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Recursos Materiais

e Patrimoniais
Autor: Prof. Herbert Gonçalves Espuny
Colaboradores: Prof. Fabio Ricardo Brandão dos Santos
Prof. André Galhardo Fernandes
Professor conteudista: Herbert Gonçalves Espuny

Administrador registrado no Conselho Regional de Administração de São Paulo (CRA‑SP), é graduado em Direito e foi
aprovado no XXV Exame de Ordem Unificado da OAB. É doutor na área de Engenharia de Produção, área de concentração
em Gestão de Sistemas de Operação e Linha de Pesquisa centrada nas Redes de Empresas e Planejamento da Produção, com
pesquisa específica na área de Produção de Conhecimento Estratégico (Inteligência) pela Universidade Paulista – UNIP. É
também mestre no Programa Interdisciplinar Adolescentes em Conflito com a Lei pela Universidade Bandeirante de São Paulo
e especialista nas áreas de Segurança Empresarial (Universidade Anhembi‑Morumbi), Segurança Pública (Fundação Escola
de Sociologia e Política de São Paulo), Inteligência de Segurança Pública (Universidade Sul de Santa Catarina), Educação a
Distância (Universidade Federal Fluminense) e História das Culturas Afro‑Brasileiras (FTC). Está se especializando em Direito
Constitucional e Administrativo e em Direito Corporativo e Compliance pela Escola Paulista de Direito (EPD). É membro
da Associação Brasileira dos Analistas de Inteligência Competitiva (Abraic) e da Associação Brasileira de Profissionais de
Segurança (ABSEG).

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

E77r Espuny, Herbert Gonçalves

Recursos Materiais e Patrimoniais. / Hebert Gonçalves Espuny. -


São Paulo: Editora Sol, 2021.
104 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e


Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230.

1. Gestão de estoques. 2. Gestão de compras. 3. Gestão de


Patrimônio. I. Título

CDU 658.7

U512.09 – 21

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
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Vice-Reitora de Graduação

Unip Interativa – EaD

Profa. Elisabete Brihy


Prof. Marcello Vannini
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático – EaD

Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Deise Alcantara Carreiro – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Lucas Ricardi
Vitor Andrade
Sumário
Recursos Materiais e Patrimoniais

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7

Unidade I
1 A ÁREA DA ADMINISTRAÇÃO DE MATERIAIS E PATRIMÔNIO...........................................................9
1.1 Conceitos iniciais......................................................................................................................................9
1.2 Noções históricas da administração de materiais................................................................... 13
1.3 Visão sistêmica das organizações................................................................................................... 16
1.3.1 Definições e conceitos........................................................................................................................... 17
1.3.2 Recursos materiais e patrimoniais.................................................................................................... 17
1.3.3 Outros recursos: humano, capital e tecnológico........................................................................ 18
2 ADMINISTRAÇÃO DE MATERIAIS............................................................................................................... 21
2.1 Conceitos gerais..................................................................................................................................... 21
2.2 Aspectos importantes.......................................................................................................................... 23
2.2.1 Responsabilidades éticas e sociais.................................................................................................... 23
2.2.2 Qualidade.................................................................................................................................................... 25
3 GESTÃO DE ESTOQUES................................................................................................................................... 26
3.1 Estoque de segurança ou estoque mínimo................................................................................ 26
3.2 Tipos de estoques.................................................................................................................................. 29
3.3 Aspectos importantes no gerenciamento de estoques......................................................... 31
3.4 Previsão de demanda........................................................................................................................... 35
4 CUSTOS DE ESTOQUES................................................................................................................................... 43
4.1 Custos de capital................................................................................................................................... 43
4.2 Outros custos.......................................................................................................................................... 45
4.2.1 Custo de armazenagem........................................................................................................................ 45
4.2.2 Custos com pessoal................................................................................................................................. 47
4.2.3 Custos com edificação........................................................................................................................... 48
4.2.4 Custos de manutenção.......................................................................................................................... 48
4.3 Ferramentas de otimização............................................................................................................... 48
4.3.1 Just in Time – JIT...................................................................................................................................... 48
4.3.2 Kanban......................................................................................................................................................... 53
Unidade II
5 GESTÃO DE COMPRAS.................................................................................................................................... 60
5.1 Pontos principais da atividade de compras................................................................................ 60
5.2 Objetivos da atividade de compras................................................................................................ 64
5.3 Dicas para uma boa gestão de compras...................................................................................... 66
6 COMPRAS NA ÁREA PÚBLICA..................................................................................................................... 68
6.1 Tipos de licitação................................................................................................................................... 70
6.2 Modalidades de licitação.................................................................................................................... 70
7 PONTOS COMPLEMENTARES DA GESTÃO DE PATRIMÔNIO............................................................ 73
7.1 Inventário................................................................................................................................................. 74
7.2 Propriedade intelectual....................................................................................................................... 75
7.2.1 Proteção sui generis............................................................................................................................. 81
8 BOAS PRÁTICAS E ÉTICA NOS NEGÓCIOS.............................................................................................. 81
8.1 Governança corporativa..................................................................................................................... 81
8.2 Compliance.............................................................................................................................................. 84
8.3 Ombudsman e outros.......................................................................................................................... 86
APRESENTAÇÃO

O mercado e as organizações passam por transformações profundas: novas técnicas, novas formas
de desenvolvimento das diversas formas de gestão e a busca constante pela qualidade e excelência.

O gestor de materiais e patrimônio trabalha particularmente numa área multidisciplinar. Princípios


de contabilidade, de direito e de administração estão na base de quem cuida dessa área.

O presente material permite que o aluno aprenda os princípios básicos de cada um desses temas,
além de permitir que se aprofunde – através das diversas referências – na área que desejar e/ou
necessitar. O material traz também uma série de conceitos importantes, que fazem parte da construção
da imagem da organização no mercado, como o respeito estrito à legislação do consumidor e aos
princípios da governança corporativa e do compliance. O aluno fará uma imersão nos temas relevantes
desta disciplina, que vão capacitá‑lo a enfrentar um mercado competitivo e dinâmico.

INTRODUÇÃO

De uma forma geral, todas as áreas de gestão estão vinculadas a algumas atividades básicas. Tais
atividades são documentadas e estudadas pela ciência da administração.

Há várias nomenclaturas, mas a ideia central está baseada nos três passos que todo gestor
precisa dominar:

• Planejar: o planejamento está baseado naquilo que se espera da atividade, no ponto em que se
pretende chegar. O bom planejamento permite chegar ao objetivo de forma mais rápida e efetiva.

• Executar: é o próximo passo. Após planejar, seguindo os caminhos previamente traçados, o gestor
deve dar andamento ao que previamente foi definido.

• Controlar: o controle está relacionado às fases anteriores. O planejamento foi bem realizado?
Há pontos em que pode ser corrigido? Após analisar o planejamento, deve‑se analisar também a
execução. Os passos foram executados conforme o planejado? Algo deve ser tirado ou acrescentado?

Enfim, o gestor deve levar em conta que todas as atividades estão relacionadas aos três pilares
mencionados. Neste livro‑texto, o gestor obterá subsídios importantes para planejar, executar e controlar
a importante área de materiais e patrimônio.

Detalhes essenciais: o conhecimento não se esgota. Além das informações obtidas neste material,
lembre‑se de consultar os links! Outro detalhe importante: as coisas mudam! Atualize‑se constantemente!

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RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

Unidade I
1 A ÁREA DA ADMINISTRAÇÃO DE MATERIAIS E PATRIMÔNIO

É importante saber que a área da Administração de Materiais e Patrimônio tem relação com alguns
conceitos importantes. A primeira ideia que o nome sugere é a de planejar, executar e controlar a área
de materiais e patrimônio. Substituir a palavra administração pelos verbos planejar, executar e controlar
caracteriza bem esta atividade. Observe estes conceitos:

• Planejar para que o dia a dia da empresa não se ressinta com a falta de materiais, por exemplo,
para a fabricação de seus produtos.

• Executar é colocar em prática o que foi estabelecido no planejamento.

• Controlar é verificar se o planejamento está correto e se a execução também transcorreu sem


qualquer problema. Se houve qualquer erro no planejamento ou na execução, o controle entra em
cena, no sentido de corrigir o que for pertinente.

É necessário, também, compreender que a vida da organização depende, em boa parte, de providências
adequadas por parte do gestor nessa área: providências mal tomadas, como estoques desorganizados,
compras fora de prazos adequados e seleção deficiente de fornecedores podem, efetivamente, causar a
perda de clientes e transformar qualquer empreendimento num grande fracasso.

Para evitar isso, esta disciplina proporcionará os conceitos e as ferramentas adequadas para uma
excelente gestão de materiais e patrimônio! Mãos à obra!

1.1 Conceitos iniciais

A área abordada neste material está vinculada à atividade na “elaboração de um pedido de compras, ou
ainda à determinação assertiva das quantidades adquiridas, evitando‑se perdas por aquisições excessivas ou
por desperdício de oportunidades devido a reposições insuficientes” (HARA, 2012, p. 13). Isso quer dizer que o
gestor precisa saber quantificar adequadamente o que comprar, para usar e estocar de forma racional.

Administrar patrimônio e materiais é entender a importância desta área para a organização e,


consequentemente, desenvolver uma rotina que propicie um funcionamento harmonizado e que atenda às
necessidades. Um dos pontos mais importantes da administração de estoques é controlar seus níveis (POZO, 2010,
p. 25). Esse processo influencia razoavelmente no desempenho e no resultado financeiro de toda a organização.

O controle de estoque recebe informações dos diversos setores da organização e, a partir de tais informações,
consegue fazer o planejamento da área. Por exemplo, se a organização for uma indústria, o planejamento da
9
Unidade I

produção é fundamental, pois envolve a compra de insumos, a programação do que será produzido e a própria
comercialização dos produtos.

A área de Planejamento e Controle da Produção (PCP) deve estar constantemente monitorada pelo
gestor de patrimônio e materiais, pois “um planejamento feito sem os devidos cuidados impossibilita a
adequada coordenação das atividades afins” (POZO, 2010, p. 99). Em outras palavras, imagine um gestor
que resolve adquirir um lote maior de insumos para um determinado produto que está sendo fabricado,
apenas porque há uma promoção no preço desse insumo, sem pensar em outros fatores, como:

• local para o estoque adequado desse insumo;

• seu prazo de validade;

• possível substituição do item em função de atualização ou modernização do produto final.

Analisando apenas esses aspectos, entre outros possíveis, será que foi um bom negócio? Será que a
economia feita no desconto do insumo não seria “perdida” com possíveis problemas ocasionados pelos
outros itens analisados?

Como podemos perceber, a área de Administração de Materiais e Patrimônio exige que o gestor tenha
visão sistêmica, ou seja, que não se concentre apenas em itens isolados. Essa visão sistêmica, ou visão do
todo, permite evitar erros que podem ocasionar perda de faturamento ou gastos excessivos e desnecessários.

Pontos importantes a serem sempre observados:

• Administrar materiais e patrimônio é uma atividade contínua, que exige conhecimentos específicos.

• O gestor deve utilizar o planejamento como instrumento para minimizar problemas nas áreas que
sustentam a organização, como a de suprimentos e fabricação.

• O planejamento, a execução e o controle devem ser utilizados harmonicamente, um


complementando o outro.

Saiba mais

Planejar é uma das mais importantes atividades da administração. Muito


do sucesso de cada área da organização depende de um bom planejamento.
Sobre o tema, leia o texto a seguir:

SOARES, D. Qual a importância do planejamento? Por que planejar?


Administradores, 11 dez. 2016. Disponível em: https://bit.ly/3zzgghy.
Acesso em: 12 dez. 2018.

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RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

Observe a figura a seguir:

Figura 1 – Exemplo de supermercado

Observe que se trata de um supermercado. Veja a distribuição das mercadorias, por setores e a
quantidade disponível de cada um dos itens. Essa distribuição e o estoque ali demonstrado não são
aleatórios. O gestor responsável deve estar atento para uma série de detalhes: a quantidade média de
vendas (para que o estoque seja adequado), o prazo de validade de cada mercadoria, a devida exposição
no cenário de vendas, entre outras preocupações. O exemplo dado é apenas para caracterizar o que
ocorre no campo do varejo.

Com as devidas variações e especificidades de cada área, os estudos também são importantes tanto
na indústria como na prestação de serviços.

Na indústria, por exemplo, há estoques de diversas naturezas: há estoques de insumos, há estoques


de produtos semiacabados (quando falta, por exemplo, uma peça específica para serem completados),
há estoques de produtos acabados (prontos para serem entregues aos clientes), entre outros tipos de
estoques específicos.

Na área de serviços, de acordo com as características da organização, pode haver estoques de


máquinas e equipamentos utilizados num determinado serviço, além de insumos para eles e materiais
necessários à prestação de determinado serviço (por exemplo, materiais de limpeza).

Agora, observe a figura seguir:


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Unidade I

Figura 2 – Exemplo de indústria

A figura mostra um exemplo de indústria, no caso, de produtos de alta tecnologia. Observe que, nesse
caso, as preocupações do gestor serão tanto com os estoques dos insumos utilizados na fabricação de
cada produto como com o estoque de cada produto fabricado que será comercializado.

E, a propósito, insumo é todo o produto necessário para a fabricação do produto final. Por exemplo,
determinada fábrica produz refresco de laranja. Quais são os insumos? Provavelmente, laranjas + água
+ açúcar. Pode haver conservantes, também.

De forma geral, no mercado, insumo muitas vezes é o nome que se dá para a matéria‑prima. Há,
entretanto, aqueles que preferem distinguir um do outro: “matéria‑prima é o material base de um
produto. Insumo é o conjunto de todos os ‘fatores’ necessários para a fabricação de um produto” (PAULA,
2013). Em outras palavras, matéria‑prima faz parte do produto: por exemplo, o algodão, em relação ao
tecido, ou a laranja, para o exemplo anterior do suco de laranja. Já o insumo é um componente, como a
água para o refresco de laranja.

Observe aqui as diferenças: para o refresco de laranja (por exemplo, feito de água, laranjas
e açúcar), a água e o açúcar são certamente os insumos. E a laranja? Há autores que entendem
tratar‑se de matéria‑prima. Outros tratam por insumo, também. Portanto, o aluno precisa tomar o
cuidado de identificar o que o autor quer dizer.

Na língua portuguesa, insumo e matéria‑prima também têm definições parecidas. Observe as


definições a seguir:

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RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

Quadro 1 – Definições

Insumo Matéria‑prima
1 Substância bruta principal, insumo básico
Todo tipo de elemento que entra no a partir do qual se fabrica determinado
processo de produção de mercadorias e/ou produto ou bem.
serviços, matérias‑primas, equipamentos, 2 FIG Aquilo a partir do qual se inicia
capital, trabalho humano etc.; input. alguma coisa que ainda se encontra em
estado bruto; base, fundamento.

Fonte: Michaelis (1998).

Esses são apenas alguns conceitos básicos. No transcorrer das unidades que compõem esta disciplina,
o aluno encontrará os principais conceitos de gestão que parametrizam a administração de materiais
e patrimônio, além de ferramentas que possam auxiliar nesse processo, como fórmulas e cálculos que
auxiliam na gestão de estoques, por exemplo.

Lembrete

Gerir materiais é monitorar para nunca faltar o necessário, mas também


evitar qualquer desperdício. A sazonalidade é um dos maiores desafios para
a gestão de materiais. Um exemplo é a venda de sorvetes nas diferenças no
verão e no inverno.

1.2 Noções históricas da administração de materiais

Administrar materiais e patrimônio não é exatamente uma atividade nova. Desde os tempos mais
antigos há notícias de obras, grandes construções e atividades que necessitavam de princípios logísticos
para serem viabilizadas. Note‑se que para cada ramo de atividade, a administração sempre foi necessária.

A história da Administração iniciou‑se num tempo muito remoto, mais


precisamente no ano 5000 a.C, na Suméria, quando os antigos sumerianos
procuravam melhorar a maneira de resolver seus problemas práticos,
exercitando assim a arte de administrar.

Depois no Egito, Ptolomeu dimensionou um sistema econômico planejado


que não poderia ter‑se operacionalizado sem uma administração pública
sistemática e organizada.

Em seguida, na China de 500 a.C, a necessidade de adotar um sistema


organizado de governo para o império, a Constituição de Chow, com
seus oito regulamentos e as Regras de Administração Pública de
Confúcio exemplificam a tentativa chinesa de definir regras e princípios
de administração.

13
Unidade I

Apontam‑se, ainda, outras raízes históricas. As instituições otomanas, pela


forma como eram administrados seus grandes feudos. Os prelados católicos, já
na Idade Média, destacando‑se como administradores natos. A Alemanha e a
Áustria, de 1550 a 1700, através do aparecimento de um grupo de professores
e administradores públicos chamados os fiscalistas ou cameralistas. Os
mercantilistas ou fisiocratas franceses, que valorizavam a riqueza física e o
Estado, pois ao lado das reformas fiscais preconizavam uma administração
sistemática, especialmente no setor público (GOMES, 2005).

Os sumérios foram pioneiros por desenvolverem “barragens para impedir o avanço da água dos
rios durante o período de cheia e por construírem reservatórios para armazenamento de água e canais
de irrigação para utilização na agricultura e para o consumo em suas cidades” (SILVA, 2018). Essas
atividades envolviam a administração adequada dos materiais utilizados nesses empreendimentos.

No Antigo Egito, os sacerdotes exerciam a função de administradores das riquezas dos faraós: “Os
sacerdotes tinham enorme prestígio e poder, tanto espiritual como material, pois administravam as
riquezas e os bens dos grandes e ricos templos. Eram também os sábios do Egito” (SILVA, 2009).

A China possui inúmeros exemplos em que a administração em geral e a administração de materiais


e patrimônio, em particular, foram extremamente significativas, muito especialmente na construção de
algumas obras, como a Muralha da China: “A gigantesca muralha da China foi construída no século III a.C.,
na dinastia Tsing, para defender o império chinês das invasões dos hunos. Ela mede aproximadamente
2.400 km de comprimento e atualmente se tornou uma grande atração turística” (SILVA, 2009).

Assim, a administração de materiais passou por várias fases na história da humanidade. Três dessas
fases merecem ainda destaque:

A Revolução Industrial, meados dos séc. XVIII e XIX, acirrou a concorrência de


mercado e sofisticou as operações de comercialização dos produtos, fazendo
com que “compras” e “estoques” ganhassem maior importância. Este período
foi marcado por modificações profundas nos métodos do sistema de fabricação
e estocagem em maior escala. O trabalho, até então, totalmente artesanal foi
em parte substituído pelas máquinas, fazendo com a produção evoluísse para
[que] um estágio tecnologicamente mais avançado e os estoques passassem a
ser vistos sob outro prisma pelas administrações. A constante evolução fabril,
o consumo, as exigências dos consumidores, o mercado concorrente e novas
tecnologias deram novo impulso à Administração de Materiais, fazendo com
que a mesma fosse vista como uma arte e uma ciência das mais importantes
para o alcance dos objetivos de uma organização seja ela qualquer que fosse
(FRANCISCHINI; GURGEL, 2002).

Além da Revolução Industrial, as fases da Primeira e Segunda Guerras Mundiais foram particularmente
importantes no tocante aos aspectos logísticos em geral e nos aspectos de administração de materiais
em particular, sejam materiais bélicos, sejam materiais de apoio para as tropas.
14
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

Mais recentemente, Francischini e Gurgel (2002) estabeleceram algumas etapas importantes


para a administração profissional de materiais nas organizações. Resgatando alguns conceitos
mais modernos, observe‑se que as fases especificadas a seguir não são necessariamente históricas,
pois expressam situações que podem ser vividas por qualquer empresa atual, dependendo da
sua estrutura:

• Fase da atividade exercida pelo proprietário: essa fase representa aquele que por conta
própria fazia praticamente tudo; logo, a parte de administração de materiais também era exercida
somente pelo dono. Comprar era a essência do negócio.

• Fase das compras integradas à produção: essa fase representa um período em que as compras
estavam tão somente ligadas à área produtiva.

• Coordenação dos serviços envolvendo materiais: essa fase representa um avanço, pois a área
de compras passa a ter uma visão sistêmica da organização. Ela começa com o planejamento
das matérias‑primas e a entrega dos produtos acabados, em uma organização independente da
área produtiva.

• Fase da agregação à área logística: a área de compras passa a fazer parte das atividades
logísticas, inclusive dando suporte também ao Marketing.

• Fase da administração de materiais: representa a fase atual. A administração de materiais está


cada vez mais especializada.

O gestor deve observar em que fase a organização se encontra e se é possível promover


melhorias pertinentes. Por exemplo, se uma determinada empresa está numa fase de crescimento
e ainda se as compras de materiais estão nas mãos de uma única pessoa, tal situação pode
representar um gargalo que prejudica a administração do setor e, consequentemente, de toda
a organização.

Saiba mais

Você sabe o que é um gargalo? Nas empresas, é algo que atrapalha a


administração. Leia o artigo:

BUZZI, E. M.; RIBEIRO, M. E. O. R.; CARLESSO, R. E. C. A Teoria


das Restrições na identificação de gargalos no setor produtivo : a
indústria Uniformes 1000 Cores. [s.d.].

Disponível em: https://bit.ly/3zxpbA8 Acesso em: 28 out. 2018.

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Unidade I

1.3 Visão sistêmica das organizações

Visão sistêmica tem a ver com a visão geral, a visão do todo. É muito importante que o gestor
aprenda a analisar qualquer problema dentro desse conceito, senão, corre o risco de não adotar a
solução correta. Por exemplo: houve um determinado fato dentro da empresa com a participação de
quatro funcionários. É importante o gestor analisar os relatos dos quatro envolvidos, principalmente
se houver diferentes interesses envolvidos, como uns acusando outros de irregularidades. Se o
gestor ouvir apenas um funcionário, ou uma das partes, pode deixar de tomar as providências
adequadas que o problema requer.

Karl Ludwig von Bertalanffy (1901‑1972) foi o primeiro autor na área da Administração a conceituar
a visão sistêmica, baseado na Teoria dos Sistemas. Bertalanffy foi biólogo e desenvolveu a Teoria Geral
dos Sistemas, que

[...] constitui‑se na busca da melhor compreensão e unificação dos


conhecimentos de uma ampla variedade de áreas altamente especializadas.
Para ele, não somente os pontos de vistas e os aspectos gerais são iguais
em diferentes ciências, mas frequentemente encontramos leis formalmente
idênticas em campos diferentes, que se aplicam a qualquer sistema,
independentemente de suas propriedades específicas (COLOSSI; BAADE,
2015, p. 11).

Derivada das concepções de Bertalanffy, a visão sistêmica busca entender a organização como um
todo. Oderich, Avelino e Queiroz (2015, p. 32) comentam:

Sistema é um “todo”, conjunto de elementos inter‑relacionados. Existem


sistemas orgânicos, a exemplo do corpo humano, e sistemas inorgânicos,
como um avião. Existem sistemas sociais, por exemplo, bairros, cidades,
estados, países. Elementos agrupados por quaisquer afinidades formam
subsistemas dentro de sistemas maiores, que, por sua vez, integram subsistemas
de outros sistemas. O organismo vivo é a metáfora para a visão sistêmica,
não mecanicista.

O gestor da área de materiais e patrimônio precisa trabalhar com visão sistêmica, pois suas decisões
envolvem uma série de vertentes da organização, que interagem constantemente.

Essa visão sistêmica busca integrar os recursos de várias áreas, tais como os recursos materiais, os
recursos patrimoniais, os recursos humanos e os recursos tecnológicos, entre outros.

A visão sistêmica é importante porque não adiantaria, por exemplo, ter equipamentos com alta
tecnologia e de última geração (recursos materiais) se não houvesse pessoas qualificadas (recursos
humanos) para operá‑los, nem a organização contratar recursos humanos supercompetentes em operar
recursos tecnológicos modernos se a organização não dispõe e não pretender adquirir tais recursos.

16
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

1.3.1 Definições e conceitos

Os bens de uma forma geral podem ser divididos em bens tangíveis e bens intangíveis, como pode ser
observado no quadro a seguir. Os bens tangíveis são aqueles que podem ser tocados, ou seja, possuem
materialidade. Já os bens intangíveis são incorpóreos.

Os recursos materiais da organização podem ser definidos como os bens tangíveis que ela possui e
com os quais trabalha para desenvolver a sua produção.

Aqui cabe uma observação: normalmente, o gestor de materiais e patrimônio pode gerir tanto
os bens materiais como imateriais. Isso depende muito do nível em que esteja inserido o gestor no
contexto da organização. Por exemplo, uma editora trabalha com os direitos autorais, tanto dos autores
que fomentam as obras como das edições patrocinadas pela editora. Esses são itens incorpóreos dos
quais, muitas vezes, o gestor de patrimônio é o responsável pela administração. O mesmo ocorre com
indústrias que trabalhem com produtos patenteados ou licenciados.

Mais adiante, serão abordadas essas formas de patrimônio, inclusive a legislação específica com a
qual o gestor deve estar sempre atualizado, pois as leis e os regramentos mudam constantemente.

Quadro 2 – Bens tangíveis e intangíveis

Bens tangíveis Bens intangíveis


Também conhecidos como bens materiais, corpóreos.
Também conhecidos como bens imateriais, incorpóreos.
Características: podem ser tocados. Possuem concretude
física. Exemplos: objetos, automóveis, prédios etc. Características: não podem ser tocados. Não possuem
concretude física. Exemplos: direitos autorais, softwares etc.
Os bens tangíveis podem ser móveis ou imóveis.

Os exemplos demonstrados no quadro explicam a divisão entre aqueles tangíveis e intangíveis.


Observe, ainda, que os bens tangíveis podem fazer parte tanto dos aspectos materiais como dos aspectos
patrimoniais da organização. Por exemplo, o prédio próprio em que está instalada a empresa é um
recurso patrimonial. Já o estoque de matéria‑prima é um recurso material. Isso será mais bem explicado
logo a seguir.

1.3.2 Recursos materiais e patrimoniais

Ainda a respeito de conceitos iniciais, é importante que o aluno saiba que alguns autores podem
não diferenciar recursos materiais daqueles considerados patrimoniais. Alguns tendem a utilizar o termo
materiais para classificar todos os bens tangíveis de uma organização.

Por exemplo, Brandão (2010) classifica os recursos materiais da seguinte maneira: “são os recursos
físicos, como edifícios, prédios, máquinas, equipamentos, instalações, ferramentas, matérias‑primas etc.”.
Ou seja, é o conjunto do que se possui como propriedade e do que se possui como instrumentos para a
produção (matéria‑prima, equipamentos e máquinas). Assim, para essa autora não há diferença entre o
que se pode classificar como material ou patrimonial.
17
Unidade I

Apesar disso, outros autores preferem a distinção entre materiais e patrimoniais, que permite uma
análise mais diferenciada. Observe o quadro a seguir:

Quadro 3 – Recursos

Definição: sempre escassos. Precisam ser administrados.


Tipos: materiais, patrimoniais, humanos, tecnológicos e de capital.
Exemplos de recursos materiais Exemplos de recursos patrimoniais

• Matérias‑primas • Prédios
— Materiais de uso cotidiano • Galpões
— Produtos acabados • Máquinas e equipamentos
— Produtos semiacabados • Veículos
— Materiais auxiliares — Terrenos

Adaptado de: Felini (2013, p. 10).

Para completar o raciocínio, pode‑se considerar, ainda, que alguns bens que fazem parte do
patrimônio da organização podem não ser exatamente tangíveis (ou materiais), por exemplo, a
marca ou uma patente. Nesse caso, tais bens são intangíveis, mas fazem parte dos recursos patrimoniais
da empresa. Por causa desse exemplo, a utilização da divisão de bens materiais e patrimoniais pode
evitar confusões.

Além daqueles já citados, há os recursos humanos, tecnológicos e de capital.

Observação

O gestor de materiais e patrimônio precisa conhecer aplicações de


Administração e Contabilidade. Dependendo do tipo da organização, o
gestor pode ter que administrar níveis variados de estoques de materiais.

1.3.3 Outros recursos: humano, capital e tecnológico

Além da gestão dos recursos materiais e patrimoniais, há outros recursos que a organização precisa
gerir. Tais recursos estão vinculados a outras gestões e/ou diretorias da organização. São eles:

Recursos Humanos

Área tradicional nas organizações, Recursos Humanos é a que trata de pessoas. Especialistas na área
costumam enfatizar que as pessoas podem ser meramente tratadas como parte da organização ou de
forma mais abrangente, como parceiros:

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RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

Os empregados podem ser tratados como recursos produtivos das


organizações: os chamados recursos humanos. Como recursos, eles precisam
ser administrados, o que envolve planejamento, organização, direção e
controle de suas atividades, já que são considerados sujeitos passivos da
ação organizacional. Daí a necessidade de administrar os recursos humanos
para obter deles o máximo rendimento possível [...].

Mas as pessoas podem ser visualizadas como parceiros das organizações.


Como tais, elas são fornecedoras de conhecimentos, habilidades, capacidades e,
sobretudo, o mais importante aporte para as organizações – a inteligência,
que proporciona decisões racionais e imprime o significado e rumo aos
objetivos globais. Desse modo, as pessoas constituem o capital intelectual
da organização (CHIAVENATO, 1999, p. 7).

Observe que apesar do nome “recursos”, quando se trata da área humana, os gestores modernos tendem
a considerar os funcionários como colaboradores que, envolvidos na empresa, conseguem alcançar mais
facilmente os objetivos. Várias são as funções do Departamento de Recursos Humanos (RH) das organizações.
Os mais comuns são: seleção, recrutamento, treinamento e reciclagem, além de tratar da parte documental
dos funcionários (registros e baixas nas carteiras de trabalho, documentos comprobatórios de estado civil,
formação etc.).

Capital

Sinônimo de dinheiro. O recurso de capital é o dinheiro que a organização dispõe para investimentos
e/ou manutenção. Contabilmente, ou seja, pelos princípios utilizados pela Contabilidade, o item que
reúne o capital das empresas é o do ativo circulante (RIBEIRO, 2011, p. 34). O capital pode ser representado
pelo dinheiro físico (o que está em caixa na própria empresa), o que está disponível em contas bancárias
ou o que está em investimentos (aplicações financeiras) com liquidez imediata.

Normalmente, os recursos de capital são gerenciados pelo departamento financeiro da organização.


O gestor de finanças (que pode ser o diretor, o gerente ou o encarregado, conforme o organograma
e/ou porte da empresa) é a quem compete planejar os recursos financeiros. Muitos dos projetos
do gestor de materiais, como a aquisição de estoques e/ou equipamentos, devem ser planejados e
executados com o setor financeiro da empresa para terem viabilidade (conseguirem alcançar os objetivos).

Tecnológico

Os recursos tecnológicos são aqueles com os quais as organizações conseguem desenvolver tanto as
suas atividades‑fim como as atividades‑meio de forma mais eficaz e eficiente.

Em outras palavras, a tecnologia pode dinamizar os processos produtivos e, também, a parte


administrativa, por exemplo.

19
Unidade I

Atualmente as empresas vêm investindo na tecnologia, sendo a mesma uma


ferramenta importante para facilitar e agilizar nos processos administrativos
dentro das organizações reduzindo custos em longo prazo. Na tecnologia,
quanto mais conhecimento produzido, mais rápido é sua evolução. Com a
inovação tecnológica é possível oferecer um produto/serviço de qualidade.

O crescimento dos negócios vem acontecendo por causa desta ferramenta


que é utilizada para planejar, organizar e controlar os funcionamentos, se
utilizados adequadamente. Com isto pode‑se minimizar as possíveis falhas
que podem ocorrer na empresa (FRANÇA, 2013).

O gestor de materiais e patrimônio deve trabalhar, também, em consonância com o gestor


de tecnologia. Normalmente, a Tecnologia da Informação (TI) é um setor que se envolve com toda
a organização, pois desenvolve controles de entrada e saída de materiais e também cadastro de
fornecedores e clientes, entre outras importantes funcionalidades.

Leia as definições de eficiência e eficácia (MARQUES, 2018):

Entenda o que é eficiência

A eficiência é o processo de executar aquilo que foi planejado, ou seja, é


colocar a “mão na massa”. Considere, por exemplo, o processo de construção
de uma casa: o tempo que demorou para a obra ser concluída, a quantia
gasta, e equação entre recursos planejados e os usados, entre outros pontos.
Caso você tenha conseguido fazer tudo a tempo, gastando menos tempo e
recursos, então você foi eficiente.

Um líder eficiente é capaz de coordenar, planejar e organizar o trabalho


de seus subordinados da melhor maneira, respeitando a competência de
cada um. A capacidade de conduzir pessoas com eficiência é um dos grandes
diferenciais competitivos do mercado, pois garante o aumento da produtividade,
redução dos conflitos e aceleração dos resultados.

Entenda o que é eficácia

Ser eficaz é conseguir atingir seu objetivo. Utilizando o mesmo exemplo


da construção, se você conseguiu construir a sua casa e finalizar a obra da
maneira como foi planejada, então você foi eficaz. A eficácia está relacionada
diretamente ao resultado.

Quando um líder é eficaz, ele impulsiona sua equipe a alcançar os objetivos


da organização. Desse modo, certamente ele irá tornar a equipe mais eficaz
e melhor preparada para enfrentar os desafios.

20
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

Observação

Todas as tarefas e atividades precisam ser empreendidas com foco na


eficiência e na eficácia.

2 ADMINISTRAÇÃO DE MATERIAIS

Vários são os tipos de materiais que o gestor vai administrar na organização. Um dos mais
importantes é o relacionado à gestão de estoques. O estoque exerce uma importância fundamental na
organização, na medida em que propicia uma segurança no desenvolvimento das atividades.

2.1 Conceitos gerais

Um estoque mal dimensionado e mal administrado pode trazer vários prejuízos:

• Prejuízo por estocar quantidade desnecessária de mercadorias: nesse caso, o excesso de mercadorias
no estoque é capital imobilizado que poderia ser aplicado em outras áreas. Além disso, estoque
envolve despesas, com armazenamento, limpeza e segurança, por exemplo.

• Prejuízo por estocar quantidade que não supra a demanda. Nesse caso, em vez do excesso, o
estoque poderá dar prejuízo pela falta de mercadorias: a organização deixa de vender porque
não dispõe do produto. Isso pode gerar perda definitiva de clientes. Além disso, há questões
relacionadas às demandas sazonais. São aquelas demandas que ocorrem somente em períodos
específicos ao longo do ano. Se o gestor não se preparar para elas, certamente perderá clientes e
poderá perder mercado.

• Além do que já foi citado, em relação ao estoque de produtos a serem comercializados, o gestor
de materiais precisa se preocupar, também, com os estoques de insumos, ou seja, os componentes
que são utilizados para a confecção de seus produtos. Há organizações com um número grande
de insumos. Imagine uma indústria automobilística: quantos insumos, isto é, quantas partes de
um veículo são necessárias para que ele tome a forma final? Milhares de itens.

• Outros itens também podem fazer parte da rotina do gestor de materiais: itens necessários à
manutenção cotidiana da organização, como materiais de limpeza, produtos utilizados para
a manutenção de máquinas e equipamentos, uniformes de determinados funcionários, produtos
alimentícios para os setores de alimentação da empresa, produtos farmacêuticos ou médicos, para
eventuais setores de emergência ou enfermagem, entre outros.

De uma forma geral, as preocupações na área de administração de materiais podem ser resumidas
em quatro itens fundamentais, que estão expressos a seguir:

21
Unidade I

Quadro 4 – Atividades primárias relacionadas com a gestão de estoques

C Compras P Pedidos
Registro do pedido/ordem de compra ou prestação de
Especificação correta dos pedidos de compra. serviço.
Avaliação, seleção e monitoramento dos fornecedores. Verificação da disponibilidade dos produtos requeridos
Definição das condições de compras: momento (quando), no estoque.
quantidade (quanto) e local de entrega (onde). Conferência do produto separado com ordem do
Definição das formas de pagamento. pedido solicitado antes de seu processo de expedição/
distribuição.
Acompanhamento do comportamento da demanda
juntamente com o estoque. Rastreamento e acompanhamento do pedido até o
momento da entrega ao cliente.
M Manutenção estoques D Distribuição
Cálculo dos níveis ideais de estoque.
Definição do modal de transportes em função das
Definição dos parâmetros de ressuprimento do estoque. disponibilidades e custos.
Monitoramento e controle dos níveis de estoques, bem Estudos de viabilidade de transporte intermodal.
como inventário físico‑financeiro.
Definição das melhores rotas e trajetos a partir de
Classificação dos materiais (curva ABC). cálculos de minimização de distância, tempo e custos.
Monitoramento da saída e da entrada de materiais. Cálculo dos custos de frete e tempo de transporte.
Definição de indicadores gerenciais.

Fonte: Tadeu e Rocha (2017, p. 23).

A área de Compras é a que alimenta a organização. Os fornecedores devem ser selecionados por
alguns critérios específicos (por exemplo, pelas certificações de qualidade que possui). Além disso, o
gestor de materiais pode fazer visitas técnicas aos fornecedores habituais, com o objetivo de verificar
se eles produzem de forma condizente. Os fornecedores devem ser avaliados constantemente, no
que se refere à qualidade dos produtos que entregam, na pontualidade do atendimento e, também
um item muito importante, nas situações em que há uma necessidade urgente, como uma situação
de demanda inesperada.

Por outro lado, outros aspectos também devem ser avaliados com o devido cuidado: a especificação
correta dos pedidos de compra. O fornecedor deve receber a informação correta, para atender
corretamente o pedido. Outras definições, como as formas de pagamento e os prazos, devem ser
previamente acertados.

Outro aspecto a ser acompanhado pelo gestor de materiais é em relação aos pedidos que a empresa
recebe. Todo e qualquer pedido deve ser devidamente registrado. Antes de aceitar o pedido, a empresa
deve verificar se há disponibilidade do produto solicitado; se não houver disponibilidade imediata,
quando haverá, para que a entrega possa ser marcada com segurança. Além disso, todo pedido deve ser
expedido sob a fiscalização – direta ou indireta – do gestor e rastreado até a entrega ao cliente.

A manutenção dos estoques é fundamental. Há cálculos específicos para que isso possa ser realizado
com segurança, além de outros indicadores que serão abordados mais adiante.

22
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

Outros conceitos importantes, como o Just in Time (JIT), o Kanban, entre outros, também
serão abordados na seção de Controle de Estoques, que complementarão alguns dos temas
abordados até aqui.

Completando os quatro itens, a distribuição deve e precisa ser acompanhada. A entrega adequada
do pedido ao cliente muitas vezes está relacionada à utilização correta de um determinado modal.
Via de regra há o transporte rodoviário para cumprir essa missão. Contudo, há regiões nas quais a
utilização de outro modal é necessária, como no interior do estado do Amazonas. Nesses casos, o estudo
antecipado de gastos extras com as entregas precisa ser desenvolvido para que a organização não arque
com eventuais prejuízos.

2.2 Aspectos importantes

A seguir serão abordados alguns tópicos que o gestor de materiais e patrimônio deve ficar atento.
A administração moderna trouxe novos enfoques que poderão auxiliar na imagem da empresa no
mercado, além de produzir relações de confiança entre os colaboradores e clientes da empresa.

2.2.1 Responsabilidades éticas e sociais

Um aspecto importante do qual nenhum gestor pode abrir mão é o respeito às responsabilidades
éticas e sociais. Sobre uma organização moderna, Marques (2017) afirma:

No mundo dos negócios cada vez mais está se falando sobre a questão
da ética. As empresas que querem ser bem-sucedidas e ter uma marca
reconhecida como confiável e honesta, estão orientando sua cultura
organizacional para um modelo ético que respeite os padrões morais
da sociedade.

Além das questões éticas, que envolvem negócios corretos, sem negociatas ou corrupção, o gestor
deve se comprometer com as questões da responsabilidade pessoal. Bortotto (2015) lembra:

A responsabilidade social é um conceito que deve perpassar toda a empresa,


desde a criação de produtos que valorizem os quatro “érres” (reduzir,
reutilizar, reciclar e respeitar a biodiversidade), passando pela fabricação
dos produtos de uma forma alinhada com conceitos verdes, até o ponto de
venda e a relação ética e transparente com clientes e consumidores. Todas
as áreas e os níveis devem ser envolvidos.

Observe que a questão do respeito ao meio ambiente, que está embutido nas ideias de reutilizar e
reciclar produtos, ocupa uma área central nas responsabilidades das organizações com a sociedade.

Uma empresa que não se preocupa com esses fatores pode cair no descrédito e sofrer consequências,
como a desvalorização de suas ações no mercado (no caso de empresas com capital aberto).

23
Unidade I

A empresa ambientalmente responsável pode, por exemplo, obter a certificação pela norma
ISO 14000.

Um dos maiores problemas certamente é o da poluição, que exige ações corretivas e preventivas.
Barros (2013, p. 90) observa:

Do ponto de vista ambiental, as soluções voltadas exclusivamente para o


controle da poluição são fundamentais, mas insuficientes. Sem esse controle, a
humanidade e a maioria dos outros seres vivos já teriam desaparecido,
a quantidade e a toxidade dos poluentes ultrapassariam, em muito, a
capacidade de assimilação da Terra.

Em outras palavras, as ações precisam ter o viés da prevenção, mas também da correção, quando
necessário. Um gestor que trate de materiais e patrimônio em qualquer organização deve ter em
mente, sempre, que as responsabilidades éticas e sociais são relevantes e determinantes. E, numa ação
conjunta – se for o caso – com os gestores de finanças e da área produtiva, deve estimular as ações de
desenvolvimento sustentável, além daquelas que possam prevenir e, até mesmo, corrigir eventuais danos
ambientais, antes mesmo de provocados por qualquer órgão governamental. Tais ações certamente
valorizam a organização.

Lembrete

O meio ambiente é direito de todos. Preservá‑lo é obrigação de todas


as organizações.

Saiba mais

Conheça mais a respeito da Ilha do Lixo em meio ao paraíso das Ilhas


Maldivas, através dessas duas reportagens:

PALETTA, G. Ilha de lixo no meio das Ilhas Maldivas mede o equivalente a


70 campos de futebol. Globo, 4 jun. 2017. Disponível em: https://glo.bo/3gBehRe.
Acesso em: 9 jul. 2018.

ITO, M. O luxo e o lixo nas Ilhas Maldivas. Brasileiras pelo Mundo,


11 nov. 2016. Disponível em: https://bit.ly/3vueVoR. Acesso em: 5 out. 2018.

24
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

2.2.2 Qualidade

Outro aspecto importante ao qual o gestor de materiais e patrimônio deve estar sempre atento
é a qualidade. A qualidade deve ser observada em todos os aspectos da organização. Há programas
específicos de qualidade, conforme o tipo de organização.

• Indústrias alimentícias: as indústrias no ramo da alimentação podem ter a certificação pela norma
ISO 22000, que trata da gestão da segurança alimentar.

• Indústrias automobilísticas: baseada na norma ISO 9000 há a norma IATF 16949, que foi criada
por fabricantes mundiais de automóveis.

Pode haver, ainda, normas específicas para inúmeros setores. Contudo, há uma norma que trata da
gestão da qualidade como um todo, a ISO 9000, que pode ser desenvolvida em qualquer organização.
Uma das características é a ênfase no processo:

Cabem aqui algumas observações. Se perguntarmos a várias pessoas


leigas, “O que é Qualidade?”, provavelmente receberemos várias respostas
diferentes. A Qualidade está ligada a sentimentos subjetivos que refletem
as necessidades internas de cada um. Muitas pessoas avaliam a Qualidade
pela aparência; outras se voltam à qualidade do material com que é feito
o produto. Outras, ainda, avaliam a Qualidade de alguma coisa pelo preço.
Existem várias dimensões da Qualidade.

O aspecto objetivo, mensurável da Qualidade, é o processo. É através dele


que se pode implantar sistemas como o da ISO 9000, por exemplo. Isto pode
ser aplicado desde a fabricação de um automóvel até a confecção de um
sanduíche. Utilizemo‑nos de dois exemplos de Qualidade nas atividades
citadas: o veículo Rolls‑Royce e os sanduíches McDonald’s. Tanto um quanto
o outro têm todas as suas etapas de desenvolvimento bem estabelecidas. É a
valorização dos processos. A tinta na coloração exata, as máquinas da linha
de produção perfeitamente reguladas, os parafusos nos lugares corretos,
o tempo de fabricação perfeitamente controlado, um veículo exatamente
igual ao outro. Da mesma forma, os componentes do sanduíche sempre
do mesmo fornecedor, a chapa de fritura aquecida na mesma temperatura,
a forma do manuseio do sanduíche sempre com higiene resultando num
produto final bastante parecido, independentemente da lanchonete que se
utilize. É o chamado padrão de Qualidade (ESPUNY, 2008).

Portanto, a organização da empresa em processos que possam ser rastreados, além de fornecerem
subsídios para treinamento e avaliação de desempenho de pessoal, possibilita que a organização possa
racionalizar as suas atividades, através de um planejamento e de um controle mais eficazes, permitindo
uma certificação pela norma de qualidade ISO 9001.

25
Unidade I

De uma forma geral, e claro, sempre de acordo com as características da organização, o gestor pode
pensar em implantar normas de qualidade e normas ambientais que, em tese, podem ser adequadas a
qualquer tipo de atividade. Já as normas específicas dependem do segmento.

3 GESTÃO DE ESTOQUES

A Gestão de Estoques tem por objetivo fazer os registros, estabelecer a fiscalização e controlar a entrada
e saída dos produtos, seja numa indústria, seja num estabelecimento varejista. Preocupa‑se tanto com os
materiais que serão utilizados para a fabricação (matéria‑prima) quanto com as mercadorias que serão
vendidas (OLIVEIRA; SILVA, 2013 p. 2‑3). Segundo esses autores, as principais funções do estoque são:

• Garantir o abastecimento de materiais à empresa, prevenindo possíveis demora de fornecimento,


problemas originados em sazonalidades, entre outros.

• Proporcionar economias através de compras adequadas, pela eficiência no atendimento às


necessidades ou outras razões do próprio processo produtivo.

A utilização de estoques sempre será uma questão controversa, na medida em que as organizações
discutem a utilização de ferramentas como o Just in Time, conforme abordamos anteriormente. Contudo,
há situações em que a manutenção de certo estoque pode ser estratégica para a organização.

Tadeu e Rocha (2017, p. 15) avaliam que há vantagens e desvantagens na utilização de estoques
e que isso está vinculado às “necessidades, capacidades e restrições reais da empresa, ou seja, sua
condição atual de operações”.

3.1 Estoque de segurança ou estoque mínimo

Quantidade de produtos (matérias‑primas para a produção ou mercadorias prontas para serem


comercializadas) necessária para que o gestor evite riscos operacionais.

Autores como Pozo (2010, p. 55‑62) citam vários métodos de cálculos para o estoque de segurança.
Há alguns bem complexos, como o Método com Grau de Atendimento Definitivo (MGAD). Contudo, o
gestor pode se utilizar de um modelo mais simples, baseado num fator de risco observável no mercado,
que é o Método do Grau de Risco (MGR). Se a organização trabalhar com produtos de alto valor agregado
ou de grande complexidade, o gestor deverá implantar métodos mais precisos.

Outro método bastante simples é aquele que calcula em função do histórico de consumo: o estoque
mínimo é calculado com a multiplicação entre a diferença do consumo máximo e o consumo médio de
determinado período pelo tempo de ressuprimento (HARA, 2012, p. 87).

Outros autores preferem um cálculo bastante simplificado, que leve em conta tão somente a
demanda e o tempo de espera (lead time para o fornecimento).

26
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

Observe a seguinte fórmula:

ES = DMD X TE

Ou seja:

ES = Estoque de Segurança

DMD = Demanda Média Diária

TE = Tempo de Entrega (em dias)

Exemplos:

a) Uma empresa qualquer produz 200 produtos por dia e vende todos no mesmo dia. O tempo de
entrega das matérias‑primas para confeccionar cada um desses produtos é de 3 dias. Qual seria o
estoque mínimo recomendado?

ES = DMD X TE

ES = 200 X 3

ES = 600

Resposta: o estoque de segurança ou estoque mínimo seria de 600 produtos.

b) Uma empresa vende 300 produtos por dia. Trata‑se de um varejista, que compra no atacado esses
produtos de um distribuidor. Considerando que o distribuidor demora 10 dias para entregar as
encomendas para o varejista, qual seria o estoque de segurança recomendado?

ES = DMD X TE

ES = 300 X 10

ES = 3000

Resposta: o estoque de segurança ou estoque mínimo seria de 3000 produtos.

Nem sempre o gestor deve se basear nas margens da fórmula recomendada. Ávilla (2015) fornece
um exemplo bastante pertinente, com a representação gráfica do estoque de segurança.

A lógica para entender o estoque mínimo é simples. No gráfico abaixo


você vai ver que o eixo x (horizontal) corresponde ao tempo e que o eixo y
(vertical) corresponde a quantidade em estoque de determinado produto.
27
Unidade I

Vamos dizer que estamos falando aqui de uma loja de roupas e que esse seja
o gráfico de estoque mínimo de bonés. Vamos ver alguns dados:

Estoque máximo: 200 bonés

Estoque médio (ou mínimo): 150 bonés

Estoque de reserva: 100

Prazo de Abastecimento: 5 dias

Prazo de Renovação: 8 dias

Vendas diárias: 10 bonés

Veja como esses dados ficariam no gráfico:


Quantidade em
estoque

200 EMax Estoque máximo


Q Q Q

Pedido Pedido Pedido


150 EMe Estoque médio

100 ER Estoque de reserva


Recebimento Recebimento Recebimento Recebimento

0
Tempo
Prazo de Prazo de
renovação abastecimento
8 dias 5 dias

Figura 3 – Gráfico estoques

Dois outros conceitos foram agregados neste exemplo, que o autor esclarece:

Prazo de abastecimento: é o tempo de reposição de itens entre o pedido


realizado, a entrega, o recebimento e os procedimentos finais para deixar o
item disponível para uso ou venda. Também é conhecido como lead time.

Estoque máximo: vai variar de acordo com o espaço para armazenamento


disponível, o custo de ter o estoque, prazo de validade e cuidados especiais
necessários (ÁVILLA, 2015).

28
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

Observando o gráfico, o autor comenta:

Observe que em um mundo ideal e com vendas constantes, teríamos o


processo se repetindo continuamente. A partir do momento do primeiro
recebimento de 80 bonés, o nosso estoque sobe de 100 para 180 bonés.
Depois de 3 dias (e vendendo 30 bonés nesse período), atingimos 150 bonés,
que é o nosso estoque mínimo, também conhecido como o ponto de pedido.
Nesse momento uma nova remessa é solicitada para os fornecedores.

Como o prazo de entrega é de 5 dias (50 bonés vendidos), veja que o nosso
estoque sai de 150 até chegar a 100. Nesse momento acaba ocorrendo mais
uma reposição e o estoque volta para os 180 bonés. A partir desse ponto, no
gráfico, tudo se repetirá normalmente (já na vida real, sabemos que essas
linhas não seriam tão uniformes) (ÁVILLA, 2015).

No exemplo apresentado, o tempo total de reposição é de 8 dias, considerando que o comerciante faz
o pedido em 3 dias depois que recebe o pedido de reposição. Contudo, o tempo que o mesmo espera
para o recebimento é de 5 dias. No total, ao longo de 8 dias ele já vendeu 80 bonés. Observe que, nesse
caso, o estoque mínimo ou de segurança será de 150 bonés, 70 a mais que a fórmula inicial estipula,
ou quase duas vezes a quantidade vendida durante o prazo de reposição (80 unidades = 10 vendas
ao dia X 8 dias).

As organizações podem estabelecer margens de segurança adequadas, de acordo com o contexto


em que estiverem inseridas.

Saiba mais

Há fórmulas mais complexas para o cálculo do estoque mínimo ou de


segurança. Leia no texto a seguir:

COELHO, L. C. O que é e como calcular o estoque de segurança – com


planilha para download. Logística Descomplicada, 20 fev. 2011. Disponível
em: https://bit.ly/35t5rQd. Acesso em: 3 out. 2018.

3.2 Tipos de estoques

Pozo (2010, p. 30) estabelece cinco tipos de estoque, os quais podem ser mantidos num mesmo
almoxarifado ou em almoxarifados diferentes. São eles:

• Matérias‑primas: componentes que serão utilizados no processo de fabricação da organização,


que vão gerar o produto acabado. Por exemplo, uma chapa metálica que será utilizada para
fabricar um carro.

29
Unidade I

• Materiais auxiliares: materiais que ajudam na fabricação. Por exemplo, óleos lubrificantes.

• Materiais de manutenção: peças que servem de apoio à manutenção geral. Por exemplo,
parafusos, pregos, ferramentas, entre outros.

• Materiais intermediários: conhecidas como peças em processos (WIP – work in process).


Constituem‑se nos produtos ainda não acabados. Por exemplo, a carcaça de um veículo.

• Materiais acabados: estoque de produtos prontos. Já podem ser enviados aos clientes. Por
exemplo, uma caixa de refrigerantes.

Observe a figura a seguir. Nela é possível observar produtos já engarrafados, em embalagens com
grandes quantidades, provavelmente para serem entregues para atacadistas ou varejistas. É um exemplo
de estoque de produtos prontos.

Figura 4 – Armazenagem

Saiba mais

Leia o artigo:

CAMPOS, M. R. R. Gestão de estoques com rastreabilidade de


materiais – estudo de caso de impactos no inventário de uma indústria
eletroeletrônica. Revista de Ciências Gerenciais, v. XII, n. 15, 2008.
Disponível em: https://bit.ly/3q15MTG. Acesso em: 2 out. 2018.

30
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

3.3 Aspectos importantes no gerenciamento de estoques

A organização precisa e depende de seus estoques para que possua um bom desempenho no mercado.
A questão básica é a da competitividade. Uma empresa competitiva deve ser capaz de oferecer produtos
de qualidade com bons preços. Cada setor da organização deve estar empenhado nesse objetivo.

Monks (1987 apud HARA, 2012, p. 19) elenca alguns fatores pelos quais os estoques existem:

• Atender aos clientes com demandas variáveis (imediatas e sazonais): o autor pretendeu com esse
item demonstrar que a flexibilidade deve ser uma vertente. O cliente deve ser atendido em suas
expectativas, mesmo que tenha uma demanda diferente da habitual.

• Proteger contra erros de suprimento, faltas e estoque esgotado: subentende‑se aqui que o
planejamento, a execução e o controle precisam acompanhar as atividades de gestão de estoques.
O gestor deve corrigir eventuais erros de forma imediata.

• Auxiliar o nivelamento das atividades de produção, estabilizar o emprego e melhorar as relações


de trabalho: na medida em que o setor produtivo esteja bem alinhado com a demanda da
organização, o relacionamento fica facilitado, tanto entre os diversos departamentos quanto em
relação às pessoas. É importante a troca constante de informações para que o gestor de materiais
e patrimônio possa atender e ser atendido pelos clientes internos.

• Decompor o processo em etapas sucessivas de modo que interrupções não parem todo o sistema:
organizar a área produtiva de modo compartimentado, de modo que problemas pontuais possam
ser resolvidos sem repercutir em toda a produção.

• Facilitar a produção de produtos diferentes nas mesmas instalações: aproveitar e valorizar o


escopo da organização.

• Fornecer um meio de obter e manusear materiais em lotes econômicos e de ganhar descontos por
quantidade: obter, através de estudos internos, dados e informações que possam gerar otimizações
no processo de produção.

• Fornecer um meio de proteção contra as incertezas de entregas e preços futuros, tais como greves,
aumentos de preços e inflação.

Observação

O gestor deve manter registros atualizados de todas as atividades.

Pozo (2010, p. 28‑29) também salienta alguns pontos relevantes, entre outros, que se constituem
nas políticas de estoque:

31
Unidade I

• Assegurar o suprimento adequado a todos os estoques (matéria‑prima, auxiliar, produtos


acabados etc.).

• Manter o nível de estoque mais baixo possível (o objetivo é não dispender dinheiro de forma
inútil, porém sempre atendendo adequadamente o cliente).

• Verificar e eliminar itens defeituosos ou obsoletos.

• Prevenção contra danos, perdas, extravios ou mau uso.

Observe que um ponto de grande importância é o treinamento de pessoal envolvido com o trabalho
em estoques. Ênfase especial deve ser dada aos estoques de medicamentos ou de produtos alimentícios,
além das especificidades próprias desses segmentos, que podem incluir:

• Cuidados especiais de manuseio: determinados produtos precisam de cuidados especiais ao


serem manuseados, sob risco de se danificarem ou de se tornarem impróprios para o consumo.
Por exemplo, caixas de ovos e empilhamento inadequado.

• Prazos de validade: este aspecto envolve, inclusive, problemas legais. Observe que um determinado
produto, com data de validade vencida, que esteja exposto à venda ou esteja em estoque junto a
outros produtos disponíveis para a venda, incorre em crime previsto no artigo 7º da Lei nº 8.137
(BRASIL, 1990b):

Art. 7° Constitui crime contra as relações de consumo:

I — favorecer ou preferir, sem justa causa, comprador ou freguês, ressalvados


os sistemas de entrega ao consumo por intermédio de distribuidores ou
revendedores;

II — vender ou expor à venda mercadoria cuja embalagem, tipo, especificação,


peso ou composição esteja em desacordo com as prescrições legais, ou que
não corresponda à respectiva classificação oficial;

III — misturar gêneros e mercadorias de espécies diferentes, para vendê‑los ou


expô‑los à venda como puros; misturar gêneros e mercadorias de qualidades
desiguais para vendê‑los ou expô‑los à venda por preço estabelecido para os
de mais mais alto custo;

IV — fraudar preços por meio de:

a) alteração, sem modificação essencial ou de qualidade, de elementos tais


como denominação, sinal externo, marca, embalagem, especificação técnica,
descrição, volume, peso, pintura ou acabamento de bem ou serviço;

32
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

b) divisão em partes de bem ou serviço, habitualmente oferecido à venda


em conjunto;

c) junção de bens ou serviços, comumente oferecidos à venda em separado;

d) aviso de inclusão de insumo não empregado na produção do bem ou na


prestação dos serviços;

V — elevar o valor cobrado nas vendas a prazo de bens ou serviços, mediante


a exigência de comissão ou de taxa de juros ilegais;

VI — sonegar insumos ou bens, recusando‑se a vendê‑los a quem pretenda


comprá‑los nas condições publicamente ofertadas, ou retê‑los para o fim de
especulação;

VII — induzir o consumidor ou usuário a erro, por via de indicação ou


afirmação falsa ou enganosa sobre a natureza, qualidade do bem ou serviço,
utilizando‑se de qualquer meio, inclusive a veiculação ou divulgação
publicitária;

VIII — destruir, inutilizar ou danificar matéria‑prima ou mercadoria, com o


fim de provocar alta de preço, em proveito próprio ou de terceiros;

IX — vender, ter em depósito para vender ou expor à venda ou, de


qualquer forma, entregar matéria‑prima ou mercadoria, em condições
impróprias ao consumo;

Pena — detenção, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, ou multa.

Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II, III e IX pune‑se a modalidade
culposa, reduzindo‑se a pena e a detenção de 1/3 (um terço) ou a de multa
à quinta parte.

O inciso IX deixa claro o “vender, ter em depósito para vender ou expor à venda ou, de qualquer forma,
entregar matéria‑prima ou mercadoria, em condições impróprias ao consumo”. A questão enfocada pela
lei é complementada pela Lei nº 8.078 (BRASIL, 1990a), Lei de Proteção ao Consumidor, que estabelece
no parágrafo 6º do inciso III do artigo 18 que:

§ 6° São impróprios ao uso e consumo:

I — os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos;

II — os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados,


corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda,
33
Unidade I

aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação,


distribuição ou apresentação;

III — os produtos que, por qualquer motivo, se revelem inadequados ao fim


a que se destinam.

Isso quer dizer que independentemente do estado em que o produto se encontre (mesmo que não
esteja deteriorado), o simples fato de estar com a data de validade vencida já o coloca na condição de
produto impróprio para o consumo, condição esta que constitui crime contra as relações de consumo,
com base na Lei nº 8.137 (BRASIL, 1990b).

Juridicamente há uma discussão bastante recente a respeito deste problema. Por exemplo, o Supremo
Tribunal de Justiça tem considerado que o simples fato de o prazo de validade estar vencido não deve
configurar o crime. No entanto, o tema é controverso. Reis (2016) pontua:

O Superior Tribunal de Justiça, no que se refere ao crime tipificado no art.


7°, IX, da Lei n° 8.137/90, tem decidido no sentido de que não basta a venda
ou exposição à venda de mercadoria com prazo de validade vencido para
a configuração de crime contra a relação de consumo, devendo haver,
necessariamente, a realização de perícia para confirmar se tal produto é
realmente impróprio ao consumo (assim, p. ex., RHC 60.937/RJ, Rel. Ministro
Sebastião Reis Júnior, 6ª T, DJe de 01/03/2016).

Ocorre que pelo teor da lei, bem como pela natureza do delito em questão,
não se pode concordar com a atual jurisprudência do STJ.

O art. 7°, inciso IX, da Lei n° 8.137/90, dispõe que “constitui crime contra
as relações de consumo vender, ter em depósito para vender ou expor à
venda, ou de qualquer forma, entregar matéria‑prima ou mercadoria, em
condições impróprias ao consumo”.

Observação

Leis podem mudar. Não esqueça de sempre verificar possíveis mudanças.

Portanto, o gestor de materiais e patrimônio por cautela deve adotar dois procedimentos básicos:

• Não permitir qualquer produto com validade vencida na prateleira de vendas ou no estoque de
produtos para vender. É necessário inspecionar o estoque sempre. Caso seja encontrado um ou
mais produtos com validade vencida (ou com outros problemas que o tornem impróprios para
o consumo), é necessário retirá‑lo dali imediatamente e, se não descartá‑lo na mesma hora, ele
deve ser deixado acomodado em um local com a inscrição “Produtos para descarte” ou “Produtos
inadequados para a venda”.
34
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

• Atualizar‑se – sempre – em relação à legislação. Mudanças podem ocorrer e é sempre


importante que a administração de materiais tenha conhecimento delas, para tomar as
providências pertinentes.

Para finalizar, o gestor também deve se preocupar com situações atípicas em que os produtos com
validade vencida podem representar problemas: por exemplo, nos restaurantes ou lanchonetes que
muitas indústrias grandes possuem inseridas em suas instalações, ou ainda nos ambulatórios ou salas
para pequenos curativos. Por cautela, é preciso verificar os produtos armazenados nessas unidades.
Mesmo que tais espaços sejam terceirizados, é prudente acordar vistorias de tempos em tempos para
evitar dissabores. Além de todas as consequências legais, os crimes contra as relações de consumo
podem ensejar repercussões negativas para a imagem e reputação da organização.

Saiba mais

Sobre os riscos inerentes à gestão de estoques, leia o artigo:

REALIDADES do risco de estoques. Revista Logística e Supply Chain,


28 ago. 2015. Disponível em: https://bit.ly/3cMvSVg. Acesso em: 13 dez. 2018.

3.4 Previsão de demanda

Vários são os métodos de previsão de demanda. Hara (2012, p. 25‑40) cita os métodos baseados em
séries temporais históricas, os modelos baseados em regressões e os métodos qualitativos de previsão.

Entre os métodos baseados em séries temporais históricas estão: método do último período, método
da média aritmética móvel, método da média ponderada móvel, método da ponderação exponencial e
previsão sazonal.

Os modelos baseados em regressão, conhecidos como modelos causais ou de causa‑efeito, são


confeccionados com o auxílio de ferramentas estatísticas.

Já os métodos qualitativos de previsão são: opinião de especialistas, método Delphi (ou Delfos) e
pesquisas de mercado.

A seguir, detalhes de alguns desses métodos.

Método da média aritmética móvel

É um método simples. Para prever a demanda do período seguinte, basta tirar a média aritmética
simples de um determinado número de períodos anteriores.

35
Unidade I

O método é expresso pela equação representada a seguir:

1 n C1 + C2 + C3 + ... + Cn
PC = ∑
n i=1
Ci =
n

A equação relaciona:

PC = previsão de consumo

Ci = consumo (ou vendas) em cada i período

n = número de períodos considerados

Veja um exemplo:

Tabela 1 – Exercício com média aritmética móvel

Meses Unidades
Janeiro 100
Fevereiro 110
Março 120
Abril 110
Maio 100
Junho 120

Na tabela, observam‑se seis meses de consumo de um determinado produto. Pela equação do


método da média aritmética móvel, nota‑se que a soma dos valores das vendas de um determinado
número de meses, dividido por esse mesmo número, serve de previsão de demanda para o mês seguinte.

Por exemplo, a título de exercício, serão considerados os primeiros seis meses do ano (de janeiro a
junho), e o objetivo é prever a demanda de julho. Logo, a soma dos produtos vendidos nos seis meses,
dividida por seis, daria a previsão de demanda:

1 100 + 110 + 120 + 110 + 100 + 120


PCjulho =
6
∑ Ci =
6
= 110

Portanto, a previsão de demanda para o mês de julho é de 110.

Caso os meses muito anteriores representem valores muito baixos ou muito acima dos números dos
últimos meses, é prudente dispensar os registros mais antigos e calcular apenas pelos últimos.

36
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

Por exemplo, se os três primeiros meses tiverem fechado com resultados bem diferentes, os cálculos
poderiam se concentrar apenas nos últimos meses. A previsão de demanda não mudaria, pois se
considerarmos a soma de abril, maio e junho, teríamos 330, que divididos por 3 resultariam na mesma
média aritmética de 110.

Problemas podem ocorrer se os resultados forem muito variados:

Tabela 2 – Exercício com média aritmética móvel 2

Meses Unidades
Janeiro 150
Fevereiro 45
Março 120
Abril 40
Maio 100
Junho 72

Nesse caso:

1 150 + 45 + 120 + 40 + 100 + 72


PCjulho =
6
∑ Ci =
6
= 87,83 = 88

Nesse caso, a demanda prevista seria de 88 unidades. Arriscada, considerando o histórico apresentado.

Saiba mais

Leia mais sobre o assunto no artigo a seguir:

ARAÚJO, G. C. et al. Previsão de Demanda e Análise Simplificada da


Gestão de Estoque Aplicada a Uma Empresa do Setor Alimentício. Brazilian
Journal of Production Engineering, São Mateus, v. 4, n. 2, p. 48‑64, 2018.
Disponível em: https://bit.ly/35qsvzb. Acesso em: 8 set. 2018.

Classificação ABC

O termo classificação ABC foi originado de um gráfico chamado “curva ABC”. Essa ferramenta permite
identificar certas prioridades, e o gestor deve agir de acordo com a importância delas.

37
Unidade I

Historicamente, o conceito da classificação ABC está vinculado ao chamado princípio de


Pareto, homenagem ao sociólogo e economista italiano Vilfredo Pareto, que nasceu em 1848 e
morreu em 1923 (FRAZÃO, 2015).

Em termos práticos, o princípio estabelece uma relação de 80/20, explicada por Luiz (2012):

A Lei de Pareto, nascida dentro da economia, quando levada para o


campo pessoal, adverte que 80% dos resultados que se alcança é consequência
de apenas 20% dos esforços empregados. Em outras palavras, determinadas
ações estratégicas podem oferecer um retorno muito maior do que
muitas outras.

O Princípio pode ser aplicado por estudantes que desejem ser bem-sucedidos,
principalmente no que diz respeito à gestão do tempo e da produtividade na
trajetória para preparação para vestibulares ou concursos públicos.

O Princípio dos 80/20 nos leva a entender que existe um desequilíbrio muito
significativo entre ações realizadas e objetivos alcançados. Esse é o primeiro
ensinamento que um estudante tem que ter em mente para se preparar bem
para o desafio principal, é que a aprovação.

Uma realidade irrefutável é que, no cenário dos vestibulares e concursos,


menos de 20% nos candidatos consegue êxito nos resultados das provas.

Sem desconsiderar os demais fatores importantes que interferem em tal


resultado, podemos dizer que quase a totalidade desses candidatos tem
um bom nível de conhecimentos em geral, mas que somente um pequeno
percentual desse universo consegue alcançar o preparo necessário para
conquistar sua vaga, ou seja, alcançar o nível de eficácia nos estudos
adequado para o desafio, a aprovação. De modo geral, muitos estudantes
(80%) não se preparam como deveriam.

A parte mais importante é que 20% de todas as causas geram 80% dos efeitos. Em outras palavras, se
o gestor priorizar corretamente as ações corretivas, consegue resolver um número maior de problemas,
agindo sobre as causas da relação 80/20.

Para isso, é necessário relacionar as ocorrências e classificá‑las em três grupos sugeridos pelo
processo, conforme esclarece Dias (2017, p. 94):

Classe A: grupo de itens mais importantes que devem ser tratados com
uma atenção bem especial da administração.

Classe B: grupo de itens em situação intermediária.

38
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

Classe C: grupo de itens menos importante que justificam pouca atenção


por parte da administração.

Apenas uma pequena observação em relação a essa classificação: o grupo C deve ser motivo de
intervenção menos urgente. O termo “pouca atenção” deve ser interpretado nesse contexto, para não
dar a impressão de que os itens elencados numa determinada classificação C não devam justificar ações
por parte do gestor. Cada situação concreta demanda análise individual. No entanto, a intenção da
classificação ABC não é deixar qualquer problema de lado e, sim, priorizar ações mais urgentes.

Outra observação importante refere‑se ao percentual 80/20. Pareto, quando estabeleceu essa relação,
motivou‑se pelos estudos a respeito da propriedade de terras na Itália. Em termos administrativos,
aproveita‑se tal relação, que não tem a mesma exatidão. Pode‑se afirmar que poucas causas provocam
a grande maioria dos efeitos.

Para entender melhor, alguns exemplos:

Exemplo 1: defeitos na produção de um determinado produto.

Após pesquisas desenvolvidas pelo setor da Qualidade da empresa X, foram constatados os seguintes
problemas de fabricação de um lote de 100 unidades com defeitos do produto A:

• 47 unidades apresentaram problemas na pintura interna;

• 32 unidades apresentaram problemas na pintura externa;

• 8 unidades apresentaram problemas de montagem;

• 7 unidades apresentaram problemas no código de barras;

• 4 unidades apresentaram problemas de embalagem;

• 2 unidades apresentaram problemas na etiquetagem.

No exemplo, há uma quantidade grande de problemas relacionados à pintura (interna e externa):


79 unidades, ou 79% do total. Já os problemas de montagem e aplicação do código de barras ocorreram
em 15 unidades, ou 15% do total. E os problemas relacionados à etiquetagem e à embalagem foram
vistos em 6 unidades, ou 6% do total. Na hipótese de o gestor não possuir esses dados em mãos e
saber apenas que há problemas nos itens descriminados, ele pode, por exemplo, dedicar‑se a resolver
o problema da etiquetagem. Ao final, resolvendo‑o, terá equacionado tão somente 2% de todos os
problemas. Em vez disso, conhecendo a classificação ABC, o gestor buscará, primeiramente, resolver
o problema da pintura. Resolvendo‑o, ele terá equacionado 77% dos problemas da organização
(a soma dos problemas da pintura interna e da pintura externa). Essa reflexão é a motivação para a
utilização da Classificação ABC na organização.

39
Unidade I

Observe que a relação não foi exatamente 80/20. Se for relacionado o número de causas elencadas,
mesmo separando as pinturas interna e externa, haverá seis causas de possíveis defeitos, ou seja, cada
causa (proporcionalmente) representa 16,67%.

No exemplo citado, duas das causas apontadas – ou seja, 33,34% das causas – são responsáveis por
79% dos efeitos (problemas encontrados). No caso do gestor que enfrentaria apenas o problema da
etiquetagem, ele estaria lidando com apenas uma causa, ou seja, 16,67%, e teria resolvido tão somente
2% de todos os efeitos (problemas encontrados).

Lembrete

A curva ABC é uma importante ferramenta de gestão. Ela estabelece


prioridades e pode ser utilizada em várias áreas da empresa.

Exemplo 2: administração do estoque.

Observe a questão objeto do Enade 2013 – Tecnologia em Gestão Hospitalar:

No suporte à tomada de decisão em gestão hospitalar, profissionais utilizam‑se de sistemas de


gerenciamento de custos. Uma das estratégias aplicadas, nesse processo, é o método de classificação
de materiais segundo a curva ABC. Na tabela a seguir, apresentam‑se os produtos da farmácia de um
hospital com as quantidades consumidas, seguidos de informações sobre os percentuais em relação ao
total das quantidades e valores de cada produto, além do custo total. Sabe‑se que o hospital gerencia
seus estoques subsidiado pelos conceitos da curva ABC, classificada em função das quantidades
consumidas de cada produto.

Tabela 3 – Consumo de produtos da farmácia do hospital

Consumo Consumo
Produtos Custo unitário Custo total
(quantidades) (percentual)
1 40.000 40 R$ 120,00 R$ 4.800.000,00
2 35.000 35 R$ 98,00 R$ 3.430.000,00
3 20.000 20 R$ 80,00 R$ 1.600.000,00
4 5.000 5 R$ 35,00 R$ 175.000,00
Totais 100.000 100 R$ 10.005.000,00

Com base nos dados apresentados, os grupos da curva ABC serão:

a) o grupo A, formado pelo item 1; o grupo B, pelos itens 2 e 3; e o grupo C, pelo item 4.

b) o grupo A, formado pelos itens 1 e 2; o grupo B, pelo item 3; o grupo C, pelo item 4.

c) o grupo A, formado pelo item 1; o grupo B, pelo item 2; o grupo C, pelos itens 3 e 4.
40
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

d) o grupo A, formado pelo item 4; o grupo B, pelos itens 2 e 3; o grupo C, pelo item 1.

e) o grupo A, formado pelos itens 3 e 4; o grupo B, pelo item 1; o grupo C, pelo item 2.

Com base no que já foi exposto, observe‑se que, nesse caso, o foco é a gestão de estoque. Com base no
princípio 80/20, pode‑se afirmar que os produtos relacionados 1 e 2 têm um consumo de 75.000 unidades
de um total de 100.000, ou seja, 75%. Já o item 3, 20.000 unidades, ou seja, 20%. E o item 4, apenas 5%.

Administrativamente, o gestor de materiais precisa se preocupar, sempre, em primeiro lugar com os


itens 1 e 2, pois são responsáveis por 75% do consumo e, proporcionalmente, por 82% do custo total.
Claro que a preocupação deve ser no suprimento de todos os produtos, mas, pela classificação ABC,
podem‑se eleger as prioridades.

Gráfico da curva ABC

Há gráficos que podem representar o que é apurado na classificação ABC. Por exemplo, um setor de
atendimentos a clientes por telefone registrou as seguintes reclamações (já ordenadas por número
de reclamações, do maior para o menor):

Tabela 4 – Exercício curva ABC

Tipos de reclamação Número de ocorrências


Falta de cortesia dos atendentes 80
Demora no atendimento telefônico 75
Telefones ocupados 32
Demora nas providências 28
Demora na entrega 12
Problemas de embalagem 09

Como o objetivo é verificar quais as providências mais urgentes que poderiam diminuir sensivelmente
o número de reclamações, foi atribuída a porcentagem relativa de cada uma das reclamações em relação
ao universo total das ocorrências.

Tabela 5 – Ocorrências com porcentagem acumulada

Item Tipos de reclamação Número de ocorrências % ocorrências % acumulado


1 Falta de cortesia dos atendentes 80 33,90 35,94
2 Telefones ocupados 75 31,78 65,68
3 Demora no atendimento telefônico 32 13,56 79,24
4 Demora na entrega 28 11,86 91,10
5 Demora nas providências 12 5,08 96,19
6 Problemas de embalagem 9 3,81 100,00
Total 236 100,00

41
Unidade I

Pode‑se observar que o número total de ocorrências foi 236. As ocorrências se dividiram entre os seis itens
especificados na coluna “Tipos de reclamação”. O primeiro item, com 80 ocorrências, acumulou 33,90% do
número total (236). O segundo item, com 75 ocorrências, ocupou 31,78% do valor total. Os dois itens acumulados
representam 65,68% do número total de ocorrências, conforme indicado na quarta coluna “% acumulado”.
E, assim, foi calculado sucessivamente até o último item, que compôs os 100% das ocorrências.

Como o objetivo era analisar quais as providências que gerariam maiores efeitos quando enfrentadas,
o gestor reuniu os dois primeiros itens na classe A, com um total de 65,68% das ocorrências; os itens 3
e 4 na classe B, com 25,42% das ocorrências; e os itens 5 e 6 na classe C, com 8,89% das ocorrências.
As figuras a seguir expressam as ocorrências por item e já reunidas em classes, em gráficos de barras:
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Falta de cortesia Telefones Demora no Demora na Demora nas Problemas de
dos atendentes ocupados atendimento entrega providências embalagem
telefônico

Figura 5 – Gráfico de número de ocorrências

Já com os itens reunidos nas respectivas classes, conforme já especificado:

• Classe A: falta de cortesia dos atendentes e demora no atendimento telefônico.

• Classe B: telefones ocupados e demora nas providências.

• Classe C: demora na entrega e problemas de embalagem.

91,1% 100%
Curva ABC; A; 155

65,68%
50%
Curva ABC; B; 60

Curva ABC; C; 21
20%

Figura 6 – Curva ABC

42
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

4 CUSTOS DE ESTOQUES

O gestor de materiais e patrimônio precisa lembrar que manter estoque sempre gera custos.
Os custos devem ser administrados na medida da necessidade. Estoques enxutos, sempre recomendados,
administrados pela filosofia do Just in Time, nem sempre resolvem totalmente o problema, haja vista
questões como a sazonalidade, vendas não esperadas, entre outras.

Dias (2017, p. 69‑70) aborda os custos relativos à manutenção de estoques:

• custos de capital;

• custos com pessoal;

• custos com edificação;

• custos de manutenção.

A seguir são analisados tais itens individualmente.

4.1 Custos de capital

Os custos de capital estão relacionados a itens como o pagamento de juros ou a depreciação,


por exemplo.

Se a organização investe capital na aquisição de insumos (para a fabricação dos produtos) ou de


estoques do próprio produto (seja comprado de terceiros, seja produzido na organização), o custo relativo
do dinheiro empregado faz parte dos custos de capital. Se a empresa usa financiamento bancário, esse
é mais um ônus que deve ser contabilizado.

Já a depreciação é a perda de valor de determinado bem, em razão do seu uso. Tecnicamente, pode
ser definida da seguinte maneira:

Depreciação corresponde ao encargo periódico que determinados bens


sofrem, por uso, obsolescência ou desgaste natural. A taxa anual de
depreciação de um bem será fixada em função do prazo, durante o qual se
possa esperar utilização econômica (ENCARGOS..., [s.d.]).

O controle da depreciação é importante por razões fiscais e contábeis. É importante na declaração


de bens ao fisco e na apresentação dos resultados contábeis da empresa.

A taxa de depreciação é calculada em função da vida útil estimada do bem. Padoveze (2014, p. 287)
aponta os bens mais comumente depreciados nas organizações. Observe a tabela:

43
Unidade I

Tabela 6 – Bens depreciáveis

Imobilizado Vida útil estimada Taxa anual de depreciação


Terrenos Indeterminada Não existe
Edifícios 25 anos 4%
Instalações 10 anos 10%
Máquinas 10 anos 10%
Móveis e utensílios 10 anos 10%
Veículos 5 anos 20%
Equipamentos de informática 5 anos 20%

Adaptada de: Padoveze (2014, p. 287).

O cálculo da taxa anual de depreciação é feito dividindo‑se o percentual de 100% pela vida útil
estimada. Por exemplo, veículos têm a vida útil calculada em cinco anos. Logo, a taxa anual é de 20%.
Em cinco anos, o bem está totalmente depreciado.

De uma forma geral, pode‑se definir: Valor residual = Valor inicial – (Depreciação X Tempo de utilização).

Exemplo: um carro custou R$ 10.000,00 e já está sendo utilizado há três anos. Qual o seu valor,
levando em consideração a depreciação, segundo a tabela que acabamos de apresentar?

Solução:

Valor inicial = R$10.000,00

Depreciação: 20%

Tempo de utilização: 3 anos

Logo:

Valor residual = 10.000,00 – (2.000,00 X 3)

Valor residual = 10.000,00 – 6.000,00

Valor residual = 4.000,00.

Observações importantes:

• A tabela de depreciação pode ser mudada. Sempre consulte o setor contábil da organização.

• A Receita Federal emite tabela oficial de depreciação de bens (BRASIL, [s.d.]).

• Procure sempre a atualização dos temas aqui tratados.

44
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

4.2 Outros custos

4.2.1 Custo de armazenagem

O custo de armazenagem pode ser calculado a partir da seguinte fórmula:

CA= (Q/2) T.P.I

Observe que:

CA = Custo de armazenagem

Q = Quantidade de material em estoque no tempo considerado

T = Tempo considerado de armazenagem

I = Taxa de armazenamento (pode ser expressa em valor unitário ou porcentagem)

Uma observação importante é que o item I é obtido a partir de diversos cálculos, que são as variáveis
obtidas em cada organização, pelas especificidades concretas de cada caso. Itens que podem ser
mensurados são a taxa de retorno do capital, a taxa de seguro, a taxa de movimentação, além de outros
custos, como os fixos (aluguel, condomínio etc.).

É importante lembrar que os custos podem variar por causa de vários fatores, tais como:

• Custos de armazém próprio ou armazém locado.

• Equipe administrativa e operacional.

• Aluguel ou depreciação de equipamentos.

• Despesas com manutenção.

Observe a figura a seguir, de acordo com informações presentes em Lima (2000):

Identificar os itens de custo



Calcular os itens de custos

Agrupar itens de custos relativos a cada função ou atividade

Alocar os custos a cada produto ou cliente

Figura 7 – Compras (etapas do custeio de armazenagem)

45
Unidade I

O autor observa que os custos de armazenagem, por mais complexa que seja a organização, podem
ser identificados através de quatro etapas.

1) Identificar os itens de custo

Lima (2000) cita alguns exemplos, como “operadores de empilhadeira, supervisores, depreciação das
empilhadeiras, custo de oportunidade das empilhadeiras, aluguel do armazém, depreciação dos racks e
custo de oportunidade dos racks”.

Observação

Rack é uma espécie de prateleira utilizada em armazéns.

Figura 8 – Exemplo de racks

2) Calcular os itens de custo

Conforme Lima (2000), “Alguns itens, como salários, benefícios, manutenção, aluguel e outros,
são obtidos com facilidade através da contabilidade. Outros itens, como a depreciação e o custo de
oportunidade, precisam ser calculados de fato [...]”.

46
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

A depreciação já foi analisada na seção de custos do estoque. Custo de oportunidade é o conceito


de que para obter algo é necessário abrir mão de outras coisas. Por exemplo: um estudante lê três horas
todos os dias, de segunda a sexta‑feira. Qual seria, nesse caso, o custo de oportunidade? Seria tudo
aquilo que ele poderia fazer nessas quinze horas semanais em que despende seu tempo com a leitura,
como passear com amigos, opções de lazer etc.

É comum, também, na literatura acadêmica e empresarial a utilização do termo em inglês trade‑off,


que tem o mesmo significado.

3) Agrupar itens de custo relativos a cada função ou atividade

Para Lima (2000), “O objetivo de agrupar os custos em funções ou atividades é facilitar a alocação
desses custos na etapa seguinte”.

Nesse caso, para facilitar os cálculos é possível reunir vários custos para um objetivo comum.
Por exemplo, um determinado armazém que tenha dois operadores de máquinas. Calculam‑se o
salário e os benefícios sociais de cada um, o custo de manutenção das máquinas, a depreciação
delas e os custos fixos do armazém para, no fim, calcular‑se, por exemplo, quanto custa o dia de
armazenamento de um determinado produto ali estocado.

4) Alocar os custos a cada produto ou cliente

Após os cálculos da etapa anterior é mais fácil atribuir os custos relacionados especificamente a
cada cliente ou produto.

Saiba mais

O custo de armazenagem envolve diversas vertentes. Saiba mais


neste artigo:

SILVA, A. P.; NASCIMENTO, S.; LIZOTE, S. A. Custos de armazenagem: um


estudo de caso em uma distribuidora de bebidas. Unoesc & Ciência – ACSA,
Joaçaba, v. 6, n. 1, p. 75‑84, jan./jun. 2015. Disponível em: https://bit.ly/3gD1DAX.
Acesso em: 4 nov. 2018.

4.2.2 Custos com pessoal

Os custos de pessoal devem ser calculados com base na mão de obra efetivamente utilizada para
o estoque. Se o funcionário não for exclusivo do estoque, seu custo deve ser fracionado e calculado
proporcionalmente. O custo salarial e os respectivos encargos sociais, além de outros benefícios
pertinentes, podem ser calculados com o auxílio do departamento de recursos humanos. O estoque
pode ter atividade relacionada aos seguintes funcionários:

47
Unidade I

• estoquistas;

• operadores de máquinas (empilhadeiras etc.);

• pessoal de limpeza;

• pessoal de segurança;

• outros (depende do tipo e do tamanho da organização).

4.2.3 Custos com edificação

Os custos com edificação têm a ver com aluguéis (quando for o caso), impostos, despesas com água,
luz, gás e conservação em geral, como eventuais pinturas, asfaltos na área etc.

Observe‑se que tais grupos podem ser associados com as despesas de pessoal. Por exemplo: se
a segurança for própria, as despesas com o pessoal da segurança serão associadas às despesas da
manutenção da atividade da segurança, como manutenção das câmeras de vigilância, uniformes,
eventuais armamentos, despesas com dispositivos de acesso, entre outros.

4.2.4 Custos de manutenção

Esses são os custos relacionados à substituição ou manutenção de máquinas e equipamentos, por


causa da deterioração, obsolescência ou manutenção, seja preventiva, seja corretiva. O gestor, no caso
de máquinas e equipamentos, deve monitorar o tempo que ficam parados, em razão da manutenção.
Isso pode, por exemplo, instruir a compra de itens de substituição.

4.3 Ferramentas de otimização

Há algumas ferramentas que podem ajudar a reduzir os custos de estoque. Essas ferramentas
propiciam administrar de forma mais racional. A seguir, serão abordadas a Just in Time – JIT e a Kanban.

4.3.1 Just in Time – JIT

O Just in Time, ou simplesmente JIT, tem a propriedade de reduzir ou eliminar desperdícios que
ocorrem em todos os setores da organização, como “compras, produção, distribuição e atividades de
apoio à produção e de qualquer atividade produtiva” (POZO, 2010, p. 99). A chamada filosofia JIT surgiu
na empresa automobilística japonesa Toyota, na década de 1950.

O JIT foi desenvolvido por Taiichi Ohno, que se baseou no seguinte raciocínio: as empresas japonesas
não tinham condições de manter grandes estoques, como as empresas norte‑americanas; logo, teriam
que adotar outra estratégia: “produzir somente conforme a demanda [...], produzir corretamente da
primeira vez; combater todos os tipos de perdas e desperdícios e promover a cultura de melhoria
contínua (Kaizen)” (HARA, 2012, p. 159). Isso quer dizer que a produção seria baseada, rigorosamente, na
48
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

necessidade de atendimento do mercado (vendas) e em processos que garantissem a ausência de erros,


evitando custos e desperdícios, e que toda a fábrica deveria pensar em se desenvolver continuamente.
Observe a figura a seguir:

Figura 9 – Exemplo de indústria automobilística

Uma indústria automobilística é um exemplo da complexidade da aplicação do JIT: milhares de


insumos que compõem a montagem de um carro que precisam ter as compras perfeitamente sintonizadas
com as linhas de produção. Além disso, a quantidade de veículos produzida deve ser perfeitamente
compatível com a demanda. Isso é o JIT. Afinal, estoque desnecessário representa custos: custos para
mantê‑lo em segurança, custos para administrá‑lo, custos dos insumos necessários para produzi‑lo.

Saiba mais

A produção enxuta é um dos princípios que as empresas modernas e de


qualidade utilizam cada vez mais. O artigo a seguir mostra este princípio
na área de máquinas agrícolas. Leia e aproveite para conhecer mais ideias
desta importante realidade da área de gestão.

SAURIN, T. A.; FERREIRA, C. F. Avaliação qualitativa da implantação de


práticas da produção enxuta: estudo de caso em uma fábrica de máquinas
agrícolas. Revista Gestão & Produção, São Carlos, v. 15, n. 3, p. 449‑462,
set./dez. 2008. Disponível em: https://bit.ly/2S6HpaK. Acesso em: 28 out. 2018.

49
Unidade I

Talvez o aspecto mais importante da ferramenta JIT seja a facilidade que propicia em relação à
gestão da produção na organização.

Como bem observa Silva (2014, p. 46‑47):

É relevante ressaltar que um sistema produtivo sem ou com poucos estoques


facilita a gestão da organização, cria segurança nos processos e estimula
a qualidade do produto final. Ratifica‑se também que no Just in Time, as
tomadas de decisões ficam mais fáceis de serem observadas e as estratégias
e diretrizes produtivas se direcionam para a melhoria e eliminação de
desperdícios. Como não existirá ou serão diminuídos os custos para manter
e alocar materiais, torna‑se mais fácil a realização de implementações e
aperfeiçoamentos nos processos com maior frequência.

Lembrete

Complementando a ideia, a eliminação de desperdícios ajuda a eficiência


e a eficácia na tomada de decisões da gestão.

Pozo (2010, p. 119‑129) enfatiza alguns elementos do JIT:

• Filosofia do JIT: o gestor deve compreender seus fundamentos e entender que não se trata
apenas de um processo. Na verdade, trata‑se de uma forma de ver as coisas em que toda a
organização precisa estar envolvida. A filosofia está centrada na eliminação do desperdício.

• Qualidade: o gestor deve procurar implantar práticas que garantam a satisfação do consumidor,
utilizando as ferramentas mais adequadas com a cultura organizacional.

• Estoques: o JIT elimina os estoques, mas não é a preocupação central. Apesar dos estoques
custarem dinheiro, eles podem esconder outros problemas organizacionais. Por exemplo, por que
manter estoques se a produção pode ser mais bem monitorada, as compras podem ser feitas
com mais exatidão e todo o processo de embalagem e distribuição pode ser mais adaptado à
demanda real? Será que o trabalho de toda essa adaptação acaba gerando uma “fuga” (onerosa!)
para um estoque desnecessário? Essas questões acabam propiciando uma nova metodologia na
implantação do JIT nas organizações.

Passos para tornar o JIT possível:

• definir as necessidades;

• definir como controlar o processo;

• definir como manter o processo sob controle.


50
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

Esses passos consistem em conhecer inicialmente todos os aspectos relativos à produção, estabelecer
as medidas adequadas para o atendimento da demanda e estabelecer o controle adequado (para mudar
rapidamente o que não estiver funcionando).

O gestor deve conhecer todos os aspectos relativos à produção, tais como: capacidade, lead time
(tempo entre o pedido feito pelo cliente e a efetiva entrega do produto) e as quantidades das vendas
(médias) e o consumo de matérias‑primas. Alguns autores chamam essa ferramenta de JIT/Lean. Isso
ocorre porque a ferramenta Lean Production, também conhecida como Produção Enxuta, tem princípios
bastante parecidos.

O sistema JIT/Lean apresenta diversas diferenças de abordagem em


relação aos sistemas tradicionais de produção. Talvez a principal seja sua
característica de “puxar” a produção ao longo do processo, de acordo com
a demanda. Nesse sistema (“puxado”), o material somente é processado em
uma operação se ele é requerido pela operação subsequente do processo,
que, quando necessita, envia um sinal (que funciona como a “ordem de
produção”) à operação fornecedora para que esta dispare a produção e a
abasteça. Se um sinal não é enviado, a operação não é disparada (CORRÊA;
CORRÊA, 2017, p. 492).

A palavra‑chave é a organização da produção de acordo com a demanda. Pensando na função


de gestor de materiais é importante observar que esse raciocínio deve ser estendido, também, para a
compra de matérias‑primas e outros materiais necessários à manutenção da organização.

O gestor deve sempre raciocinar que nos sistemas tradicionais de produção cada um dos setores
possui certa independência e, até, produz de forma individual. Muitas vezes, cada um deles se programa
para aumentar ou diminuir a produção baseado em critérios do próprio setor ou, pelo menos, enfatizando
mais as informações dele mesmo.

A diferença do sistema JIT/Lean é que a visão sistêmica é privilegiada. A produção (ou a compra de
matérias‑primas, por exemplo) é determinada por um conjunto de informações que busca compreender e
prever a demanda. Isto compreende o estudo e a pesquisa das necessidades do mercado (inclusive
as sazonalidades), das especificidades dos fornecedores, da dinâmica da produção interna, do sistema
de vendas e outros fatores que possam contribuir para uma produção enxuta responsável.

Um fator que pode interferir decididamente em todo o planejamento do gestor de materiais para a
implantação de um sistema JIT é a localização da organização na cadeia de suprimentos. A organização é
a fabricante, um distribuidor, um atacadista ou o varejista que vende direto ao consumidor? Dependendo
da posição em que a organização se encontre, o planejamento será centrado na própria produção ou
nas compras pertinentes. Isso quer dizer que o gestor terá diferentes preocupações para manter a sua
atividade enxuta.

51
Unidade I

Observe a figura a seguir:

Lead time de
produção

Fábrica

Distribuidor

Lead time Atacadista Lead time de


do pedido fornecimento

Varejista

Cliente

Figura 10 – Ciclo de materiais na cadeia de suprimentos

A figura mostra os três tipos de lead times que o gestor de materiais e patrimônio precisa monitorar,
conforme a empresa ou organização que estiver gerindo. O primeiro, o lead time do pedido, é o tempo
que demora entre o pedido que o cliente faz e a efetiva entrega. Por exemplo, o cidadão vai até uma
marcenaria, encomenda uma caixa de madeira e recebe a encomenda em três dias. O lead time do
pedido é aquele que mede o tempo entre o cliente apresentar o pedido e a entrega do produto, que
no exemplo citado seria de três dias. O segundo lead time da figura é o de fornecimento na cadeia de
suprimentos. O terceiro refere‑se exclusivamente ao tempo consumido na produção.

Vemos na figura uma cadeia complexa, pois indica o fabricante, seguido de distribuidor, atacadista,
varejista e cliente final. Normalmente, as organizações em geral, hoje em dia, não estão vinculadas a
cadeias tão extensas. Há varejistas (principalmente nas grandes redes) que compram diretamente dos
produtores. De qualquer forma, a ilustração serve para mostrar o que é possível ocorrer numa cadeia de
suprimentos, e é importante o gestor ter consciência do papel específico de cada etapa. Isso porque em
cada elo que o gestor se encontrar a negociação tem as suas características. Por exemplo, quanto mais
próximo do produtor, mais facilmente é possível adequar quantidades e dias específicos de recebimento.

Exemplo prático: vamos supor que a empresa tenha recebido uma encomenda de 100 produtos. Esses
produtos dependem de insumos que são recebidos de várias organizações da cadeia de suprimentos.
Após o recebimento de todos os insumos, há um tempo necessário para a confecção do produto e um
tempo de entrega dos produtos para o cliente. Veja os lead times:

• Insumos recebidos de um determinado produtor: 3 dias.

• Insumos recebidos de um determinado atacadista: 2 dias.

52
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

• Tempo necessário para a produção dos 100 produtos: 10 dias.

• Tempo necessário para a entrega ao cliente: 2 dias.

Do que foi exposto, observe‑se:

• Tempo do fornecimento ou lead time do recebimento de insumos (insumos recebidos): 3 dias


(considera‑se o tempo maior).

• Tempo de fabricação ou lead time da produção: 10 dias.

• Tempo de entrega: 2 dias.

Logo, teremos o lead time do pedido (tempo entre o pedido feito e efetivamente entregue ao cliente)
de 15 dias (a soma de 3 + 10 + 2 dias).

Caso houvesse todos os insumos em estoque, o prazo seria reduzido para 12 dias (10 + 2 dias). Caso
houvesse em estoque o insumo que demora 3 dias para chegar, mas não o de 2 dias, nesse caso o prazo
ou lead time do pedido seria de 14 dias (2 + 10 + 2 dias).

4.3.2 Kanban

Kanban é uma palavra de origem japonesa e significa “cartão” ou “cartaz”. É uma ferramenta
importante para a efetiva implantação do JIT, e há autores que considerem a ferramenta mais importante
do JIT (SOUZA et al., 2017, p. 372). Pode ser compreendido como uma forma visual de controlar o fluxo
produtivo.

Como características do sistema, podem ser citados:

O sistema Kanban de abastecimento apresenta algumas características


na forma de controlar os estoques de material, que lhe confere uma
verdadeira mudança na filosofia de trabalho quando ele é comparado com
o sistema tradicional de abastecimento. O sistema Kanban exige um espaço
determinado por uma área física delimitada, ou por um número fixo de
contentores ou por cartões, onde a quantidade de material próximo à linha
de produção nunca deverá ser superior àquela que estes espaços, cartões ou
contentores determinam. Da mesma forma que a quantidade de material
não pode ser superior ao máximo permitido, também não pode ser inferior
ao mínimo estabelecido. Isto significa que a existência de contentores vazios
ou cartões no quadro indica que está na hora de abastecer o estoque. Tudo
é feito apenas de forma visual, sem necessidade de formulários, ordens de
compra ou ordens de produção (AGUIAR; PEINADO, 2007, p. 138).

53
Unidade I

Essas sinalizações visuais permitem orientar a produção nas necessidades e permite que os
operadores priorizem determinados processos.

Basicamente o Kanban possui três campos: To Do (para fazer), Doing


(Em execução) e Done (Finalizado). Mas nada impede que sejam criados
novos itens. Os campos são abastecidos com cartões, que trazem informações
sobre a tarefa a ser executada, o nome da pessoa responsável e a hora que
foi pedido. Cada cartão deve conter apenas uma tarefa.

Conforme o profissional vai desenvolvendo o trabalho, ele mesmo vai


mudando o cartão de lugar, para Doing e Done, escrevendo a próxima tarefa
a ser desenvolvida e indicando um responsável.

Para facilitar, a empresa pode usar cores diferentes de cartões para


identificar o andamento das atividades (em dia, atrasadas ou com
impedimento) ou o departamento responsável (vendas, desenvolvimento,
design e conteúdo) e ainda separar os primeiros cinco minutos do dia
para fazer uma avaliação geral do quadro e definir novas diretrizes
(O QUE É..., 2016).

Pode, ainda, haver uma série de cartões sinalizando o que está no tempo certo e o que está com
o tempo esgotado (situação crítica). Pode haver sinalização de processos que dependem apenas da
produção interna e de fornecimento externo. Observe a figura a seguir. O Kanban pode e deve ser
bastante simples.

Tarefas planejadas Tarefas em execução Tarefas executadas

1 4 7

2 5 8

3 6 9

Figura 11 – Exemplo de cartões Kanban

No exemplo, temos a indicação de tarefas que foram planejadas, as que estão sendo executadas e as
que já terminaram. Observe que o importante é que a sinalização seja clara, simples e objetiva, para que
os funcionários possam otimizar o processo.

54
RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

Saiba mais

Para aumentar o conhecimento a respeito do Just in Time e da


ferramenta Kanban é interessante que o estudante conheça alguns casos
específicos sobre o tema. Busque o assunto em sites especializados em
artigos científicos, como o Google Acadêmico (https://scholar.google.com.br/)
ou o Scielo (http://www.scielo.br/). Quanto mais o aluno ler e estudar artigos
científicos sobre o tema, mais intimidade terá e mais visão de aplicabilidade
prática obterá.

Para exemplificar, três artigos sobre os temas elencados:

FEITOSA, M. J. S. et al. Análise da aplicação do sistema Just in Time em


uma indústria calçadista de Campina Grande – PB: um estudo de caso na
São Paulo Alpargatas. Ingepro – Inovação, Gestão e Produção, v. 2, n. 9, set.
2010. Disponível em: https://bit.ly/3xocPs7. Acesso em: 14 dez. 2018.

OLIVEIRA, A. A.; SCHIMIGUEL, J. Produção enxuta: estudo de caso de


uma melhoria kaizen em uma empresa automotiva. Revista de Estudos e
Reflexões Tecnológicas da Faculdade de Tecnologia de Indaiatuba, n. 13,
2015. Disponível em: https://bit.ly/3q3SaqF. Acesso em: 12 out. 2018.

SILVA, T. B.; SOUSA, T. M. P. de. Administração de materiais: estudo de


caso do processo de estocagem da empresa Medtronic. Revista de Iniciação
Científica da Libertas, São Sebastião do Paraíso, v. 5, n. 2, dez. 2015.
Disponível em: https://bit.ly/3wwcIuq. Acesso em: 12 out. 2018.

Observação

Procure no lugar certo. Se o contexto, por exemplo, pedir dados


específicos da indústria de eletroeletrônicos, uma das mais importantes
atividades do mercado brasileiro, faça uma busca no site da Associação
Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abnee) http://www.abinee.org.br

55
Unidade I

Resumo

Esta unidade teve como objetivo apresentar os conceitos iniciais da


área de gestão de materiais e patrimônio. Há alguns temas que o gestor
precisa conhecer: conceitos de controle e estoques, controle da produção,
compras e princípios relacionados à produção (como questões relacionadas
à demanda e à sazonalidade, entre outros), a diferenciação entre os bens
que uma organização possui, tangíveis e intangíveis, e outros conceitos em
relação aos recursos materiais e patrimoniais.

Outros diferentes tipos de recursos, como os recursos humanos e


tecnológicos e o capital, foram vistos. Foi abordada, também, a visão
sistêmica que toda organização precisa ter, especialmente nessa área de
materiais e patrimônio.

Foram estudados conceitos relativos à história do tema, bem como


a posição atual das organizações, na qual apenas uma pessoa pode ser
responsável pela área, ou toda uma organização adequada, sempre levando
em consideração o tamanho e a complexidade da empresa.

Posteriormente, foram abordadas algumas preocupações importantes


dos gestores da área de materiais e patrimônio: a gestão de estoques e os
custos de estoques.

Na gestão de estoques, foram expostos os tipos de estoques, conceitos


ligados à previsão da demanda e ao estoque de segurança. Também, alguns
conceitos relacionados aos aspectos legais, como a preocupação com
eventuais produtos com datas de validade vencidas.

Nos custos de estoque, foram acentuados os custos de capital e outros


custos – com o pessoal e com a armazenagem, por exemplo.

Por fim, foram mostradas ferramentas importantes para o gerenciamento


de estoques, como a Just in Time e a Kanban.

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RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

Exercícios

Questão 1. O analista de demanda, também chamado de Demand Planning, toma suas decisões a
partir de feedbacks apresentados pelo time comercial de uma empresa. Diretores, gerentes, supervisores
e vendedores montam suas projeções de vendas baseando‑se na expectativa dos números de cada
um dos clientes individualmente, a partir dos quais se permite estimar os insumos, matérias‑primas
e produtos que serão necessários ao atendimento dessa demanda agregada. Além disso, o analista
de demanda também conta com feedbacks dos integrantes da área financeira e logística da empresa.
Os primeiros falarão sobre a capacidade que a empresa tem de adquirir materiais no curto, médio e
longo prazos, enquanto os demais apontarão as próximas chegadas e despachos de materiais. As pessoas
envolvidas no processo de demanda de uma empresa acabam por integrar‑se com muitas outras áreas
da companhia, seja de forma direta indireta. Essa integração também é conhecida por:

A) Visão sistêmica.

B) Visão holística.

C) Visão geral.

D) Visão localizada.

E) Visão generalista.

Resposta correta: alternativa A.

Análise das alternativas

A) Alternativa correta.

Justificativa: a visão sistêmica permite que diversas áreas possam criar conexões e integrações,
permitindo que, além de eficaz, a gestão de materiais e patrimônio seja eficiente.

B) Alternativa incorreta.

Justificativa: apesar de guardar alguma semelhança no sentido da palavra – holístico representa o


todo –, não há menção de visão holísticas nos trabalhos de gestão de materiais e patrimônio.

C) Alternativa incorreta.

Justificativa: a visão geral permite que se observe tudo o que se necessita, no entanto, o nome
correto do conceito nem se assemelha à visão geral.

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Unidade I

D) Alternativa incorreta.

Justificativa: a visão localizada não está correta, primeiro pelo uso da palavra, o que nos permite
intuir que a questão está errada. Uma visão localizada, sem integração, certamente não seria ideal em
um processo que envolve diversas áreas da companhia.

E) Alternativa incorreta.

Justificativa: o termo “visão generalista” não aparece em nenhum momento dos estudos de gestão
de materiais e patrimônio.

Questão 2. “Quando uma empresa decide manter um ES, na prática o que ela está decidindo é obter
do fornecedor (no caso de itens comprados) uma quantidade além daquela necessária para atender à
demanda planejada e que será usada no caso de ocorrer alguma eventualidade (caso o consumo seja
maior do que o planejado, por exemplo)” (GUERRA, 2009).

Uma das formas mais simples cálculo de estoque mínimo é o que leva em conta a demanda e
o tempo de espera médio (lead time) das entregas de insumos e matérias‑primas. Sob esse aspecto,
imagine que determinada empresa que tenha demanda diária de 5.420 produtos “A” e que o lead time
médio da reposição desses itens seja de 3 dias. Observando o método mais simples para o cálculo de
estoque mínimo, o estoque de segurança (ES) atribuído para este item seria de:

A) 10.840

B) 12.840

C) 16.260

D) 32.520

E) 42.520

Resposta correta: alternativa C.

Análise das alternativas

A) Alternativa incorreta.

Justificativa: se o estoque de segurança (ES) é igual à demanda média diária (DMD), multiplicada
pelo tempo de entrega (TE), então 10.840 seria o estoque de segurança correto se o tempo de entrega
fosse menor em 33%.

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RECURSOS MATERIAIS E PATRIMONIAIS

B) Alternativa incorreta.

Justificativa: se o estoque de segurança (ES) é igual à demanda média diária (DMD), multiplicada
pelo tempo de entrega (TE), então 12.840 seria o estoque de segurança acrescido em 2.000 unidades se
o tempo de entrega fosse menor em 33%.

C) Alternativa correta.

Justificativa: se o estoque de segurança (ES) é igual à demanda média diária (DMD), multiplicada
pelo tempo de entrega (TE), então ES = 5.420x3, ou ES = 16.260.

D) Alternativa incorreta.

Justificativa: se o estoque de segurança (ES) é igual à demanda média diária (DMD), multiplicada
pelo tempo de entrega (TE), então 32.520 seria o estoque de segurança correto se o tempo de entrega
fosse maior em 100%

E) Alternativa incorreta.

Justificativa: se o estoque de segurança (ES) é igual à demanda média diária (DMD), multiplicada
pelo tempo de entrega (TE), então 32.520 seria o estoque de segurança correto se o tempo de entrega
fosse maior em 100%, além disso, acrescido em mais 10.000 unidades.

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