrinho, as fosse arrebanhar.

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Ananda que tinha saído para cavalgar pelo campo, já
estava fora do alcance visual da casa, quando avistou um
cavalheiro que se aproximava. Logo pode ver que era
Pedrinho. Parou o cavalo e o esperou. Pedrinho ao chegar
perto parou o cavalo e a ficou contemplando sem dizer
uma única palavra. Ela por sua vez o olhava fixamente.
Pedrinho apeou do cavalo, o mesmo fez Ananda. Ele
estendeu as mãos e alcançou as dela, olhando-a no fundo
dos olhos e lhe disse:
- Ananda! Porque nos separaram, éramos apenas duas
crianças?
Ficaram ali um olhando para o outro como estivessem
hipnotizados, quando Ananda disse:
- Pedrinho! Como você está forte e alto.
- E você Ananda como está linda.
Recordaram os tempos de crianças, as travessuras que
faziam, e assim o tempo passou. Quando Pedrinho olhou
para o relógio e disse, estou atrasado, tenho de recolher os
extraviado. Prometa-me que nos encontraremos todos os
dias.
Assim eles passaram a se encontrar no retorno das aulas,
nunca mais do que cinco minutos, pois não podiam chegar
atrasados, os pais de ambos poderiam desconfiar.
Quando Ananda tinha dezesseis anos, passaram a se
encontrar no campo, mais precisamente num mato
denominado de Mato Grosso. Sobre folhas secas e sob a
mata fechada, trocaram demorados beijos, e depois de
vários encontros ela permitiu que ele a penetrasse. A
pequena dor que sentira ao ter o hímen rompido, foi
totalmente neutralizada por uma sensação de prazer, como
estivesse entrando em um paraíso celestial. A sensação foi
aumentando de intensidade. Os movimentos de penetrar e

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retroceder ficavam cada vez mais gostoso, mais intenso, e
todo o seu corpo aos poucos entrou em uma espécie de
delírio que, pareciam projetá-la até as nuvens e soltá-la em
queda livre. A sensação foi aumentando de intensidade,
ela notou que já não enxergava ou escutava direito, tudo
parecia ter ficado apagado, gemeu de prazer e atingiu o
seu primeiro orgasmo.
Seu corpo estava encharcado de suor, Pedrinho descansava
sobre seu corpo em estado de abandono de todas as forças.
Então era aquilo uma relação sexual! Que maravilha! De
repente todas as respostas as suas perguntas afloraram.
Era aquilo que seus pais queriam evitar que acontecesse
quando eram tão pequenos.
Agora passara a sentir seu órgão genital dolorido, uma
pequena porção de sangue sujara a sua vagina e havia
manchado sua calcinha e seu vestido. O que a fez
preocupar-se, pois não poderia chegar a casa com o
vestido manchado de sangue, o que diria a sua mãe. O que
os levou a procurar um regato e fazer a limpeza do vestido
na água corrente.
- À noite Ananda reconstituía o prazer através das
recordações, ansiava por um novo encontro com Pedro,
para uma nova relação. Assim eles passaram a se
encontrar quando era possível.
Era uma manhã no início do outono, o pai de Ananda
estava sentado, após o café da manhã, em frente de um
fogo crepitante na lareira do galpão de encilha, onde
aqueciam água para o chimarrão. Estivera muito quieto
nos últimos dias, como quem pressentisse algum
acontecimento malévolo.
O rebanho já estava encurralado, quando chegou um dos
peões e lhe disse:

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- Seu Antônio o gado tá na mangueira.
- Já estou indo.
Com o cavalo já encilhado, puxou-o pelas rédeas para fora
do galpão, montou-o e se dirigiu para a mangueira. A
atividade do dia consistia em banhar o gado contra
carrapatos e dar vermífugos via oral.
A atividade matinal já estava no meio da jornada, quando
Antônio embretava um touro reprodutor, este disparou. O
cavalo que montava deu um giro curto, na perseguição do
touro e tropeçou, no tombo do cavalo, Antônio foi
projetado tendo batido com a cabeça em um dos moirões
da cerca, ficando desacordado. Todos correram em seu
socorro, mas ninguém conseguiu reanimá-lo em poucos
minutos ele estava morto. O patrão foi chamado pelo rádio
e logo o avião estava pousando na pista da fazenda.
Após haverem velado o corpo por mais de vinte e quatro
horas, e féretro sai da casa grande da fazenda, onde
residira o morto e sua família. A carreta fúnebre seguia
pela estrada de chão batido, rumo ao cemitérios da
fazenda, que ficava a mais de três quilômetros das casas
da fazenda, local onde há longos anos eram enterrados os
que morriam ali, fossem empregados ou proprietários.
Uma das rodas da carreta rangia, acusando a total falta de
graxa. A junta de bois, lentamente se movia com um
andar firme e compassado, empurrando a canga que lhes
prendia. À frente um piazito, com não mais que dez anos,
levava cruz de madeira, erguida à frente do peito,
orientando o caminho. Atrás da carreta, uma dúzia de
mulheres, todas pertencentes à fazenda. Umas choravam,
outras rezavam. Dona Chiquinha, comandava as rezas. O
corso tropicando nas pedras soltas na estrada, uma camada
de poeira levantava.

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Atrás das mulheres, carregando uma pá de corte no ombro,
seguia o coveiro, seguido pelos demais homens da
fazenda. O patrão todo de terno escuro, chapéu na mão, a
frente do estômago, acompanhava as rezas. Ao lado do
patrão, ia à viúva e sua filha Ananda, todas vestidas de
preto.
Dentro da carreta, um caixão de madeira bruta, entre
flores, jazia o corpo de Ramiro Bastos, conhecido por
todos como capataz. Morreu aos quarenta e cinco anos,
depois de uma vida laboriosa e produtiva.
No cemitério o corpo foi transladado para a sepultura, um
buraco no solo com um metro de profundidade, onde iria
descansar eternamente o morto. A terra foi colocada sobre
o caixão e sobre estas as flores. Uma reza foi entoada e
todos se dispersaram. O patrão acompanhou a viúva e sua
filha de volta para as casas da fazenda e no caminho lhes
disse:
- Vendo que não há a menor razão para que vocês
permaneçam aqui na fazendo, até mesmo pela má
recordação. Eu as convido para se transferirem para
aminha casa na cidade, onde poderão trabalhar e Ananda
poderá completar seus estudos.
Nos dias que sucederam o enterro, Pedrinho, não
conseguira falar com Ananda.
Uma semana depois, a viúva tomara a decisão de deixar a
fazenda e aceitar o oferecimento do patrão. Comunicou
sua decisão a Ananda, que foi contraria a ideia, pensando
em Pedrinho, mas sua mãe foi inflexível. A decisão estava
tomada.
Na noite que antecedeu a partida para a cidade, Ananda,
após sua mãe haver dormido, abriu a janela do seu quarto
e Pedrinho a pulou, foi à primeira noite de amor que

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Ananda tivera, deixando, os encontros fortuitos que
tiveram no mato, superados em muito.
Ananda e Pedrinho enquanto se amavam, prometiam um
ao outro que custasse o que custasse, um dia estariam
juntos para sempre.
Dois dias depois, as duas estavam chegando à grande
mansão do patrão. Um quarteirão todo era dominado pela
residência do industrial e pecuarista Doutor Ralph
Anderson Cabreira, homem maduro, com 51 anos, viúvo,
pai de três filhos, que atualmente tomavam conta dos
negócios da família. Uma vez que 50% de tudo que a
família possuía lhes pertenciam por herança deixada por
sua mãe, falecida a mais de dez anos. Cabreira, como era
conhecido por todos, costumava a fazer grandes viagens
em seu veleiro de quinze metros de comprimento e 20
toneladas, onde costumava passar vários meses, pelos
mares do caribe. Considerava-se aposentado, após mais de
trinta anos de laborioso trabalho a frente do grupo de
empresas e fazendas que a família possuía. Quando
chegava a casa permanecia em seus aposentos, sem entrar
em contato com os criados da casa.
Ananda e sua mãe foram tratadas com grande distinção
por todos da família, Ananda ajudava a mãe na cozinha,
após as aulas do curso colegial e estudo da língua inglesa.
Sua mãe recebera o cargo de chefe de cozinha.
Ananda, na época era uma garota de 16 anos, possuía
estatura mediana para sua idade e já chamava a atenção de
todos com seus cabelos loiros e levemente cacheados, seus
olhos verdes e marcantes, sua boca e nariz bem
desenhados. O corpo já demonstrava traços característicos
de uma adolescente, os seios cresciam e encaixavam
perfeitamente em todas as roupas que usava. Seus pés,

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pequenos, calçavam sandálias com tiras, que combinavam
perfeitamente com seus vestidos joviais.
Quando ela completara os dezoitos anos, sua beleza se
salientara mais, fazendo-a ser notada por todos.
Uma festa de aniversário foi preparada para Ananda.
Todos no salão a espera da aniversariante, a porta se abrira
e entrara uma moça. Estava vestida modestamente, mas
bem arrumada e tinha um rosto alegre, alerta, cheio e a
maneira enérgica de uma mulher que tem de ganhar a
vida.
Cabreira ao vê-la se surpreendeu positivamente, nunca
havia visto tamanha beleza em uma mulher. No dia
seguinte, o patrão mandou chamar Ananda, sob o pretexto
de que queria saber como estavam os estudos de inglês.
Ela estava falando razoavelmente o inglês, mas
necessitaria um pouco de conversação, para isso o patrão
se dispôs a conversar com ela em inglês, uma hora por dia.
Alguns dias depois ele passou a cortejá-la, convidando-a
para saírem para jantar. Levou-a para conhecer o seu
veleiro, fazendo uma excursão, saindo de Tramandaí,
passando por diversas praias do litoral gaúcho e
retornando à Tramandaí onde o barco costumava a ficar
ancorado, quando estava no Sul do País. Cabreira embora
com seus cinquenta e quatro anos, era um homem
fisicamente forte, com características atléticas. Fazia o
que muitas pessoas sonham fazer na vida, mas poucas têm
a coragem de abandonar a rotina segura e perseguir seu
sonho até o fim. Cabreira era o tipo persistente, nunca
desistia de suas idéias, as perseguia até obter os resultados
almejados.
Ananda deslumbrada com a riqueza que envolvia seu
pretendente, não resistiu o assédio e terminou ficando

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noiva de Cabreira, que a induziu a estudar além do inglês e
francês, para tanto, contratou uma professora, que a
ensinara por oito horas diárias. Seis meses após o noivado
eles casaram. A única exigência da família foi que casasse
com total separação de bens. E que Ananda teria direito a
uma pensão vitalícia em caso de morte do esposo.
Após o casamento eles foram passar a lua de mel a bordo
do veleiro Paraíso, um barco propelido por um velame,
conjunto de velas em forma de triângulos e em forma de
quadrados de tecido apropriado, apoiado em um mastro
controlado por um conjunto de cabos chamado cordoalha,
todo esse sistema que se denomina armadoria. Possui uma
quilha e um leme apropriado segundo sua armadoria, que
impedem à deriva e forçam o conjunto avante em sua rota
naval.
A tripulação era constituída apenas pelo casal e pelo
navegador. Um jovem caribenho, que detinha grande
conhecimento dos oceanos, mares e da navegação.
Ananda que se recordava das relações que tivera com
Pedrinho, a partir dos seus quinze anos, esperava que fosse
a mesma coisa com o seu marido. Ledo engano, o homem
não tinha a mesma pegada, o mesmo arrojo, seus beijos
deixavam a deseja, as relações sexuais não a faziam
vibrar, era bom, mas faltava vibração, não sentia aquela
volúpia que a levava as nuvens e a soltava flutuando no ar.
Esperava ela fazer sexo diariamente, mas seu esposo a
procurava apenas uma vez por semana, o que para ela era
insuficiente.
Após seis meses de casada Ananda já havia concluído que
não passaria a sua vida ao lado de um homem que não a
satisfazia por completo, passou a notar nos dotes físicos
de.

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Johan Aparecido Ferreira, o marinheiro caribenho.
Ela não lhe era indiferente, mas ele sabia que a mulher do
patrão seria intocável, seria para ele apenas uma bela
visão.
O patrão costumava a sestear após o almoço, Ananda
aproveitava este tempo para tomar sol.
O marujo, aparentemente absorto em seus afazeres de
manobrar o veleiro, a observava de longe. E pensa:
Que bela mulher deve ser um fogo na cama. Há se eu
fosse o patrão, não estaria sesteando, enquanto ele
apanha sol. Ma, como diz o velho ditado, Deus da nozes a
quem não tem dentes.
Para de pensar bobagens Johan, ela não para o seu bico,
sossega homem. Deixa de pensar bobagens.
Ananda em seu banho de sol, de soslaio olhava para Johan
e pensava:
O navegador não é de se jogar fora, parece um homem
com grandes méritos na cama. Faz-me lembrar Pedrinho,
que saudades de fazer amor com ele. Cabreira está
deixando a desejar como esposo, quase não comparece e
quando o faz é algo sem entusiasmo. Se essa viagem durar
muito tempo, acho que não vou aguentar. Johan não vai
me escapar é ter uma oportunidade e ele vai ver só.
Johan, por sua vez conjecturava em pensamentos:
Quando teremos uma oportunidade de nos conhecermos
melhor dona Ananda? Garanto que vou faz-la subir pelas
paredes do veleiro e flutuar nas ondas do Pacifico...

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A ILHA DE DEUS

PRIMEIRA PARTE - EPOCA ATUAL

II CAPÍTULO

A TRAIÇÃO

Cabreira determinara que o veleiro ficasse ancorado em


uma determinada área do mar do Caribe, em um local
próprio para mergulho submarino. A ancora fora lançada,
as velas foram arreadas. Cabreira era aficcionado por

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mergulho. Ananda não sabia nadar, por isso não o podia
acompanhar nos mergulhos.
Enquanto Cabrera mergulhava, Aparecido, o monitorava
por uma câmara que o mergulhador trazia instalada no
ombro direito. Nesses momentos Ananda aproveitava para
conhecer melhor o marujo, que lhe parecia muito
interessante.
Aproximou-se e como pretexto de ver o que a câmara
estava filmando disse:
- Como está o mergulho, posso ver o monitor de vídeo?
- Como queira senhora – respondeu o marujo.
- Ananda para você, quando o patrão não estiver junto.
Olhares de sedução foram lançados de ambos os lados.
Johan disse:
- Ananda! Não faça isso comigo, posso perder o meu
emprego. O patrão tem grande confiança em mim.
Você é linda demais e não resistirei aos seus encantos.
- Então não resista – respondeu Ananda.
- Quanto maior a confiança maior será a traição - disse-lhe
Johan.
Assim começou o flerte entre Ananda e Johan.
O veleiro chegara ao porto da Somália, onde o senhor
Cabreira teria de participar de uma reunião no clube dos
navegadores. Ananda que o iria acompanhar alegou que
estava com indisposição estomacal e que seria maçante
participar de tal reunião. Preferindo ficar no aposento do
veleiro, com as luzes apagadas, o que fazia passar a sua
dor de cabeça.
Cabreira, contrariado, foi sozinho participar da reunião.
O veleiro que atracado estava na marine em local afastado
dos demais barcos, propiciava um estado de isolamento e
privacidade.

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Johan Aparecido Ferreira estava no convés trabalhando no
barco, quando Ananda aparece na porta da cabina de
comando e o chama. Ele logo a atende. Ananda estava
com um chambre branco que lhe cobria todo o corpo.
Quando ele começa se dirigir ao seu encontro, ela adentra
na cabina e se dirige aos aposentos do casal. Aparecido a
segue e quando está dentro do quarto, Ananda retira o
chambre e se apresenta totalmente nua. Aparecido hesitou
por alguns instantes, mas não resistiu ao chamamento de
tamanha beleza feminina. Despiu-se e a pegou nos braços
e a deitou na cama. Ananda reviveu as relações que tivera
no passado com Pedrinho. O sexo era realmente aquilo
que ela havia conhecido e não o que tinha com o marido.
Johan na posição de cúbito dorsal, Ananda sentara-se
sobre ele que a invadira com seu penis ereto, ele parecia
galopar em um corcel, levantando e se deixando cair, num
vai e vem frenético. Um incontido gemido deixava ecoar
no ambiente, a cada vai e vem da penetração o gemido se
tornava mais forte e rápido, até que um suspiro fundo
anunciava o que chegara ao orgasmo. Seu corpo perde as
forças e ela cai para frente e é segura pelos braços de
Johan, que também culminara o ato. Os corpos
permaneceram inertes por algum tempo em absoluto
repouso.
No final da tarde Cabreira chega de taxi, se dirige ao
escritório da guarda da marine e diz:
- Como foi a sua vigilância:
- O senhor tinha razão, uma hora após o senhor ter saído, o
marujo entrou na cabina de comando e saiu três horas
depois, e continuou o seu trabalho no convés.

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- Aqui tem a sua gratificação. – alcançando-lhe uma nota
de cinquenta dólares. – Há! Tem mais uma coisa que
quero que faça para mim.
Virá às oito horas da noite um instalador de informática,
ele o procurará, por favor, leve-o até o veleiro Paraíso.
Quando ele chegou ao Veleiro Ananda já o estava
esperando.
- E ai querida! Estais melhor da enxaqueca?
- Sim querido, melhorei sensivelmente.
- Então podemos jantar fora?
- Sim, podemos.
Se dirigindo a Aparecido disse:
- Aparecido! Jantaremos fora hoje, esteja pronto antes das
vinte horas.
O jantar em um dos melhores restaurante da Somália
ocorreu tranquilamente, Cabreira estava alegre, chegou a
tomar uma garrafa de vinho e em seu discurso, ouvido
com toda a atenção por Ananda e Aparecido, ele dizia:
- Para finalizar o nosso cruzeiro, amanhã partiremos rumo
ao Panamá, para tanto teremos de atravessar o Oceano
Pacifico. E ai eu pergunto a você Aparecido. Que tempo
levaremos na atravessia do Pacífico?
Aparecido, colocou a mão no queixo, pensou por alguns
instantes e disse:
- O oceano Pacífico estende-se de norte a sul, entre os dois
círculos polares, e a leste e oeste, entre a Ásia e a
América, numa extensão de cento e quarenta e cinco graus
de longitude. É o mais tranquilo dos oceanos, com
correntes largas e lentas, marés fracas e chuvas
abundantes.
- Claro que dependerá do vento, mas vamos considerar
que atravessaremos mais de dois terços do globo, ou seja,

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em torno de oito mil e quinhentos quilômetros, a uma
velocidade media de vinte nós por hora. Na pior das
hipóteses, levaremos dois meses.
Ao ouvir a velocidade em nós, Ananda perguntou:
- Senhor aparecido, para que eu entenda pode me dizer a
velocidade em quilômetros por hora?
- Sim, dona Ananda, um nó equivale a 1,852 quilômetros
por hora.
- Pois bem, amanhã providenciaremos os viveres
necessários para a viagem sem escalas. – disse Cabreira.
O jantar terminou próximo da meia noite. Cabreira
alcoolizado pelo vinho que havia tomado. Pegaram um
taxi que os levou à marine.
Cabreira teve de ser carregado por Ananda e Aparecido,
que o colocaram no quarto. Enquanto Cabreira dormia o
casal de amantes aproveitou para se amarem mais uma
vez, desta feita nos aposentos de Aparecido.
No dia seguinte, Cabreira acordara com dor de cabeça, por
isso, determinou a aparecido que levasse Ananda na
cidade para adquirirem os viveres para alonga viagem que
iriam empreender, observando que nada deveria faltar no
decorrer da atravessia do Pacifico.
Quando o casal de amantes havia partido ruma à cidade,
Cabrera foi conferir as fitas que haviam sido gravadas
pelas câmaras escondidas que mandara instalar na noite
anterior.
Lá estavam às cenas que não queria ver, eles se amavam
de uma maneira que o deixou constrangido a ponto de não
suportar assistir a fita por inteiro.
Passava do meio dia quando Johan e Ananda chegaram.
Os víveres chegariam mais tarde com um transportador. À

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tarde os trabalhos foram intensos, organizando tudo para a
grande viagem.
Passava das dezoito horas quando os últimos preparativos
foram concluídos.
A lua escondida entre nuvens começava a surgiu através
das franjas que a cobria. A superfície do mar brilhava sob
os seus raios, incentivando Cabreira que levantou a cabeça
e disse:
- Esta luz benfazeja fez-me recuperar as força
Levantemos ancora e partamos.
O vento soprava a bombordo, no convés Johan, suspenso
na vigia do mastro principal do veleiro, com um croque na
mão, que é uma vara com um gancho na extremidade para
puxar cabos, ou outros objetos para bordo. Na cabina de
comando Cabreira manobrava o leme - peça destinada ao
governo da embarcação.
Ananda se ocupava organizando os viveres na dispensa
para preparar o cardápio da primeira semana.
Ao completar seis dias de viagem a tripulação já
enfrentava os primeiros problemas a bordo do Paraíso. O
veleiro foi atingido por uma grande onda. Com o impacto,
a janela da sala de comunicação foi quebrada e os
equipamentos que estavam na mesa de navegação foram
danificados. "Todos os aparelhos eletrônicos deixaram de
funcionar: como computadores, telefones e vídeo.”
Passada a tempestade que durou apenas algumas horas.
O vento soprava de Leste com oito nós de intensidade o
rumo era 90 graus, isto é: vento na cara. Johan subiu
somente a vela mestra para dar maior estabilidade ao
veleiro. Olhando em direção a terra, ele viu uma nuvem
enorme com alguns raios cruzando o céu, portanto fez um
rizo, (diminuição da área vélica) somente como precaução

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para passar a noite, pois a qualquer momento o tempo
poderia mudar de forma violenta.
A noite chegou e com ela veio à chuva, não muito forte. O
pessoal começou a se recolher e o Johan ficou responsável
por manter o rumo durante o primeiro turno. A rotina
durante a viagem era a cada hora verificar o
funcionamento do motor e observar o nível de água e óleo.
Passava da meia noite quando o motor desacelerou
sozinho e a fumaça invadiu a cabine. Johan parou o motor:
era a conexão do Waterlock, sistema de escapamento e
silencioso, que não estava o suficientemente apertado.
Após dez minutos, o navegador tinha consertado o defeito
e tudo voltou ao normal, e o Paraíso seguiu seu rumo, sem
qualquer imprevisto.
O veleiro mantinha uma média de 30 nós por hora.
Naquela manhã de um azul flamante. Cabreira olhando o
mar que não via há algum tempo, com tanta calmaria, era
o mesmo Pacifico de sempre, um oceano que se repetia e
era irrepetível. Misterioso e sem mistério nas ondas
estourando naquelas espumas flutuantes Ele apertava os
olhos para ver melhor e seu olhar era demorado enquanto
ia acendendo o cachimbo com gestos vagarosos,
compondo todo um ritual de elegância. Deixou o
cachimbo no canto da boca e consertou o colarinho da
camisa branca que aparecia sob o decote do suéter azul-
claro, devia estar sentindo calor, mas não tirou o suéter,
apenas desabotoou o colarinho. Deu uma baforada no
cachimbo e largou a fumaça para cima, vendo-a se
dissolver na brisa que soprava. De onde estava via o
marujo Johan, que naquele momento preparava uma
carretilha para pescar o alimento para o almoço.
Mentalmente recitava:

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Ouço a voz muda de minha consciência, a me dizer, isto é
certo, aquilo é errado.
Respondo num sussurro de lamento: Ho! Quão bom e
quão suave seria se minha consciência não me acusasse
de nada. Que os erros cometidos pudessem ser reparados.
Que a minha doce vida nunca acabasse. Que os meus
viçosos cabelos não caíssem, que minhas pernas não
cambaleassem. Que minha juventude nunca findasse.
Continuava a contemplar o homem que havia roubado a
sua mulher. Via nele o homem que fora a mais de vinte
anos atrás. Forte, resoluto, cheio de entusiasmo, com um
grande futuro pela frente. E, pensava:
Analisando a minha situação, não sou mais jovem, não
tenho como competir com esse homem, que está no auge
de sua vida sexual. Ananda é jovem e fogosa. É isso ai
Cabreira, ou você se conforma e faz que não sabe de nada
e desfruta das benesses da jovem esposa, ou quebra logo
vinculo, despedindo o rapaz. Mas se eu fizer isso, talvez
ela resolva ir com ele. Tenho de tomar uma atitude, seja
ela qual for, mas tenho de tomá-la.
De repente Johan que pescava, puxou o caniço com vigor
e logo deu linha. Há mais de cem metros uma vigorosa
marlin projetou-se totalmente para fora da linha d’àgua,
seu corpo prateado reluziu com o brilho do sol.
* Marlin, Istiophoridae, é um dos peixes marinhos
conhecidos como "peixe agulha". A Marlin possui um
corpo alongado, uma lança como focinho, e uma nadadeira
rígida longo dorsal, que se estende para a frente para
formar uma crista.
Cabreira de onde se encontrava, não conseguiu ver o peixe
que havia sido pescado, apenas enxergava o pescador, por
isso, saiu da cabina e se dirigiu ao local onde estava Johan

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Aparecido. Logo, olhando para o oceano pode ver o
grande peixe que se debatia peso ao anzol.
- Um belo exemplar de marlin, você acaba de fisgar,
espero que consiga tirá-lo da água.
- Com toda a certeza Senhor Cabreira, com toda a certeza.
A cansativa batalha entre o peixe e o pescador, já durava
mais de meia hora, os três, pois Ananda também correra
para assistir o embate.
O grande peixe cansado de se debater, contra o puxar da
carretilha, já se encontrava próximo ao barco. A grossa
linha de nylon, mantinha o peixe parcialmente suspenso,
seu bico aparecia sob a água calma do Pacifico. Cabreira,
vestiu suas luvas de pesca e quando consegui, agarrou o
bico do marlin, que exausto, não mais se debatia. Johan
colocou o caniço no suporte e foi ajudar Cabreira que o
mantinha preso, Johan pegou um gancho próprio para
retirar peixes do oceano. Fisgou-lhe o gancho na barriga e
ambos conseguiram erguer o grande peixe e colocá-lo
dentro do barco.
- Uffa! Que trabalheira me deu este peixe, mas teremos
carne de peixe para vários dias - disse Johan Aparecido,
enquanto se preparava para eviscerá-lo.
Estrategicamente Cabreira se afastou, deixando Johan e
Ananda na lida do recém pescado.
De longe não deixou de observar a grande cumplicidade
que havia entre os dois. E se perguntou.
O que vais fazer Cabreira? Tens de tomar alguma
decisão, assim não pode ficar assim - falava Cabreira em
pensamentos com sigo mesmo.
A noite Cabreira não conseguia conciliar o sono, ao seu
lado Ananda se virava de um lado para o outro, como

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quem estivesse se debatendo entre um emaranhado de
pensamentos.
Cabreira lhe diz:
- Perdestes o sono?
- Acho que aqui está muito quente, sou até o convés me
refrescar um pouco, que ir junto?
- Não estou quase dormindo.
Ananda se levantou, vestiu um abrigo e foi para o convés.
Lá estava Johan que encostado no cunho, olhando as
estrelas. Chegando perto ela lhe disse:
- Perdeste o sono como eu?
- Estou aqui a pensar no futuro, e como tudo isso vai
acabar.
- Meu lema é viver o agora, o futuro, é amanhã e nunca
chega.
Passados alguns momentos, Ananda retorna para a cama.

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A ILHA DE DEUS

PRIMEIRA PARTE - EPOCA ATUAL

CAPITULO III

BRINCANDO DE RATO E GATO.

Cabreira, arquitetava um plano para sair daquela situação


que o deixava embaraçado e muito preocupado.
De repente veio-lhe a idéia:
É isso! Eles devem estar arquitetando algum plano para
se livrarem de mim. Tenho de descobri-lo para o
neutralizar. Amanhã tomarei providências.
Ananda, ao seu lado, por sua vez, inquieta se mexendo de
um lado para outro na cama, pensava:
Esta é uma situação insuportável, estar deitada com esse
velho, enquanto poderia estar nos braços de Johan, que
me satisfaz plenamente.
Apertava uma pena contra a outra, de modo a sufocar
aquele fogo que a queimava. – Temos de dar um basta
nisso.
Johan, em seu aposento, ouvindo o motor que em marcha
lenta, movimentava o veleiro em baixa velocidade,
pensava:

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Que destino cruel o meu, encontro a mulher da minha
vida e ela é casada com o meu patrão, o que podemos
fazer numa situação desta.
Assim eles passam mais uma noite, sobre às onda do
Pacifico.
Às seis horas, amanheceu. Os primeiros raios solares
romperam as nuvens brancas, que acanhadas tentavam
bloqueá-lo no horizonte, os vermelhos raios do astro rei
se elevou rapidamente.
Ao meio dia, Ananda servia o almoço, files de peixe, arroz
branco e salada conservada. Cabreira pegou uma garrafa
de vinho, e a abriu. Serviu Ananda e logo, começou a
servir Johan, que, ao estar a taça pela metade, fez sinal que
seria o suficiente, dizendo:
- Tenho de conduzir o barco, por isso devo estar sóbrio.
Após o almoço, ainda havia mais de meia garrafa de
vinho. Cabreira a pegou juntamente com a taça e se
dirigiu ao aposento.
Meia hora depois Ananda entra no quarto e vê a garrafa
totalmente vazia e Cabreira dormindo. Era tudo o que ela
queria há muitos dias. Ela saiu eufórica e disse à Johan:
- Ele bebeu todo o vinho e esta roncando como um porco
velho.
Johan, receoso, resolve constatar, adentra no aposento,
pega um dos braços de Cabreira levanta e solta no ar, ele
cai pesadamente sobre o colchão. Ananda e Johan se
dirigem aos aposentos ao lado. Lá ela o pega pelo pescoço
e o beija ardentemente, com grande frenesi, um despe o
outro, enquanto se beijam. Johan pega Ananda e a deita na
cama e fazem amor.
Esquecidos de Cabreira, passam ali por um longo tempo,
um nos braços do outro.

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Após haverem se amado, mais uma vez, Ananda diz:
- Esta situação não pode continuar, temos de dar um jeito
nisso, o que sugeres querido.
- Logo estaremos na Polinésia, podemos abandoná-lo em
uma das ilhas, continuar o nosso cruzeiro, e quando nos
cansarmos do oceano, vendemos o veleiro a um conhecido
meu e iremos morar no caribe, na minha terra natal, que é
uma pequena ilha caribenha. Lá nunca seremos
encontrados.
E se procurarem por ele e o encontrarem, poderão nos
perseguir.
- Duvido que nos encontre, eu conheço todo o caribe ele
não.
Por volta das dezessete horas, Cabreira se levanta. O casal
de amantes já haviam se separado, Johan fazia limpeza no
motor do barco, que no momento estava funcionando.
Ananda dava inicio aos preparativos para o jantar.
Cabreira se aproximou de Ananda que lhe perguntou:
- O que foi isso querido bebeste demais outra vez?
- Um dia é um dia, uma hora é uma hora, de vez enquanto
é bom sair do sério.

Cabreira aguardou um momento de distração de Ananda e


entrou no alojamento do piloto e de baixo da cama retirou
um pequeno gravador. Logo procurou Ananda e lhe disse
que iria tomar uma ducha.
Abriu o chuveiro e colocou o gravador a reproduzir a
gravação. Ao final da reprodução ele pensa:
Há então é isso, pretendem me abandonar numa ilha
deserta, para que eu morra sozinho ou viva, como um
Robson Crusoé.

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Na manhã seguinte, o céu azul claro e sol brilhante,
quando o casal se levantou.
Johan preparava o barco para velejar, com grande
destreza e técnica, armava as velas.
Quando estas estavam erguidas e sob a influência do vento
que soprava a bombordo, correu e desligou o motor.
Cabreira olhando o mar que não via há algum tempo, por
ter ficado recluso em seu aposento. Como o oceano estava
calmo, era o mesmo Pacifico de sempre, misterioso e sem
mistério nas ondas calmas com espumas flutuantes em
suas cristas.
Ele pesava: Como sua vida mudara, em pouco tempo, de
um homem despreocupado com o futuro que era, se via
preocupado e inseguro quando o destino que o
aguardava.
Retorna a calmaria que dominava o oceano. Ele olha para
o horizonte, corre, pega a luneta e sobre a escada de corda
do mastro principal e olha pela luneta, e grita:
- Terra a vista. Terra Vista...
Cabreira pega a sua luneta e da cabina onde estava olha
para o horizonte e vê ao longe, sinais de terra que aflorava
nas água do Pacifico.
Ananda Corre da cozinha e, toma a luneta da mão de
Cabreira e olha.
Johan se aproxima de cabreira e pergunta:
- Senhor, é uma ilha, das muitas que formam a Polinésia,
vamo explorá-la?
- Sim, Johan! Vamos rumar para a ilha.
A cada minuto que passava a ilha mais se apresentava,
exibindo sua praia e seus acidentes.
Há mais de mil metros da praia, Johan diz a Cabreira.

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- Senhor! Acho que devemos parar e lançar ancora, temo
ser perigoso nos aproximarmos mais da ilha, podemos
encontrar obstáculos para o calado.
- Tens a minha permissão para baixar ancora.
O marujo, acionou o motor que movimentava o guincho
ao qual enrolado estava o cabo da âncora e esta começa a
submergir.
A âncora já estava arriada quando Cabreira disse:
- Baixar o bote salva-vidas, eu e Ananda iremos à ilha para
explorá-la em busca de água e frutas.
Johan dando sinais de preocupação disse:
- Senhor! Acho arriscado, vocês iram sozinhos a ilha,
poderá haver antropófagos e sabe lá o que mais.
- Acho que devemos ir eu e Johan, enquanto ele vigia, eu
faço a coleta de água e frutas – disse Ananda.
Johan interfere dizendo:
- Acho arriscado ir com dona Ananda, devo ir sozinho e
armado, para avaliar a situação após isso, poderá a dona
Ananda ir para me ajudar.
- Não iremos todos, aqui o veleiro fica seguro, o local não
deve ser rota de navios, pois a dias não encontramos
nenhum.
Acho razoável a sua ideia senhor cabreira - disse Johan.
Cabreira e Ananda embarcam no bote e Johan o desce ao
nível de flutuação, e após usando uma escada de cordas,
Johan alcança o bote.
Johan, no centro do bote, remando, Cabreira na proa e
Ananda na popa. Após alguns minutos chegam à praia. Os
dois homens retiram o bote da água.
Johan sugere que, o casal ficasse na praia enquanto ele
adentrasse na mata para fazer um reconhecimento. Uma
hora depois Johan retornou e disse que a ilha não era

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habitada, até a parte em que lhe foi dado a ver, que havia
adentrada na mata por mais de um quilômetro e não viu
sinais de vida, que a água era abundante e de boa
qualidade.
Cabreira e Ananda retiraram as bambonas do bote. Após
Cabreira disse:
- Vocês podem ir buscar água, eu ficarei tomando conta do
bote e com a luneta vigiarei o veleiro.
Carregando as vasilhas eles se embrenharam na mata.
Quando sentiram que estavam ocultos das vistas de
Cabreira, pela vegetação, abraçaram-se e fizeram amor
sobre folhas secas que cobriam o solo.
Cabreira, na praia, empurrava o bote para dentro d’água.
Quando flutuava sobre as ondas que batiam no costado do
bote, Cabreira se colocou no assento central do barco e
começou a manejar os dois remos, rumando para o
Paraíso. Quando lá chegou encostou o bote a bombordo e
subiu na escada de cordas que se estendia de cima a baixo
do costado. Subiu o bote e logo acionou o guincho
elevando a ancora do Paraíso. Quando esta estava
totalmente suspensa, ele acionou o motor e o Paraíso
começou a se movimentar.
Cabreira se dirige ao seu aposento e debaixo do colchão,
retira um GPS portátil, (Sistema de Posicionamento
Global), e verifica no visor do receptor a posição do
mesmo com referência as coordenadas terrestres. Consulta
o mapa da região e constata que a ilha não se encontra
mapeada. Marca em seu livro de anotações as coordenadas
registradas no aparelho.
O casal na ilha, após fazer amor demoradamente,
começam a recolher água de uma bacia formada pela
queda de quatro cachoeiras, que despencavam de um vale.

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Johan diz a Ananda:
- Quando chegarmos a praia, temos de dar um jeito no
Cabreira, a minha idéia é de primeiro colocarmos o bote a
flutuar e depois começamos a carregá-lo, certamente ele
ficará na praia, quando o bote estiver carregado, nos
embarcamos e eu remo, se ele quiser nada para entrar no
bote nos o empurramos com os remos. Ele não aguentará
nadar até o Paraíso.
- Eu concordo, só não me agrada, o fato de ter de empurrá-
lo com os remos.
Quando eles chegam à praia com a pesada carga de água,
olham em busca do bote e constatam que o bote e Cabreira
haviam sumido, olham para o oceano em busca do bote, e
veem ao longe o veleiro que se afastava.
Johan desesperado diz a Ananda:
- Vou alcançá-lo - e corre para dentro do oceano, e começa
a nadar afoitamente. Nadando a mais de quinze minutos,
já se sentindo cansado, mas compreende que ainda precisa
nadar mais rápido para alcançar o veleiro, antes que ele
suma. Dá cinco ou seis braçadas, e tem a impressão de que
não saiu do lugar. Pior: parece que está sendo arrastado
para fora. Continua a dar braçadas, mas está exausto.
A força dos músculos esgotou-se; sua respiração está curta
e presa.
É preciso ter calma. Vira-se de barriga para cima e tenta se
manter assim, sem exigir nenhum esforço dos braços
doloridos, que estende na lateral do corpo, enquanto as
pernas se movimentam, dando equilíbrio ao corpo . Mas
vê que uma onda grande se aproxima. Mal tem tempo para
voltar-se e enfrentá-la. Por um segundo pensa que ela vai
desabar sobre ele, e consegue dar duas braçadas em sua

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direção. Foi o necessário para não ser colhido pela
arrebentação; é erguido, e depois levado pelo repuxo.
Tem dificuldade de respirar, e vê que já vem outra onda.
Seria melhor talvez mergulhar, deixar que ela passe por
cima ou o carregue; mas não consegue controlar a
respiração e fatalmente engoliria água; com o choque
perderia os sentidos. É outra vez suspenso pela
água e novamente se deita de costas, na esperança de
descansar um pouco os músculos e regular a respiração;
mas vem outra onda imensa. Os braços negam-se a
qualquer esforço; agita as pernas para se manter na
superfície e ainda uma vez consegue escapar à
arrebentação. Vira-se de costas e deixa o corpo cansado
flutuar ao sabor das ondas que o levam de volta a praia.
Quando sente que dá pé ergue o corpo cansado e olha o
veleiro já se movimentava, frustrando-lhe qualquer
esperança de alcançá-lo.
Aparecia apenas a ponta do mastro principal. Johan lança
um berro de revolta:
- Miserável ele nos abandonou a nossa própria sorte nesta
ilha deserta.
Ananda, que se aproximara dele, tenta acalmá-lo dizendo:
- Não, acho que ele vai contornar a ilha para avaliar o seu
tamanho.
- Não seja tola, ele controlava todos os nossos
movimentos, sabia o que iríamos fazer com ele – disse
Johan desesperado.
- Vamos andar pela praia, para ver o que encontramos –
disse Ananda.
Passados alguns minutos, Johan diz:
- Veja a ponta da vela principal desaparecendo no
horizonte.

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Ananda olhou e quando viu, caiu de joelhos na praia e
chorou copiosamente.
Johan aproximou-se dela, colocou o braço sobre os seus
ombros e disse:
- Querida havemos de nos virar, afinal, ficar a sós, não é o
que queríamos
Ananda entre soluços diz:
- Só que não nessa condição de abandonados em uma ilha
deserta. E, agora o que faremos?
- Temos um facão e uma espingarda de caça com alguma
munição. Sobreviveremos.
É possível a sobrevivência sem comida por longos
períodos, desde que haja água para beber e água temos em
fartura.
Johan abraçando Ananda e colocando sua cabeça apoiada
no seu peito, lhe disse:
- Querida! Preste bem atenção no que eu vou dizer. A
vontade de sobreviver e o fator mais importante. E nós
temos essa vontade, além disso, temos um ao outro, o que
nos dá coragem para enfrentar as vicissitudes deste
isolamento.

A ILHA DE DEUS

PRIMEIRA PARTE - EPOCA ATUAL

CAPITULO IV

OS HABITANTES DA ILHA

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O medo, o desespero e a solidão, são perigos mentais, que
devemos conhecer e conviver com eles. Devemos lembrar
sempre disto: “ A vida mesmo em condições inumanas,
vale a pena ser vivida”. O medo tem de ser dominado e
convenientemente orientado, ou pode nos levar ao pânico.
O pânico é a resposta mais destrutiva de uma situação de
sobrevivência. O pânico pode nos levar ao desespero, o
qual pode começar por quebrar a nossa vontade de
sobreviver. Posso lhe assegurar que você está protegida,
eu sou um marujo, filho de marujo. Tenho treinamento
para sobreviver em locais que apresentem grande perigo.
Sei como fazer um abrigo provisório, o que faremos, antes
de construir um abrigo definitivo.
O que acha de começarmos a construir agora o abrigo
provisório? – disse Johan, acariciando o braço de Ananda.
Eles levantaram e se dirigiram a uma palmeira, Johan,
usando um facão, cortou diversas folhas. Atravessou um
pedaço de pau, obtido de um galho seco. Aproveitando
uma arvore com uma forquilha, como suporte. Apoiou as
folhas da palmeira uma do lado da outra, bem unidas.
Amarrou-as com cipó e logo estava feito o abrigo
provisório, que serviria para passarem a noite.
Ela logo chegou. O casal de abandonados, no interior do
abrigo, na escuridão total e de um silêncio absoluto,
quebrado apenas pelo estalido ocasional de um galho que
atritava no outro forçado pelo vento que levemente
soprava. O que exercia em Ananda um efeito aterrador.
Ela abraçada a Johan que a amparava envolvendo-a em
seus braços.
Para que você fique confiante, vou lhe contar a minha
vida, antes de conhecê-la – disse Johan

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Meu pai era um norueguês. Disse minha mãe, que eu me
parecia muito com ele, salvo pela minha cor que, esta eu
herdei de minha mãe, que era uma caribenha. Eles se
conheceram, quando o navio em que ele estava
embarcado, atracou no porto de Porto Príncipe. Minha
mãe que era uma garota que servia um dos cabarés,
freqüentados pelos marujos. Ela se apaixonou por ele e
quando ele partiu a levou para o seu navio. Eu nasci em
pleno oceano Pacifico. Separei-me deles apenas quando
tinha dez anos, para frequentar a escola. Em todo o tempo
que estudei, passava os períodos de férias com meus pais,
abordo do navio, tendo aprendido a navegar desde cedo.
Meu pai morreu quando eu tinha vinte anos e minha mãe
durou mais dois anos e faleceu. Para tratar da minha vida,
empreguei-me como navegador de iates e após seis anos
de experiência, fui contratado pelo senhor Cabreira e aqui
estamos.
Ananda contou-lhe parte de sua história, disse que
conhecera o medo quando era pequena, na fazenda onde
seu pai era capataz, ela queria andar a cavalo, mas tinha
medo. Seu pai a carregava na frente do cavalo, ali ela se
sentia amparada, sob a guarda de mãos poderosas. Que a
primeira vez que montou sozinha, seu pai puxava o cavalo
pelas rédeas, de repente apareceu uma cobra, saída de um
arbusto, o cavalo se assustou e empinou jogando-a no
chão. Seu pai na tentativa de segurar o animal deixou a
corda correr em sua mão, queimando-a pelo atrito. Ele
logo foi ampará-la, ela não se machucou, mas o susto
forma tremendo, fazendo-a chorar por vários minutos.
Após varias horas de conversa, Ananda adormeceu nos
braços de Johan, que ainda permaneceu em de vigília, por
algum tempo e adormeceu dominado pelo cansaço.

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Quando acordaram o sol, já estava desperto e iluminava o
interior do abrigo, entre as folhas da cobertura.
-Temos de procurar alimento, ontem não comemos nada –
disse Johan. – Iniciaremos por procurar coco babaçu.
- Por que coco babaçu- perguntou Ananda.
- Quando o encontrarmos, se encontrarmos, lhe direi o
porque.
Eles começam a adentrar na mata a procura de alimento.
Após quase uma hora de procura na mata cerrada, abrindo-
a com o facão, Johan expressando alegria diz:
- Veja Ananda, coco babaçu.
Ele subiu no coqueiro e derrubou vários cocos.
Abre um coco, de dentro dele retira uma larva, branca do
tamanho de amendoim e a coloca na boca, logo pega outra
e alcança a Ananda, que tinha feito arcada de vômito ao
velo comer a larva.
- Vamos coma é saudável e nutritiva, e o gosto é bom.
Uma mosca coloca no coco babaçu uma larva que
comendo a amêndoa, cresce, cada cem gramas de larva
equivale a 480 calorias, para saber está saudável o bicho
tem de estar vivo – disse Johan.
Ananda relutante, fecha os olhos e abre a boca, Johan
coloca o verme em sua boca e ela o mastiga e logo engole.
- É bom – disse Ananda.
Esta foi a primeira refeição que fizeram sob os auspicio da
ilha.
- Veja Johan, alguma coisa se movimentou na floresta –
disse Ananda.
Ambos pararam e se deitaram no solo, atrás de uns
arbustos e sôfregos, auscultavam o solo para ouvir algum
barulho.
Como nada ouviram e nem viram. Levantaram-se.

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- Foi só impressão sua – disse Johan.
- Não eu tenho certeza que vi alguma coisa se movendo na
floresta.
- Veja Ananda, agora eu vi, as folhas se movimentaram ali
naquele ponto.
O que devemos fazer? Correr para longe ou tentar achar
achá-lo?
- Nem um nem outro, vamos ficar ver o que é.
Escondidos permaneceram por vários minutos e de repente
puderam ver o que se movia entre arbustos na floresta
densa.
- Veja Johan é um silvícola.
- Parece um menino, que estranhas vestes ele usa, parecem
malhas feitas com palha de palmeira.
- E agora o que vamos fazer Johan?
- Apenas vamos ver em que direção ele vai e logo o
seguiremos a distância.
- ele parece ter sentido a nossa presença e está indo
embora, não conseguiremos alcançá-lo.
- Nem o tentaremos, ele é muito rápido e deve conhecer a
selva como conhece o pai e a mãe.
- Então o que faremos, seguiremos na direção em que ele
foi. Talvez encontremos um acampamento, tribo, ou seja,
lá o que for.
- Eu acho que devemos subir naquela montanha lá há
frente, de lá poderemos ver a ilha e determinar o seu
tamanho – disse Ananda.
- Tá bem, vamos lá, mas e o garoto nativo, vamos perder a
direção em que ele foi.
- Podemos avistar o acampamento lá de cima, sem que os
nativos nos vejam.
- Vamos lá.

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Ao subir o monte que apresentava algumas escarpas, após
algumas dificuldades eles chegam ao seu cume e contatam
que se trata de um vulcão adormecido. Sua cratera tinha
um diâmetro de aproximadamente, entre oitenta a cem
metros. Eles foram contornando a cratera e olhando o
contorno da ilha, tendo constatado que a ilha era de
pequena dimensão, calculou Johan que teria no máximo
uns dois quilômetros quadrados de área.
Quando eles estavam exatamente no lado oposto ao que
subiram.
- Veja Ananda! Lá em baixo.
Conseguiam ver uma clareira onde havia algumas malocas
e alguns ameríndios, que se movimentavam expondo-se ao
sol radiante. A clareira estava localizada a frente de uma
escarpa de pedras negras, sobre as pedras havia vegetação
cerrada.
- Deve ser para lá que o garoto foi – disse Ananda.
- Vamos até lá para fazer contato com os nativos.
Ele iniciaram a descida, já estavam quase chegando à área
plana quando Ananda sofreu uma torção no tornozelo,
jogando-se no chão.
- Há! Que droga, torci o pé- disse Ananda chorando.
- Fique calma que eu vou ajudá-la.
Johan examinou o pé e disse:
- Foi uma torção de tornozelo, é muito dolorido, você não
vai poder caminhar, vou ter que carregá-la.
Johan colocou Ananda nas costas e começou a empreender
a caminhada. Ela tramara as pernas na cintura de Johan, e,
com os braços cruzados sobre o seu pescoço, fazia com
que ele ficasse com as mãos livres para empunhar o facão.
- Prepare-se para falar através de sinais, pois não sei que
língua falam os nativos – disse Johan.

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- Você que é caribenho e fala diversas línguas, deve falar
com eles. E se eles forem canibais o que faremos?
- Eu dou você para eles e fujo – disse
Johan em forma de troça.
A caminhada até o acampamento avistado de cima do
vulcão, era longa e exigiu de Johan diversas paradas para
descanso. No caminho eles descobriram uma fruta que
havia em pequena quantidade na mata. Johan pegou meia
dúzia delas e levando até onde Ananda estava disse:
- Veja o que achei esta fruta chama-se noni – disse Johan,
exibindo uma fruta do tamanho de um tomate. – Coma é
saboroso, nutritivo e energético.
Ananda pegou o fruto que tinha uma coloração amarelo
esbranquiçado. Provou e disse:
- Acho o gosto conhecido, parecido com alguma coisa que
comi, mas não sei explicar.
- Pois não explique, coma que lhe fará bem.
Após um breve descanso eles continuaram a caminhada
rumo a avistada clareira. Enquanto caminhavam Johan
dizia:
- Temos de ter muito cuidado com esses aborígenes,
podem ser selvagens e até mesmo antropófagos. Há uma
técnica que diz que devemos deixar que eles nos
encontrem e façam o primeiro contato. Não devemos
exibir armas, nem fazer movimentos bruscos que possam
assustá-los.
Quando próximos do descampado, Johan parou, largou
Ananda sentada no solo e escondida atrás de arbustos e
arvores, começou avançar. Pode ver de perto o que seria a
clareira avistada lá de cima do vulcão. Havia casas ou
malocas. João contou, sete casas e dezoito nativos, sendo
alguns deles de tenra idade.

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João munindo-se de coragem se fez ver pelos nativos, que
desconfiado o olharam e no primeiro momento recuaram,
diante da aparição.
Johan parado esperou que eles tomassem as primeiras
iniciativas, fossem elas amistosas ou agressivas.
Aquele que parecia ser o líder do grupo fez um movimento
de aproximação rápida. Johan permaneceu imóvel. Eles
foram se aproximando e o cercando. Johan pode ver de
perto as suas vestes e sua pele. As roupas eram feitas de
uma espécie de tecido tramado com fibras de folhas de
palmeiras. Uma espécie de saiote que lhes cobria da
cintura até os joelhos. No tronco uma espécie de blusa que
ia dos ombros ao ventre. Seus cabelos longos e lisos. Não
tinham nenhuma semelhança com os cabelos dos
ameríndios que habitavam as ilhas da polinésia.
Johan não sabendo o que fazer aponta para si e rodando as
mãos uma em volta da outra, querendo dizer que teria
vindo de muito longe.
Aquele que parecia ser o líder. Junta as mãos em forma de
cunha e faz movimentos para frente e para trás, querendo
dizer que ele teria vindo de barco. Johan se abaixa sobre a
areia, pega um pedacinho de madeira e começa a desenhar
um veleiro, ondas e a ilha onde estavam. O ilhéu aponta
com o dedo para o barco e faz um gesto de interrogação,
perguntado onde está o barco. Johan entende a pergunta e
faz com as mãos um gesto de que teria ido embora. Eles
fazem um gesto de decepção, todos estavam atentos ao
dialogo por sinais.
Johan vendo que os nativos não portavam qualquer
espécie de armas, fez sinal com a mão para que
esperassem, movimentando ambas as mãos abertas para
baixo, com os braços fez sinal que iria para a floresta e

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que voltaria. Afastou-se e logo surgiu com Ananda nos
braços. O grupo estava ali parado. Quando Johan largou
Ananda na areia ela, falando em inglês perguntou:
- Johan que língua eles falam?
- Nos falamos inglês respondeu o líder dos nativos.
Johan sacudindo a cabeça, disse:
- E eu como um idiota falando a língua dos sinais com
eles.
Os olhos cinzentos do líder assumiram uma expressão
penetrante. E perguntou:
Como chegaram aqui? Outros repetiram a pergunta quase
que em coro.
Johan relata a história do abandono na ilha deserta,
omitindo o romance que o originara.
E, ao final pergunta e vocês como chegaram aqui. Se
falam inglês e tem a pele clara certamente não são nativos
da ilha.
- Ledo engano, respondeu o líder. Todos nós nascemos na
ilha, nossos antepassados aqui chegaram após um
naufrágio do navio em que viajavam.
Ananda pergunta:
- Há um meio de curar o seu pé torcido?
- Sim - respondeu um jovem - eu sou médico.
O casal recém-chegados, se olharam em sinal de
interrogação. Mas nada disseram.
O jovem se aproximou de Ananda olhando para Johan
disse:
- Permite que eu a examine?
- Por favor – disse Johan.
O jovem, dirigindo-se a Ananda disse:

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- Está fora do lugar, posso recolocá-lo, mas previno-a que
ira doer, um pouco, pois já faz algum tempo que foi
deslocado.
Com grande habilidade o jovem usando ambas as mão
uma em cada lado do pé faz um movimento brusco no pé.
Ananda da um grito de dor e o jovem médico diz:
- Pronto está no lugar.
Ele, o médico, parecia não ter mais do que vinte anos, o
que causou espécie a Johan, que disse:
- Como pode haver um médico de tão tenra idade numa
ilha deserta?
- Aquele que aparentemente era o chefe dos ilhéus,
respondeu:
- Nós estamos aqui nesta ilha há mais de um século e tudo
o que sabemos foi nos ensinado pelos nossos ancestrais.
Ele recebeu todos os ensinamentos, de um médico, que
recebeu de um médico, que recebeu de um médico e assim
de geração em geração até chegar na atual.

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A ILHA DE DEUS

PRIMEIRA PARTE - EPOCA ATUAL

CAPÍTULO V

O DEUS DA ILHA

Willian o suposto líder do grupo, convidou Johan para


levar Ananda a sua casa. A casa construída de paus
roliços, na vertical, justaposto, um do lado do outro,
fechavam um circulo, que não tinha mais do que dez
metros de diâmetro. Paus roliços com folhas de palmeiras,
serviam de cobertura. Uma tarimba, nas dimensões de uma
cama de casa, colocada em um dos costados, uma mesa
construída em toras de madeira, bancos em seu contorno
em número de quatro. Uma espécie de fogão a lenha,
construído em pedra, completava os moveis da casa.
Johan colocou Ananda sobre a cama dizendo:
- Aqui poderá descansar.

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Referindo-se ao anfitrião disse:
- Quantas pessoas habitam esta casa?
- Apenas eu e minha mulher. Nossos pais moram na casa
ao lado.
- Quantos habitam a ilha?- perguntou Ananda.
- Somos um total de vinte e dois.
- Vi algumas crianças ao chegar, esse número inclui as
crianças?
- Sim incluindo as crianças, somos vinte e dois.
Os vinte e dois habitantes da ilha se alimentavam de
peixes, frutos, molúscolos e larvas. Os peixes, que era o
principal alimento, pescavam de diversas formas, sendo a
mais usual a com uso de covos.
Ajudado pelo ilhéus e utilizando técnicas, as quais
dominavam, Johan construiu uma habitação para ele e
Ananda e passaram a integrar o grupo. Ananda participava
da coleta de frutos e larvas, Johan integrou-se a equipe da
pesca.
A maloca de Johan e Ananda, fora construída ao lado da
de Willian. Passados alguns dias, Johan e Ananda ouvem
uma discussão entre William e a esposa.
William dizia:
- E a gora o que faremos, meu pai ainda é jovem, tem
apenas trinta e oito anos, nós não podíamos ter feito isso.
Sua mulher dizia chorando:
- Aconteceu, tomamos todo o cuidado, mas aconteceu, o
que podemos fazer?
William pergunta a sua esposa:
- Com quantos meses você está?
- Três meses, vou completar na semana que vem.
- Nós não podíamos ter feito isso ao meu pai
- disse

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William, irritado. - não sei como vou dizer isso ao meu
pai, ele ainda é tão jovem.
Johan e Ananda nada entenderem, a não ser que a esposa
de William estava grávida.
De repente, ouve-se um som inigualável, que ecoou por
três vezes.
Os ilhéus abandonaram suas casa e se colocaram no pátio.
William disse aos neófitos:
Deus está chamando.
Todos começaram a caminhar, dirigindo-se para a entrada
de uma caverna existente na escarpa a mais de cem metros
de onde estavam as casas.
Os recém chegados, sem nada dizerem, apenas trocando
olhares demonstrando surpresa os seguiram.
Chegaram à encosta escarpada da montanha.
A rocha fora cortada, formando uma parede lisa, onde ao
centro havia uma porta de pedra que, ao girar, abria-se
revelando uma abertura estreita com uma escada quase a
prumo. A escuridão era total, chegando a causar arrepios
em Ananda e Johan. O cuidado deveria ser total, passos
cautelosos e seguros. Johan a frente de Ananda e atrás do
último nativo, seguravam-se a uma espécie de corrimãos
em ambos os lados da escada. Johan ao passar de um
degrau para outro, batia com o calcanhar da bota na
guarda do degrau e deixava o pé baixar até encontrar a
soleira do degrau seguinte. Ananda mal conseguia
acompanhar Johan, movimentando-se com cautela,
agarrada no braço forte que a amparava. Assim, andaram
por longo tempo. Notaram, que quanto mais desciam,
mais rarefeito ficava o ar. Assim eles chegaram ao final da
escada, descortinando a frente um salão de grande
dimensão, onde se podia ver uma luz azulada, que deixava

41
a ambiente completamente iluminado. A luz parecia
sair de uma fenda na rocha.
Os nativos colocaram-se a frente da grande luz
azul que brotava da fenda. Johan e Ananda
pararam a uma pequena distância para acompanhar
os acontecimentos.
Ananda, nesse momento, tinha todos os músculos
retesados, estavam duros como pedra. O pé traumatizado
doía, por isso se amparava no ombro de Johan. Cheia de
curiosidade acompanhava o desenrolar dos
acontecimentos.
Johan, não menos tenso que Ananda, mantinha a
respiração ofegante pela evidente pouca ventilação do
ambiente, que tinha o oxigênio consumido pela respiração.
Era como estar no nível do mar e ir a cem metros de
profundidade em um instante. Náusea e tonteira
começavam a sentir. Seus ouvidos pipocaram. De repente
ouviu-se o som que os chamara antes.
Um dos nativos se aproximou do local de onde brotava a
luz, com ambas as mãos, movimentou uma pedra fazendo
com que a luz ficasse tênue, quase penumbra. O ar que
vinha da fenda enriquecia o ambiente com oxigênio. Johan
lutou contra o reflexo da náusea e relaxou o peito,
enquanto seus alvéolos pulmonares se dilatavam.
A penumbra dominou o ambiente. Todos se colocaram
sentados ao solo em forma de meia lua. Johan e Ananda
foram convidados a fazer o mesmo.
O som voltou a ser ouvido, todos atentos, num silêncio
sepulcral olhavam para uma parede lisa. Johan voltou aos
seus onze anos.
Deitado em sua cama na cabina de comando. Tudo
escuro, o balanço do navio, ele podia ver inúmeros
fantasmas flutuarem pelo ar. Ele cobria a cabeça e

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soluçava seu medo, por horas a fio, num sussurro mudo. A
situação era idêntica, nada podia fazer a não ser sufocar
o medo e assistir o desenrolar dos acontecimentos.
De repente o ranger da pedra que se movimentava no
centro da parede, um raio de luz invade o ambiente através
da fenda da porta que se abria lentamente, clareando tudo
como o mais claro dia de sol.
A luz escondia o que estava do outro lado da porta de
tanta intensidade. Algo se movia no interior da luz
ofuscante, tinha a forma arredondada como um cogumelo
resplandecente e se movimentava como estivesse planando
no ar.
Nesse momento Ananda alcança a mão de Johan e, por
medo, lhe cravava as unhas. Ele sabia que o momento era
de imensa expectativa, sabia que Ananda teria medo. O
medo, aprendera com seu pai, era seu inimigo maior, que
mutila mais depressa do que qualquer artefato de guerra.
Olhou para Ananda que estava extasiada diante do que os
olhos identificavam. Um ligeiro sorriso aflorou nos lábios
de Johan que sussurrou.
- Fique tranquila que, seja o que for, é de paz, se não
fosse, nos não estaríamos aqui.
A aparição transmitia uma sensação nitidamente
incorpórea.
Johan sussurra a Ananda:
- Acho que até o fim dos meus dias vou debater comigo
mesmo o significado disso que estamos testemunhando.
A porta de pedra totalmente aberta deixava parecer um
imenso salão escavado na rocha. Tinha forma
arredondada, com projeções de picos ao redor e um grande
anel circundando todo o seu perímetro, o qual, emitia luz
de alta intensidade.

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Os espectadores em silêncio recebiam diretamente em
seus cérebros a seguinte mensagem:
- Os recém chegados são bem-vindos ao nosso habitat.
Devem ser instruídos nos nossos costumes e regras de
sobrevivência e os tributos que deverão pagar se lês
forem quebradas. Devem ser informados dos nossos
mandamentos e que assim vivam como se aqui fosse o
paraíso.
Johan e Ananda, nunca haviam visto algo parecido. A luz
se movimentava e em seu interior o espectro, parecendo
que a luz provinha dele próprio, não permitia que fosse
visto em toda a sua forma.
Diga William o que quer me comunicar?
William baixou a cabeça, fechou os olhos e começou a
falar com a voz da mente. Narrando o que havia
acontecido com sua esposa, grávida de três meses.
- Sabe o que deve ser feito quando o dia chegar. Nossas
regras de sobrevivência não podem ser quebradas.
O espectro deu uma volta completa pelo salão, parando
próximo de cada um por alguns momentos, o que pareceu
a Johan e Ananda que falava com cada um com a voz da
mente.
Quando se aproximou do casal de neófitos parou, ambos o
olharam de perto e puderam ver a sua forma com muita
nitidez.
O topo de sua figura era redondo como um cogumelo, que
tivesse brotado sobre uma pedra arredondada. Não tinha
pés ou mãos, seu tronco terminava como estivesse cortado,
a distância, que o separava do piso era a mesma de sua
altura, sem duvida estava flutuando no espaço.
Johan e Ananda simultaneamente receberem a seguinte
mensagem diretamente em seus cérebros:

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Sejam bem-vindos, ao nosso meio, para falarem comigo,
basta que pensem e eu os entenderei. Tudo o que
pensarem eu fico sabendo. Serei o vosso protetor, porem
exijo que seja fiel às regras de sobrevivência do grupo
neste pequeno habitar.
O casal ficara tão surpreendido que nada disseram, Deus
se afastou e retornou a sua morada.
A grande porta de pedra se movimentou até o último filete
de luz haver desaparecido.
Ao retornarem ao acampamento, Johan pergunta a
William:
- Você havia dito que Deus estava chamando. Acabamos
de falar com Deus é isso?
- Sim, ele assim é chamado por nós, foi o nome que lhes
deram os nossos ancestrais ao encontrá-lo.
- Deus na concepção da palavra, ou é um simples nome
que lhe foi dado?
- Quando você e sua esposa estiverem completamente
integrados no nosso meio, lhes daremos o diário do
imediato para que possam tomar conhecimento de tudo.
O tempo foi passando, a barriga da mulher de William,
cada vez maior, e a cada dia que se passava, mais os
ânimos se acerbavam. Johan e Ananda, sabiam que
alguma coisa grave estava por acontecer com relação ao
nascimento do filho de William, mas não queriam ser
indiscreto, acompanhando de perto os acontecimentos
como eles se apresentavam.
Certo dia eles puderam ouvir um dialogo que William teve
com seu pai. – dizia o pai:
- São as regras que aceitamos para a nossa sobrevivência
a várias gerações, nada podemos fazer a respeito, a não ser
aceitar que as devemos cumprir.

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- Mas pai, isso não é justo.
- Pode até não ser justo, mas nós os descendentes do
imediato, lideres deste grupo, não somos nós que
subverteremos a ordem e as leis que regem a nossa
sobrevivência. Deus assim o quer e assim será.
Johan e Ananda foram chamados a comparecer na cabana
do pai de William. Lá chegando foram recebidos por
William que se fazia acompanhar pelo seu pai.
- Entrem, por favor, e sentem-se:
Em uma pequena mesa estava um livro negro de folhas
surradas, fechado com um atilhos de cipó.
O pai de William, pegou o livro e o alcançou a Johan e
disse:
- Aqui neste livro estão os registros do imediato. Sua
narrativa se dá nos mínimos detalhes, e contem a
explicação de tudo o que está acontecendo. Mas para que
lhes seja permitido tomar conhecimento da nossa história,
devem jurar que cumprirão todas as nossas leis.
Estão dispostos a firmar este compromisso?
- Sim, estou – disse Johan.
- Sim, estou – disse Ananda.
- Então repitam o juramento que vou dizer:
- Eu ... juro e prometo de livre vontade, sem qualquer
coação psicológica ou material, não revelar a não ser a
meus descendentes diretos, ou a um legitimo membro do
nosso grupo, tudo aquilo que tomar conhecimento ao ler o
diário do imediato. Se eu for perjuro permito que minha
língua e meu coração sejam arrancados e lançados no
oceano, para servir de alimento aos peixes. E assim que
Deus me ajude.
- Aqui está o diário do Imediato façam boa leitura, após lê-
lo.

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A ILHA DE DEUS

SEGUNDA PARTE - ANO DE 1895

CAPÍTULO VI

O NAUFRÁGIO

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Final do século dezenove. Ano de mil oitocentos e noventa
e cinco. O navio de bandeira americana parte do porto de
Point Arena, rumo ao Hawaii. A bordo, a tripulação
composta de: capitão, imediato, oficial piloto,
contramestre e os marinheiros: chefe de máquinas,
maquinista, eletricista, mecânico de bordo, um cozinheiro,
dois auxiliares de cozinha e dois garçons.
Além de um carregamento de máquinas e ferramentas
para indústria, como passageiros, um grupo teatral,
composto de dez atrizes, seis atores, um diretor e três
ajudantes de palco.
Um casal de aposentados, um médico, uma professora, e
mais vinte e oito passageiros de ambos os sexos, que
compunham uma excursão pelo Hawaii.
Total 62 pessoas embarcadas.
Já estavam com dois dias de viagem, quando o marinheiro
chefe de máquinas, se dirigiu ao contramestre e informou:
- Contramestre! Temos um problema na casa de máquinas,
a caldeira está com vazamento em um dos tubos, o
vazamento está aumentando e o fogo mal está se
sustentando, por isso a pressão está caindo. Em minha
opinião, devemos parar para conserto.
- Temos todos os materiais a bordo para fazer o reparo?
- Sim já verifiquei isso com o mecânico de bordo, ele
confirma que tem todos os materiais necessários para o
conserto.
Quinze minutos depois, o Contramestre diz ao chefe de
máquinas que o comandante autorizou a parada para
conserto do gerador de vapor.
O conserto levou três dias, sendo dois dias para o
esfriamento e limpeza da caldeira, quando o conserto

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estava sendo efetuado, uma brusca mudança de tempo
encobriu o céu, enquanto rajadas de vento, anunciando a
chegada de um temporal. A chuva logo se projetou,
seguida de ventos de pequena intensidade, com capacidade
de levantar ondas de mais de dois metros e, estando o
navio ancorado, começou a se mover, ao impacto das
ondas. O imediato determinou que o conserto que já
estava em seu término fosse concluído o mais rápido
possível, pois teriam de levantar ancoras e enfrentar a
tempestade de frente, quando ela aumentasse de
intensidade, o que iria acontecer com toda a certeza. Os
trabalhos logo foram concluídos e o fogo foi ateado na
fornalha e, em meia hora já havia vapor suficiente para
girar os motores.
O navio continuou seu destino, enfrentando as ondas de
proa, a intensidade da tempestade, como previra o
imediato, continuou a aumentar de intensidade. As ondas
estavam com altura superior a dois metros, mas tudo
estava correndo dentro do esperado, quando se ouviu um
estrondo ensurdecedor. Um grande volume de vapor saia
pela lateral do navio. O imediato correu para a casa de
máquinas. A água estava invadindo. O corpo do
marinheiro operador de caldeira flutuava sobre a água que
entrava por um buraco no casco. O imediato fechou a
porta, para isolar a casa de máquinas e manter a
embarcação flutuando. Correu e anunciou um possível
naufrágio, que uma das caldeiras, a que havia sido
consertada teria explodido. O capitão, após se inteirar dos
fatos ordenou que baixassem os botes salva-vidas e que,
em ordem, iriam abandonar o navio. Primeiro iriam às
mulheres e crianças, com parte da tripulação.

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A ordem dada foi executada, no primeiro bote salva-vidas,
iria o imediato, que o comandaria até a chegada do
salvamento, mulheres e crianças e o médico, mais três
marujos que remariam. Algumas ferramentas foram
colocadas no bote, como machados, facas e garfos
tridentes de movimentar feno, retirados do carregamento
de ferramentas. O mínimo suficiente para se defenderem
dos tubarões em alto mar. O imediato pega o seu livro de
registros diários, um tinteiro, uma pena e a luneta.
O médico junta o máximo que pode de medicamentos e
aparelhos de seu uso.
A água e os alimentos foram divididos em quatro partes
iguais, pois eram quatro os botes salva-vidas. O primeiro
bote com sua carga humana completa começa a ser
descido. A bordo: O imediato, três marujos, sete atrizes, o
médico, uma menina de onze anos, filha de uma das
atrizes e um menino de dez anos, filho da professora que
também fazia parte do grupo.
Total de quinze pessoas a bordo. Fazendo com que o bote,
como se diz vulgarmente, estivesse de pau na água, isto é
com a borda do costado na flor d’água.
Os outros botes salva-vidas, com seus náufragos a bordo,
foram arreados e afastados do navio que estava
submergindo com rapidez. De longe os náufragos,
estarrecidos, viam o navio afundar nas águas do Pacífico.
No bote salva-vidas, os marinheiros se concentraram na
popa, o imediato na proa e os demais a bombordo e
estibordo. Os homens se revezariam a cada hora, dois a
dois remariam. As mulheres e crianças seriam poupadas
de inicio, podendo tomar parte nos remos caso fosse
necessário. Os barcos se uniram, logo após o navio haver
submergido totalmente. O comandante, por não saber onde

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estavam, sugeriu que remassem em sentidos postos,
aumentando assim a possibilidade de serem encontrados.
Os barcos se afastaram uns dos outros rapidamente, logo
não mais se enxergavam.
O imediato de pé na proa examinava o oceano com sua
luneta. O contramestre assumira o primeiro turno no
remo, junto com o médico. A bombordo, o marinheiro
eletricista colocara-se ao lado das atrizes. A estibordo o
marinheiro mecânico, conhecido como pregador, por ser
uma espécie de curandor, misturado com pastor. Sempre
carregando um pequeno terço na mão direita e falando
palavras proféticas. Acomodara ao lado da professora e
crianças, rezavam em voz baixa segurando o terço
firmemente, com ambas as mãos postas sobre o peito. No
bote, os quatro marinheiros e onze passageiros.
O imediato, homem Com 43 anos, magro, mas com grande
higidez física, medindo, aproximadamente um metro e
oitenta. Tez morena, barba rala, por fazer, cabelos longos,
negros como as penas de um abutre, adornados por um
chapéu de abas largas com uma pena no lado direito. Suas
vestes convencionais para a época, um par de botas pretas,
calça negra e uma camisa branca, sob um casaco preto que
lhe cobria os joelhos. Parou um instante, tentando se
orientar. E, em sua primeira intervenção assim falou:
- Dentro dos conhecimentos que adquiri quando estudava
para ser um oficial da marinha mercante dos estados
Unidos da America. Nas primeiras 24 horas, não devemos
comer nem beber. Tal procedimento se faz necessário para
forçar uma alteração do nosso metabolismo, que passará a
conviver com racionamento de comida e bebida enquanto
estivermos perdidos.

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Outra recomendação para ser levada muito a sério é a
respeito à ingestão de água salgada. Em nenhuma
hipótese, nenhum de nós, nunca, mas nunca mesmo, deve
beber água do mar, pois, se o fizermos sofreremos o que é
chamado de a osmose reversa que ocorrerá no organismo
acelerando a desidratação, sobrecarregando os rins, nos
levando fatalmente à morte.
O tédio, a incerteza e a desesperança, serão inimigos
implacáveis, durante o tempo em que estivermos perdidos
no oceano, para neutralizá-los, vamos determinar tarefas a
todos. Eu como imediato, no comando deste bote salva-
vidas. Incumbo-me de ficar atento, com minha luneta,
examinando o oceano a procura de um barco que nos
possa salvar.
As senhoras e as crianças estarão encarregadas de retirar a
água do bote e mantê-lo limpo, quando digo limpo, digo o
suficiente para se chover a qualquer momento, possamos
recolher água para bebermos. O médico, além de remar
um dos turnos, se encarregará da alimentação e hidratação
de todos. Incumbo o menino a me substituir na observação
do oceano, enquanto eu estiver no meu turno de remo. E
para concluir, como comandante deste bote salva-vidas, eu
lhes prometo ser implacável, fazer tudo, até mesmo o
impossível, para mantê-los vivos, sãos e salvos até que
sejamos resgatados. Colocarei toda a minha experiência e
conhecimento para atingir este objetivo. Mas não tolerarei
insubordinação, ou revolta e assim que Deus me ajude.
O imediato tirando de um dos bolsos de seu casaco longo,
um livro de anotações e uma caneta com tinteiro, disse:
- Este livro servirá de diário de bordo, nele registrarei
todos os acontecimentos importantes, enquanto estivermos
perdidos. Iniciarei minhas anotações, registrando o nome

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de cada um a bordo. Iniciarei declinando o meu nome e o
registrando. Sou o imediato Alfred.
- Marinheiro Eletricista Anselmi, disse o marujo.
- Rodrigo, mais conhecido por Rodrigão, disse o marujo
mecânico.
- Afrânio, disse o marujo contramestre.
- Arnold, disse o médico.
- Elisabet, disse uma das atrizes, mãe deste menino,
apontando para Josef.
- Angelina, atriz e mãe de Justine, apontando para afilha.
As demais na sequencia disseram: Martha, Stella,
Cristine, Michelle, Sheila, Bertina, e finalmente as
crianças, se pronunciaram:
- Sou Justine, tenho onze anos, e este é Josef de dez anos.
O imediato tudo registrou, guardou o livro entre seus
pertences.
Passadas às 20 horas de jejum absoluto, todos estavam em
ponto de desmaiar de fraqueza. O médico pediu licença ao
imediato comandante e disse:
- Senhor! Entendo que devamos começar a hidratar
aqueles que estão em pior situação, que talvez já estejam a
mais de vinte e quatro horas sem ingerirem água de
espécie alguma, pois não teriam bebido água antes de
saírem.
- Concordo, mas que seja lhes dado o mínimo necessário
para mantê-los hidratados, até que a primeira ração seja
fornecida a todos. Passada as vinte e quatro horas. As
rações foram distribuídas com parcimônia, os náufragos
receberam as mesmas quantias de água e alimento, salvo
aos remadores que receberam uma ração mais robusta.

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Dois dias haviam passados e nenhum sinal de terra firme.
Os remadores já estavam exaustos, e o revezamento, nos
remos, ocorria de meia em meia hora.
De dia o Sol queimava a noite o frio os obrigava a se
manterem envoltos em cobertores adormeciam sem que
pudessem remar. E, por estarem exaustos, o imediato
determinou que dormissem à noite e remariam durante o
dia. Assim, eles atingiram o quinto dia de sobrevivência
no Oceano Pacífico, dentro do bote salva-vidas. Por volta
das cinco horas da tarde, surgiu uma barbatana rasgando a
superfície do oceano. Logo outra foi vista, em poucos
minutos a barco estava rodeado de tubarões, que com seus
focinhos batiam no barco. Os sobreviventes, usando
machados e garfos, batiam em suas cabeças para afugentá-
los. A batalha durou mais de duas horas, e finalmente os
tubarões desistiram e se afastaram.
Sétimo dia, a água estava pouca, logo seria de ser
racionada ao extremo. Mais uma vez o imediato falou aos
sobreviventes.
- Daqui em diante, nossa situação é de penúria, cercados
de água podemos morrer de sede. Há duas hipóteses de
obtermos água sem que seja salgada. Uma é esperarmos
que a chuva caía em grande quantidade capaz de acumular
no bote salva-vidas quantia capaz de suprir as nossas
necessidades. A outra é de pescarmos, pois a água que
contem os peixes é doce e em comendo-os, estaremos nos
hidratando e nos alimentando ao mesmo tempo.
Algumas horas havia passadas após a primeira ração,
quando Angelina, em tremedeira, coloca a mão sobre o
peito e começa a respirar com dificuldade. O médico
Arnold, logo foi em seu socorro, ela em soluços dizia que
não conseguia respirar e que tinha uma dor no peito e que

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sua garganta esta fechando. O médico pegou o seu pulso e
olhou para o relógio pulseira e contou os batimentos
cardíacos. Retirou do bolso o estetoscópio e auscultou os
batimentos cardíacos, e disse a paciente.
- Fique calma, não há nada com o seu coração, é apenas
uma crise de pânico, passará em alguns minutos, basta que
você se acalme.
O que aconteceu, conforme dissera o médico, Angelina
voltando à normalidade.
O imediato vendo que os náufragos estavam desanimando,
para levantar o moral, se levantou na proa e disse:
-Qualquer um que desejar, poderá contar a sua própria
história, ou algum causo. Em o fazendo, manterão o grupo
atento e com isso dissiparão a angustia que a atual situação
nos está impondo.
Elisabet levantou a mão. O imediato disse: - Ouçam o que
dona Elisabet tem a nos dizer:
- Meus amigos! Não quero falar de mim e sim de meu
filho Josef.
No período de gestação, só tive alegrias, nunca tive
qualquer complicação. Josef nasceu de parto natural, um
belo menino, igual a tantos outros que estavam no
berçário.
Quando sai da maternidade, de volta ao lar, comecei a
perceber que o meu menino, tinha um comportamento
singular, raramente chorava e nunca solicitava qualquer
alimento. Ele crescia como as outras crianças, mas
começou a falar frases inteiras aos oito meses.
Com dois anos e meio, lia jornais.
Os que ouviam entreolharam-se, duvidosos. E, ela
continuou:

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- O pai deu-lhe um jogo de peças para montar figuras e
ele começou a elaborar peças geométricas combinando
diferentes partes com precisão. Eu tinha a impressão de
que nós éramos como para ele, seres estranhos com os
quais ele estava tentando se comunicar.
Quando Josef tinha dois anos começou a desenhar figuras
que, à primeira vista, eram abstrações nas quais se
misturavam tons de azul e violeta. Quando psicólogos
examinaram os desenhos, disseram que o garoto estava,
provavelmente, tentando representar a aura das pessoas
que via ao seu redor. Aos três anos, Josef começou a
conversar com seu pai sobre o Universo. Ele sabia nomear
todos os planetas do Sistema Solar e seus respectivos
satélites. Ele falava também nomes e número de Galáxias.
Isso pareceu assustador pensamos que o nosso filho estava
fantasiando; por isso, resolvemos conferir se aqueles
nomes realmente existiam. Consultamos livros de
astronomia e ficamos chocados ao constatar que Josef, de
fato, sabia muito sobre aquela ciência. O que é lastimável
é que este menino, meu filho querido, com todo o prodígio
que tem, esteja perdido em um bote conosco, tendo um
destino incerto.
Elisabet começou a chorar. Josef, que estava na proa, foi
para junto dela e a consolava passando-lhe a mão sobra à
cabeça.

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A ILHA DE DEUS

SEGUNDA PARTE - ANO DE 1895

CAPÍTULO VII

TERRA A VISTA

Por alguns instantes, todos ficaram mudos, apenas ouvia-


se o marejar das ondas sobre o costado do bote. Quando o
contramestre levantou o braço. O imediato disse:
- Ouçamos o que tem a dizer o nosso contramestre.
- Sou marujo dês de que me conheço por gente. Nunca
estive numa situação como esta, que enfrentamos no
momento. Nunca fui religioso, às vezes até um tanto
descrente. Mas hoje peço a Deus que vele por nós e que,
nos conduza sãos e salvos até as nossas famílias. Sou

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viúvo e tenho um casal de filhos que dependem de mim
para viver. Que Deus nos ajude e que eu volte para casa.
Mais uma vez o silêncio foi determinante estimulo para
que outros contarem suas historias.
Os olhos do médico perscrutaram as águas
incessantemente, e se fixaram em um ponto vago no
horizonte.
O médico Arnold era um homem de média estatura, não
gordo nem magro, com óculos com aros preto e uma calva
avermelhada, que brilhava diante dos raios de sol que a
iluminavam.
Alguns instantes depois, ele voltou a olhar os
companheiros e disse:
- Era o ano de 1880 e eu estava clinicando em
Chicago, quando fui chamado por minha mãe para ir
à Illinois, uma cidadezinha a uns cem quilômetros de
Chicago, onde ela morava. Era uma zona
absolutamente matuta, sem nenhuma cidade maior à
distância de trinta quilômetros, em qualquer direção.
Quando nos tempos de universidade, eu a encontrava
umas três vezes por ano. Ela era uma mulher ainda jovem,
aos seus quarenta e cinco anos. Mas aquele momento era
especial, ela estava com cinquenta anos e me tinha
chamado, pois estava doente e em estado terminal. Uma
doença grave, em poucos dias, poderia levá-la a morte.
Cheguei, ajoelhei-me ao lado de seu leito, ela me olhou e
estendeu a mão. Eu a peguei e a beijei. Ela, com a outra
mão, acenou para que eu me aproximasse. Em voz
sussurrante disse:
- Eu o criei sozinha, com muita dificuldade e privações.
Trabalhando de dia e a noite, consegui que estudaste até se
formar na universidade de medicina. Nunca precisei do teu

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pai para nada, também nunca lhe disse quem era o seu pai.
Mas neste momento, não mais posso guardar tal
revelação. A você caberá a decisão de procurá-lo ou não.
Eu era muito jovem e fui passar férias no Hawaii, lá
conheci o teu pai. Ele era também um jovem, filho de um
grande proprietário de diversos negócios. O homem mais
rico do lugar. Passamos o veraneio juntos e eu fiquei
grávida. Ele queria casar comigo, mas seu pai foi contra e
quando teve oportunidade me disse que eu engravidara de
propósito para fisgar o filho dele.
Deixei-o falando sozinho, e naquele mesmo momento,
deixei o Hawaii sem procurar o seu pai. Nunca mais ele
me viu. E eu nunca mais soube noticias dele. O nome dele
é Arnold, como o seu, o sobrenome Wilhermann.
Ela segurando a minha mão entrou em óbito. Eu embora
médico nada pude fazer. Um mês após os funerais de
minha mãe, resolvi ir ao Hawaii, a procura de meu pai
quando fui colocado nesta missão a qual estamos todos
nós.
O marujo mecânico, um homem de mais de cinquenta
anos, de baixa estatura, rosto largo e atarracado, cabelo
apenas no contorno da cabeça, barba comprida nos lados e
no queixo, tendo o bigode raspado, olhos azuis brilhantes,
sobrancelhas marcantes, nariz acunto, boca larga formada
por lábios grossos e pele avermelhada. Na cabeça um
gorro de lã, igual a camisa que também era de malha de lã,
a calça, de brim surrado, suspensa por um par de
suspensórios de elástico preto, nos pés um par de botinas
do tipo naval.
O “pregador”, levantou e disse:
- Nada tenho a dizer sobre mim, sou um simples marujo,
que teve a dádiva divina de ser escolhido por Deus para

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arrebanhar as ovelhas perdidas. Desejo nesta hora de
incerteza para todos nós, fazer uma oração, ao altíssimo
para que nos guia por estas águas infinitas.
“Nos como criatura de Deus feita à sua semelhança e
remida com o seu santíssimo sangue, vos ponho preceito,
demônio ou demônios, para que cessem os vossos delírios,
para que esta criatura não seja jamais por vós
atormentada com as vossas fúrias infernais".
"Pois o nome do Senhor é forte e poderoso, por quem eu
vos cito e notifico que vos ausenteis deste lugar para
fora. Eu vos ligo eternamente no lugar que Deus
Nosso Senhor vos destinar; porque com o nome de Jesus
vos piso e rebato e vos aborreço mesmo do meu
pensamento para fora. O Senhor esteja conosco, que
estamos perdidos neste imenso oceano, para que tu,
demônio, não possas jamais atormentar as almas que
estão a deriva neste barco, todas criaturas do Senhor.
“Fugi, partes contrárias, que venceu o leão de Judá e a
raça de David".
"Amarro-vos com as cadeias de São Pedro e com a toalha
que o santo rosto de Jesus Cristo, para que jamais possais
atormentar estes viventes e que a salvação esteja próxima
de todos nós, amem". Todos fizeram o sinal da cruz e o
orador sentou-se.
O silêncio voltou a dominar, e como ninguém se
apresentava, o imediato falou.
- Atenção! Quero que a exemplo daquele que falaram
contando as suas histórias. Peço que todos que ainda não
falaram se apresentem, podem dizer o seu nome e outros
dados pessoais. Aquele que quiserem contar a sua história
poderá fazê-lo, dando o seu nome.

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Eu iniciarei: Chamo-me Victor, tenho trinta e sete anos,
formado na Academia Naval dos Estados Unidos da
America. Era o imediato do navio comercial afundado.
Tive uma infância serena. Sou noivo e iríamos casar, logo
após esta viagem. Minha noiva certamente me espera. O
que me da vigor para enfrentar todas as agruras desta
jornada. O próximo:
Uma das atrizes levantou o braço e disse:
- Sou Martha, atriz, podem me chamar de pequena, que é o
meu apelido domestico. Tenho 41 anos, sou casada, meu
esposo embarcou em outro bote, esta é minha filha, de
doze anos que se chama Justine.
Martha uma mulher de pequena estatura, podia-se dizer
que era pequena até demais. Tinha um metro e meios, seu
corpo, podia se dizer que era normal, se não fosse pelo
fato de suas pernas serem curtas em relação ao tronco, o
que lhe dava a pequena estatura. Seus cabelos, negros, tez
morena clara, cabelos abundantes e soltos sobre os
ombros, seus olhos de um negro brilhante, sob
sobrancelhas bem formadas. Seu nariz, delicado com
também a sua boca desenhada por lábios finos e sensuais.
Cobria-lhe o corpo uma espécie de capote cinza-claro,
fechado por um cinto com uma grande fivela metálica.
Nos pés um sapato preto com grandes saltos.
- Minha história é trivial, nada de importante tenho para
lhes contar, apenas que eu era uma mulher muito feliz,
antes de entrar naquele navio, com minha família.
Assim, um a um, se apresentaram ninguém tinha uma
história que valesse apena contar aos demais.
Mais dois dias se passaram. A água já estava chegando
ao fim e estava sendo racionada a mais de doze horas. O

61
imediato resolveu avaliar junto com os demais a real
situação que se encontravam.
- Na qualidade de comandante deste barco, não posso me
furtar de expressar minha opinião sobre o grave quadro em
que nos encontramos.
Em minha opinião, o mais grave é a falta de água doce.
Por isso pergunto ao médico, o que podemos fazer para
nos hidratar, na total falta de água?
- Como médico, posso afirmar que se diluirmos um pouco
de açúcar na água do mar e tomarmos meio litro dessa
água por dia e em pequenas quantidades, digamos um gole
a cada hora, nosso organismo terá a capacidade de excretar
o sal, fazendo com que este não nos faça mal.
O contramestre, agradeceu e disse:
- Faremos isso, o médico fará a diluição e dara a medida
certa a cada um de nós a cada hora.
Nos próximos três dias a água do mar assim foi consumida
sem que causasse grandes males aos náufragos.
Passaram-se mais cinco dias, sem que qualquer sinal de
terra firme fosse avistado. Os ânimos estavam acerbados.
Uma das atrizes começou a acusar o comando do navio
pelo desastre e pela decisão errada de se separarem, que
mal ou bem, estariam mais seguros juntos, até que o
salvamento chagasse. Ela foi contida pelos demais, e
resignada silenciou.
O jovem naufrago, de pé na proa, com a luneta no olho
direito, olhava o quase infinito Oceano Pacífico. O
imediato remava, e de cabeça baixa e pensava.
Tenho de manter o moral elevado, se o desespero dominar
qualquer um deles, certamente arrastara os demais.

62
Margaret, a menina, chorava copiosamente, e em
desespero dizia que todos iriam morrer de fome e sede, e
que jamais atingiriam terra firme.
- As nuvens que surgem no horizonte é sinal de que
teremos chuva em poucas horas, devemos estar preparados
para recolher a maior quantidade que for possível. Quero
que todos os que não estão remando, peguem panos e
limpem o fundo do barco, mas que seja limpo o suficiente
para que a água que certamente irá cair, permaneça como
quando caiu limpa e cristalina – disse o contramestre.
Todos, usando panos e água do mar, trataram de limpar o
fundo e o costado do barco, retiraram os calçados e os
limparam, de forma que nada que pudesse sujar a água.
A chuva caiu e foi recolhida em boa quantidade. No
entanto tudo ficou molhado, mas o sol quente, que abriu,
tão logo a chuva parou, tudo secou e os perdidos
continuaram o seu errante caminho pelo Pacifico.
Décimo quinto dia, a água não era mais problema, as
chuvas caiam com regularidade e eles sabiam como
recolhê-la e armazená-la. Agora, outro fator preocupara os
náufragos, os alimentos tinham acabados, a última ração
tinha sido distribuída a mais de vinte e quatro horas.
O imediato falou:
- O único meio de provermos a nossa alimentação é
pescarmos. Mas, infelizmente, este fato não foi por nós
previstos, não temos nada que nos permita pescar. Por
isso, descarto essa possibilidade, salvo de aparecer algum
peixe, ou tartaruga ao nosso alcance, o suficiente para ser
fisgado pelos garfos.
Já fazia dez dias que os náufragos, nada comiam, salvo,
pedaços de roupas e papel, que umedeciam e mastigavam
por longo tempo antes de engolir.

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Alguns dos perdidos temiam a morte iminente, enquanto
outros a desejavam.
Agora a ameaça que lhes era conhecida se aproximava, um
novo grupo de tubarões cercava o bote. Um peixe que
estava sendo perseguido pelos tubarões pula desesperado e
cai dentro do bote. Quase todos se lançaram sobre o peixe
que tentava pular, enquanto os demais com os garfos e
machados tentava afugentar os tubarões, que com o
focinho batiam no costado do barco, tentando virá-lo. O
destino às vezes é prodigioso, os tubarões que os
ameaçavam lhes propiciou alimento tão necessário as suas
sobrevivências. Quando os tubarões se afastaram, um dos
marinheiros eviscerou o peixe e o dividiu em três partes.
Uma seria comida imediatamente. As outras seriam
guardadas para o dia seguinte. Os restos, como vísceras,
guelras, rabo e espinhaço seriam utilizados para atrair
mais peixes que seriam fisgados com os garfos.
Mas pela longa permanência no mar com falta de
alimentos, uma nova ameaça surgia o escorbuto.
* O escorbuto (do latim scorbutus) é uma doença que tem
como primeiros sintomas hemorragias nas gengivas,
tumefação purulenta das gengivas (inchaço com pus),
dores nas articulações, feridas que não cicatrizam, além
de desestabilização dos dentes. É provocada pela
carência grave de vitamina C na dieta.
O médico diagnosticou o escorbuto em três dos pacientes
e comunicou ao imediato que disse:
- Para evitar o escorbuto, faremos como as baleias:
comeremos plânctons. Para tento necessitamos de um
tecido de malhas o maior que for possível.
Logo uma das atrizes lhe ofereceu um chalé de malha de
algodão. Utilizando dois cabos de garfos distanciados um

64
do outro, foi amarrado o tecido em forma de concha. A
água do mar era coletada na superfície e derramada sobre
a concha de tecido. Enquanto o imediato derramava as
primeiras porções de água, sobre o tecido, esta logo sumia
nada deixando no tecido. Os náufragos se olharam uns
para os outros em sinal de reprovação da idéia. Passados
alguns minutos de trabalho, já se podia ver uma tênue
camada que mais parecia uma gosma. O Imediato raspou
sobre o pano e coletou a gosma e a deu para que o que
apresentavam os sintomas.
Cincos dias depois, todos os perdidos haviam tomado uma
porção de plânctons o suficiente para repor a vitamina “C”
no organismo.
Alimentando-se com regularidade e suprindo-se de água
das chuvas que foram abundantes. Com os restos do peixe,
pescaram outros, que com seus restos, permitiram que a
pesca continuasse. Os plânctons, os suprira de vitamina
“C”.
Assim os náufragos já estavam a noventa e três dias
perdidos no Oceano Pacifico. Quando do amanhecer do
nonagésimo quarto dia.
-Veja! Imediato, lá no alto- disse o menino.
- É uma gaivota.
Ele pega a luneta e olha para o horizonte e grita.
- Terrra a Viiisssta - da uma grande gargalhada de alegria
– Graças ao bom Deus! Estamos salvos.
Todos ficam de pé uns abraçados aos outros e rezam
agradecendo o altíssimo pelo aparecimento de terra firme.
Mais de meia hora remando e eles enxergam uma grande
pedra que, com forma trapezoidal, sendo um dos lados do
trapézio, mais baixo do que o outro. Ao seu lado esquerdo,
outra elevação rochosa, com menor altura. No lado direito

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um grande monte coberto por uma vegetação escura. Mais
meia hora de remo e eles já estavam próximo da terra,
podiam ver, a praia que terminava em uma grande área
coberta por floresta. Quando estavam a ponto de
desembarcar, podiam apreciar as belezas incomparáveis da
grande enseada, que na praia exibia um conjunto de pedras
de grandes dimensões que pela posição e forma, parecia
um grande pato acomodado em seu ninho. Outras
grandes pedras afloravam na areia branca da praia.
Finalmente o barco enterra sua proa na áreia e eles
começaram a desembarcar. Primeiro o imediato, logo a
seguir o pregador, que se ajoelhou e disse uma simples,
mas sincera oração:
- Meu Deus! Agradeço a dádiva de ternos favorecidos com
o aparecimento deste lugar. Ouso pedir mais, que este
lugar nos acolha e nos sirva para contatamos com o nosso
continente. Amem.
As demais manifestações de alegria e agradecimento se
seguiram, uns levantavam as mão aos céus e agradeciam,
outros de joelho oravam. Os descrentes corriam e gritavam
expandindo a sua alegria.
Passada a euforia restou uma grande interrogação em suas
mentes. O que seria aquela terra, uma ilha habitada, ou
uma ilha deserta?
O imediato reuniu todos e falou:
- Meus companheiros, eu na qualidade de imediato,
assumi a liderança do grupo quando estávamos no oceano.
No entanto em terra firme, vocês, se entenderem
necessário, nomear uma liderança para conduzi-los por
terra. Como marujo que sou, não tenho em terra,
conhecimentos especiais, o que me distinguia no oceano.

66
Todos confabularam e decidiram que o imediato manteria
a liderança do grupo. Após haverem comunicado a
decisão. Ele formulou os planos a seguir:
- No meu entendimento, devemos explorar esta terra que
nos está acolhendo. A primeira e mais urgente necessidade
é a de obtermos água potável. Como temos apenas um
revolver 38 e uma carabina com alguma munição. Sugiro
que nos dividamos em dois grupos, o primeiro que
encontrar água faz um disparo, para chamar os demais.
Não é aconselhável avançarmos muito para o interior da
selva, ela pode apresentar perigos que desconhecemos.

67
A ILHA DE DEUS

SEGUNDA PARTE - ANO DE 1895

CAPÍTULO VIII

EXPLORANDO A ILHA

O grupo que em que ia o imediato, após uma hora de


caminhada, chegam a uma cachoeira que despencava de
um vale elevado. A mais alta, com maior volume de água,
era ladeada por outras três de menor magnitude. A água
caia em uma bacia que terminava em um riacho que
serpenteava sobra às pedras.
A carabina foi disparada, para avisar ao outro grupo que
haviam encontrado água. Logo todos os componentes do
grupo estavam se refrescando na água da grande bacia.
Em poucos minutos o trinta e oito foi disparado. O outro
grupo havia chagado a uma grande lagoa engastada na
rocha solida que a cercava, a água doce era abundante e de
boa qualidade.

Como haviam combinado os dois grupos horas mais tarde


se encontraram na praia.
O primeiro obstáculo havia sido vencido, agora teriam de
prover alimentação para todos.

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Falou o imediato:
- Sugiro que dividamos o grupo em dois, que uma parte vá
à procura de alimento, enquanto e a outra ficará tomando
providências no sentido de construir abrigo provisório.
Podemos usar o bote para construir o abrigo.
— Perdoe-me por inquiri-lo, — disse o médico. – sugiro
que antes todos se submetam a um rápido exame médico,
para que eu possa avaliar as condições do grupo e sugerir
se algum dos membros deva permanecer neste local.
- Podeis fazê-lo, caro médico – respondeu o imediato.
Após os exames médicos, foi constatado que todos
estavam em perfeita saúde, embora estivessem mal
nutridos. O grupo que ficou na praia, foi composto pelo
médico, pelas mulheres e crianças, os demais partiram
para o interior da selva.
O médico se levantou e andou de um lado para o outro
com as mãos nos bolsos e uma expressão profundamente
grave, dando sinais de grande preocupação. E pensava:
“Isto só pode ser uma ilha, que dimensões terá?
Acharemos alimentos para todos? O que farei se alguém
adoecer, não temos medicamentos, não há como fazer
uma intervenção cirúrgica.
Enquanto isso os demais movimentavam o bote para fazer
dele um local para se abrigarem.
O grupo que partira para o interior da mata chega às
quatro cachoeiras. Constata que há um grande número de
árvores derrubadas e secas, possivelmente efeito de um
vendaval. As arvores seriam suficientes para a construção
de abrigos contra o frio e animais.
O Imediato, meditabundo senta-se em uma pedra e em
seus pensamentos conclui que possivelmente se tratava de
uma ilha vulcânica de pequena dimensão. E, que nesse

69
caso, não teria qualquer espécie de vida sobre ela, a não
ser vegetais. Temos água em abundância, e o alimento
podemos tirar do oceano.
O imediato sacode gravemente a cabeça. — - - Deixaria
de ser um perigo se pudéssemos explorar toda a ilha. —
Mas a qualquer hora do dia ou da noite, podemos ser
surpreendidos por algum animal bravio.
Seus pensamentos são interrompidos quando uma voz o
chama.
- Imediato! Era o marinheiro eletricista que lhe disse:
- Que acha de subirmos aquele monte, de lá certamente
veremos a extensão da ilha, seja o que for.
- Sim faremos isso
O grupo parte e após mais de uma hora de caminhada
chega ao cume do morro mais alto que havia. O imediato,
com sua luneta observa ao redor e diz:
- É uma ilha de pequeno tamanho. Temo que não seja
suficientemente grande para abrigarmos a todos e prover a
nossa alimentação.
No monte a grande cratera, do vulcão que a formara, em
sua parte mais profunda se via gases que se elevavam,
dando sinal de que o vulcão não estava totalmente extinto.
- Esta é uma ilha vulcânica, que poderá desaparecer a
qualquer momento, ou aumentar de tamanho com a
erupção do vulcão, que ora está adormecido.
O grupo retornou a praia onde os esperavam os demais.
Os botes, que partiram em outros sentidos, após alguns
dias navegando, foram encontrados por navios comerciais
que se dirigiam para ao Hawaii. Eles foram resgatados.
Logo se deu inicio a procura dos outros sobreviventes. Na
busca foi encontrado o navio avariado, que se desviara de
sua rota em mais de quatrocentos e oitenta milhas

70
náuticas. (uma milha náutica equivale a l,852
quilômetros).
Levando em conta as informações do capitão. A busca
levou vários dias e o grupo não foi encontrado. Todos
foram dados como desaparecidos.
Na ilha, os náufragos, reunidos na praia, ouviam o
imediato e o médico que estavam de pé, enquanto os
demais estavam sentados na areia da praia.
- Como imediato e líder deste grupo de náufragos, nomeio
meu substituto legal, em todos os meus impedimentos, o
nosso médico, por entender que ele saberá o que fazer nas
mais inesperadas situações.
Tenho a lhes comunicar que do alto daquele monte, com
minha luneta, consegui ver todo o território desta pequena
ilha.
Possivelmente uma ilha jovem, como tantas da mais de
2.200 ilhas da polinésia. Esta ilha possivelmente foi
formada por um vulcão que ora se encontra adormecido.
Amanhã sairemos em excursão pela ilha, e devemos
examiná-la, percorrendo-a pela praia, sairemos pela direita
e devemos retornar pela esquerda, assim saberemos o seu
perímetro. Após essa jornada, partiremos para o seu
interior e a percorreremos, palmo a palmo, desnudando
todas as suas partes.
Nisso uma das atrizes levanta a mão e lhe pergunta:
- Há a possibilidade de encontrarmos canibais?
- Entendo que esta ilha jamais foi habitada por qualquer
ser vivo, salvo os vegetais que existem em grande
quantidade. Estes, serão alvo de nossos exames. Pois eles,
os vegetais, certamente serão o nosso fornecedor de
energia e proteínas. Sem desprezarmos o que o oceano nos

71
pode fornecer. Por hora nos concentraremos na montagem
de abrigo para todos.
Primeiro decidiremos o local onde vamos permanecer por
algum tempo, a seguir começaremos a construir um
abrigo. Montaremos uma estrutura em forma de "A", que
será coberta com folhas de palmeiras ou folhas largas que
forem possíveis de encontrar. As folhas deverão ficar com
as pontas para baixo, e deverão sobrepor-se.
O grupo partiu para a coleta das folhas e paus necessários
para a montagem do abrigo. “Cipós titica” , um cipó de
pequeno diâmetro, que existia em grande quantidade nas
florestas, foram recolhidos para amarrarem as folhas.
Após duas horas de trabalho o abrigo estava pronto. Foi a
hora de providenciar as camas. Dentro do abrigo fizeram
tantas tarimbas, quantos eram os sobreviventes,
acolchoadas com folhas de palmeiras divididas pelo talo,
para ficarem mais macias. Assim passaram a primeira
noite na ilha.
No dia seguinte, como havia sido programado, eles
partem. Em menos de três horas de caminhada, estavam
no ponto do qual haviam saído.
Após um descanso merecido, o líder falou:
-Em todo o perímetro da ilha, este é, no meu ver, o melhor
lugar para instalarmos o nosso acampamento definitivo,
estamos próximos de uma grande fonte de água potável, e
podemos nos banhar nas cachoeiras e nadar na bacia que
as recebe.
Mas no momento o que é mais premente e provermos a
nossa alimentação. Um grupo de busca, composto dos
homens, partirá para o interior da floresta em busca de
alimento. Os demais permanecerão sob o comando de
médico e se ocuparão no planejamento e construção de um

72
abrigo definitivo. Antes, porém, ouviremos as
recomendações que nos fará o doutor Arnold. As
recomendações serão validas para ambos os grupos, uma
vez que todos nós estamos na mesma floresta.
- Atenção todos, antes de nos embrenharmos na floresta,
devo fazer algumas observações importantes para a nossa
segurança. Devemos ter cuidado com cobras.
Provavelmente, nós chegaremos a ver uma cobra
venenosa. O verdadeiro perigo das florestas tropicais são
os insetos, que podem transmitir doenças e parasitas. De
qualquer modo, se isso acontecer. O que fazer?
Em geral, o ataque de animais peçonhentos é provocado
pelo próprio homem que, sem perceber, caminha na
direção deles. As cobras contra-atacam em sua autodefesa.
Por isso, durante a nossa caminhada, tenham cuidado com
tocas, cupinzeiros, pedras e folhagens rasteiras. Atenção,
também, com galhos suspensos.
Os especialistas sabem distinguir os animais peçonhentos.
Nós como não somos especialistas em serpentes,
consideraremos todas as espécies como sendo
peçonhentas, se virmos uma, devemos nos distanciar o
máximo possível dela e acompanhar a sua trajetória, para
sabermos para onde ela foi. Nunca, jamais, tente matar
uma cobra, deixa-a se afastar normalmente, ela se encontra
assustada com a sua presença e se embrenhará na mata
indo parar o mais longe possível de você. Mas se
provocada ou ameaçada, tenderá a se defender atacando.
Outro ponto importante que quero abordar:
Quase todos os que se viram perdidos, isolados e
separados da civilização experimentaram medo, medo do
desconhecido, medo da dor e do desconforto, medo de
suas próprias fraquezas. Em tais condições, o medo não é

73
apenas normal, é também saudável. O medo aguça-nos os
sentidos e nos leva a, a não subestimar os perigos e os
riscos. O medo aumenta a adrenalina em nós, que passa a
atuar como um mecanismo de defesa contra o que é hostil
ou desconhecido.
O medo tem de ser orientado e convenientemente
dominado, ou pode nos levar ao pânico. O pânico e a
resposta mais destrutiva numa situação de sobrevivência.
O pânico pode levar ao desespero, o qual pode começar
pela quebra da nossa vontade de sobreviver. Por isso eu
lhes digo, confie em nosso líder o Imediato, que possui
conhecimento para conduzir-nos nas circunstâncias em
que nos encontramos. E, a quem passo a palavra para as
suas considerações e recomendações.
- O meu substituto o médico Arnold, chefiará o grupo que
ficará providenciando o acampamento definitivo, será
formado pelas mulheres e crianças. Os demais irão comigo
para o interior da selva a procura de fontes alimentares.
Algumas recomendações aos que me seguirão também
valendo aos que ficam.
Como nos dividiremos durante a exploração da ilha, é
possível que um de nós encontre algum nativo, se houver.
Embora eu não acredite nessa hipótese, vale a
recomendação.
Normalmente os grupos tribais de nativos existentes nas
ilhas do Pacifico, não são hostis; contudo aproximem-se
deles com cautela, seguindo as seguintes recomendações.
Deixem que sejam eles a fazer o contato inicial; mostre
amizade, cortesia e paciência. Não se assuste, não exiba
armas.

74
Na maioria das tribos o homem é dominante. Como regra
geral, procure evitar o contato direto ou verbal com os
membros femininos da tribo.
Evite o contato físico, a menos que lhes dêem a impressão
de que o devam fazer.
Para se movimentarem sob a selva serrada, devem afastar
a vegetação e, para tanto devem usar mangas compridas,
abotoadas ou amarrada nos punhos, para evitar cortes e
arranhões.
Não se preocupe com a configuração das arvores. Foque a
vista para além do que se encontra imediatamente a sua
frente e em vez de olhar para a floresta olhe através dela.
Pare e agache-se ocasionalmente e examine o solo da
selva.
Mantenha-se alerta movendo-se lenta, mas firmemente,
pare periodicamente para se orientar e escutar. Use uma
catana para abrir o caminho através da selva serrada, não
faça cortes desnecessários. Para afastar a vegetação e
reduzir a possibilidade de desalojar formigas mordedoras,
aranhas e cobras, use um pau ou bastão. Não se agarre ao
mato ou trepadeiras, para trepar; podem ter espinhos
afiados.
E finalmente, dentro de quatro horas devemos nos reunir
aqui. Portanto, lembram-se de que se caminharem a frente
por duas horas, deve retornar, pois levarão duas horas para
chegar ao local de onde saíram.
O grupo, comandado pelo Imediato, se embrenhou na
mata densa.
Os que permaneceram sob o comando do médico Arnold,
reunidos para ouvi-lo:
- Pessoal, vamos construir abrigos semi-permanente. Eles
servirão para nos abrigar enquanto estivermos construindo

75
os abrigos permanentes. Como somos quinze pessoas,
faremos 5 abrigos semi-permanentes, dessa forma cada um
abrigará três pessoas. A primeira tarefa é decidirmos onde
os construiremos. Para tanto devemos considerar os
seguintes aspectos:
a) O local deve ser alto, para que as chuvas não os
alaguem;
b) Deve ser perto da nossa fonte de água;
c) Devemos escolher o tipo de abrigo que iremos
fazer;
d) Verificar se temos o material necessário para a
construção, isso norteara o tipo de abrigo.

Eu sugiro que façamos um abrigo do tipo A, para tanto


devemos ver se encontramos os materiais necessários, que
são:
Para cada um dos abrigos devemos achar:
dois galhos com forquilha na extremidade;
treze pedaços de madeiras, todas do mesmo comprimento,
em torno de três metros;
um grande feixe de cipós finos, para amarras as peças
umas nas outras;
folhas de palmeiras, em quantidade para forrar as cinco
barracas;
o ferramental que temos a nossa disposição são dois
machados, um facão, uma faca e dois garfos tridentes com
cabo longo. Portanto mãos a obra.
Na mata densa, o grupo liderado pelo imediato, abria
picada e estudava o potencial alimentar da floresta. Após
uma busca que durou mais de quatro horas, eles haviam
chegado ao final, haviam percorrido toda a ilha e
identificado como fontes de sobrevivência na floresta

76
apenas, coco babaçu, fruta denominada Cambuci, com
florada de agosto a novembro e Noni, ambos frutos
nativos das ilhas do Pacifico, não estavam com frutos no
momento.

A ILHA DE DEUS

SEGUNDA PARTE - ANO DE 1895

CAPÍTULO IX

O MILAGRE

77
O improvisado acampamento estava concluído quando os
exploradores da floresta chegaram.
Em reunião o imediato falou:
- A ilha é pequena e não nos proverá de alimentos. A
única solução para nos é retirar do oceano tudo aquilo que
necessitamos para nos nutrir. Alias o que fizemos por
longos dias a bordo do nosso salva-vidas. Pois bem, eu
pergunto alguém entre nós tem experiência em pesca
oceânica?
O contramestre Bem Dukem levantou a mão. O imediato
lhe disse aproxime-se contramestre. Ouçam o que nos tem
a dizer o contramestre Bem Dukem.
- Meus amigos, eu tenho alguma experiência em pescaria
em oceano, ou seja, em praias oceânicas. No meu ver
devemos pescar com "covos" que são gaiolas fabricadas
de arame ou fibras, no nosso caso teremos de usar fibras
de palmeiras transadas.
Para que todos entendam de que estou falando, eu
explico: A pesca dos covos é uma pesca tradicional. Os
covos são o tipo mais comum da chamada “pesca de
armadilha” Trata-se de uma arte “passiva”, uma vez que é
o próprio peixe que procura o dispositivo, para refúgio ou
procura de alimento, mas depois dificilmente consegue
escapar. Dadas as características da armadilha, apenas os
animais adultos ficam presos.
A forma construtiva de um covo é bem simples, basta
fazermos uma caixa tramando as fibras como se trama um
cesto, numa das pontas, utilizando as próprias tramas
fazemos uma espécie de funil, por onde o peixe entrará, e
quando dentro não conseguirá sair. Na outra ponta uma
abertura por o0nde será o peixe retirado. O covo deve ser
colocado, de preferência no costado de uma parede de

78
pedra, no fundo do, e dentro dele o isco, que poderá ser
restos de mariscos, ou qualquer outro molúsculo de praia.
Devemos colocá-lo na água pela tardinha e recolhe-lo no
meio da manhã, pois os peixes costumam a procurar
alimentos ao cair da noite e ao amanhecer. Eu orientarei a
construção dos covos, digo dos covos, pois devemos
lançar no oceano no mínimo cinco covos. O que eu
entendo necessário para a captura de peixes para alimentar
a todos nós.
Coeso o grupo tratou de construir os covos, os homens
providenciarem no corte de fibras de palmeiras, cipós e
madeira para a sustentação dos costados. As mulheres
construíram as laterais em fibras de palmeiras tramadas.
Após um dia de trabalho os cinco covos estava prontos.
Aquela noite, todos iriam dormir sem alimentar-se, na
esperança de terem uma farta refeição no dia seguinte.
A primeira noite na ilha os náufragos permaneceram em
vigília até altas horas da noite. Em sua vigília o médico
Arnold pensava:
Nada que eu faça nesse momento ira alterar a nossa
situação. No entanto devo me preocupar em longo prazo,
com toda a certeza com o passar do tempo, vivendo neste
isolamento social, haverá acasalamentos e
consequentemente filhos virão.

No dia seguinte, sob a orientação do contramestre, os


marinheiros os levaram ao oceano, colocaram em seu
interior os isco e lançaram dois na encostas do rochedo,
presos por cordas de cipó. Os outros três foram amarrados
em paus enterrados no banco de areia da praia.
Os covos deveriam permanecer, o dia e a noite, somente
sendo retirados no meio da manhã do dia seguinte. A

79
parca refeição que conseguiram naquele dia foi lhes
fornecido pela praia, na forma de pequenos mariscos. Para
assá-los, o imediato ateou fogo em folhas secas, utilizando
a lente da luneta, para concentrar os raios solares. Os
mariscos foram assados em brasas, cada um tinha de cavar
os mariscos, assá-los, apenas as crianças foram ajudadas
por todos.
A noite novamente chegou. O imediato reuniu todos ao
redor de uma fogueira e falou:
- Meus caros! Temos de nos organizar, para tanto, tarefas
terão de ser distribuídas de forma inteligente. Quero que
cada um faça aquilo que mais saiba fazer. O médico fará
medicina e educação, quando falo em educação, quero
dizer que deva ele, ensinar a sua profissão ao nosso
infante, que segundo nos revelou sua mãe é inteligente e
ira com certeza apreender a profissão de médico com
relativa facilidade, a despeito das adversidades que este
lugar oferece. O pregador, nosso marujo mecânico, ficará
encarregado de manter a fé e a esperança do nosso grupo.
O nosso marujo contramestre, esperto em pescaria, ficará
encarregado de liderar as atividades de pesca, com o
objetivo de prover a alimentação a todos.
Como não sei das habilidades dos demais, salvo o marujo
eletricista, cujas habilidades nesta ilha de nada nos
servirão. Sugiro que cada um escolha o que fazer ou o que
liderar.
Temos como sugestão:
- Prover alimentos vegetais, como frutas e ervas.
- Ampliar e conservar os abrigos.
- Fabricação de malhas de fibras de palmeira.
No dia seguinte, devia passar do meio da manhã, quando
os náufragos foram retirar os covos da água.

80
Os dois covos que foram instalados nas rochas estavam
completamente destruídos pelas ondas que batiam no
rochedo. Os que tinham sido colocados entre dois bancos
de areia, a maré havia movimentado os bancos e enterrado
os covos, sendo impossível retirá-los.
Quando os que haviam ido retirar os covos retornaram, a
desesperança ficava estampada em seus cenhos. O que
fazer para prover a alimentação do grupo.
De repente peixes saem do oceano como estivessem
voando e caem a seus pés, um bagre de mais três quilos e
três cações de uns cinco quilos.
Cascudas e linguados, completavam o abastecimento
fantástico que acaba de acontecer.
Nesse momento o Pregador (marinheiro mecânico), se
pronunciou:
- Todos nós acabamos de presenciar um milagre do
senhor. Proponho que oremos em louvor a Deus pelos
benéficos recebidos até aqui e que Le nos proteja no futuro
como tem feito até aqui.
Todos se ajoelharam na areia e o pregador puxou uma reza
aos quais todos acompanharam.
Após a reza todos se voltaram aos alimentos recebidos,
dariam para no mínimo dois dias. Eles podiam ficar
sossegados que por hora de fome não morreriam.
Os peixes, ainda vivos foram eviscerados e preparados
para serem assados.
Eles reuniram uma boa quantidade de galhos secos, um
buraco foi escavado e em seu interior foram colocadas
folhas de palmeiras e sobre estas os peixes, que logo
foram cobertos por mais folhas e finalmente colocado terra
sobre as folhas. Os paus secos foram colocados sobre a
areia que cobria os peixes. O imediato retira a lente de sua

81
luneta e concentrando os raios solares ateou fogo nas
folhas secas que destas se espalhou para os falhos mais
finos até atingir os mais grossos. A fogueira foi alimentada
por mais de uma hora, o que seria o tempo necessário para
a cocção dos peixes. Ao final restara apenas um braseiro
sobre a areia, que foi retirado e os peixes descobertos e
retirados do interior dom invólucro de folhas. Todos se
alimentaram até não quererem mais, sendo as sobras
guardadas para ser consumida a noite.
Até então ninguém havia se perguntado, como os peixes
haviam saído do oceano como impulsionados por força
sobrenatural.
O imediato se aproxima do médico e lhe diz:
- Meu caro Doutor! Qual o seu diagnostico para os fatos
que acabamos de presenciar?
- Se a medicina pudesse resolver todos os fatos
sobrenaturais, por certo eu teria uma resposta aos fatos
ocorridos.
- Diga-me o que pode ter ocorrido, peixes voando de
dentro do oceano e caindo na praia sobre nossos pés, justo
no momento em que a desesperança nos açoitava como
um escrevo ao tronco.
- Certamente foi algo além da nossa imaginação. Alguma
força que nós não conhecemos, e seque podemos
imaginar. Sugiro que reunamos todos e discutamos o
assunto.
- Sim, Doutor, faremos isso.
Reunidos o imediato falou:
- Todos nós ficamos estupefatos pelos últimos
acontecimentos. Peixes voando do oceano para nos
alimentar. Com toda a certeza isso foi obra de Deus. –
todos concordaram. – Mas tais manifestações podem não

82
mais ocorrerem, por isso o broblema continua, temos de
prover o nosso alimento. Não devemos contar com
providência divina, para a nossa sobrevivência nesta ilha.
E, mais fiquemos atentos, pois outros fatos sobrenaturais
podem vir a acontecer.
O contramestre Bem Dukem, tomando a palavra assim
disse:
- A malograda tentativa de obtermos peixes através da
pesca com covos, não deve nos abater, muito menos a
esperança de obtermos peixes de uma forma não
convencional, como o milagre que aconteceu.
O oceano, nem sempre está agitado como na noite que
foram lançados os covos. Os bancos de areia nem sempre
se deslocam de um lado para outro, como ocorreu, as
ondas que quebram no rochedo, e que despedaçaram os
covos, não ocorrem sempre. Por isso proponho que
construamos mais covos e que os lancemos a água.
O imediato e Doutor apoiaram as palavras do contramestre
e induziram a todos a trabalharem nesse sentido.
Seis covos foram construídos, iscados e lançados, três na
encosta do rochedo e três entre os bancos de areia. Seriam
recolhidos nas últimas horas da manhã do dia seguinte.
Tudo estava calmo no acampamento, quando a mãe de
Josef se aproximou do médico e disse;
- Doutor o meu filho está passando mal.
O médico levantou apressado e seguiu a mulher. Eles
adentraram na cabana, Josef com ambas as mãos na
cabeça, sobre as frontes parecia transtornado. O médico se
aproximou dele, colocou a mão sobre sua nuca e lhe pegou
o pulso. Após alguns instantes disse:
- Os batimentos cardíacos estão normais e não tem febre.
O que está sentindo?

83
- Há algo em minha cabeça, não consigo explicar o que
está acontecendo, ouço ruídos que não consigo identificar.
- Está sentindo alguma dor? – perguntou o médico.
- Não, não estou sentindo nenhuma dor, apenas estou
confuso com esses ruídos.
O médico puxou a mãe do menino para fora do abrigo e
lhe disse:
- Se não estou enganado a senhora disse quando
estávamos no bote que seu menino era uma espécie de
superdotado.
- Sim, ele é realmente um superdotado aprende com
imensa facilidade, mas o que tem isso a ver com o que está
acontecendo?
- Acho que não tem nada a ver.
Voltaram a ter com o menino, o médico lhe perguntou:
- Josef, você pode reproduzir os ruídos que está ouvindo?
- Receio que não, é algo incomparável, nunca ouvi nada
parecido.
- Diga os sons são repetidos, intermitentes, contínuos, que
forma eles tem?
- São confusos, vibrantes, diferentes. Não sei, não sei.
- Se precisar de ajuda é só me procurar.
No dia seguinte passavam das onze horas, quando o
contramestre auxiliado pelos demais marinheiros,
iniciaram a retirada dos covos junto ao rochedo, estavam
repleto de peixes, o mesmo aconteceu com os três que
estavam no banco de areia.
A alimentação dos próximos dias estava assegurada.
Passava das quinze horas, quando a mãe de Josef,
procurou o médico novamente.
- Doutor! Meu filho agora está repetindo coisas
desconexas, e me parece que ele passou a noite toda

84
acordado. Ao menos, quando eu acordei, a noite ele estava
falando, coisas que eu não podia entender.
- Vamos lá ver o que está acontecendo- disse o médico.
Lá chegando o médico constatou, que menino estava
coberto de suor, falava incessantemente, o melhor, emitia
sons que nada significavam para o médico.
- Vamos levá-lo à praia e submetê-lo a um banho de
imersão. O choque térmico poderá quebrar o estado de
torpor.
Ao adentrar o menino sente um tremor pelo impacto da
água gelada e interrompe a fala e volta ao normal.
Logo é retirado e secado sendo levado para o abrigo.
Extenuado adormece sobre o leiro de folhas secas. O
médico que tudo acompanhava, disse:
- Deixemo-lo descansar no mínimo por oito horas e
tornaremos a velo.
Após o descanso de mais de dez horas, o menino foi
despertado pelo médico que lhe falou:
- como se sente Josef?
- Estou bem, é algo que adentra em minha mente
ensinando-me uma linguagem estranha. É algo que eu não
consigo controlar, não há como parar a intervenção. A não
ser como fizeram.
- Agora você vai se alimentar e andar pela praia, um bom
exercício melhorará a sua condição física. Retornarei à
tardinha para ver como se encontra. Procure não pensar
em nada, assim poderá não permitir a intervenção, seja o
que for que o está importunando.

85
A ILHA DE DEUS

SEGUNDA PARTE - ANO DE 1895

CAPÍTULO X

A REVELAÇÃO

O médico saiu do abrigo, a mãe de Josef o acompanhou e,


quando fora, lhe perguntou?
- O que está acontecendo com o meu filho Doutor?
- Não sei, mas sendo ele um menino de excepcional
inteligência, poderá estar recebendo alguma mensagem
telepática diretamente em seu cérebro. Embora isso pareça
coisa irreal, para as circunstâncias que estamos vivendo,
somada a estranha pesca que efetuamos, com peixes
saindo voando de dentro do oceano para nos alimentar.
Nada nos parece impossível de acontecer. Em todo o caso,
vamos acompanhar o desenrolar dos acontecimentos.
O menino dormiu a noite toda, e o próximo dia ajudou nas
lides do acampamento, tudo parecia normal. Pela manhã,
passava das nove horas quando ele teve um novo surto.
Sua mãe foi logo chamar o médico.
- Doutor ele está novamente tendo o ataque, o senhor
precisa nos ajudar, temo que ele esteja ficando louco.

86
- Não é para tanto, vamos descobrir o que está se passando
com Josef.
Ao chegar o médico constatou que Josef, não estava
extenuado como da vez anterior, seu semblante estava
sereno, falava coisas desconexas e parava com estivesse
falando com outra pessoa e logo voltava a falar.
O medico colocou a mão sobre o seu ombro, ele o fitou e
disse:
- Doutor! Estou me entendendo com ele, agora nos
começamos a dialogar. Ele é uma trindade, ele é o pai, o
filho e o espírito.
A mãe de Josef, ao ouvir isso, se ajoelhou e disse:
- Meu filho está falando com Deus!
O médico lhe disse: - Josef! Explique-se melhor.
- Não sei, sei apenas o que ele me está dizendo, e ele disse
que é uma trindade, composta do Pai, do filho e do
espírito.
- Pergunte se ele é Deus.
- Não ele nem sabe o que é Deus.
Nisso a mãe de Josef, sai do abrigo e grita a todos:
- Meu filho está falando com Deus, Meu filho está falando
com Deus.
Ao ouvirem isso, todos, que estavam nas cercanias, se
aproximaram do abrigo onde estava Josef e o médico.
O pregador se ajoelhou e iniciou uma oração a Deus Pai
todo poderoso. Todos se ajoelharam a frente do abrigo e
puxados pelo Pregador iniciaram a rezar um terço.
Ao ver o que estava acontecendo o Imediato se aproximou
do grupo e disse:
- Parem com isso, para tudo haverá uma explicação
razoável. E, dito isso adentrou no acampamento onde
estava o médico com Josef.

87
- Doutor o que está acontecendo?
O medico sai do cubículo, e puxa o imediato para fora e
lhe diz:
- Josef diz que está se comunicando com uma entidade que
é uma trindade, pai, filho e espírito. A mãe dele diz que é
Deus.
- E o senhor o que acha disso?
- Acho que é um surto paranóico, criado pelo estado de
angustia, dado as agruras que estamos passando.
- O senhor tem como controlá-lo?
- Necessitaria de algumas drogas as quais não temos.
Portanto nas podemos fazer.
- Mais essa, era só o que nos faltava, ter um paranóico,
sem qualquer recurso para controlá-lo. Posso falar com ele
doutor?
- Sim, ele parece estar normal.
Ambos adentram no barraco onde está Josef.
O imediato lhe diz:
- Como está Josef?
- Estou bem senhor imediato. Apenas estou me
comunicando com uma entidade que diz ser uma trindade,
pai, filho e espírito.
- Josef, isso é fruto de seu estado emocional, não é para
menos, com tudo o que temos passado.
- Não senhor imediato, ele se comunica comigo, passamos
várias dias tentando nos comunicar, acho que ele
aprendeu a minha língua e eu a dele, e estamos nos
comunicando razoavelmente bem. Faça uma pergunta para
que eu o consulte.
- Pois bem, pergunte como ele explica ser pai, filho e
espírito.
Alguns segundos depois:

88
- Ele diz que é uma criatura, que gerou o filho, portanto
são pai e filho. E, o que os une é o espírito, que é comum
aos dois, formando uma trindade. Eles são a mesma
entidade pai, filho e espírito.
- Pergunte, quando ele chegou a esta ilha?
Após alguns segundos:
- Ele disse que chegou aqui há um tempo incontável,
parecendo que sempre esteve aqui, que não sabe se teve
principio e possivelmente não terá fim.
- Pergunte se ele praticou o milagre dos peixes?
- Sim, já lhe fiz essa pergunta, ele respondeu que sim.
- Pergunte-lhe se ele é Deus.
Alguns segundos depois.
- Ele diz não sabe o que é Deus. Tentei explicar o nosso
conceito de Deus. Ele me disse que isso era algo criado
pela nossa imaginação. Que nunca ouviu falar dessa
entidade.
- Pergunta! Como podemos sair dessa ilha?
- Já lhe fiz essa pergunta, ele não sabe e não pretende sair
daqui.
- Como ele fez o milagre dos peixes?
Já lhe fiz. Ele disse que tem força mental suficiente para
fazer coisas se movimentarem.
Enquanto isso lá fora o pregador dizia:
- Meus irmãos. Finalmente a salvação, encontramos com
Deus nesta ilha, aquele que tudo sabe, tudo vê e tudo pode.
Vamos nos entregar a Deus todo poderoso. Construamos
uma capela em seu louvor e devemos fazer penitências e
rezar pedindo a ele que nos proteja e faça com que um
barco venha nos resgatar dessa ilha na qual estamos
presos. Amem. Devemos considerar o menino Josef, como
um santo, pois ele foi o escolhido, só os santos conseguem

89
falar com Deus. Ele será o nosso guia na busca da
salvação, não só dessa ilha, mas também das nossas almas.
O imediato sai com o médico, deixando Josef e vão sentar
sob uma palmeira.
- Imediato! Não sei o que dizer, teria o menino inventado
tudo isso? Quando eu me faço essa pergunta, me vem,
outra, como teria retirado os peixes do oceano. E, ai eu
fico confuso e não sei em que acreditar. – disse o médico.
O imediato coçou a cabeça, cofiou a barba, gestos que
sempre faz quando está com alguma incerteza, pigarreou e
disse:
- Sou cético quando se trata de religiões e crenças.
Somente não sou ateu porque não sei responder como
surgiu tudo o que nos cerca. Acho que para tudo há uma
explicação razoável. E este caso também deve ter. Como
o senhor vê, não tenho explicação razoável para o que está
acontecendo com o menino.
Alguns momentos de hesitação quando se aproximou o
pregador, com seu gorro de marujo, na mão sendo
amassado, dando sinal de nervosismo.
- Dá licença, imediato?
- Chega mais marujo mecânico, junte-se a nós, talvez nos
traga alguma explicação razoável, para o que está
acontecendo. – disse o imediato.
- Senhor! O milagre está explicado, Deus colocou Josef
entre nós para se revelar. Estamos nos braços de Deus
todo poderoso, deixemos que ele faça de nós segundo a
sua vontade o que queira. Ergamos em sua homenagem
uma igreja e façamos novenas de contemplação ao senhor.
O senhor como líder deste grupo, deve comandar a
construção do templo.

90
- Eu e o médico, não estamos convencidos de que isso que
estais dizendo seja a verdade sobre o que está
acontecendo. No entanto não temos explicação razoável
para os acontecimentos fantásticos que presenciamos.
Por isso, sugiro que não nos precipitemos, poderá haver
uma explicação lógica para tudo isso.
- Mas senhor! O que mais quer? O milagre dos peixes, a
santíssima trindade, pai, filho e espírito santo.
- O santo é por sua conta, nada foi mencionado a respeito
até o presente momento.
O pregador contrariado deixa o local, gesticulava e
sussurrava baixinho:
- Ele deve ser ateu, é totalmente descrente, não serve para
ser o nosso líder maior, agora que estamos nas mãos de
Deus todo poderoso.
O grupo de náufragos, que até então estava coeso,
começou a se dividir. O imediato e o médico, não
aceitavam a simples idéia de que Deus estaria na ilha. De
outro lado estava o pregador, que já havia convencido a
maioria de que Deus os comandaria dali para frente.
Josef, o único que conseguia se comunicar com a trindade
permanecia cético quanto ser ela Deus, pois ela própria
não admitia tal hipótese.
Passados alguns dias, Josef procurou o imediato e o
médico e lhes disse:
- Senhor imediato, doutor! A trindade me disse que como
somos seres heterossexuais e estando numa ilha, onde os
recursos, para a nossa sobrevivência são escassos devemos
criar regras para a nossa reprodução.
Quando o pregador tomou conhecimento da mensagem
recebida por Josef reuniu os seus seguidores e disse:

91
- Agora eu não tenho a menor duvida sobre Josef estar se
comunicando com Deus todo poderoso. Temos de que
evitar o sexo, não podemos procriar, devemos considerar o
ato sexual pecado, como a religião sempre preconizou.
Com o passar do tempo foi formado dois grupo, de um
lado ficaram o imediato, o médico e Elisabeth, mãe do
Josef. Do outro lado o marujo mecânico ( o pregador) e
todos os demais. Josef se manteve cético quanto às
divergências ocorridas e a separação dos grupos.
O pregador comandava a reza do terço todos os dias antes
do escurecer. Rezava horas a fio procurando se comunicar
com Deus todos poderoso. Mas ele somente falava com
Josef, o que o deixava desconfortável perante seus
comandados.
O grupo dos céticos, não participava das rezas, que era o
ponto de discórdia, no mais todos participavam dos
trabalhos de sobrevivência na ilha.
Certo dia uma tempestade quase arrasou a ilha, motivo
para o pregador dizer que foi enviado por Deus, por que
alguns dos náufragos não participavam das rezas.
Josef que mantinha habitualmente diálogos telepáticos
com a trindade chamou todos os náufragos e lhes disse:
- A trindade pede que eu seja conduzido com líder do
grupo até o seu habitat, que fica numa escarpa do outro
lado da ilha.
O imediato tomou a palavra e disse a todos que ele iria
conduzir Josef ao local indicado.
O pregador ficou contrariado com a decisão, achava que
ele como líder espiritual e quem deveria conduzir Josef até
a presença de Deus todo poderoso.

92
Muita discussão e ficou decidido que Josef escolheria
quem o deveria conduzir até a trindade. Ele escolheu o
imediato como seu guia e protetor.
No dia seguinte ambos se prepararam para a jornada até o
local onde a trindade se encontrava.
Após caminharem por algum tempo, a dupla chega a uma
parede lisa na escarpa, onde havia uma abertura entalhada
como uma porta fosse.
Josef recebe diretamente em seu cérebro instruções que a
porta seria aberta, e que, por ela deveriam adentrar para
atingir o reduto da trindade. Em poucos instantes a porta
começou a se movimentar permitindo a passagem de
ambos. Uma escada esculpida na pedra, quase que na
vertical, com dois apoios um em cada lateral da escada. O
local era escuro, mas segundo as instruções da trindade,
recebidas por Josef, davam conta de que eles teriam de
percorrer a escada por um longo tempo e com o máximo
de cuidado.
Quanto mais avançavam, mais rarefeito ficava o ar. O
imediato, segurando a mão de Josef disse:
- Devemos parar e esperar que o ar que esta entrando pela
porta, torne o ambiente mais arejado.
Permaneceram parados por alguns instantes até que
sentiram o ar ser renovado e suas forças voltarem ao
normal, permitindo a descida. Finalmente eles chegam a
um salão, onde uma luz que brotava de uma fenda na
rocha clareava parcialmente o ambiente.
O marujo imediato Alfred e o menino Josef, estavam
deslumbrados e aterrorizados diante do desconhecido, sem
poder prever os futuros acontecimentos, quando uma
mensagem é recebida diretamente dentro do seus cérebros.

93
- Nada temam de mim, sou uma criatura do bem, não lhes
farei mal algum.
Diante de tal mensagem, ambos conseguiram relaxar,
momento em que um ruído, nunca antes ouvido por eles,
seguido do ranger de uma porta de pedra se abrindo num
dos constados do salão.

A ILHA DE DEUS

SEGUNDA PARTE - ANO DE 1895

94
CAPÍTULO XI

O DEUS DA ILHA

Por uma fenda surgida pela abertura da porta, passa uma


luz de altíssima intensidade que torna o ambiente mais
claro do que se o sol clareia um dia sem nuvem alguma. A
cada movimento da porta a fenda aumentava e a luz se
tornava mais intensa. A claridade intensa começa a se
movimentar. No centro da intensa luminosidade via-se
algo se movimentando, parecendo que o que se
movimentava era quem irradia a luz. Tinha a forma de um
cogumelo delgado e parecia flutuar no ar. Quando a
aparição ficou entre os dois, passaram a receber
mensagem telepática que dizia:
- Tenho acompanhado suas dificuldades e até mesmo os
ajudei, fornecendo-lhes alimento quando mais precisaram.
Com a grande distância que nos separava, apenas podia
contatar com Josef que possui ondas cerebrais de alta
frequência.
O imediato disse:
- Sou Alfred, conhecido pelo meu posto de imediato e
gostaria de lhe fazer algumas perguntas.
- Podeis fazer, prometo responde-las adequadamente.
- Quem é você, o que faz aqui nessa ilha em tais
condições.
- Esperava por esta pergunta. Sou um remanescente de
uma espécie que viveu neste globo, em certo período, que
se situou exatamente após os grande ovíparos e antes do
aparecimento da sua espécie.
- Como surgiram no nosso planeta?

95
- Existiram diversas hipóteses do nosso aparecimento na
face deste planeta, entre as muitas, as mais prováveis são:
A da soma de micros mutações, que com o passar de
milhares de anos, foi modificando a espécie até chegarmos
ao ápice da mudança, que foi uma faze bem superior a
minha, ou naquilo que sou hoje.
Outra diz que no inicio éramos seres aquáticos, quando
sofremos algumas mutações e passamos a anfíbios e
finalmente passamos a seres terrestres.
Outra hipótese, de grande probabilidade, é que teríamos
vindo do universo. Eu particularmente, creio nessa
hipótese, como sendo a mais provável de todas.
- Como um ser pode ser uma trindade, como diz que é? –
perguntou Josef.
- Para inicio de entendimento, tenho de lhe dizer que
somos hermafroditas, podemos nos reproduzir sozinhos. O
pai gera o filho, quando o filho for gerar o neto, o pai
deixa de existir, por isso, o filho somente gerará o seu
filho, quando o pai estiver no fim de sua existência, assim
nos perpetuamos através dos tempos.
- Entendo, mas, isso explica apenas o pai e o filho, e o
espírito? – perguntou Alfred.
- O espírito é o que une o pai e o filho, deixando-os um
único ser. O espírito, é que faz com que o pai, saiba tudo
do filho e o filho saiba tudo do pai. Eles sentem os
mesmos efeitos do universo, se um esta presente o outro
também está. Agora por exemplo, estamos conversando
com você, nos três, pai, filho e espírito.
- Quanto tempo sua espécie dominou o nosso planeta?-
perguntou Alfred.
- Nossa espécie permaneceu no planeta por mais de cinco
milhões de anos.

96
- O que aconteceu com sua civilização, se é que se pode
assim chamar?
- Perfeitamente, no inicio éramos hermafroditas, como
somos, com o avanço da ciência, passamos a ser
heterossexuais, macho e fêmea, cada um com seu espírito.
- Como você explica a sua permanência como
hermafrodita.
- Por muito tempo, houve nascimento de hermafroditas, no
período em que havia separação de sexos. Eu fui uma
experiência, pois, mantinha as características primitivas.
Para preservar a espécie pura, fui colocado nesta ilha, com
todas as condições para sobreviver eternamente em
condições normais. Com a passagem de hermafrodita para
seres sexuados, perderam-se alguns privilégios, como a
percepção extra sensorial, telecinese e telepatia.
- Você explicou como se sucedem, em fim, como
biologicamente se tornou perpetuo. Mas como você
permaneceu incólume, durante tanto tempo? Em fim como
se manteve por todo esse tempo?
- Então, quando fomos colocados neste habitat, para nos
perpetuarmos, na forma original. Um grande aparato, foi
montado, uma verdadeira cidadela foi montada para nos
abrigar e garantir que nada nos faltasse, fosse por milhares
de anos a fora. Toda a energia que necessitávamos para
nos manter foi colocada de forma perpetua. Isso tudo foi
feito, pois o fogo destruiria tudo na face do planeta. O
cataclismo foi previsto com mais de cem anos de
antecedência. Por isso fomos colocados aqui, bem antes
dele ocorrer, para vivermos eternamente, pela preservação
da espécie.
- Sim, entendo, mas tenho mais uma pergunta a fazer. Os
dinossauros, ou ovíparos como se referiu, e outras espécies

97
que precederam o homem deixaram vestígios de sua
existência. E a sua espécie nada deixou?
- Os ovíparos e outros seres que habitaram o planeta eram
vertebrados, seus fosseis, foram encontrados pela minha
espécie. E, posteriormente pela sua espécie. Nós, no
entanto, não somos vertebrados, não somos formados por
ossos. Somos energia luminosa e nos alimentamos de
fótons. Quando nos extinguimos, nada fica para ser
identificado.
Por exemplo, se a vossa civilização for destruída por
algum cataclismo, todos os registros do seu mundo
poderão desaparecer. E cinco mil anos depois, nada mais
restará. Salvo algumas lembranças raciais truncadas que
falarão do ocorrido.
- Como teria desaparecido sua civilização:
- A previsão do final dos tempos, diziam que a cada
26.000 anos o sol se alinha com o centro do Universo. Ao
mesmo tempo ocorre outro raro fenômeno astrológico,
uma mudança do eixo da terra em relação à esfera celeste.
O fenômeno se chama Precessão. O planeta oscila
lentamente sobre seu eixo mudando sua orientação angular
em relação ao Universo. A esfera seria bombardeada por
um feixe poderoso de fótons, que queimaria tudo na face,
nenhuma espécie sobreviveria. Tudo seria queimado.
Talvez algumas ruínas de construções feitas por meus
iguais, ainda possam existir.
As predições diziam e, fatalmente, isso aconteceu, sem
que nós, aqui no nosso santuário, tenhamos sido
acometidos. As predições diziam:
Cairiam meteoros de fogo do firmamento. Ventos nefastos
começariam a soprar. Os próprios elementos pareceriam
estar perturbados. O planeta atingido por calores

98
extraordinários pareceria estar com febre. Os animais,
chamuscados pela energia vinda do espaço, correriam
aterrados, arfando ruidosamente e desejosos de proteção
contra a terrível força. Outros, chamuscados pelo fogo,
correrão para aqui e para lá, berrando aterrados, como no
meio de uma tempestade de fogo aniquiladora.
A própria água ficaria aquecida, também as criaturas que
nela vivessem seriam queimadas. As árvores queimadas
por um incêndio avassalador tombariam uma após outra.
E as predições foram cumpridas, e a nossa espécie
provavelmente foi destruída pelo cataclismo. Todos os
registros de nossa civilização devem ter desaparecido. Isso
aconteceu há mais de cinco milhões de anos. Nada mais
restou do nosso conhecimento secular.
- Mas, eu os chamei aqui para orientar sobre a real
situação em que se encontram neste lugar. Como já devem
ter constatado, não há como uma grande população de
seres da sua espécie sobreviverem aqui. Meus ancestrais
me colocaram aqui, como uma trindade única, se eu fosse
um ser reproduzível como vocês, certamente não haveria
lugar para todos e, a espécie entraria em caus.
O mesmo ira acontecer com vocês se não tomarem
medidas cautelares. A principal lei da sobrevivência que
deverão adotar é que apenas duas gerações devem se
encontrar, jamais a terceira geração deve se encontrar com
a primeira.
- Mas como faremos isso, nossa espécie é diferente da
sua, isso é quase que impossível de ser realizado. – disse o
imediato Alfred.
- Busquem uma solução, seja ela qual for, mas não deixe
de atender esta determinação, sob pena, de chegarem ao
caus.

99
Nada mais foi dito nem perguntado. A trindade retornou
ao seu habitat, a porta foi fechada e os dois visitantes
retornaram ao acampamento.
O imediato reuniu a todos e disse o havia acontecido:
- A entidade que encontramos em uma caverna profunda,
não é Deus como nos acreditamos e sim uma criatura
excepcional, que viveu no nosso planeta na antiguidade. A
espécie foi extinta a milhares de anos, sem deixar qualquer
vestígio da sua passagem pelo nosso planeta. A não ser
esta que acabamos de encontrar. Ela nos disse que onde
estamos é uma pequena ilha, o que já sabíamos, e que
devemos criar uma lei, um mandamento, que nunca três
gerações se encontre, portanto, para nascer o neto, o avo
deve ter morrido. Vejam bem, isso foi apenas uma
sugestão, mas eu como líder deste grupo a acho acertada e
que devemos estabelecer como lei a ser cumprida daqui
para frente.
Os náufragos discutiram por vários meses a adoção da lei
de sobrevivência, como foi chamada.
Feita a votação a lei foi por unanimidade aceita e
estabelecida. Ninguém se preocupou de como isso deveria
ser feito, provavelmente por entenderem que a terceira
geração seria evitada até a morte da primeira.
E o tempo passou, casamentos se realizaram. O imediato,
casou com a mãe de Josef. O médico contrair matrimônio
com uma das atrizes, assim os casamentos foram
realizados e os filhos começaram a nasceram.
Os quinze náufragos se reproduziram e já havia vinte e
cinco habitantes da pequena ilha. O imediato Alfred,
juntamente com o médico Arnold, comandavam as ações
do grupo, enquanto Rodrigão, o pregador, tomava conta da
fé religiosa, achando que Deus todo poderoso estava na

100
ilha, atribuiu-se a missão de casar e batizar, o que fazia
com grande esmero e dedicação.
O tempo que tudo arranja e tudo faz ser esquecido fez com
que a comunidade dos náufragos se organizasse e fizesse
progressos. Para ficar mais próximo da trindade, o
acampamento foi mudado para o outro lado da ilha, onde
estava o habitar do ser iluminado. As roupas que tinham,
com o passar do tempo, se deteriorando obrigou-os a
confeccionar novas a partir de fibras de folhas de
palmeiras.
Josef, com dezoito anos, contraiu matrimônio com Justine,
que tinha dezenove anos. No décimo ano em que estavam
na ilha, o imediato adoeceu. O médico envidou todos os
esforços para salvá-lo, mas ele acabou morrendo de
diverticulite. Por aclamação Josef ficou em seu lugar
como líder máximo do grupo.
Três anos após o casamento, Justine ficou grávida, até
então ninguém havia se preocupado com o compromisso
que todos haviam assumido de que três gerações não
deviam se encontrar.
Sendo Josef filho de Elisabeth, com o nascimento haveria
o encontro de três gerações, o que pelo compromisso não
seria permitido, o mesmo acontecendo com a mãe de
Justine.
Quando Justine estava no sexto mês de gravidez os
náufragos fizeram uma assembléia para definirem o que
deveria ser feito quando ocorresse o nascimento. A
discussão durou vários dias e não chegaram a uma
conclusão do que deveria ser feito.
Josef resolveu consultar a trindade, que fora alcunhada de
Deus, para que ele o aconselhasse.
Deus lhes disse:

101
- Apenas posso lhes informar como acontece com nos
outros. Somente quando o pai sente que é chegada a sua
hora de descansar, o filho concebe uma nova continuação.
Nessa situação o pai à medida que o novo começa a se
desenvolver o pai começa a definhar. E horas antes do
nascimento do novo o velho desiste da vida, cedendo o seu
lugar de pai ao filho, que por sua vez cede o seu lugar de
filho ao novo ser.
Quanto ao que sua espécie deve fazer eu não posso
interferir no seu livre arbítrio, pensem e busquem uma
solução. Mas aconselho que não deixem de cumprir com o
compromisso que assumiram, para que o futuro não lhes
seja desastroso.
Josef ficou desesperado, não tinha a mínima idéia do que
deveria ser realizado em tal situação.
O tempo foi passando e nenhuma solução havia sido
encontrada para solucionar o problema, algo haveria de ser
feito. Josef como líder do grupo, seria o primeiro a ser
penalizado, com o compromisso de zelar pelo controle
populacional do grupo.
O dia se escondia sobre a selva, a noite escura dominava
os ambientes. O médico fora chamado as presas para
atender o parto de Justine. Josef o recebeu na porta do
abrigo e lhe disse:
- Doutor é chegada a hora, as dores começaram.
O medico, acompanhado de sua esposa, apressaram-se em
ir até o acampamento de Josef e Justine. Lá chegando ele
disse:
- Deixe-me ver!- após examiná-la, disse - Sim, está
próximo, nascerá dentro de alguns minutos. Josef! Deixe-
nos às sós com Justine, você está muito nervoso, vá e ande

102
um pouco para espairecer, tudo será dentro da
normalidade.
Enquanto o parto era realizado, As futuras avós oravam no
acampamento de Elizabeth.
Antes de ecoar o choro do bebe, as mulheres pararam de
orar e saíram silenciosamente, como seguindo alguém que
as tivesse levando e, embrenharam-se na escuridão da
selva.
Na cabana de Josef, o médico sustenta um belo menino
pelos pés de cabeça para baixo e lhe aplica palmada e ele
chora, dando início ao ciclo respiratório. Logo chega Josef
e adentra no abrigo. E vai ver Justine que já está com o
bebe nos braços.
- Meu amor como você está?
- É um menino perfeitinho.
Josef os abraçou e chorou copiosamente.
Após, o médico, referindo-se ao menino disse:
-Ele é forte e será um líder como o pai. Crie-o com amor e
carinho ele o merecerá.
O menino chamou-se Alfred, em homenagem ao imediato.
Justine, disse a Josef:
- Querido onde está a tua mãe e a minha já deviam estar
aqui.
- Sim, querida, vou ver porque elas estão demorando tanto.
Josef adentra no acampamento de Elisabeth, tudo estava
vazio, nem ela nem a mãe de Justine se encontravam. Um
escrito sobre a mesa dizia:
O Anjo da Morte veio nos buscar, a lei da sobrevivência
foi cumprida. Sejam felizes.
As buscas pela ilha foram intensas e nunca as duas foram
encontradas.

103
O tempo passou, outros acontecimentos idênticos
ocorreram e daí para frente nunca três gerações se
encontraram.
Johan acabara de fechar o diário do imediato e em seus
pensamentos conjecturava:
Por isso eles são poucos, em mais de um século, no
mínimo quatro gerações devem ter se sucedido, chegaram
à ilha apenas quinze pessoas e hoje há apenas vinte e
duas pessoas. Quer dizer que se eu e Ananda tivermos
filhos, e estes procriarem, ao nascerem os netos nos
deveremos estar mortos ou ser levados pelo Anjo da
Morte. Esta situação é que está passando William nesse
momento, seu filho vai nascer e seu pai deve desaparecer,
ou ser levado pelo Anjo da Morte. Mas não ficou claro
como ele surgiu. No inicio poderia ser Josef, pois ele era
o líder inconteste do grupo. Agora é William, se foi Josef,
teria ele sido um matricida e William será um patricida.
Que costume mais cruel, ter de matar o próprio pai ou
mãe?
Ou a trindade seria o Anjo da Morte, não, não pode ser
ele se eximiu até de sugerir como deveriam fazer. Em todo
o caso, vamos tratar de não termos filhos logo, o faremos
quando estivermos bem mais velhos.

104
A ILHA DE DEUS

EPÍLAGO

O DIÁRIO DO VELEIRO

O mesmo temporal que quase arrasara a ilha, tinha sido


enfrentado por Cabreira em seu veleiro. Sozinho, por
várias horas tentou manter o leme seguro e enfrentar as
ondas de proa. Uma vaga, de grande dimensão, chegou no
momento em que ele reposicionava o leme, não lhe dando
tempo de enfrentá-la de proa, e o atingiu a estibordo. O
poder destruidor da onda fez com que o mastro principal
tombasse, despedaçando as velas, que naquele momento

105
estavam recolhidas. Passada a tempestade, o veleiro
passou a ser movimentado pelo motor movido a óleo.
Porem em poucos dias o óleo acabara, deixando o veleiro
a deriva.
Os víveres chegaram ao fim e ele passou a se alimentar
dos peixes que pescava. Ao sabor das ondas que o
lavavam para onde queriam, muitas vezes, passava dias
em uma direção e o vento mudava e ele era levado para
outra direção. Em frangalhos, cabreira meditava em tudo o
que havia ocorrido. E já estava arrependido de haver os
abandonado na ilha. Finalmente a água acabou e ele
passou a juntar água da chuva para tomar e fazer a higiene.
Seus instrumentos todos avariados, não lhes deixava
qualquer alternativa a não ser a de contemplar o tempo
passar. Sua única distração nos longos dias e
intermináveis noites, eram os seu pensamentos.
Reconstituía toda a sua vida, nos mínimos detalhes. Já não
tinha ânimo para continuar vivo, suas pernas
cambaleavam, seus braços doíam a cada movimento, sua
cabeça parecia estar vazia, sentia que seu tempo havia
acabado. Reuniu todas as forças que lhe restavam e
começou a escrever:
A última gota de óleo combustível fora queimado, as velas
foram destruídas pelo temporal. Estou à deriva neste
infinito oceano, que embora tenha o nome de Pacífico é
de uma agressividade aterradora.
Hoje a última refeição convencional foi consumida. Todos
os viveres acabaram, é hora de começar a pescar e mudar
a dieta. Isso não será problema os peixes abundam nas
águas. Não, não é isso que quero escrever. Riscou e
reiniciou. Eu os abandonei numa ilha deserta, minha
esposa e o meu navegador. Eles estavam me traindo e

106
queriam se livrar de mim. Seria eu ou eles. Preferi que
fossem eles. A ilha se localiza nas seguintes coordenadas:
longitude xx, latitude yy. Lá provavelmente eles poderão
ser encontrados. Que Deus me perdoe e me deixe morrer
em paz.
A bordo da fragata da marinha dos EUA, o comandante
com seu binóculo examina o oceano. De repente ele fixa a
visão em algo que se movimenta há grande distância,
aparece e desaparece sobre as vagas. Está exatamente na
direção em que estão indos, e a cada movimento parece
mais próximo.
O veleiro é alcançado e amarrado ao costado da fragata.
Dois marujos descem ao convés e ao adentrarem nos
aposento principal, lá estava o corpo de Cabreira,
completamente deteriorado. O comandante determina o
sepultamento nas águas e o barco é colocado na posição
de reboque. Um dos marujos alcança ao comandante o
diário de bordo. Ao terminar de lê-lo o comandante
termina um novo rumo.
Na ilha de Deus o médico fora chamado, chegara a hora
do nascimento do filho de William. Nesse momento ouve-
se em todo a ilha o soar intermitente sonoro emitido pela
fragata da Marinha dos EUA.
Todos correm para a praia e ao largo, a fragata lança suas
ancoras, e dois botes, com dois marinheiros cada um, são
lançados n’àgua.
William levanta as mãos ao céu e diz:
- Obrigado senhor, estamos salvos. Corre ao acampamento
do pai e diz:
- Pai! Estamos salvos um barco está ancorado ao largo.
Pai e filho se abraçam, enquanto os botes chegam à praia.

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Johan e Ananda se apressam para ajudar os marujos no
atracamento dos botes. Johan diz:
- Fomos abandonados nesta ilha, onde há também vinte e
duas pessoas que são descendentes de náufragos e estão
aqui há mais de um século.
Ouvindo isso os marujos determinaram que um dos botes
permaneceria na ilha e que o outro levaria Johan e Ananda
a bordo da fragata, para falarem com o comandante.
Após ouvir os relatos de Johan e Ananda, o comandante
decidiu que iria à ilha para ver de perto as condições que
se encontravam os descendentes de náufragos.
Na ilha, o comandante da fragata constata que a maioria
queria ser resgatado e que poucos preferiam permanecer
na ilha como estavam. A família de William, decidira que
queriam ser resgatados. O comandante da fragata, em um
breve discurso aos ilhéus, os convenceu de que teriam
melhor vida, no continente, que o avanço da ciência e
tecnologia, lhes proporcionaria uma vida nuca por eles
imaginada e que todos seriam considerados herói e teriam
a proteção dos Estados Unidos da America. William
dirigindo-se ao comandante disse:
- Senhor eu antes de partir devo consultar Deus, e ver o
que ele acha de voltarmos à pátria de origem de seus
ancestrais. E ver como ele ficará.
O comandante nada entendeu, mas disse-lhe que teria três
horas antes da partida para consultar a sua divindade.
William chega ao habitat de Deus. A grande porta de
pedra é aberta e ele se aproxima de William. E antes que
este falasse, ele disse com a voz da mente:
- Sim, ficarei bem, afinal permaneci aqui por um tempo
quase que infinito, sem que vocês aqui estivessem. Não
deixem de ir, como lhes disse no principio a ilha é

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pequena e não suportara vida em demasia, lhe impingindo
grande angustia e sofrimento.
Somente peço que não revelem o meu habitat, pois
certamente serei importunado pelos curiosos e
aproveitadores que para cá se dirigirão.
William lhe diz: Prometo que seu segredo será preservado
por todos os habitantes da ilha. Eu envidarei o melhor de
meus esforços para que isso aconteça.

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