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Resumo
A disseminação do modelo de Educação Inclusiva, no- as atitudes que são necessárias para se trabalhar com
meadamente pela inclusão de alunos com condições classes inclusivas. Realça-se, ainda, a importância
de deficiência na escola regular, origina novos de- das estratégias de formação como inseparáveis do
safios para a formação de professores. Já não se trata processo de formação: a inovação e a valorização da
de formar professores para alunos que são educados diferença são partes essenciais da formação de pro-
num modelo segregado, mas, sim, professores que fessores.
são capazes de trabalhar com eficácia com turmas
assumidamente heterogêneas. Para isto é necessário Palavras-chave: formação de professores, educação
um novo olhar sobre os saberes, as competências e inclusiva.
1
Doutor em Ciências da Motricidade Humana na área de Educação Especial e Reabilitação (UTL/FMH), professor da Universidade Técnica de Lisboa, e
coordenador do Fórum de Estudos de Educação Inclusiva (www.fmh.url.pt/feei)
The growing process of including pupils with special knowledge, the competencies and the attitudes that
educational needs, in the regular schools, became a teachers need to be efficient in Inclusive Education.
new challenge for teacher’s education. This is a new In this paper we present a reflective analysis about
challenge considering that the present aim is not which kind of teacher education – including contents,
“Special Education” in “Special Schools” but to attend experiences and strategies – is needed to provide the
in the regular schools the heterogeneous needs of teacher with the skills he/she needs to act in Inclusive
the population. It is necessary to train teacher to pres- schools.
ent a wide range of competencies to work in hetero-
geneous classes. This implies a new “look” over the Key words: teacher education, inclusive education.
DIFERENÇA E EXCLUSÃO
ou ... a gestação de uma mentalidade inclusiva
Marisa Faermann Eizirik1
meizirik.ez@terra.com.br
Resumo
Este artigo se propõe a examinar a questão da diferen- guerra como metáfora, defendo a idéia de ser a inclu-
ça e seus atravessamentos com o poder, tratando a in- são escolar um projeto revolucionário em processo de
clusão pelo seu avesso, a exclusão, partindo do questio- implantação que, por ser complexo, difícil e doloroso,
namento: não se trataria de tornar visíveis as forças que demanda a gestação de uma mentalidade inclusiva,
emperram as mudanças? As resistências que micropo- constituinte de novas formas de subjetividade.
liticamente cerram fileiras contra aquelas que insistem
em trazer para o solo institucional novas práticas, outros Palavras-chave: diferença, exclusão, inclusão, poder,
saberes e formas de ensinar e de aprender. Utilizando a subjetividade.
1
Marisa Faermann Eizirik é doutora em Educação, psicóloga e professora/UFRGS. Desenvolve pesquisas no campo da inclusão escolar, com ênfase nas
relações de poder institucionais. Além de artigos publicados, é autora de Educação e Escola: a aventura institucional (AGE, 2001); Michel Foucault, um
pensador do presente (Unijuí, 2005, 2a ed.) e co-autora de A escola (In)-visível ( Editora da UFGRS, 2005, 2a. ed).
This article focuses the question of difference and its hypothesis that the inclusion, as a new paradigm of
departing splittings with power. Inclusion is analysed teaching, is a revolutionary process. It is a complex,
inversely when the process of exclusion asks: what difficult and painful process of implanting, that asks
about making visible the allied forces that get stiffen? for an inclusive mentality in its constitution by form-
The micro-politics closes up the ranks that pushes ing the mind in new ways of subjectivity.
away our new institutional practices, our knowledges
in their manner of teaching and learning. Key words: difference, exclusion, inclusion, power, sub-
If we take the war as a metaphor, we stand up for our jectivity.
Inclusão escolar, uma tornar visíveis as forças que emper- entram pelos mecanismos legais e
ram as mudanças, as resistências forçam a presença – nas empresas,
guerra? que micropoliticamente cerram fi- nas escolas, nos lugares públicos,
leiras contra aquelas que insistem nas diferentes formas de cultura,
O debate sobre a inclusão esco- em trazer para o solo institucional lazer e diversão, na sexualidade, n o
lar tem proporcionado intensa refle- novas práticas, outros saberes e for- trabalho. Como estamos enfrentan-
xão e numerosos artigos, trabalhos, mas de ensinar e de aprender? do esse desafio? Quais as lutas que
experiências, questionamentos e A inclusão se apresenta como se travam no cotidiano das escolas,
muitas dúvidas, especialmente, em uma revolução, como contra-face em seus processos de ensino regu-
seus processos de implementação. da exclusão. Revolução porque está lar, currículos, formas de avaliação,
Como forma de participar desse produzindo um turbilhão de movi- tempos e ritmos? Como se sacode
debate, pensei em compartilhar al- mentos que invadem todas as áreas, o torpor da acomodação, do silên-
gumas reflexões sobre a questão da
diferença e seus atravessamentos
com o poder, examinando a expe-
riência da segregação e suas impli-
cações nos processos de exclusão e
inclusão, articulando com as formas
de subjetivação contemporâneas e
suas implicações para a educação.
Ou seja, penso em tratar da inclu-
são pelo seu avesso, a exclusão, e
utilizar como metáfora, a guerra.
Por estarmos tão acostumados
a excluir, não seria a inclusão esco-
lar um projeto revolucionário que
precisaria “decifrar as dissimetrias,
os desequilíbrios, as injustiças, as
violências, que funcionam apesar
da ordem das leis, sob a ordem das
leis, por meio das ordens das leis e
graças a elas?”2 Não se trataria de
2
FOUCAULT, M. Em Defesa da Sociedade: curso no Collège de France (1975-1976). São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 92.
3
EIZIRIK, M.F. Por que a diferença incomoda tanto? In. EIZIRIK, M.F. Educação e Escola: a aventura institucional. Porto Alegre: AGE, 2001: 37-57.
4
OVIDIO. Metamorfosis. Barcelona: Brugueda, 1983.
5
PUGLIESI, M. Mitologia Greco-Romana: Arquétipos dos deuses e heróis. São Paulo: Madras Editora, 2003.
6
LYOTARD, J. F. La Diferencia. Barcelona: Gedisa, l988.
7
CANGUILHEM, G. O normal e o patológico. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2000.
8
FOUCAULT, M. Loucura e sociedade. IN: FOUCAULT, M. Problematização do sujeito: psicologia, psiquiatria e psicanálise. Rio de Janeiro: Forense Univer-
sitária, 2002. (Ditos e escritos; I)
9
Ver EIZIRIK, M. F. Michel Foucault, um pensador do presente. Ijuí: Editora Unijuí, 2005, 2ª ed.
10
FOUCAULT, M. La loucura y la sociedad. IN: FOUCAULT, M. Estética, ética y hermenéutica. Barcelona, Paidós, 1999. Obras Esenciales, Volumen III: 73-95.
13
BAPTISTA, C.R. Inclusão em Diálogo: algumas questões que insistem...In: III Seminário Nacional de Formação de gestores – Educação Inclusiva: direito
à diversidade. Ensaios pedagógicos. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial: 36-40, 2007. 146 p
14
Folha de São Paulo, caderno A 13- Mundo -, 8 de julho de 2007.
15
FFREUD, S. O Estranho (1919), in Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago Editora, 1976, v
XVII: 273-314.
C
aro leitor e leitora, venho onde tanto a sociedade quanto o pé: independência, autonomia e
aqui opinar a respeito da sujeito com deficiência constróem emancipação, base do paradigma
educação da pessoa com juntos as relações sociais. da inclusão social.
deficiência. Para iniciar esta expo- Neste contexto, vale lembrar Partindo deste pressuposto,
sição, parto do princípio geral de que o histórico de submissão e é fácil inferir que este segmento
que a inclusão social da pessoa tutela vivido pelas pessoas com da população não pode prescin-
com deficiência é uma questão de deficiência interfere, preponde- dir de educação e trabalho neste
políticas públicas e ação bilateral, rantemente, na conquista do tri- processo de construção do novo
1
Coordenadora geral da Política de Inclusão da Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação; conselheira do Conselho Nacional dos Di-
reitos da Pessoa Portadora de Deficiência – CONADE – 2006/2008; licenciada em Letras – Universidade Estadual de Londrina. Especialista em Educação
Especial – UNIFIL. Especialista em Administração, Supervisão e Orientação Educacional – UNOPAR. Mestre em Educação pela Universidade Cidade de
São Paulo.
32 ENFOQUE
Resumo
A inclusão se traduz pela capacidade da escola em dar danças significativas na gestão da escola, tornando-a
respostas eficazes à diferença de aprendizagem dos mais democrática e participativa, compreendendo o
alunos. Ela demanda que a escola se transforme em espaço da escola como um verdadeiro campo de
espaço de trocas o qual favoreça o ato de ensinar e de ações pedagógicas e sociais, no qual as pessoas com-
aprender. Transformar a escola significa criar as condi- partilham projetos comuns. Ela se caracteriza por seu
ções para que todos participem do processo de cons- carácter colaborativo, desenvolvendo valores e organi-
trução do conhecimento independente de suas carac- zando o espaço da escola de modo que todos se sin-
terísticas particulares. A inclusão requer também mu- tam dele integrantes. Esta escola tem como princípio
1
(Ph.D) Professora da Universidade Federal do Ceará.
fundamental compartilhar liderança e estimular a troca quando o professor o percebe como sujeito de apren-
de experiências, minimizando as dificuldades do con- dizagem e organiza propostas didáticas que favore-
texto e dos alunos e favorecendo as mudanças neces- çam essa participação. Os professores que enfrentam
sárias na gestão da sala de aula e das práticas peda- o desafio da inclusão percebem que este processo
gógicas. A escola que inclui valoriza o papel social do modifica a vida escolar e a relação com os demais
aluno, pois repousa sobre o princípio da contribuição. membros da sua escola, modificando inclusive sua for-
A classe se constitui em um reagrupamento no qual mação pessoal e profissional.
cada aluno deve colaborar com o processo de constru-
ção do conhecimento dentro de suas possibilidades. A Palavras-chave: Inclusão escolar; Práticas pedagógicas;
participação ativa do aluno com deficiência é possível Educação nas diferenças.
Abstract
The inclusion is reflected by the ability of the school to and fostering the necessary changes in the manage-
respond effectively to the difference in student learning. ment of the classroom and teaching practices. The
It demands that the school would become an area of school values that includes the social role of student
trade that favors the act of teaching and learning. because it rests on the principle of contribution. The
Transforming school means creating the conditions for class constitutes a family in which each student must
everyone to participate in the process of constructing cooperate with the process of constructing knowledge
knowledge regardless of their particular characteristics. within their possibilities. The active participation of stu-
Inclusion also requires significant changes in school dents with disabilities is possible when the teacher per-
management and make it more democratic and partici- ceives as the subject of learning and organizes didactic
patory, including school space as a true field of educa- proposals that encourage such participation. Teachers
tional and social activities in which people share com- who face the challenge of inclusion realize that this
mon projects. It is characterized by its collaborative process changes the school life and relationship with
nature of developing values and organizing the space of the other members of their school, including changing
the school so that everyone feels his members. This their personal and professional development.
school has the fundamental principle of sharing leader-
ship and encourage the exchange of experiences, thus Key-words: School inclusion; Pedagogical practices,
reducing the difficulties of the context and the students Differences in education.
Introdução 2008) assegura o direito de toda cri- essa política, este atendimento as-
A premissa da inclusão escolar é ança freqüentar a escola comum, segura que os alunos aprendam o
relativamente bem compreendida esclarecendo ações que são de que é diferente do currículo do ensi-
em nosso país. A polêmica em torno competência da educação especial no comum e que é necessário para
do tema parece se situar na maneira daquelas que são de competência que possam ultrapassar as barreiras
como realizar as condições para do ensino comum. Este último é res- impostas pela deficiência. O Atendi-
concretizar a convivência e a apren- ponsável pela escolarização de to- mento Educacional Especializado
dizagem de alunos com e sem defi- dos os alunos, indistintamente, nas foi regulamentado pelo Decreto Nº.
ciência no espaço da sala de aula, classes comuns de ensino, o primei- 6.571, de 2008. O referido decreto
bem como explicitar as ações e inte- ro, pelos serviços de que podem ne- reestrutura a educação especial,
rações entre a educação especial e cessitar os alunos público alvo da consolida diretrizes e ações já exis-
os sistemas comuns de ensino. A educação especial. Dentre esses tentes, voltadas à educação inclusi-
Política da Educação Especial na serviços, a política orienta para a va, e destina recursos do Fundo da
Perspectiva de Educação Inclusiva, oferta do Atendimento Educacional Educação Básica (Fundeb) ao aten-
de janeiro de 2008 (MEC/SEESP, Especializado - AEE. De acordo com dimento de necessidades específi-
cas do segmento. que contribui com as ações daquela Segundo Hemmingson e Borell
O professor de AEE oferece comunidade educativa. Este mesmo (2002), promover a educação inclu-
acompanhamento em sala de aula preceito deve ser observado no inte- siva tem como pré-requisito a parti-
para ensinar o uso de recursos des- rior da sala de aula, espaço pedagó- cipação efetiva dos alunos, a qual
tinados aos alunos com deficiência gico em que cada aluno se constitui está relacionada ao ambiente esco-
aos professores e demais alunos. O em sujeito de aprendizagem que lar. Os autores desenvolveram na
professor do AEE deve identificar e contribui efetivamente para elabora- Suécia um estudo que teve como
desenvolver estratégias educativas ção de um saber o qual só tem sen- objetivo identificar as barreiras para
visando à superação das dificulda- tido quando compartilhado por to- a participação em escolas inclusi-
des de aprendizagem dos alunos. dos os membros da classe. vas a partir da perspectiva dos pró-
Ele inclui em suas ações: avaliação A concretização da política de in- prios estudantes com deficiência fí-
do aluno, a gestão do seu processo clusão se expressa pela criação de sica. Os resultados mostram que
de aprendizagem e acompanha- salas de recursos multifuncionais dois terços dos estudantes experi-
mento desse aluno na sala de recur- nas escolas públicas brasileira, por mentaram barreiras na participação
sos multifuncionais (espaço destina- uma política de formação de profes- tanto no ambiente físico quanto no
do para realização do AEE) e na in- sores em Atendimento Educacional social. A maioria das barreiras teve
terlocução com o professor do ensi- Especializado voltado para o atendi- origem na maneira como as ativida-
no comum. mento das crianças nessas escolas, des da escola estão organizadas e
Apesar de assegurado pelo de- bem como pela transformação das são executadas. Por exemplo, mes-
creto acima mencionado, o AEE não práticas pedagógicas e da gestão mo com todas as salas adaptadas
está implementado em todas as es- escolar nas redes de ensino. Deste fisicamente, o fato das atividades
colas brasileiras e, ainda como se modo, o desafio de escolarizar to- desenvolverem-se em lugares dife-
trata de um serviço recente, não dis- das as crianças no ensino comum rentes dependendo da disciplina,
pomos de pesquisas que indiquem não é tarefa da educação especial, dificultava a participação dos alu-
o impacto desse atendimento na mas das redes públicas de ensino. nos com deficiência física simples-
aprendizagem dos alunos que dele Uma política de vanguarda não mente pelo fato desses alunos apre-
se beneficiam. O atendimento edu- garante a acessibilidade aos sabe- sentarem maior lentidão na locomo-
cacional por si só não garante a res escolares se não houver uma ção de um espaço a outro da esco-
aprendizagem dos alunos, ou seja, verdadeira transformação no interior la. As falhas em conseguir os ajus-
mudanças substanciais no interior da escola. Faz-se necessário con- tes ambientais adequados resulta-
da escola e nos sistemas de ensino cretizar, no cotidiano dessa institui- ram na restrição da participação ou
se fazem necessárias para garantir a ção, o que já está assegurado por exclusão destes alunos de algumas
aprendizagem de todos os alunos. A lei. Não basta garantir a acessibilida- das atividades em classe. Os resul-
colaboração entre os diversos agen- de, ou seja, é preciso criar as condi- tados do estudo sugerem que a ma-
tes da escola tais como os gestores ções para que a escola se transfor- neira como as atividades estão or-
e a equipe técnica, os professores me em espaço verdadeiro de trocas ganizadas na escola devem ser o
da sala comum e os professores do que favoreçam o ato de ensinar e de principal alvo de transformação pa-
AEE é imprescindível para o desen- aprender. Neste sentido, nosso país ra garantir uma total participação
volvimento de uma prática sintoniza- ainda tem um importante caminho a dos alunos que apresentam defici-
da com as necessidades dos alu- percorrer para assegurar educação ência. Este aspecto não prevê ape-
nos. Esses profissionais devem a todos os jovens, crianças, adultos nas a previsão de atividades didáti-
aprender a trabalhar juntos e or- e adolescentes que integram o siste- cas, mas também o ambiente sócio-
questrar seus esforços em favor do ma público de ensino. interacional da escola.
desenvolvimento de uma educação Transformar a escola significa Em relação ao ambiente escolar
de qualidade. Faz-se necessário às criar as condições para que TODOS favorável à inclusão, Soodak (2003)
redes de ensino conceberem um os alunos possam atuar efetivamen- faz referência ao desenvolvimento
modelo de formação e acompanha- te nesse espaço educativo, focando de estratégias para melhorar a qua-
mento que permita a cada um des- as dificuldades do processo de lidade global do ambiente da sala
ses grupos desenvolver um saber e construção para o ambiente escolar de aula para acolher os alunos com
um saber fazer que valorize a partici- e não para as características particu- deficiência. Essas estratégias con-
pação de cada um como membro lares dos alunos. templam a organização de um am-
biente, onde os alunos se sentem quado o professor procurava discu- apoiar, estabelecendo rotinas de tra-
acolhidos, seguros e apoiados. Su- tir com todas as crianças as medi- balho cotidiano da sala de aula e as-
as principais sugestões são: criar das que deveriam ser tomadas para segurando a participação de todos
uma comunidade inclusiva, promo- contornar ou resolver aquele pro- os alunos nas atividades da classe.
ver o sentimento de pertença, facili- blema. Ainda no contexto da convivência da
tar a aproximação das crianças, fa- O autor exemplifica com o caso classe é importante reconhecer que
vorecendo a amizade entre os alu- de uma criança com síndrome de a criança é fonte de um saber e de
nos, desenvolver a colaboração en- Down que freqüentemente fugia da uma cultura. Logo, ela participa da
tre pais e professores e entre pro- sala. O professor discutiu o proble- construção de um saber coletivo de
fessores e outros membros da es- ma com a turma e pediu que escre- modo que a participação de cada
cola, apoiar e incentivar comporta- vessem possíveis soluções para fa- aluno nas atividades da classe é re-
mentos positivos em todos os alu- zer a criança ficar em sala. As solu- conhecida pelos demais colegas. O
nos e não apenas naqueles que de- ções apresentadas pelos colegas acolhimento é garantido quando o
monstram comportamentos inade- estavam vinculadas aos aspectos professor faz o acompanhamento
quados ao ambiente escolar, evitan- afetivos e atitudinais tais como: de- das estratégias utilizadas pelas cri-
do punições e expulsões. monstrar que gosta do colega com anças em suas aprendizagens, sen-
Ainda em relação à interação síndrome de Down e dar mais aten- do capaz de ouvi-la manifestando in-
entre os alunos em contexto de in- ção para ele. teresse e afetividade por ela (pelos
clusão, Bloom e Perlmutter (1999) O autor ressalta também a im- seus sucessos, suas dificuldades,
alertam que problemas relaciona- portância da crença no sucesso do suas preocupações). Estes aspec-
dos a comportamentos devem ser trabalho para que o processo de in- tos dizem respeito diretamente à
abordados como um problema clusão aconteça. Ele enfatiza que é gestão da sala de aula, mas estão
pertencente a toda a classe, e não fundamental não apenas o profes- relacionados também a gestão da
apenas ao professor. O autor res- sor acreditar que participação da- escola. Eles se constituem em ele-
salta a importância de construir quela criança na sala de aula regu- mentos centrais na mudança de
um ambiente acolhedor e interati- lar é possível, como também fazer uma escola que exclui para aquela
vo entre as crianças, contrapon- as outras crianças acreditarem nis- que inclui.
do-se à punição e repreensão. Ele so. E isso está diretamente ligado à
aponta alguns aspectos importan- capacidade de acreditar em si mes- A gestão da escola e
tes para o processo de inclusão mo e de manter a auto-estima de to-
a gestão da classe
de crianças com deficiência no dos os alunos.
que se refere ao comportamento e Em estudo por nós realizado (FI- como elementos
à interação da turma toda: a pre- GUEIREDO, 2008) em uma escola constitutivos de
paração dos demais alunos que pública em contexto de inclusão es- atenção às diferenças
devem desde sempre ser ensina- colar, constatamos que o tipo de
dos a respeitar, a cuidar uns dos convivência estabelecida na classe Mudanças na gestão da escola
outros e a expressar afetividade; a independe da presença de alunos se configuram no sentido de torná-la
auto-regulação das crianças com com deficiência, bem como as difi- mais democrática e participativa pa-
deficiência no que concerne aos culdades de inserção não estão re- ra alunos, professores e demais ato-
comportamentos apropriados pa- lacionadas à deficiência, mas a for- res desse espaço pedagógico. Sig-
ra viver em comunidade. ma como a criança é educada. No nifica compartilhar projetos e deci-
O autor observa que algumas espaço da sala da aula, a convivên- sões e desenvolver uma política que
crianças com deficiência não pos- cia se torna mais harmoniosa quan- compreenda o espaço da escola co-
suem habilidades de selecionar e do a professora consegue estabele- mo um verdadeiro campo de ações
controlar seu próprio comportamen- cer com seu grupo um ambiente on- pedagógicas e sociais, no qual as
to de modo a interagir socialmente de as crianças se sentem seguras, pessoas compartilham projetos co-
de forma positiva; trabalhar tendo respeitadas, acolhidas e percebem muns, cada um deles representando
em vista uma abordagem do tipo re- o reconhecimento do outro sobre as uma oportunidade real de desenvol-
solução de problemas: a cada suas ações. Para isso, o professor vimento pessoal e profissional. A
acontecimento perturbador provo- deve ser uma referência de seguran- gestão na escola inclusiva tem um
cado por um comportamento inade- ça sobre a qual a criança pode se caráter colaborativo que implica no
desenvolvimento de valores que mo- trabalho conjunto entre professores Uma das grandes marcas da es-
bilizam as pessoas a pensarem, vive- regulares e professores especiais, cola que inclui é a valorização do
rem e organizarem o espaço da es- sugerindo atividades que podem ser papel social do aluno, qualquer que
cola, incluindo nele todos os alunos. divididas ao mesmo tempo em sala sejam suas características, visto
Segundo Hines (2008), a atua- de aula por ambos. Por fim, o autor que esta escola repousa sobre o
ção da direção é fundamental para o reforça a importância de trabalhar princípio da contribuição. Deste mo-
sucesso na transformação de uma mediante uma sistemática de resolu- do, a classe do ensino regular se
escola para uma perspectiva inclusi- ção de conflitos. O diretor deve es- constitui em um reagrupamento no
va. A ação da direção é importante forçar-se para explorar de forma qual cada aluno deve colaborar
no sentido de guiar, estimular e faci- aprofundada as estratégias de reso- com o processo de construção do
litar a colaboração entre os profes- lução dos conflitos que surgirão. conhecimento dentro de suas pos-
sores do ensino comum e entre es- Ouvir cada professor, estimular a co- sibilidades. A valorização do papel
tes e os professores especializados, municação entre eles, esclarecer social do aluno só é possível na me-
sendo, portanto, o trabalho coletivo pontos de divergência deixando cla- dida em que ele é reconhecido por
como tarefa incontornável por parte ro para cada um a fonte do proble- seus pares como uma pessoa que
do contexto escolar. De acordo com ma e sugerindo que cheguem a um traz uma contribuição, mesmo que
o autor, quatro princípios devem fun- ponto em comum deve ser parte in- seja modesta, ao desenvolvimento
damentar o trabalho do diretor na dispensável do trabalho de uma de saberes, de saber-fazer e do sa-
perspectiva da construção de uma gestão escolar inclusiva. O aspecto ber ser coletivo. A criança percebe-
escola que inclui. O primeiro diz res- da comunicação e da colaboração se como um indivíduo que contribui
peito à manutenção de uma comuni- também foi identificado por Penafor- para o desenvolvimento de saberes
cação aberta com o corpo docente te (2009) como fundamental no pro- e do saber-fazer coletivo e retira dis-
da escola, bem como estimular e in- cesso de construção de uma escola so múltiplas vantagens. Entretanto,
termediar a comunicação livre e ho- inclusiva. Na nossa compreensão, a essa participação ativa do aluno
nesta. Dentro deste princípio, ele gestão compartilhada aumenta as com deficiência no contexto da sala
enxerga seis atividades que devem possibilidades dos atores escolares regular só é possível se o professor
ser sugeridas aos professores: assumirem os projetos da escola co- perceber esse aluno como sujeito
compartilhar experiências bem su- mo de todos e minimizando as difi- de aprendizagem e se conseguir or-
cedidas, agendar tempo para plane- culdades do contexto e dos alunos, ganizar propostas didáticas que fa-
jamento conjunto, registrar suas ati- favorecendo as mudanças necessá- voreçam essa participação.
vidades, suas preocupações e o rias na gestão da sala de aula e con- A percepção de professores de
modo como conseguiram resolvê- seqüentemente nas práticas peda- classes regulares a respeito de co-
las, visitar outras instituições que te- gógicas. Isso significa transformar mo eles organizam seu trabalho ten-
nham experiência no processo de as práticas que temos hoje (na sua do em vista a presença de um aluno
inclusão, coletar material de fontes maioria, pautadas no conceito de com deficiência foi investigada na
diversas sobre a temática da inclu- homogeneidade) em práticas que Austrália por O'Donoghue e Chal-
são e, finalmente, comemorar cada atendam às diferenças dos alunos mers (2000). A pesquisa durou em
acerto, como forma de valorizar as da sala de aula. torno de um ano letivo e teve como
pequenas conquistas. Essa transformação da escola sujeitos 22 professores de escolas
O segundo princípio consiste em não decorre apenas da demanda de ensino fundamental. Os resulta-
compartilhar a liderança e estimular de crianças com deficiência que dos permitiram classificar os profes-
a troca de conhecimento, bem como apresentam dificuldades para se sores em três categorias: 1) os que
empoderar os professores, fazendo- apropriarem dos conteúdos esco- realizavam adaptações seletivas
os capazes de compartilhar suas ex- lares, mas também de uma grande com ênfase na organização da sala
periências como professores espe- parte daquelas consideradas nor- de aula, 2) os que realizam o traba-
cializados de modo a estimular a mais que também apresentam difi- lho enfatizando metodologias (estra-
união de forças, e não a concorrên- culdades semelhantes, e ainda, tégias) de ensino e 3) aqueles que
cia entre eles. O terceiro princípio re- por uma consciência coletiva de baseavam suas modificações tendo
fere-se ao estabelecimento de me- que a escola que temos já não como foco os conteúdos curricula-
tas viáveis e objetivos comuns. Nes- atende mais as exigências da soci- res. Tais categorias foram definidas
te ponto, o autor reforça a idéia de edade atual. a partir da forma como os professo-
res elaboravam suas estratégias de mudança. Alguns professores ade- realização de projetos comuns. A
manejo de sala de aula tendo nela rem rapidamente e demonstram colaboração estabelecida entre os
um aluno com deficiência. De acor- confiança na possibilidade de de- professores, conforme já descrita
do com os autores, os professores senvolverem uma pedagogia que anteriormente, é outro aspecto que
evoluíam no processo de adaptação contemple as diferenças de todos deve ser ressaltado também na es-
de suas estratégias de sala de aula os alunos. Outros, ao contrário, re- cola das diferenças.
que consistem nas seguintes eta- sistem a essa idéia, e, há aqueles Thousand e Villa (2006) realiza-
pas: 1) Diante da informação de que que se apropriam pouco a pouco ram um estudo no qual exploraram
iriam receber alunos com deficiência dessa concepção e vão implemen- os benefícios do planejamento cola-
em suas salas, os professores co- tando pequenas mudanças no ensi- borativo e concluíram que quando
meçavam a discutir as bases legais no e na gestão da classe. Os aspec- os professores trabalham em coo-
dessa inclusão e as possibilidades tos de investimento das mudanças peração no seu planejando e em su-
de recusar esses alunos, no qual também se diferenciam. Alguns as atividades práticas de ensino,
uma certa resistência era observa- atentam rapidamente para a organi- eles tornam-se mais capazes de su-
da. 2) O professor começava a con- zação da classe e as formas de prirem as necessidades específicas
siderar efetivamente o impacto des- agrupamento de seus alunos; ou- de seus alunos e podem cumprir
se processo na sua prática de sala tros priorizam o desenvolvimento de melhor os objetivos propostos. O
de aula e no seu trabalho como um atividades com diferentes propostas estudo explicita os diferentes modos
todo e começava a considerar alte- didáticas que favorecem as diferen- de colaborar e co-ensinar, inclusive
rações em sua atividade em sala pa- tes possibilidades de manifestação tendo os estudantes como parceiros
ra realização do trabalho. 3) Os pro- de aprendizagem por parte dos alu- colaborativos. Os autores ilustram
fessores definitivamente engajavam- nos e há os que começam a trans- esses modos de colaboração com
se (ou não) no processo de inclusão formação pelo desenvolvimento da os seguintes exemplos:
de seus alunos. Nesta etapa, eles pedagogia de projetos. A autono- l Suporte natural do colega:
definem um ponto de vista e come- mia dos alunos se constitui no as- quando um colega da mesma ida-
çam a racionalizar sua execução. 4) pecto mais difícil a ser implementa- de ou mais velho pode assumir a
Os professores começam identificar do pelos professores (FIGUEIRE- responsabilidade de apoiar a parti-
as práticas que deverão ser modifi- DO, 2008b). Investigando o proces- cipação de um estudante com de-
cadas para acomodar o aluno incluí- so de mudança de práticas pedagó- ficiência em atividades curriculares
do, desenvolvem estas práticas e re- gicas no contexto da inclusão esco- e atividades sociais. Por exemplo,
organizam o trabalho de acordo lar, Lustosa (2009) observou resulta- os colegas podem tomar notas pe-
com os resultados obtidos. E, por úl- dos semelhantes no processo de lo amigo, facilitar a comunicação
timo, os professores fazem uma es- mudanças das professoras que fize- com os outros colegas conheci-
timativa das mudanças realizadas ram parte de sua pesquisa. dos, ajudar na locomoção, dentre
em suas salas e dos resultados po- Em uma escola que organiza as outras possibilidades.
sitivos do trabalho. situações de aprendizagem consi- l Suporte consultivo: ocorre quan-
A pesquisa revela ainda que os derando as diferenças, o ensino e do um ou vários adultos, muitas ve-
professores consideram que o pro- os apoios ao ensino se integram zes um professor especializado,
cesso de inclusão modifica a vida para orquestrar a aprendizagem, encontram-se regularmente com o
escolar e a relação com os demais garantindo a participação efetiva professor de sala de aula para tro-
membros da sua escola. Figueiredo dos alunos em todas as práticas car informações sobre o progresso
(2008) constatou que as professo- educativas. Elas se embasam na do estudante, avaliar a necessida-
ras em contexto de inclusão atribu- implementação de um ensino que de de adaptar ou complementar
em transformações não somente na leve em conta as especificidades materiais e solucionarem proble-
gestão da sala de aula, mas tam- de cada sujeito e que faz apelo à mas em conjunto.
bém em sua vida pessoal. Essas cooperação em situação de apren- Segundo os autores, é possível
mudanças não se fazem de modo dizagem. O professor deve respei- ainda que dois ou mais professores
similar nem nas crenças dos profes- tar os diferentes ritmos de aprendi- trabalhem colaborativamente com
sores quanto às próprias capacida- zagem dos alunos, favorecendo a grupos diferentes de estudantes
des de efetuarem a mudança nem atividade conjunta entre eles, com em diferentes situações. Essas
nos aspectos de investimento dessa e sem deficiência no momento da ações, certamente, constituem-se