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Exma. Sra. Dra.

Mariana Crespo,

Por solicitação do Gabinete da Sra. Ministra, vem a Direcção-Geral de Inovação e


Desenvolvimento Curricular (DGIDC) responder à exposição elaborada por V. Excia,
na qual se afirma que “as escolas básicas e secundárias do nosso país, não
possuindo tal alvará, recebem animais para manipulação dos mesmos em aulas
práticas” e que solicita ao Ministério da Educação esclarecimento sobre “que regras
pretende este Ministério ditar para impedir o uso de animais nas aulas do ensino
básico e secundário”, vimos informar que:

Sob o ponto de vista jurídico,

As normas regulamentadoras desta matéria estão contidas não apenas no Decreto-Lei


n º 129/92, de 6 de Julho, mas também na sua regulamentação, constante da Portaria
nº 1005/92, de 23 de Outubro, portaria esta que também foi assinada pelo Ministro da
Educação.

Desconhece-se se as escolas ou agrupamentos aplicam ou não as disposições


constantes da citada Portaria, dada a sua autonomia., assim como se desconhecem
quaisquer instruções que tenham sido transmitidas às mesmas sobre experimentações
em animais vivos, não tendo tal questão sido colocada a esta Direcção-Geral, tanto
quanto é do nosso conhecimento.

Sob o ponto de vista da gestão curricular,

A DGIDC não tem conhecimento da existência de manipulação experimental (que


recorra a métodos intrusivos ou que causem sofrimento) com animais vivos em aulas
práticas realizadas nas escolas básicas e secundárias portuguesas.

No entanto no que respeita ao Ensino Experimental das Ciências, devem ter-se em


conta as seguintes considerações, concordantes com as recomendações políticas e
de associações científicas e profissionais, nacionais e internacionais, na área da
Educação em Ciência:

1. O ensino de base experimental é imprescindível à melhoria da literacia científica,


nomeadamente no que respeita à compreensão de conceitos científicos, à análise
crítica de problemas éticos e sócio-científicos e à motivação das crianças e jovens
pelas carreiras científicas.

2. Diversas actividades experimentais ou de observação envolvem o uso de


determinados espécimes biológicos, sendo de encorajar actividades tais como as que
a seguir se apresentam:

a) A manutenção de animais de estimação em sala de aula, tais como


tartarugas, peixes, e aves, pelos quais as crianças se responsabilizam no que respeita
à manutenção das suas condições vitais e de bem-estar (Cuidados de higiene, saúde
e alimentação) é uma forma de promover a compreensão sobre as necessidades dos
seres vivos, o respeito pela vida e o desenvolvimento do sentido de responsabilidade.

b) No âmbito da ecologia e dos ecossistemas, recomenda-se o estudo


experimental de factores do ambiente que afectam o comportamento de determinados
seres vivos. Uma das actividades pode consistir, por exemplo, no estudo da influência
da luz no comportamento de minhocas. (Apesar de que o mais frequente nesta
temática, seja o uso de plantas, não só pela maior facilidade de aquisição, como
também de manipulação.) Trabalhos práticos desta natureza são ideais para o
desenvolvimento de determinadas competências científicas, nomeadamente de
esquemas de raciocínio do tipo causa-efeito e de planificação de procedimentos
experimentais que impliquem o controlo de variáveis. Experiências deste tipo são
relativamente rápidas e correspondem a simulações do que acontece na natureza
quando os animais respondem a estímulos, não implicando sofrimento.

c) Outro tipo de actividade, muitas vezes usada no estudo da ecologia, é a


simulação de ecossistemas naturais, terrestres ou aquáticos, através da construção e
manutenção de terrários ou aquários, em sala de aula. Neste caso, as crianças e
jovens devem criar todas as condições de equilíbrio, necessárias à manutenção do
“ecossistema”, nomeadamente no que respeita aos factores bióticos e abióticos.

d) Finalmente, é recomendado, no estudo dos seres vivos, a realização de


actividades experimentais para dissecação de alguns órgãos. Este tipo de trabalho
possibilita, não só o conhecimento mais pormenorizado de características
morfológicas e fisiológicas destes órgãos, mas também o manuseamento de material
laboratorial que se utiliza preferencialmente nestas actividades. Este tipo de trabalho
não é feito com animais vivos, mas sim com órgãos adquiridos em lojas de produtos
alimentares.

3. As questões éticas, morais e sociais (das quais a manipulação de animais para fins
científicos, é um exemplo) constituem uma das dimensões inerentes a uma tipologia
de actividade didáctica, recomendada para a educação em ciência, as chamadas
“Discussões de Temas Controversos”.

Este tipo de actividade pretende desenvolver- para além das capacidades de análise
de informação, argumentação e negociação-, a compreensão de que nos processos
reais de tomada de decisão concorrem diversas perspectivas, reflectindo interesses e
valores diferentes e que perante questões dilemáticas não existe uma resposta única e
certa, mas antes tomadas decisão que implicam, quase sempre, um assumir de
compromissos.

As Discusssões de Temas Controversos são, já, frequentemente exploradas pelos


professores de Ciências no âmbito da abordagem “Ciência-Tecnologia-Sociedade”,
que percorre todos os programas disciplinares de ciências, quer no ensino básico,
quer no ensino secundário, que integram o Currículo Nacional português.

4. Nalguns países, nomeadamente nos EUA, algumas instituições científicas,


nomeadamente a NSTA (National Science Teachers Association) e a National
Academy of Sciences procederam à divulgação de recomendações e guidelines para o
uso de animais em laboratórios de escolas básicas e secundárias. Essas
recomendações não constituem Lei e, no caso das guidelines analisados (Principles
and Guidelines for the use of Animals in Precollege Education, em anexo), não foram
publicadas pelo Ministério da Educação, mas sim por associações científicas em
colaboração com instituições com uma missão análoga à da Plataforma de Objecção
ao Biotério (POB).

5. Sublinha-se, ainda, o elevado prestígio das Instituições que publicaram


as guidelines americanas, considerando-se que, caso a POB venha a equacionar a
produção de um documento semelhante, estas se pode constituir como um elemento a
ter em consideração

Com os melhores cumprimentos,

Luisa Ucha

DGIDC
Directora de Serviços de Desenvolvimento Curricular

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