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RESUMO
Objetiva-se refletir sobre a violência na escola sob uma perspectiva teórica psicanalítica. Educadores e
alunos são implicados no processo de manifestação da violência na escola quando, diante de conflitos,
buscam negar a alteridade própria às relações humanas. Apresentam-se diferentes posições da teoria
psicanalítica sobre a violência e, em seguida, analisa-se a violência nas relações pedagógicas à luz de
uma dessas posições. Ao final, avaliam-se algumas conseqüências para a escola e indicam-se eixos
orientadores para uma educação não violenta.
N a mitologia fenícia, o leviatã era identificado como um monstro marinho do caos original. Não
à toa, na tradição judaico-cristã, ele, séculos depois, foi utilizado por Hobbes (1979) para nomear seu
livro de filosofia política, cujo argumento busca fundamentar a necessidade do estado moderno para a
regulação dos interesses e paixões individuais como garantia da vida social: violento em sua natureza, o
homem só pode atender às suas necessidades em sociedade que, mais forte que ele, faz-se organizar e
representar pelo poder estatal.
A lógica de Hobbes, fundada nessa tradição que afirma haver nos homens uma natureza perversa
que precisa de controle e disciplina, é um bom exemplo de como a violência instiga, até hoje, tanto
assombro quanto repúdio, sem que, com isso, boa parte dessa aura mítica se desfaça: ela continua
enigmática porque põe em questão a possibilidade de existirmos como seres sociais em contraposição,
inclusive, com nossos desejos individuais.
Muito se tem falado sobre a violência na escola, ultimamente, com discursos que terminam por
caracterizar a violência como uma espécie de monstro mítico e terrível que indefensavelmente assal-
ta, por assim dizer, a escola-vítima. Contudo, passa despercebido ao senso comum que a escola
também muitas vezes pode funcionar de maneira violenta, particularmente quando reproduz
acriticamente ideologias e relações de poder autoritárias. Assim, ela sempre esteve implicada em
algumas das manifestações cotidianas de violência – silenciosas e legitimadas pelas instituições, mas
igualmente danosas. E se hoje uma face mais visível da violência – as agressões físicas e morais; as
depredações dos prédios escolares; o porte de armas e o tráfico de drogas no interior e cercanias da
escola – preocupa, cumpre perguntar: por que tratá-la ainda (e apenas) como se ela fosse externa,
projetada no outro e na sociedade, eximindo-se a escola de sua parcela de responsabilidade nesse
processo? Por que manter a fantasia da escola edênica?
O que se propõe neste trabalho é o entendimento do fenômeno dentro de uma perspectiva
institucional que reposiciona a violência no contexto das relações pedagógicas de modo que todos
possam, eventualmente, estar envolvidos na sua (re)produção, por meio de teias muitas vezes in-
conscientes no meio das quais se busca a negação da alteridade – em particular os educadores (dire-
ção, corpo técnico, professores) e os alunos. Nesse sentido, cumpre, em primeiro lugar, entender a
violência, do ponto de vista das contribuições trazidas pela teoria psicanalítica, como a negação da
alteridade nas relações humanas, para, em seguida, aplicar essa leitura à violência nas relações peda-
gógicas construídas no universo escolar, avaliando algumas conseqüências para a escola.
Violência em psicanálise: bases teóricas para uma reflexão sobre a violência na escola
Para sobreviver, os homens devem suprimir uma parte considerável de suas tendências violentas naturais.
Isto, todavia, nunca se dá completamente – daí as guerras, discutidas no texto de 1932.
No ínterim desses dezessete anos, Freud já havia apresentado dois novos elementos: a hipóte-
se da pulsão de morte, segundo a qual haveria no indivíduo uma tendência à (auto-) destruição para
retornar ao estado inorgânico originário de toda vida (FRE U D, 1920-1987, p. 55-58; 63, v. 18) e a
idéia de que os grupos, revivescências da horda primeva, têm seu laço mais forte na identificação
amorosa com o líder e na projeção da pulsão de morte sobre os estranhos ao grupo (FRE U D, 1921-
1987, p. 141, seq., v. 18 ), a fim de liberarem-se os homens desse “mal-estar” inerente à cultura,
promovido por sua própria inclinação pulsional para a capacidade de destruir (FRE U D, 1930-1987,
p. 134. v. 21). Desses elementos, sobressai-se a idéia da pulsão de morte como moção da violência
individual e social. Aquela natureza violenta implícita no contrato social reproduz e maneja, muitas
vezes precariamente, a violência pulsional do psiquismo individual, insuperável em seu cerne por ser
constitutiva do ser humano. Para Freud, como lembram Laplanche e Pontalis (1991, p. 397), morte e
agressão fazem parte de um mesmo espectro, em que as pulsões de agressão são definidas como a
expressão do investimento das pulsões de morte sobre um objeto externo.
Sem dúvida, na tarefa psicanalítica com seus pacientes, Freud reconhecia o valor (e mesmo a
necessidade) do investimento de um quantum de agressividade (aqui entendida como sinônimo de
força) para analisar os sintomas e ultrapassar os obstáculos típicos de uma psicanálise – o que impli-
caria na análise (e na superação) de uma certa organização psicopatológica. Porém, é importante
lembrar: no âmbito cultural, ao definir o paradoxo da violência como fundação de uma sociedade que
precisa dela se afastar para sobreviver, ele concebia a violência como uma ameaça permanente à
comunidade humana. Pode-se, assim, protelar a destruição, mas não se pode evitá-la total ou defini-
tivamente. Sempre “entre a cruz e a espada”, é preciso, por um lado, agregar-se e constituir civiliza-
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ção com Eros, para contrapor-se ao que há de Thánatos no pulsional – o que poderia mesmo consti-
tuir um futuro promissor, se beneficiado pela supremacia do que haveria de melhor na civilização (o
cultivo da ciência e do intelecto).
Para Freud (1927-1987. v. 21), entretanto, o destrutivo e o mortífero no pulsional terminam por
condenar o grupo, em última instância, à destruição pelo embate com outros grupos sobre os quais
Thánatos foi projetado a partir do “narcisismo das pequenas diferenças” (FRE U D, 1930-1987, p. 136;
170-171. v. 21). Vê-se, aqui, um Freud permanentemente dividido, em suas reflexões sobre a violência
em sociedade, entre a esperança – exigida pela racionalidade (iluminista, por certo) – e o desencanto
pela mesma sociedade, produzida pelo conflito inconciliável e irracional em seus fundamentos.
Se a primeira posição sobre a violência na teoria psicanalítica é representada pelo trabalho
fundador de Freud, a segunda posição foi assumida por outros autores que aplicam ao conceito uma
análise metapsicológica centrada no entendimento da violência como resultante de um conflito no
ego, mais precisamente entre os interesses narcísicos (de completude egóica, de auto-suficiência) e
os ideais que representam a alteridade (e, por conseqüência, apontam para a finitude e a fragilidade
desse mesmo ego). O trabalho de Costa (1986; 1991) caminha nessa direção.
Ressaltando, precisamente, a qualidade narcísica das dinâmicas ligadas à violência, Costa (1986)
analisou o artigo freudiano de 1932 para indicar as incoerências no argumento de Freud, questionan-
do como uma força indomável, em última instância, pode ser domesticada pela Cultura. Assim, o
argumento biológico adotado por Freud na esteira de Hobbes, em última análise, é tautológico e
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inconsistente: nem a violência é animal (porque agressividade animal é bem diferente da violência, já
que sempre voltada para a preservação da vida), nem mesmo é irracional por ser animal (seja porque
não há violência animal, seja porque a violência é, muitas vezes, produto de atos de vontade consci-
ente e de elaborações intelectuais sofisticadas, como a tortura). Ou, como adverte Laplanche (1997a,
p. 6), “esta referência ao animal é puramente ideológica: ela nos permite desobrigar-nos de nosso
inconsciente, atribuindo-o ao não humano em nós, ao dito ‘pré-humano’”.
A crítica aqui apresentada, feita por psicanalistas, fundamentada nas posições freudianas, de-
monstra que as idéias originais de Freud para a violência, apoiadas no que Laplanche (1997b) chamou
de “desvio biologizante”, não se sustentam. Ainda assim, acompanhando Laplanche (Ibidem), percebe-
se que o texto freudiano é não só fundamental como útil, na medida em que se presta a uma interpreta-
ção de sua estrutura, no que ela revela da busca pelo inconsciente. Então, no caso da teoria sobre a
violência, como entender o texto freudiano? Analisando sua fragilidade ideológica, mais precisamente
aquela que confunde “poder” e “violência”. Esta é uma posição fundada em uma certa concepção de
poder, não consensual e que não pode ser generalizada, portanto. Costa (1986) e Rocha (1993), por
exemplo, são dois teóricos da Psicanálise que, como se viu, apresentam um forte contra-argumento à
leitura freudiana: na medida em que se pode conceber um poder não violento, uma distinção entre
poder e violência, a justificativa para uma violência como necessária fundação da sociedade se desfaz.
Por conseguinte, de acordo com a segunda formulação psicanalítica, aqui assumida para a
análise da violência na escola, a violência se explica como expressão narcísica, perversa, auto-sufici-
ente da agressividade que destrói o que no semelhante recorda a fraqueza, a fragilidade e a dependên-
cia que caracterizam a condição humana – eliminando o outro em sua alteridade, em sua subjetivida-
de, tornando-o puro objeto. O narcisismo, de que a violência se torna expressão, é entendido aqui em
sua acepção patológica, como o amor exclusivo a si mesmo, com a recusa de tudo o que, nos outros
da mutualidade. Ora, é com tal mutualidade que procuramos compensar a fragilidade própria à condi-
ção humana, desde o nascimento: é sobre o estado de desamparo e de impotência próprio aos primei-
ros anos que são fundadas as relações humanas, desenvolvendo-se trocas necessárias pelo resto da vida.
N as relações originárias entre a criança e os adultos, encontra-se, inclusive, o alicerce para o estabeleci-
mento, no futuro, de valores morais – a solidariedade, por exemplo – criados precisamente para regu-
lar as relações intersubjetivas. N ão é exagero, então, afirmar a existência de uma “cultura da violência”,
em que o indivíduo é estimulado a agir com o imediatismo característico do regime próprio ao princí-
pio de prazer, numa direção eminentemente narcísica: as normas e os valores deixam de ser reconheci-
dos enquanto desejáveis, já que remetem à intersubjetividade:
Esta cultura nutre-se e é nutrida pela decadência social e pelo descrédito da justiça e da lei. Seu
efeito mais imediato e mais daninho é a exclusão de representações ou imagens do Ideal do Ego
que, contrapondo-se aos automatismos conservadores do Ego narcísico, possam oferecer ao
sujeito a ilusão estruturante de um futuro passível de ser libidinalmente investido. N a cultura da
violência, o futuro é negado ou representado como ameaça de aniquilamento ou destruição. De
tal forma que a saída apresentada é a fruição imediata do presente (C OSTA, 1991, p. 129-130).
Todo ideal perde sua força de mediação entre os homens. “ No lugar do Ideal surgem então as
miragens Ego-Ideais, contrapartida previsível da insegurança e ansiedade Ego-narcísicas” (Ibidem,
p. 133), que se expressam muitas vezes em individualismo e totalitarismo nas relações do cotidiano.
violência na escola, deve aproximar-se da segunda interpretação da violência, que acabou de ser
apresentada: há violência nas relações interpessoais no interior da instituição escolar quando se ma-
nifesta o esforço de negação da alteridade e de afirmação da auto-suficiência diante dos conflitos.
Logo, se o conceito de violência deve ser compreendido em sua complexa carga semântica,
servindo a vários aspectos das relações humanas e se, na escola, ele termina por remeter a conflitos
vividos em dimensões intersubjetivas do cotidiano escolar, como no caso da organização institucional
e da indisciplina dos alunos, a Psicanálise, como aqui é entendida a partir das afirmações de Costa
(1986, 1991), aponta para a encruzilhada narcísica em que se colocam as pessoas diante do conflito:
reconhecê-lo e lidar com ele, a partir de ideais e valores estabelecidos conjuntamente com vistas à
construção de um projeto comunitário, ou negá-lo por conta da ameaça representada pelas diferen-
ças, que remetem sempre à alteridade.
Às várias contribuições de estudiosos e profissionais envolvidos com essa realidade, a Psica-
nálise acrescenta precisamente a leitura da violência pelo crivo do narcisismo, presente nas relações
intersubjetivas que se desenvolvem também no cotidiano escolar. A inserção do narcisismo nesse
enquadre teórico é importante na medida em que revela, nas motivações subjetivas e intersubjetivas
presentes na Escola, um desejo de negação da alteridade que provoca, em última instância, a violên-
cia – desejo cuja força, nas circunstâncias da cultura de violência, é bastante considerável.
As dificuldades encontradas pelos educadores em dialogar e enfrentar conflitos com seus alunos e
colegas não são provocadas apenas por questões ideológicas ou intelectuais, mas também por motivos
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No cotidiano escolar há, igualmente, fatores internos à instituição que favorecem o recurso à vio-
lência. Quando se consideram as análises de diversos pesquisadores (Z A LUAR, et al.,1992), chega-se à
impressão de que as escolas muitas vezes têm enfrentado várias dificuldades, quando às voltas com a
violência, para lidar com as repercussões das falhas sociais no que K aës (1991, p. 53) chamou, precisamen-
te, de “falhas da ilusão institucional” – ou seja, muitas vezes não conseguem rever projetos coletivos,
renegociar acordos institucionais nem revitalizar ideais que, articulados entre si, sustentam a escola como
instituição. A leitura psicanalítica das instituições aqui apresentada quer precisamente realçar o processo
de supressão da saudável ilusão institucional pelo crescimento da fantasia narcísica patológica, manifesta
na violência: “se eu não preciso dos outros, tampouco tenho de respeitar suas regras”. É quando os
desejos pessoais negam os interesses coletivos. São essas algumas das marcas mais significativas da cultura
narcísica no universo escolar (SA N T OS, 2002).
O que fazer na escola? Pontos de partida de uma educação para a não violência
Para fazer face a esse quadro, é necessária uma mudança de perspectiva. Em primeiro lugar,
como já se afirmou, deve-se considerar a violência na escola um fenômeno que implica todos – não
apenas o aluno ou o professor. N ão há bandidos nem mocinhos. Todos estão envolvidos, consciente
e inconscientemente, devendo rever suas posições quando a violência manifestar-se como saída para
os conf litos. A demais, essa é a importância da violência na escola, malgrado seus efeitos
freqüentemente nocivos: ela é sinal a indicar a necessidade de mudanças na abordagem dos conflitos
inerentes às relações de poder que constituem a instituição escolar.
Desse modo, entendemos que a reprodução da violência no cotidiano pedagógico não é ine-
vitável. A prática de muitos educadores demonstra que, mesmo diante de condições pedagógicas
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difíceis, é possível intervir eficazmente para evitar ou superar a violência na escola, fazendo dela
ocasião para ensinar e aprender valores, atitudes e formas de pensar para a não-violência.
N a medida em que a escola é um espaço indispensável de construção de mediações entre a
criança e o adolescente e suas famílias, na sociedade atual, seus profissionais necessitam de salários
dignos e reconhecimento, a fim de que se sintam motivados para o desempenho de sua atividade. O
aviltamento dos educadores, todavia, não justifica descuidar-se das funções pedagógicas pelas quais
estão encarregados por sua profissão. Quando o fazem, reproduzem, no interior da escola, com seus
colegas e alunos, com o poder em que estão constituídos, a violência de que são vítimas.
N as escolas públicas, são válidos os mesmos princípios, já que os alunos mais empobrecidos
não são mais violentos que outros grupos, apesar do preconceito que relaciona pobreza à violência:
os educadores podem valer-se de mecanismos que favoreçam uma educação para a convivência,
segundo o princípio da solidariedade. Alguns desses mecanismos são referidos a seguir.
Para os educadores, a atualização de seus conhecimentos sobre disciplina e violência, o plane-
jamento e a avaliação das atividades da escola, a participação em reuniões pedagógicas, ao lado do
cumprimento de suas atividades em classe, são indispensáveis. Sem eles, não se faz uma escola
organizada nem se podem experimentar mudanças. Nessas atividades tão simples, devem ser incluí-
das formas de contato regulares com os pais, assim como momentos privilegiados de comunicação e
participação dos alunos: festas e datas especiais do calendário podem ser planejadas e celebradas em
conjunto, por exemplo.
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A direção, em particular, não se resume à administração, mas, antes de tudo, sustenta as normas
e os ideais da escola: deve reservar espaço para garantir a constituição e manutenção dos vínculos
intersubjetivos que propiciem a organização escolar, tanto entre adultos quanto entre adultos e crianças
ou adolescentes. Deve zelar pela qualidade das relações interpessoais, inclusive entre pessoas não dire-
tamente mais implicadas no processo de ensino-aprendizagem, como zeladores, merendeiras e inspe-
tores de alunos: esses trabalhadores também devem ser conscientizados de que sua presença na escola
não é acessória, mas pode também ser educativa. A direção não pode nem reprimir os vínculos
intersubjetivos nem descuidar deles, garantindo equanimidade na aplicação das regras de convivência
para adultos (organização) e crianças ou adolescentes (disciplina) e mantendo vivos os ideais da escola,
comuns a todos. Neste sentido, a direção deve ser assumida por educadores que não somente se preo-
cupem com a aprendizagem dos alunos de sua escola, mas com a renovação dos conhecimentos dos
próprios educadores, atentando, o mais possível para os processos grupais que lá se desenrolarem.
Na relação educador-aluno, os hábitos de convivência devem ser desenvolvidos com o estabeleci-
mento dos limites e da disciplina, de forma não repressiva e não concessiva. A disciplina, assim, será
sempre resultado de um mínimo de negociação e acordo, fruto do diálogo: ela deve ser entendida a
serviço da produção do conhecimento na escola, cabendo ao professor, em particular, investir no dese-
jo de aprender dos seus alunos. Nesse enquadre, a violência sempre indica a necessidade de novamente
se negociarem as relações de poder com seus alunos São o estabelecimento mútuo de regras e o perma-
nente exercício de comunicação entre professor e alunos que permitirão a mediação entre desejos
individuais e normas escolares necessárias ao aprendizado dos alunos. Trata-se de “passar desta violên-
cia selvagem para um comportamento socialmente aceitável, sem com isso sufocar a energia que esta
violência subentende” (C O L OMBI ER; MA N G E L; PERDRI AULT, 1989, p. 101), transformando o
ensino-aprendizagem num autêntico objeto de investimento libidinal.
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Considerações psi canalític as sobre a violênc ia na escola 65
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SA N T OS, S. D. M. Sinais dos tempos - marcas da violência na escola. Campinas: Autores Associados, 2002.
RESUMÉ
On réfléchit sur la violence dans l’école selon une perspective théorique psychanalytique. Des éducateurs
et des élèves sont impliqués dans le processus de surgissement de la violence dans l’école au moment où
ils ne reconnaissent pas l’altérité dans les rapports humains en situations de conflit. Après avoir présenté
les postulats psychanalytiques sur la violence, on analyse cette dernière dans les rapports pédagogiques,
à la lumière d’une de ces prises de positions. À la fin, on évalue quelques conséquences pour l’école et
indique des orientations en vue d’une éducation non violente.
1
Associada ao Fórum do Círculo Psicanalítico do Rio de Janeiro; Doutora Universidade Paris VII e pelo
IMS – UERJ (cotutela); Professora Adjunta II – Faculdade de Educação da UFF; e-mail:
mariliaetienne@id.uff.br
2
Bolsista de Iniciação Científica PIBIC-CNPq / 2010-2011, Graduanda em Psicologia – UFF.
3
Bolsista de Iniciação Científica PIBIC-CNPq / 2010-2011; Graduanda em Psicologia – UFF.
[...] não aprende sozinha. É preciso que haja um professor para que
esse aprendizado se realize. Ora, nem sempre esse encontro é feliz.
Então, a pergunta “O que é aprender?” supõe, para a Psicanálise, a
Tomando essa citação por uma visão crítica, é possível notar, portanto, que
nosso objeto de estudos é de extrema complexidade e não arrefece diante de nenhuma
fórmula disciplinar, determinista, nem tampouco pode ser circunscrito por uma única
teoria, que defina rapidamente o “bom caminho” das pulsões, a melhor teoria para lidar
com alunos, muito menos quem é ou não é violento, apenas do ponto de vista factual
observável. Ora, o renomado psicanalista e pensador brasileiro Jurandir Freire Costa
(2003) é crítico da ideia de que se possa produzir uma profilaxia (prevenção) das
neuroses através da Educação formal, bem como outros autores de tradição freud-
lacaniana francesa (IMBERT & CIFALI, 1998; MILLOT, 1982) veem com
desconfiança a ideia de que a aplicação da psicanálise na educação possa “curar as
SILVA, Ana B. B.. Bullying: Mentes perigosas nas escolas. Rio de Janeiro: Fontanar
2010.
SOUZA, M.P.R de; ROCHA, M.L da, Eixo temático 02: Políticas Educacionais:
legislação, formação profissional e participação democrática In: Ano da psicologia na
educação: textos geradores, CFP, 2008, pp.27-52.
ZIZEK, S. “Violence: subjective and objective” in Violence. New York: Picador, 2008.
magis
7
School Violence as a Regime of Visibility
Las escueLas
VOLUMEN 4 / NÚMERO 8 EDICIÓN ESPECIAL / JULIO-DICIEMBRE DE 2011 / ISSN 2027-1174 / BOgOtá-COLOMBIA / Página 399-413
La violence scolaire en tant qu′un régime de visibilité
L a vioLencia en
A violência escolar como regime de visibilidade
Fecha de recepción: 27 DE AgOStO DE 2011 | Fecha de aceptación: 31 DE OCtUBRE DE 2011
Encuentre este artículo en http://magisinvestigacioneducacion.javeriana.edu.co/
SICI: 2027-1174(201112)4:6<399:VECRD>2.0.tX;2-Q
Resumen
Este escrito aborda los discursos sobre la violencia escolar y los asume
como regímenes de visibilidad que se construyen históricamente. Además,
expone de manera esquemática cómo son asumidas las nociones de ju-
ventud, cultura escolar y cultura juvenil en los estudios sobre la violencia
escolar.
Reflexionar sociológicamente sobre las diversas formas de definir la vio-
lencia escolar y su relación con las poblaciones en condición juvenil implica
asumir que las determinaciones analíticas de estas categorías coadyuvan a
conservar o transformar la realidad y que, en consecuencia, la mirada del
investigador social es una mirada al mismo tiempo política.
Para citar este artículo | To cite this article | Pour citer cet article | Para citar este artigo
Forero-Londoño, O. F. (2011). La violencia escolar como régimen de visibilidad. magis, Revista Internacional de Investigación en Educación, 4 (8)
Edición especial La violencia en las escuelas, 399-413.
Key words author Abstract
Discipline, Bullying, School Violence, this text approaches the discourse on school violence from the viewpoint of histo-
School Culture, Juvenile Culture, rically constructed regimes of visibility. Also, it briefly describes how the concepts
Diffuse Violence. of youth, school culture and juvenile culture are used in studies on school violence.
For sociological reflections on the different ways to define school violence and its
relation to juvenile populations, it is necessary to accept that the analytical determi-
Key words plus
nations of these concepts may conserve or transform reality, and that the approach
Violence in Education, Cultural
of a social researcher is also a political approach.
Identity, School Harassment.
magis
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L a vioLencia en
magis
referido a las experiencias que afectan las relaciones diádicas de las perso-
nas y sus tránsitos entre diferentes entornos sociales. El segundo aparte del PágINA 401
(…) Ahora bien, si uno de los niños da parte al educador de que otro com-
pañero ha estado copiando su tarea, el grupo verá amenazado dicho es-
tándar o tratará de castigar al niño que ha traicionado a su discípulo. Se
lo deja solo en el campo de juegos, le vuelven la espalda cuando intenta
dirigirles la palabra y lo apartan del equipo de fútbol de la clase. Si trata
de atravesar una puerta, los compañeros que se hallen cerca lo empujarán
y le darán puñetazos en las costillas. Si su violación lencia en la escuela”. Esta construcción teórica ejercerá
a los estándares persiste, será hostilizado sin pausa. una gran influencia sobre los estudios conexos con el
De esa manera, el grupo trata de encarrilarlo otra vez acoso entre pares, las incivilidades escolares y la vio-
por el buen sendero (Stenhouse, 1974, p. 41). lencia juvenil. Urie Bronfenbrenner (1987, p. 43) afirma
que la teoría de Kurt Lewin instaura una primacía fe-
Después de esta sumaria exposición, puedo afir- nomenológica del ambiente sobre la orientación de la
mar que para Lawrence Stenhouse la disciplina escolar, conducta, puesto que es imposible comprenderla solo
aunque dinámica, es en última instancia un problema a partir de las propiedades objetivas de un ambiente,
de orden, de esquemas mentales evidenciados en una sin hacer referencia al significado que tienen para las
conducta conforme a la norma, que se refuerza por personas que están en el entorno.
medio de recompensas o se castiga ante su incumpli- Paralelamente, Urie Bronfenbrenner (1987) pro-
miento; es decir, es sancionada socialmente. Desde pone, en La ecología del desarrollo humano, el estudio
magis
esta perspectiva, la disciplina escolar se funda en un de los procesos diádicos definidos como las relaciones de
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PágINA
asunto de aula de clase, de entorno del aula, que se interacción, entre dos personas; esta dimensión diádi-
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A continuación, reseñaré los aportes de William ceptualizar y a enfrentarse a diferentes relaciones de po-
I. MacKechnie (1974), que en términos generales coin- der. Sin embargo, las relaciones diádicas entre pares
cide con Lawrence Stenhouse cuando afirma que una por desequilibrio de poder serán precisamente el tema
de las principales labores escolares del maestro es la de estudio sobre lo que más adelante se denominará
instauración de sanciones. Sin embargo, este psicólo- como acoso entre pares.
go matiza la utilidad educativa del castigo: Al llegar aquí, se hace necesario señalar la re-
contextualización escolar de la teoría de Urie Bronfen-
(…) en la medida en que el educador castiga a un brenner, que se evidencia en el concepto de acoso o
individuo determinado con el simple objetivo de ha- bullying propuesto por Dan Olweus (1998) pues, a mi
cerlo adaptarse, está en cierto sentido sacrificando modo de ver, constituye un desarrollo de la noción de
los intereses de esa persona en aras de las necesida- díada. Aun así, la noción de acoso fija la atención
des del grupo en su conjunto. Si bien tales métodos en el desequilibrio de poder característico de las re-
pueden llegar a ser necesarios de tiempo en tiempo, laciones y hace hincapié en el efecto negativo de la
debe tomárselos por lo que son, es decir, en el me- conducta agresiva, es decir, “cuando alguien, de for-
jor de los casos, males menores, aunque tal vez tem- ma intencionada, causa daño, hiere o incomoda a otra
poralmente inevitables, pero no bondades positivas persona” (Olweus, 1998, p. 25). Para describir este fe-
(MacKechnie, 1974, p. 33). nómeno, Dan Olweus (1998) propone una serie de no-
ciones, como víctima, agresor, acoso indirecto, acoso
A pesar de la crítica al ejercicio del castigo realizada directo con el fin comprender mejor el ‘clima social del
por MacKechnie, esta no es radical, no llega a afirmar aula’ y así prevenir la exclusión, la agresión y la intimi-
que el castigo carezca de toda relación con la ense- dación entre pares. Como anuncié antes, el concepto
ñanza y que, por tanto, pueda y deba ser abandonado. de acoso escolar marca un desplazamiento del análisis
Para él, junto con Stenhouse, el orden entendido como de la relación entre maestro-estudiante, en términos del
disciplina, es una condición necesaria a la educación y control disciplinario y el ajuste normativo escolar, al
precisa recurrir al castigo para conseguirlo y mante- estudio de las relaciones diádicas entre pares de estu-
nerlo. diantes caracterizadas por conductas agresivas de una
En términos generales, se puede afirmar que el o de las dos partes involucradas.
enfoque educativo es retomado y superado por el en- Hay otro aspecto que quiero señalar, la apropia-
foque psicosocial, desarrollado en la teoría sobre la ción que hace la Organización Mundial de la Salud,
ecología del desarrollo humano que, a modo de mar- OMS, del modelo ecológico. Obviamente, el discurso
co explicativo de la modificabilidad de las estructuras de esta agencia internacional supera el análisis de la
cognitivas y motivacionales constituye “un intento de violencia escolar propiamente dicho; sin embargo,
darles sustancia psicológica y sociológica a los terri- considero que constituye un nuevo desplazamien-
torios topológicos de [Kurt] Lewin” (Bronfenbrenner, to en el régimen de visibilidad de lo que aquí hemos
1987, p. 35). En este marco analítico, la conducta sur- denominado genéricamente violencia escolar, pues la
ge en función de la interacción de la persona con el mirada no está puesta en el tipo de interacción en-
ambiente, sin estar propiamente relacionada con el tre maestro y estudiante, o entre pares en el entorno
estudio de lo que aquí hemos denominado como “vio- escolar, sino fundamentalmente en las conductas en
conflicto con la ley en los diferentes entornos sociales, ticipativa, democrática y cooperativa; en otras pala-
incluido el escolar. bras, cuando se produce en un sistema generador de
En síntesis, el modelo de salud pública se inspira confianza, colaboración y apoyo mutuo.
en psicología social en general y de la ecología huma- también en España, Ana Isabel Peña-gallo y José
na en particular, al afirmar que ningún factor por sí Luis Carbonell-Fernández (2001) analizan en términos
solo explica por qué algunos individuos tienen com- psicosociales las conductas disruptivas y el acoso, con-
portamientos violentos hacia otros o por qué la violen- siderando que lo que realmente ocurre en los centros
cia es más prevalente en algunas comunidades que en educativos es un deterioro de la convivencia cuya
otras. Este discurso intenta explicar la violencia para responsabilidad, entre otras muchas, recae en la apa-
prevenirla puesto que se asume la modificabilidad de rición de conductas antisociales por parte de algunos
las conductas en relación con el entorno. miembros de la comunidad educativa, unido a proble-
A lo anterior se agrega que cuando se criminaliza mas organizativos o de gestión de los conflictos (Sau-
magis
la violencia en el sentido de ser identificable en rela- ra-Calixto, Ortega-Ruiz & Mínguez-Vallejos, 2003) que
ción con el comportamiento de las personas, a la luz pueden favorecer situaciones de violencia. PágINA 403
por la funcionalidad educativa de la escuela, pasan- en medio de la crisis de las instituciones como la fa-
404
PágINA
do por las visiones que reflejan el pánico moral que milia y la escuela, frente al posicionamiento de la ju-
Las escueLas
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ubica en la pérdida de los “valores tradicionales” la ventud como actor protagónico de la violencia social.
causalidad explicativa de la violencia escolar, hasta En este sentido, a inicios de la década de 1990 en Co-
aquellos que en la primera década del siglo XXI asu- lombia, Federico garcía-Posada (1992), profesor de la
L a vioLencia en
men el estudio de la indisciplina como conducta dis- Universidad de Antioquia, preocupado por el fenóme-
ruptiva generadora de violencia y retoman las influen- no del sicariato, protagonizado por los jóvenes de Me-
cias de los discursos europeos sobre el acoso escolar dellín, como expresión máxima de la violencia juvenil,
(Peña & Carbonell, 2001). En este tipo de investigacio- opinaba que la escuela había perdido su potencia para
nes también se desarrollan propuestas de intervención prevenir la violencia ante la ausencia en los planes de
sobre el conflicto en el aula con el fin de posibilitar el estudios escolares de la enseñanza relacionada con el
desarrollo de prácticas pedagógicas democráticas en aprendizaje de las reglas sociales, lo cual desestabiliza-
el aula de clase con el fin de generar posibilidades de ba y debilitaba la integración social. A continuación, se
negociación entre actores (Herrera-Duque, 2001). puede leer algunos de sus argumentos:
La perspectiva psicoeducativa en Colombia ha
encontrado en Enrique Chaux (2002b) uno de sus (…) Si la escuela no enseña reglas, no podrá enseñar
máximos desarrolladores, respecto a la investigación tampoco la repugnancia que debe sentirse cuando
empírica. Este investigador ha documentado evalua- esas reglas son violentadas. Hablamos, por supues-
ciones internacionales sobre el efecto positivo de pro- to, de la escuela normal, esto es, como aquel lugar
gramas educativos que buscan promover la conviven- llamado por [John Amos] Comenio [1592-1670] en el
cia por medio de la formación en resolución pacífica siglo XVII un educatorio para la juventud, un lugar
de conflictos; según él, “todos estos estudios indican al cual concurren de buen grado o por la fuerza, dos
que niños que viven en contextos violentos tienen una generaciones al menos: Una, sin sentido de integri-
mayor probabilidad de desarrollar comportamientos más dad de lo social, sin una percepción de la totalidad
agresivos que aquellos que viven en contextos más pa- en el tiempo y en el espacio de cada una de las ins-
cíficos” (Chaux, 2002a, p. 48) y que la educación rela- tituciones sociales, con la excepción de la familia. La
cionada con la transmisión de valores rara vez provee otra generación, con una aceptable percepción de
herramientas prácticas para enfrentar situaciones de la la totalidad social y por lo tanto habilitada para pre-
vida real, lo cual hace que sea necesario desarrollar ha- sentar esa totalidad como una integridad que debe
bilidades sociales y competencias ciudadanas” (Chaux, ser respetada. Así pues, una generación debe ver su
2005, p. 19). Este investigador lideró el Estudio sobre entorno social, si no como deseable, al menos como
convivencia y seguridad en ámbitos escolares, que pre- inevitable. Mientras tanto, la otra generación difícil-
senta un análisis de la violencia escolar en Bogotá des- mente encuentra a la sociedad como algo deseable
de la perspectiva del acoso entre pares y las conductas y mucho menos como inevitable. Si los niños y los
en conflicto con la ley (Subsecretaría de Asuntos para jóvenes no logran reconocer las reglas de la cohe-
la Convivencia y Seguridad Ciudadana, Observatorio de sión, del vínculo o de la integridad social, la escuela
Convivencia y Seguridad Ciudadana & Sistema Unifica- habrá fracasado estruendosamente (garcía-Posada,
do de Información de Violencia y Delincuencia, SUIVD, 1991, p. 42).
2006).
Hasta aquí, he intentado mostrar que los enuncia- De manera semejante, Santiago Peláez (1991) con-
dos psicosociales atraviesan el estudio de la violencia sideraba que los principales agentes de socialización
como problema educativo, lo cual se evidenció en los —la familia, la escuela y el entorno social— deberían
usos particulares de las nociones de disciplina en el cumplir tareas complementarias, armónicas y simultá-
neas y que las deficiencias de un agente deberían ser suplidas por el otro;
de no ser así, se generarían trastornos de la personalidad que inducirían
fácilmente al descontrol de la agresividad y su conversión en violencia.
En general, este tipo de discursos afirmaba que la juventud —des-
conocedora de las reglas elementales de la vida social— “separada de la
familia por el avance de los medios de comunicación e insuficientemente
motivada a intuir en la escuela un mecanismo de movilidad social inten-
taría la violación sistemática de todo orden, con la sola excepción de lo
que se le presentó como alternativa de poder, el delito, para entonces el
sicariato o el narcotráfico” (Peláez, 1991, p. 45). En síntesis, para este mo-
mento histórico son de uso común las explicaciones como las de Rodrigo
Parra-Sandoval (1992a), que ve en las falencias de la formación en valores y
magis
en los mecanismos de organización social de la tolerancia y la justicia en la
vida escolar las fuentes de la violencia en sus diferentes formas. PágINA 405
uniformes, la vigilancia continua, el temor que los (…) Las investigaciones realizadas hasta ahora sobre
adultos muestran a las expresiones eróticas o a for- la cultura escolar colombiana muestran que la es-
PágINA 406
mas de arreglo personal poco convencionales y el cuela cumple de manera muy deficiente su función
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uso de mecanismos disciplinarios propios de la es- de formar ciudadanos para la vida democrática y que
cuela primaria son algunos de los rituales escolares en muchos casos se ha transformado en una escue-
L a vioLencia en
que utilizan a los adolescentes, como si la escuela la violenta. Su papel debe ser en realidad, en me-
dio de una sociedad violenta, transformarse en una
quisiera perpetuar la inocencia de los niños. Esta si-
cultura alternativa a la sociedad violenta, formando
tuación también conduce a un distanciamiento de los
en su vida cotidiana, en su organización social, en
adultos, con los cuales muchos adolescentes experi-
la práctica pedagógica, ciudadanos de paz, crean-
mentan la sensación de que no vale la pena o es pe-
do, conformando una constelación de valores más
ligroso comunicarse en el terreno de la experiencia
apropiados para la vida en una sociedad igualitaria y
personal (Cajiao, 1995, p. 31).
pacífica (Parra-Sandoval, 1992a, p. 519).
magis
regaño y la humillación. “El regaño no es algo aislado, jetos sociales.
circunstancial, causado por las acciones de los alum- PágINA 407
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magis
dir el escenario situacional (la marginación, la pobreza, la exclusión) con las
representaciones profundas de jóvenes o, lo que es peor, a establecer una
PágINA 409
relación mecánica y transparente entre prácticas y representaciones. Por
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disonancias cognitivas, las maneras distintas de ver perspectiva sociocultural, el ámbito de las prácticas ju-
las cosas. “Estos conflictos se concretan por ejemplo veniles, hace visibles las relaciones entre estructuras y
cuando el/la educador(a) y el ambiente educativo no
L a vioLencia en
magis
Referencias
Chaux, Enrique (2002b). Buscando pistas para preve-
nir la violencia urbana en Colombia: conflictos y PágINA 411
Abramovay, Miriam (2005). Victimización en las escue-
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magis
cialización de los jóvenes de hoy. Bogotá: Centro de Investigación y
Educación Popular, Cinep. PágINA 413
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Um olhar psicanalítico sobre o bullying
Resumo
O bullying pode ser considerado um dos retratos do mal-estar contemporâneo na educação?
Esta é a pergunta norteadora de nossa pesquisa de mestrado, cujos primeiros resultados serão
apresentados nesse texto. Em suma, podemos afirmar que o material analisado evidencia a
juridização do campo educacional e uma forte relação entre a recusa da autoridade pelos
adultos e ascensão de situações descritas como bullying.
Nos últimos anos, o bullying tornou-se um dos assuntos predominantes quando se fala em
escola e frequentemente tomamos conhecimento de algum acontecimento, supostamente desse tipo,
ora via relatos da própria comunidade escolar (professores, alunos, pais, etc), ora via notícias
veiculadas pela mídia impressa, televisiva e digital.
Então seria possível considerar o bullying como um dos retratos do mal-estar
contemporâneo na educação? Sem dúvida esta é uma questão que divide opiniões. Para alguns se
trata de uma prática presente desde os primórdios da instituição escolar. De fato, basta uma
conversa simples com nossos avós para, aos lhes interrogarmos sobre suas lembranças da época em
que eram alunos, identificarmos situações que muito provavelmente hoje seriam classificadas como
bullying.
Podemos concordar com o argumento sobre a não novidade do fenômeno, mas não é
possível negar a evidência que o mesmo adquiriu na atualidade. É necessário, pois investigarmos
por que isto acontece. É preciso saber ainda por que situações tão diversas hoje são identificas sob
um mesmo nome: O Bullying. Para tanto precisamos considerar, escutar os discursos sobre esse
tema. Escutar, aqui, aos moldes da Psicanálise: considerar o manifesto para alcançar o latente,
transformar queixa em enigma.
Quando sugerimos a possibilidade do bullying ser pensado como um dos retratos do mal-
estar na educação, é porque aqui utilizamos o mal-estar no sentido freudiano do termo, portanto
estrutural, e estamos em busca de compreender os discursos sobre bullying como evidências de
contingências que acirram esse mal-estar.
Trazer à tona quilo que o uso do termo bullying pretende recalcar: este é o objetivo de nossa
pesquisa de mestrado, cujos s primeiros resultados serão apresentados no presente texto. Para tanto
tomamos como corpus os discursos sobre essa tema presentes em livros, artigos de jornais e revistas
destinados ao público em geral. Consideramos ainda algumas experiências vividas por nós, ao
1
longo dos últimos cinco anos, enquanto psicóloga escolar numa Secretaria de Educação de um
município vizinho à cidade de São Paulo. Salientamos que além do legado teórico deixado por
Freud e Lacan, baseamos nossas análises nas contribuições da filósofa Hanna Arendt ao campo
educacional.
Antes de mais nada, o nosso primeiro passo foi tentar entender do que se está falando
quando se usa a palavra bullying. A partir do material pesquisado, pudemos constatar que, sob a
égide desse conceito, estão alocadas situações muito diversas. Encontramos, por exemplo, no
material pesquisado, descrito como bullying desde o espancamento de um jovem pelos colegas de
sala, danos ao patrimônio físico da escola, ofensas entre alunos e professores, fofocas em redes
sociais até mordidas entre crianças no maternal.
Apesar da diversidade dos casos, quando ouvimos a palavra bullying a impressão que temos
é de que, sem muito esforço, somos capazes de compreender completamente do que se está falando.
Assim, como nos diz Carvalho (2009)
[a palavra bullying] aparece como uma palavra mágica, capaz de esclarecer toda
sorte de condutas que causariam humilhação, dor e mal [...] E ao assim fazer parece
ter o dom de nos dispensar de pensar na complexidade e particularidade de cada
caso, de refletir sobre o desafio prático que sua singularidade nos propõe. Está tudo
explicado: é bullying!
Recorrendo à psicanálise podemos dizer que uso do termo bullying, no material visitado,
tem por consequência manter recalcado tudo aquilo que é da ordem do sujeito, portando do desejo.
O que se quer é apenas administrar o problema, sem a necessidade de compreendê-lo. Não por
acaso são cada vez mais frequentes medidas como expulsão e registro de Boletim de Ocorrência
contra alunos 1, contratação de seguro contra bullying2 e outorga de projetos de Lei, em âmbito
Federal, Estadual e Municipal, que criminalizam sua prática.
Estamos diante da juridização da educação, fenômeno que assola todas as esferas do social.
Sobre esse processo, Voltolini (2004, p.94)
1
Exemplificaremos um caso desses mais adiante no texto
2
“As escolas parecem ter uma nova preocupação em relação ao bullying: além de educar seus alunos para evitar esse
tipo de violência física ou psicológica, as instituições de ensino agora querem se proteger de possíveis prejuízos
financeiros causados por ações na Justiça movidas por famílias de vítimas. Vinte colégios já contrataram um seguro
contra bullying, criado há quatro meses pela Ace Seguradora.” In Colégios Contratam seguro contra ‘bullying’.
2
tratamento jurídico da questão agrega, sem se preocupar com a heterogeneidade do
que agrega. Seu princípio é por definição homogeneizante.
Antônio tinha dez anos quando chegou ao meu consultório. Apresentava quadro
clínico compatível com depressão [...] vinha sofrendo constantes agressões verbais
e físicas por parte de alguns garotos da escola. Por medo de desapontar os pais e de
sofrer agressões ainda mais violentas, ele permaneceu calado durante todo o
primeiro semestre [...] Como nenhum dos agressores foi reprimido pelas
autoridades escolares, as ações de bullying se intensificaram, chegando a pontapés
e socos [...] A direção do colégio só tomou conhecimento do fato quando os pais de
Antônio foram à escola relatar o ocorrido. Em nenhum momento cogitou-se
advertência, expulsão ou denúncia dos agressores a órgãos responsáveis pela
proteção de crianças e adolescentes.3 [...] Diante de tal negligência, os pais de
Antônio resolveram trocá-lo de escola [...] (Ibid, p.117)
3
Note-se aqui um exemplo do que chamamos anteriormente no texto de juridização do campo educacional.
4
Antes que pudéssemos fazer qualquer intervenção, fomos surpreendidos pela notícia de que a diretora de escola,
apoiada por uma Supervisora de Ensino, conseguiram registrar um Boletem de Ocorrência na delegacia do município
contra o aluno em questão.
3
Onde estavam e o que fizeram os outros funcionários da escola quando o menino era agredido no
pátio? Como é possível que a direção da escola só tenha tomado conhecimento do fato quando há a
queixa dos pais? E os pais, onde estavam, o que os impediu de notar o sofrimento do filho antes que
este adoecesse? Se alguém deveria ser denunciado aos órgãos responsáveis pela proteção de
crianças e adolescentes – como sugere Silva (Ibid) 5 - esse alguém deveria mesmo ser a outra, ou as
outras crianças que agrediam Antônio? E qual a responsabilidade dos adultos nesta situação?
No segundo relato a situação parece ainda pior: como é possível que uma criança de 10 anos
tenha conseguido, no mesmo dia, morder uma mulher em várias partes de seu corpo sem que esta
tenha consentido com isso? A impressão que temos é que a professora em questão, ao menos
simbolicamente, abandona a cena e só retorna à mesma para tomar as medidas contra o aluno.
Ainda sobre essa situação, de que maneira podemos dizer que se posicionam a diretora, a
supervisora de ensino e o delegado de polícia quando registram um BO contra um menor de idade?
A omissão dos adultos: este parece ser o denominador comum presente em todos os casos
descritos como bullying. Os relatos são feitos como se nas cenas os adultos tivessem simplesmente
desaparecido, são omitidos voluntária ou involuntariamente das situações descritas, retornando a
aparecer apenas para tomar medidas administrativas – suspender/expulsar o aluno agressor, mudar o
filho de escola, registrar Boletim de Ocorrência - mas de maneira alguma implicando-se nele.
Arendt, no belíssimo livro “Entre o passado e o futuro” de 1954 , afirma que a chamada
crise na educação decorre de uma crise de autoridade na modernidade: tomado pelo que a filósofa
classificou com pathos do novo, o Ocidente teria recusado a tradição e consequentemente, o que é
estrutural do processo educativo, qual seja, a natalidade.
A natalidade, o fato de que crianças nascem para o mundo – mundo esse que as precede e
que permanecerá depois delas – engendra a necessidade de adultos que se disponham a apresentar a
elas esse mundo, responsabilizando-se assim, diz Arendt (2005, p. 235) “[...] pela vida e
desenvolvimento da criança e pela continuidade do mundo”. De acordo com a filósofa, a autoridade
do educador provém desse comprometer-se com o mundo, com o legado desse mundo, portanto
com a tradição.
Na educação, nas escolas, o pathos pelo novo ganhou força com as chamadas teorias
desenvolvimentistas que deslocaram o foco da Educação para o aprendizado d'A criança e
conduziram, assim, o educador à mera posição de facilitador desse processo de aprendizagem.
Em psicanálise, melhor dizendo, em Lacan, esse adulto, descrito por Arendt como
representante de um legado, assume a forma de o grande Outro. Mas para alguns psicanalistas, esse
encontro da criança com o Outro – encontro esse necessário para humanizá-la, para colocá-la no
5
Ressaltamos que não concordamos com a sugestão de Silva (2010).
4
laço social – engendra uma violência própria da educação. Como diz Kupfer (2007, p. 140 ) “[..]
violenta porque desde o princípio, submete o corpo da criança a uma ordem que nada têm de
natural [..] trata-se da imposição do simbólico, da linguagem, sobre o corpo.”
Ao recusar a tradição, o educador/o professor não comparece mais à cena educativa como
Grande Outro, como sustentador de uma ordem, portanto, como autoridade. Na posição de mero
facilitador, o educador, frente a seus alunos, não representa nada além de sua particularidade, de sua
pessoalidade. Assim, adulto e criança, Professor e alunos encontram-se nivelados simbolicamente
no que diz respeito ao mundo. Esvai-se a assimetria trans-geracional, essencial à educação.
Sem a autoridade de um adulto, a criança fica submetida à tirania de seu grupo. Recorrendo
novamente à Arendt (Ibid, p.230)
Portanto, quando o adulto comparece à cena educativa não como autoridade, mas apenas
em sua pessoalidade, a violência própria da educação torna-se impossível, dando lugar, assim, como
argumenta Kupfer no trabalho citado anteriormente, à violência na educação.
Afinal sem a Lei, a ordem sucumbe dando lugar à horda, condição nunca definitivamente
superada, como nos adverte Freud ao discorrer sobre o narcisismo das pequenas diferenças. O gozo
desenfreado de um tirano, a violência e o medo subjacente à condição de horda: não seria esta a
cena a que somos remetidos quando estamos diante de algo como o bullying?
BIBlIOGRAFIA:
Associação Psicanalítica de Porto Alegre (2011). Autoridade e Violência. Porto Alegre, RS:
APPOA
Kupfer, C. (2007). Educação para o futuro. Psicanálise e Educação. São Paulo, SP:
Escuta.
Silva, A. B. B. (2010). Mentes perigosas nas escolas. Bullying. Rio de Janeiro, RJ: Objetiva.
Voltolini, R. (2004). Psicanálise e Inclusão Escolar: direito ou sintoma? Estilos da Clínica, 2004,
Vol. IX, no 16, 92-101.
6
DOI: https://doi.org/10.11606/issn.1981-1624.v24i2p246-261.
Dossiê
Resumo. Experiências clínicas e postulados teóricos de Sándor Ferenczi trazem inúmeras contribuições para a
Educação. Procuramos articular, neste artigo, duas formas de violência desmentida, uma coletiva e outra
estranhamente familiar. Trata-se de duas dimensões fundadas num traumatismo radicalmente desestruturante,
posto que resulta na clivagem do eu. Desenvolvemos a hipótese de que a desautorização do sujeito no plano
societário - pela violência objetiva da exploração pelo capital - potencializa a identificação com o agressor e a
reprodução de mecanismos incapacitantes na esfera educacional. O traumático da violência atuada entre os
sujeitos na escola é sobreposto por uma clivagem introjetada na divisão de classes, especificamente na separação
entre o ensino público e privado, bem como no racismo desmentido da sociedade brasileira. Introjeção e
transferência fomentam esse processo. O embate entre os mundos adulto e infantil, com a imposição hierárquica
de um saber vertical e hegemônico, costuma irromper como passagem ao ato no plano intersubjetivo. A
imbricação inconsciente desses dois planos de violência clivada deve ser compreendida para que fragilidades
narcísicas venham a ser integradas empaticamente no sentir com o outro. A sensibilidade para uma transferência
mútua permite ao professor expor corajosamente suas fragilidades diante da hipocrisia sistêmica, promovendo
reconhecimento dos sujeitos mais vulneráveis.
Palavras-chave: violência; desmentido; trauma; psicanálise; educação.
1 Documentário de Marie-Pierre Jaury (2009), co-produzido entre Canadá e França. Vídeo recuperado em 26 de maio de
2019: https://vimeo.com/229420416
2 Vide Projeto Escola sem Partido, que tramitou no congresso nacional na última década, gerando grande apelo ao
público-alvo de uma sociedade tradicionalista, identificada desde longa data com o slogan “Tradição, família e
propriedade”, fomentador da Ditadura Civil-Militar no Brasil de 1964 a 1985.
Cabe a um outro significar o que deve ser introjetado, propiciando a ligação entre o afeto e
a representação; a integração entre o sentido e a intensidade. Podemos afirmar que o trauma
não é, em si, nem constitutivo, nem desestruturante ou patológico. O que define o trauma de
uma forma ou de outra é justamente seu destino. Se esse excesso receber um contorno, ele
será estruturante, ou seja, constitutivo do sujeito barrado, no linguajar lacaniano. Mas, se o
traumatismo não entrar no campo da possibilidade narrativa, a ponto de colocar em xeque a
montagem narcísica do sujeito, ele será desestruturante. É importante ficarmos atentos, desse
modo, ao papel do outro na constituição subjetiva a fim de compreender que o trauma e a
violência só se configuram a partir da relação com o outro, conforme instituída no laço social.
Tomamos o texto Elasticidade da técnica psicanalítica (Ferenczi, 1928/1992) para apontar
o quanto Ferenczi considerava a radicalidade da relação com o outro para a experiência
subjetiva, chegando a compreender o tratamento analítico de maneira intersubjetiva, como um
espaço entre dois sujeitos. Ele afirma, então, que ser analista é estar numa posição
desconfortável e, principalmente, não hipócrita. É ser absolutamente sincero e conseguir
esperar o momento do paciente entrar em atividade; é suportar a transferência negativa – que,
para ele, é fundamental para o tratamento no que diz respeito à superação da identificação
com o agressor.
Claro que, ao colocar nestes termos, Ferenczi está de acordo com Freud, que considera que
o analista deve, ele próprio, passar pela experiência de análise. Afinal, “a modéstia do analista
não é, portanto, aprendida, mas a expressão da aceitação dos limites do nosso saber”
(Ferenczi, 1928/1992, p. 31). O analista precisa, para exercer sua função, saber abrir mão do
próprio narcisismo. Essa ideia está presente na noção ferencziana de tato apresentada no texto
de 1928 (Ferenczi, 1928/1992). É o tato que permite ao analista saber o momento de
interpretar, de aguardar e calar. Através do tato, o analista pode se pôr atento às forças da
resistência. Ter tato é poder sentir com o outro. É se colocar no lugar do outro a partir da
lógica de funcionamento desse outro, e não a partir de sua própria subjetividade. Parece algo
muito óbvio, mas é uma tarefa árdua porque não requer nenhum tipo de racionalização
(Montes, 2008). O sentir com (Ferenczi, 1928/1992) é estar em sintonia afetiva e nos remete a
um campo de afetação (Maia, 2004), apontando para a existência de “um atravessamento
Considerações Finais
Se, do ponto de vista do sintoma coletivo, ainda não fomos efetivamente capazes de
insurgir contra a violência desmentida no âmbito social, do ponto de vista subjetivo, temos
um pouco mais de margem de manobra. Kaës (2007/2011), por exemplo, é um autor que trata
das alianças necessárias aos laços de grupo e às instituições, reconhecendo aspectos psíquicos
nos grupos sociais e aproximando o funcionamento coletivo ao subjetivo. Podemos, dessa
Referências
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4060.50025
Arreguy, M. E. (2014). A inversão da palmatória e seus reflexos na atualidade. Movimento – Revista
de Educação, 1(1), 1-15. Disponível em:
http://www.revistamovimento.uff.br/index.php/revistamovimento/article/view/53 (acesso
em 31/05/2019).
Arreguy, M. E. & Coelho, M. B. (2017). “Horizontalidade, dizer verdadeiro e a escuta psicanalítica
construída com educadores.” In Pereira, M. R. (org.). Os sintomas na educação hoje: que fazemos
com “isso”? Belo Horizonte, MG: Scriptum.
Dossiê
Resumo. Pretende-se, neste artigo, explorar a possibilidade de propor uma ação educativa, respaldada na ética
do cuidado, orientada pelas contribuições da teoria psicanalítica de Sándor Ferenczi. Para tanto, os autores
iniciam o texto com uma breve discussão sobre a atual situação da educação escolar, apontando a necessidade de
se atentar à dimensão do afeto e das emoções dentro do campo pedagógico. Em seguida, sustenta-se a discussão
pela apresentação de alguns aspectos centrais do pensamento ferencziano. Por fim, postula-se, por meio deste
diálogo entre psicanálise e pedagogia, construir uma conduta de ensino apoiada na empatia, na criatividade, na
liberdade de expressão dos alunos e na autorreflexão dos professores.
Palavras-chave: psicanálise; Sándor Ferenczi; educação; escola.
(...) Num quarto onde existe uma única vela, a mão colocada perto da fonte luminosa pode
obscurecer a metade do quarto. O mesmo ocorre com a criança se, no começo de sua vida,
lhe for infligido um dano, ainda que mínimo: isso pode projetar uma sombra sobre toda a
sua vida. É muito importante entender a que ponto as crianças são sensíveis; mas os pais
não o creem; não podem imaginar a extrema sensibilidade de seus filhos e comportam-se,
na presença deles, como se as crianças nada sentissem diante das cenas excitantes a que
assistem. (Ferenczi, 1928a/2011, p. 5-6)
Parece óbvio dizer que o processo educativo possui um impacto crucial sobre o
desenvolvimento do ser humano. Contudo, por mais que esta afirmação soe um tanto quanto
redundante, cremos que nunca foi tão urgente e necessário repensar a conduta e a prática dos
educadores dentro do contexto educacional atual. Acreditamos que o mal-estar psíquico
vivido na escola contemporânea não tenha explicações apenas no campo psicológico, pois ele
está em sintonia com as transformações sociais em curso. A sempre mencionada crise nas
instituições sociais de referência (como a família, o estado, a cultura, etc.) e todo o conjunto
de mudanças paradigmáticas que as mesmas atravessam (e são por elas atravessadas) parecem
sustentar o descrédito nas instituições de um modo geral, entre as quais a escola ocupa um
lugar significativo.
É praticamente impossível, no entanto, falar da expressiva crise educacional que nos
atinge, sem mencionar as relações afetivas que constituem as bases do meio escolar. Em
função deste pressuposto, buscar subsídios que enriqueçam o processo de reflexão desta
1 Para uma leitura inicial das ideias de Winnicott, recomendamos, aqui, ao profissional da área da educação que não teve
contato com a teoria desse psicanalista, o livro Por que Winnicott de Leopoldo Fulgêncio, publicado pela Editora
Zagodoni, em 2016.
Ora, antes de qualquer coisa, para embasarmos essa discussão no âmbito epistemológico e
histórico, é indispensável que recorramos às bases estruturais do arcabouço psicanalítico, para
que, por meio delas, possamos trilhar uma possível interlocução entre a ciência freudiana e a
educação escolar. Em 1913, o próprio Freud, em um texto chamado O interesse da
psicanálise para as ciências não médicas, se propõe a articular, através de um subitem
intitulado O interesse para a pedagogia, algumas das colaborações fundamentais de sua
ciência à educação. Ele nos dirá que:
Neste recorte, percebemos o quanto o mestre de Viena nos convida a repensar o papel do
educador, tomando como referência as descobertas psicanalíticas – aqui, mais precisamente,
ele destaca a importância constitutiva do papel da sexualidade no desenvolvimento da criança.
Todavia, “o ‘interesse pedagógico’ da psicanálise, conforme os termos de Freud (1913), está
longe de ser um campo de grandes acordos no decorrer dos tempos. Nele ressoa,
inevitavelmente, a história do debate mais amplo sobre a aplicação da psicanálise além da
cura” (Lajonquière, 2017, p. 244). A própria noção de sexualidade infantil ainda é,
lamentavelmente, bastante esquecida e pouco mencionada nos vértices da formação
pedagógica.
Apesar das diferenças estruturais (e ideológicas) que existem entre a psicanálise e a
pedagogia2, acreditamos que um educador que “beba da água freudiana”, seja pelo viés do
estudo teórico, ou pela prática subjetiva, fruto de sua própria análise pessoal, nada terá a
perder no trato diário com seus alunos e na conduta didática de suas aulas. Muito pelo
contrário, a psicanálise abarca uma série de questões e assuntos que não foram diretamente
desenvolvidos pela pedagogia, mas tem em comum, o mesmo fio condutor: o ser humano e
todas as suas dimensões que o estruturam. Nesse sentido, podemos realizar muito mais
aproximações do que distanciamentos. No entanto, este desdobramento “exige, como primeira
medida, deixar de lado a ilusão profilática de forma a liberar a aplicação da psicanálise de
toda a tendência técnico-instrumental traiçoeira da ética psicanalítica” (Lajonquière, 2017, p.
252).
Freud, não apenas pensou na possibilidade reducionista (e ilusória) de uma suposta
“pedagogia analítica”, mas finalizou o seu texto de 1913, propondo que “laços” entre outros
saberes e a psicanálise, pudessem ser construídos de modo enriquecedor (e visionário). Em
suma, não se trata de pressupor que Freud, num primeiro momento, iludiu-se com a
possibilidade da institucionalização real (e prática) de uma educação menos repressora. Ao
contrário, suas ideias sugeriam uma espécie de intervenção criativa e ousada na conduta dos
2 Mais sobre o tema pode ser lido no item 3.3 do livro Psicanálise e Educação Escolar: contribuições de Melanie Klein.
Almeida, A. P. São Paulo: Zagodoni, 2018.
De acordo com uma matéria publicada em janeiro de 20193, na revista Nova Escola, o
nosso país está entre os 10 mais desiguais do mundo, possuindo quase 12 milhões de
analfabetos e mais da metade dos adultos entre 25 e 64 anos não concluíram o Ensino Médio.
Além disso, temos quase dois milhões de crianças e jovens de 4 a 17 anos fora da escola e 6,8
milhões de crianças de 0 a 3 anos sem vaga em creches. Esse cenário, no entanto, é o reflexo
de décadas de descaso de uma nação que nunca colocou a Educação entre as prioridades dos
planos políticos e estruturais. Soma-se a esses dados a completa falta de infraestrutura
presente nas instituições públicas escolares: 14,3% das escolas não possui energia elétrica,
esgoto, água e banheiro dentro do prédio e 55,2% não possui biblioteca ou um espaço para
leituras.
Mediante a um contexto educacional que beira os farrapos e o colapso (percebido pela
leitura dos dados acima), não seria o momento de apostarmos numa perspectiva mais
otimista? O que nos faz pensar o quanto a infância da contemporaneidade demanda um
cuidado específico que é pouco ponderado dentro do paradigma educacional. Aliás, as
questões afetivas, quando trabalhadas por um professor que esteja munido deste
conhecimento, consegue ultrapassar obstáculos que, lamentavelmente, ainda estão presentes
em nosso cenário educacional. A escuta de um educador presente; a sensibilidade de se
envolver com a história pessoal do aluno; e, a capacidade de sentir com ele suas próprias
dificuldades, são fatores que podem amenizar o sofrimento imposto ao campo educacional
por meio do descaso do Estado. Ao fecharmos a porta de nossas salas, a relação que se
estabelece entre professor-aluno é um universo potencial para ocorrer transformações. Porém,
isso não é nenhuma novidade4. O que ocorre, é que há tempos essa conduta vem sendo
desvalorizada e esquecida pela imposição de um ensino mecânico que priorize resultados,
apenas, no rendimento quantitativo.
Nesse ponto, vamos de encontro ao pensamento de Sándor Ferenczi. Ao nos dizer que “a
psicanálise ensinará aos pedagogos e aos pais a tratar suas crianças de modo a tornar
supérflua qualquer pós-educação” (Ferenczi, 1928a/2011, p. 14), ele acredita que o estudo da
3 Dados obtidos da matéria intitulada “Os desafios da Educação brasileira em 2019: linhas e cores”, de autoria de
Alessandra Gotti, publicada na revista Nova Escola, em 30 de janeiro de 2019. Acessada pelo link:
https://novaescola.org.br/conteudo/15432/os-desafios-da-educacao-brasileira-em-2019-linhas-e-cores, em 29 de agosto
de 2019.
4 Paulo Freire – que hoje é tão atacado pelo atual governo – já nos dizia isso em suas obras. Ver “Pedagogia do
oprimido”, de 1968 e “Pedagogia da autonomia”, de 1996. Esses livros são apenas alguns exemplos da riqueza teórica
(e prática) deste autor.
Adquiri a convicção de que se trata, antes de tudo, de uma questão de tato psicológico, de
saber quando e como se comunica alguma coisa ao analisando, quando se pode declarar que
o material fornecido é suficiente para extrair dele certas conclusões; em que forma a
comunicação deve ser, em cada caso, apresentada [...]. O tato é a faculdade de “sentir
com” (Einfühlung). (Ferenczi, 1928b/2011, p. 31, itálicos do autor)
Nada de mais nocivo em análise do que uma atitude de professor ou mesmo de médico
autoritário. Todas as nossas interpretações devem ter mais o caráter de uma proposição do
que de uma asserção indiscutível, e isso não só para não irritar o paciente, mas também
porque podemos efetivamente estar enganados. [...] Do mesmo modo, a confiança em
nossas teorias deve ser apenas uma confiança condicional, pois num dado caso talvez se
trate da famosa exceção à regra, ou mesmo da necessidade de modificar alguma coisa na
teoria em vigor, até então. (Ferenczi, 1928b/2011, p. 36)
5 Kahtuni & Paraná Sanches, 2009, p. 369, nos indicam: “Empatia é a tendência de o sujeito, no caso, o analista, ser
sensível às comunicações verbais e não-verbais de seu paciente, podendo colocar-se em seu lugar, sem, entretanto, perder
os referenciais próprios (...). A empatia, dessa forma, indica uma habilidade relacional de identificação. Tato, por sua
vez, designa tanto a capacidade de distinguir e escolher o momento justo da intervenção terapêutica adequada do
analista quanto o modo de realizar essa intervenção. O tato se relaciona com o ritmo e o tom da intervenção”.
É preciso ter tido uma vivência afetiva, ter experimentado na própria carne, para atingir um
grau de certeza que mereça o nome de “convicção”. Assim, o médico que só estudou
psicanálise nos livros, sem ter submetido pessoalmente a uma análise profunda nem
adquirido a experiência prática junto dos pacientes, dificilmente poderá estar convencido da
correção dos resultados da análise. (Ferenczi, 1912/2011, p. 213)
6 Dados obtidos da matéria intitulada “Suicídio de adolescentes avança, e casos recentes mobilizam escolas de SP”, de
autoria de Marina Estarque, publicada no jornal Folha de São Paulo, em 24 de abril de 2018. Acessada pelo link:
https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/04/suicidio-de-adolescentes-avanca-e-casos-recentes-mobilizam-escolas-
de-sp.shtml, em 29 de agosto de 2019.
7 O que Winnicott chamou de holding.
8 Sugerimos como leitura o livro Presença sensível: cuidado e criação na clínica psicanalítica, de autoria de Daniel
Kupermann. Publicado em 2008 pela editora Civilização Brasileira.
De fato, há crianças que apresentam uma constituição tão robusta que suportam da parte de
seus pais as medidas mais absurdas; mas são exceções e observamos amiúde que, mesmo
quando superam essa educação insensata, deixam escapar uma parte da felicidade que a
vida teria podido propiciar-lhes. Isso deveria incitar os pais e educadores a prestar muito
mais atenção às reações da criança para assim saber avaliar as suas dificuldades. (Ferenczi,
1928a/2011, p. 6)
A singularidade é algo que fica em evidência no trecho citado. Ferenczi afirma que cada
criança reage a uma situação ambiental de modo diferente da outra, ou seja, o mesmo fato
pode ser assimilado de maneira divergente, sendo mais ameno para alguns e mais traumático
para outros. Contudo, o tempo destinado à superação do evento traumatizante, assim como a
parte do psiquismo que trabalha em sua ressignificação, poderia ser utilizado para produzir
momentos mais felizes e enriquecedores. Daí a importância atribuída pelo autor à
sensibilidade necessária aos pais e educadores para poderem observar as demandas de atenção
e reações da criança frente aos episódios cotidianos.
Posto isso, entendemos que dentro de uma sala de aula, a postura da mesma professora
pode ser interpretada de modo completamente singular por cada aluno, ou seja, uma bronca,
um castigo uma atitude de desprezo e indiferença, por exemplo, podem simbolizar um
episódio traumático para alguns, e uma situação irrelevante, para outros. O que estamos
tentando demonstrar é que o educador deve manter-se atento aos impactos de sua conduta
sobre os alunos, percebendo que suas atitudes influenciam, diretamente, o campo emocional
de sua turma, movimentando os elos que entrelaçam a situação de aprendizagem.
Porém, sabemos que, perante a nossa realidade educacional, isso não é nada fácil. Ao
ingressar numa escola, o educador se depara com as frustrações e angústias inerentes às suas
expectativas e idealizações. Os professores, acuados em um beco sem saída, responsabilizam
a tudo e a todos pelo insucesso de sua profissão. Apenas alguns pensam a respeito de sua
conduta educacional e refletem diante de suas próprias atitudes pedagógicas. O processo de
autoconhecimento é doloroso e exige certo grau de subjetividade que não se aprende nas
universidades. O que percebemos é que nos últimos tempos, infelizmente, esse jogo de
empurra-empurra tem se agravado ainda mais. É comum vermos pais delegando a função
educativa totalmente à escola, assim como também é frequente ouvirmos as queixas dos
professores “culpando” a instituição, a política, o sistema, a família e principalmente o aluno
pelos altos índices de baixo desempenho escolar que temos presenciado nos dias de hoje.
Ao considerarmos todas essas questões delineadas ao decorrer de nosso texto, o que
podemos, contudo, ponderar a respeito da tarefa educativa guiada pela noção da ética do
cuidado, amparada pelo conceito de tato apresentado no arcabouço ferencziano?
Primeiramente, é preciso que o professor enxergue sentido em seu exercício profissional. É
claro que dentro de um Estado onde a educação é fortemente desvalorizada, essa empreitada
O pedagogo, por sua vez, ouvindo e respeitando os que fazem suas escolhas, coloca o
problema de outra maneira. Ele está convencido de que a especificidade dos saberes
escolares é justamente que eles devem ser, ao mesmo tempo, ferramentas de integração em
um determinado contexto. [...] É o pedagogo que garante que o grupo não caia na idolatria;
é ele que encarna a busca da verdade e a rejeição a qualquer dogmatismo, duas exigências
que são absolutamente necessárias transmitir aos alunos ao mesmo tempo que os próprios
saberes, no mesmo ato. Assim, a sala de aula torna-se o lugar onde se aprende a
desvencilhar-se do conflito de opiniões, da tentação do “é pegar ou largar”, um lugar onde
se deve justamente discutir, examinar antes de aceitar, pôr em funcionamento sua
inteligência. (Meirieu, 2005, p. 68)
(...) o remédio para essa doença da sociedade (a neurose) só pode ser a exploração da
personalidade verdadeira e completa do indivíduo, em particular do laboratório da vida
psíquica inconsciente que hoje deixou de ser totalmente inacessível; e o meio preventivo:
uma pedagogia fundada, isto é, a ser fundada na compreensão e na eficácia, e não em
dogmas. (Ferenczi, 1908/2011, p. 44)
Muitos autores humanistas procuram há décadas, tentar ensinar às pessoas que o “essencial
é invisível aos olhos”, como dizia a Raposa do Pequeno Príncipe9. Entretanto, mesmo depois
de muitos anos de uma teoria que lançou luz sobre um assunto que há muito jazia na
escuridão, poucos, aliás, muito poucos educadores são capazes de sentir empatia pelo aluno (e
captar) este “essencial”. A maioria não alcança esta capacidade, justamente por não ter sido
captada “essencialmente” durante o seu processo de desenvolvimento como ser humano. Isto
é, quem não teve a sua “essência” afetivo-emocional apreendida no decorrer da vida, jamais
conseguirá se colocar no interior do outro. E, aqui, não estamos apenas nos referindo à
formação pessoal do professor, mas, também, ao processo de formação profissional. O curso
Referências
Almeida, A. P. (2018). Psicanálise e educação escolar: contribuições de Melanie Klein. São Paulo,
SP: Zagodoni.
Almeida, L. R. (2009). Consideração Positiva Incondicional no sistema teórico de Carl Rogers. Temas
em Psicologia, 17(1), 177-190. Recuperado de
10 Para quem se interessa sobre o assunto, recomendamos a leitura do artigo Consideração Positiva Incondicional no
sistema teórico de Carl Rogers de autoria de Laurinda Ramalho de Almeida. Publicado na revista “Temas de Psicologia”
N. 1, Vol. 17. Ano 2009. P. 177-190.
Resumo - Este artigo visa discutir a urgência da (re)construção dos laços de autoridade,
na escola, pela via do reconhecimento da importância da função paterna e do Nome-do-
Pai, na educação e na sociedade. Problematiza, ainda, à luz de alguns pressupostos da
psicanálise, a violência na escola e suas conseqüências no cotidiano escolar, bem como
seus efeitos na sociedade, em geral. As considerações finais serão apresentadas em
torno de algumas iniciativas e ações pedagógicas voltadas para o investimento na
reconstrução dos laços sociais e da autoridade, na escola, como possibilidade de
elaboração psíquica e enfrentamento das violências. A formação clínica de professores,
com dispositivos centrados na análise e reflexão de práticas docentes e ancorada na
tradição e na transmissão cultural de valores morais e éticos e no reconhecimento de
crianças e adolescentes como sujeitos da educação, é considerada essencial na
(re)construção dos laços sociais, no cotidiano das escolas.
1
Psicanalista. Professora da Universidade Católica de Brasília. Mestre em Psicologia e Doutoranda em Educação
pela Universidade Católica de Brasília, sob a orientação da coautora. E-mail: rosanam@ucb.br
2
Psicanalista. Professora dos Programas de Pós-Graduação stricto sensu em Psicologia e em Educação da
Universidade Católica de Brasília. Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq. Coordenadora do GT da
ANPEPP Psicanálise, infância e educação. Professora aposentada do Instituto de Psicologia da UnB. E-mail:
sandraf@pos.ucb.br
1
subjetivo, singular, e também social, pois construído e vivenciado nos laços sociais.
Enquanto sintoma, constitui um dispositivo usado pelo sujeito para denunciar um estado
psíquico de sofrimento. Blanchard-Laville (2005) lembra, apropriadamente, que o
sintoma é sempre endereçado ao outro.
Freud escutava as histéricas, queixosas de seu mal-estar, pela via dos sintomas.
Em 1930, anunciou que para o homem conviver na sociedade seria necessário suportar
um quantum de mal-estar, conter a autodestruição e a destruição do outro. Para Freud,
os laços sociais são responsáveis, em grande parte, pelo mal-estar na cultura, já que os
homens possuem inclinação para a agressividade e crueldade. Freud considera as nossas
pulsões destrutivas como responsáveis pelo mal-estar na civilização.
Nesta direção, concorda-se com Marty (2006), que entende que é possível
pensar a violência que se passa no palco social como forma de expressar o que se
produz no palco psíquico.
Já Bettelheim (1979), citado por Costa (2003), adverte que só há violência
quando o sujeito que sofre a ação agressiva percebe no agente da ação um desejo de
destruição. Mas, mesmo assim, é fundamental salientar, conforme Costa, que a
violência é própria do humano, embora não deixe de nos impactar e causar-nos
estranheza.
Birman (2009) enfatiza que a violência é, de fato, uma marca que perpassa a
história humana e está desde sempre presente nas sociedades. Mas, como afirma o autor,
por não ser um dado biológico, existe na própria passagem aos atos violentos a inscrição
de formas de subjetivação particulares de atuação. Sendo assim, a violência não pode
ser vista de forma simplista e sem considerar a complexidade humana.
No processo de subjetivação, ou dito de outra forma, na constituição psíquica do
sujeito, o Outro funciona como aquele a quem é demandado inserir o infans no contexto
social. A presença de um Outro interpela o caminho da constituição subjetiva da criança
e a impele a construir laços sociais. Neste sentido, Bernardino (2006) analisa o
desenvolvimento infantil distanciando-se das idéias organicistas e maturacionistas,
compreendendo-o pela via da psicanálise, ao apontar que as heranças genéticas não são
suficientes para a construção do ser humano, no pleno sentido da palavra. A autora
ressalta que isso só é possível quando um Outro atua nos cuidados do pequeno ser que
acaba de chegar ao mundo. Este pequeno, então, passa a fazer parte de uma rede de
laços sociais, que o constitui psiquicamente, já que o inconsciente não se articula fora
do social, mas, antes, é aí que se inscreve.
2
Assim, a inserção da criança na cultura se dá justamente em virtude de uma lei
simbólica interiorizada, por meio da transmissão do significante que Lacan (1998)
denomina Nome-do-Pai. A função paterna, representante dessa metáfora, pode ser
exercida, simbolicamente, tanto pelo pai real quanto por significantes culturais que
venham a ocupar esse lugar. O Nome-do-Pai tem a função de inserir o infans na cultura,
pela via da linguagem, em um mundo de leis e normas, proporcionando, portanto, a
entrada da criança no laço social e retirando-a da completa dependência de suas pulsões
primitivas ao mesmo tempo em que abre as vias para a operação psíquica de separação
do Outro.
Almeida (1999) e Almeida et al. (2010) entendem que a função paterna poderá
ser exercida simbolicamente, pela via da linguagem, por um outro que não seja o pai.
Chamam a atenção para o fato de que “ao longo do desenvolvimento do sujeito, é
possível que outros significantes e pessoas assumam, simbolicamente, a função paterna.
Deste modo, na busca pelo terceiro, pode surgir, para o adolescente, a figura do
professor ou de alguém próximo como sendo representante da lei paterna. Também o
juiz pode vir a ocupar esse lugar, tendo como função interditar a relação dual e
introduzir a metáfora do Nome-do-Pai” (2010, pp.171-172)3.
Lajonquière (2000) afirma que, nos dias atuais, há uma recusa, na sociedade
moderna, em reconhecer a importância da metáfora paterna na constituição do sujeito e
questiona qual seria, na verdade, a função do pai, na resolução do Édipo. Para o autor, o
pai tem a função de barrar o desejo da mãe e retirar, mãe e filho, da ilusão de
completude narcísica.
Também o professor pode ocupar o lugar simbólico de representante da lei e de
interditor das crianças, na vida escolar, como o de um pai na educação familiar de seus
filhos. Entretanto, na sociedade moderna, este lugar está prejudicado, esvaziado,
desinvestido de autoridade.
Notadamente, na contemporaneidade, o desinvestimento das figuras de
autoridade pode dar lugar a modalidades de violência contra a pessoa. A escola se
insere neste cenário, uma vez que, no seu ambiente, existem atuações agressivas e
violentas contra os professores, alunos e outros membros da comunidade escolar.
3
Para acompanhar as diferentes modificações que a noção de Pai ganhou, no ensinamento de Lacan,
reportar-se ao artigo de A. Zenoni, Versões do Pai na psicanálise lacaniana: o percurso do ensinamento de
Lacan sobre a questão do pai, publicado em 2007, em Psicologia em Revista, v. 13, n. 1, pp. 15-26.
3
Aguiar e Almeida (2008), em pesquisa realizada sobre o sofrimento psíquico de
professores, relatam como a violência escolar pode estar relacionada com o declínio da
função paterna, na modernidade, que se expressa na crise moral, social e familiar e no
desinvestimento do professor de seu lugar de autoridade.
Arendt (2003), referindo-se à inserção da criança no mundo social e na cultura,
afirma que aos adultos é conferida a responsabilidade da educação das crianças e que a
escola participa da responsabilidade de introduzir a criança no mundo. A autora adverte
que, “na educação, essa responsabilidade pelo mundo assume a forma de autoridade”
(p.239). Afirma, ainda, que a autoridade do professor se assenta na responsabilidade
assumida como representante do mundo dos adultos.
No entanto, como adverte Arendt (2003), a crise na educação revela que essas
funções e lugares não são bem demarcados e no que concerne à autoridade encontram-
se cada vez mais esvaziados, pois tanto pais como mestres, muitas vezes, se destituem
desse lugar ou dele desistem antes mesmo de assumi-lo. Os efeitos de tal renúncia, na
constituição psíquica do sujeito, podem ser devastadores, uma vez que se soma a isso a
ausência de referências éticas, morais e sociais. Sem referências e proteção, crianças e
adolescentes poderão vir a se organizar psiquicamente de modo não saudável.
Em seu texto, Metapsicologia do sujeito moderno, Fleig (1999) examina os
modos e os princípios organizadores da modernidade e seus efeitos no laço social,
apontando que daí resultam vários impasses, como os sintomas sociais e as dificuldades
subjetivas. Fleig argumenta que o imperativo do sujeito moderno é abandonar as
tradições e entregar-se “ao comando dos objetos”, mas adverte que a constituição
psíquica de todo e qualquer sujeito se dá a partir dos laços que o fundam e daquilo que a
cultura coloca à disposição do sujeito, já que o inconsciente não se articula fora do
campo social. Neste sentido, é preciso refletir acerca das marcas que a cultura
contemporânea tem deixado no sujeito e nos modos pelos quais a sociedade moderna
tem se organizado.
No mesmo texto, Fleig (1999) cita Arendt (1969), que analisa a violência como
uma das faces do sintoma social, fruto do declínio do poder. Para a autora, conforme
Fleig, quanto maior a diminuição do poder legítimo maior a possibilidade de violência,
que ela nomeia “força não legítima”.
Preocupados com os rumos que as novas gerações, a educação e a escola vêm
tomando, governantes de diversos países têm apoiado ações educativas de
enfrentamento da violência, nas escolas. Em maio de 2010, o atual presidente da França,
4
Nicolas Sarkozy, pronunciou um discurso exclusivamente voltado para o preocupante
cenário da escola, em seu país, intitulado “discurso sobre as violências escolares”. Em
certa passagem de seu pronunciamento, destacou que a violência escolar é um problema
de todas as pessoas envolvidas com a escola, embora cada uma tenha um papel definido.
O presidente francês deu ênfase à necessidade da reconstrução da autoridade na
escola como uma das possibilidades de prevenção e combate à violência. Destacou,
também, que o professor é depositário da autoridade a ele conferida pelo seu saber e que
é essencial que o aluno respeite o professor, para com ele aprender. Para Sarkozy, a
ordem (disciplina) tem valor fundamental no cenário escolar. Comprometeu-se, no
discurso, a engendrar estratégias para a reconstrução da ordem e da autoridade na
escola, legitimando a instituição escolar de forma a que o docente seja reconhecido,
novamente, como figura de autoridade. Para o presidente francês, só se ganha essa
batalha se todos se envolverem no mesmo propósito, pois, segundo ele, a violência na
escola se tornou um insulto à sociedade. Nas suas palavras, “não podemos ficar
indiferentes diante deste problema” (Sarkosy, 2010).
O pronunciamento da maior autoridade da França a respeito da violência na
escola anuncia uma atitude de apoio e de suporte à educação escolar, com vistas ao
resgate da autoridade docente e apoio à categoria de professores. Espera-se que essa
posição tenha desdobramentos políticos e éticos e efeitos reais positivos, para além do
que, simbolicamente, ela possa significar.
Debarbieux (2010) compara iniciativas e providências tomadas pelos sistemas
educacionais inglês e francês acerca da violência no âmbito escolar. Aponta que na
Inglaterra a família é convidada a participar das decisões e das ações da escola e da
educação escolar de seus filhos, de um modo geral. E critica duramente o sistema
educacional francês, ao afirmar que, ainda nos dias de hoje, a escola vê as famílias dos
estudantes como suas adversárias.
Entretanto, algumas iniciativas institucionais, no âmbito das escolas francesas,
podem ser citadas, como o de uma escola cuja equipe pedagógica operacionalizou
mudanças significativas na dinâmica das relações interpessoais professores-alunos, no
ambiente escolar, resgatando o sucesso no aprendizado, recompondo os laços sociais e
de autoridade e promovendo o convívio social entre os membros da comunidade, por
meio de medidas relativamente simples. Segundo Feyfant (2010), a equipe de
professores dessa escola organizou, em parceria com representantes dos alunos, novas
normas de regulação de condutas e comportamentos, diminuindo, sensivelmente, os
5
desvios das regras e normas no interior da escola. A autora lembra que o fenômeno da
violência pode ser entendido como não submissão às normas sociais estabelecidas.
Assim, a construção de novas regras, negociadas, partilhadas e acordadas por todos, na
instituição escolar, torna-se absolutamente necessária.
Feyfant (2010) observa, ainda, que o interesse familiar pela escola é fundamental
e enfatiza a necessidade de diálogo, de abertura e de um espaço de interlocução onde
pais e mestres possam conversar a respeito da violência escolar e seus modos de
enfrentamento. A autora também atribui importância às conversações acerca da moral e
dos valores familiares, propõe o resgate dos limites na educação e participação efetiva
dos pais na escola, com vistas a acompanhar de perto o desenvolvimento intelectual de
seus filhos.
Outras iniciativas tomadas por algumas escolas, na França, dizem respeito à
formação continuada de jovens professores, em início de carreira, visando a lhes dar
suporte no exercício de seu métier, sobretudo nas escolas com altos índices de
violência. Nessas instituições escolares, os professores são convocados a participar de
cursos de formação, durante o seu primeiro ano de atuação como docente de ensino
médio. Os jovens professores participam de um programa de acompanhamento e análise
das práticas docentes, de 216 horas de duração, logo após o ingresso na unidade escolar.
Enquanto freqüentam o grupo, seus alunos ficam sob a responsabilidade de professores
substitutos (Guyoyat & Quilleret, 2010). Essa formação em serviço visa dar apoio e
suporte aos professores em início de carreira para que possam expressar suas angústias
e, também, estreitar os laços com a equipe pedagógica. Na maioria das vezes, os jovens
professores se apresentam para o trabalho docente bastante angustiados e inseguros.
Com esse dispositivo, essencialmente um grupo em que a palavra circula, os docentes
ingressantes podem falar de seus sentimentos e angústias em relação à sala de aula e ao
cotidiano escolar.
Contudo, iniciativas de formação continuada focadas no desenvolvimento
pessoal e profissional do professor (Almeida & Paulo, 2009, 2010) não são usuais no
ambiente pedagógico, pois há uma negação, na escola, dos efeitos do inconsciente e do
desejo do sujeito no processo de ensinar e de aprender.
Também Aguiar e Almeida (2008) consideram que “a maioria dos ‘modelos’ de
formação inicial e continuada de professores desconhece ou nega, ainda hoje, as
manifestações psíquicas inconscientes presentes na sala de aula e na escola” (p. 80). Na
mesma direção, as autoras afirmam que o maior desafio de uma nova modalidade de
6
formação continuada de professores, consiste em “privilegiar a subjetividade do
docente, dando-lhe suporte e reconhecimento, criando condições e recursos, pessoais e
profissionais, para que o professor possa modificar o destino do seu sofrimento no
exercício do magistério. A possibilidade de escuta por um profissional qualificado no
percurso de formação e em serviço pode, de alguma forma, contribuir para a
(re)construção da identidade do mestre e para o atravessamento de suas fantasias e
ideais educativos”(p. 84).
(In) concluindo
7
Projetos inovadores, tanto intra quanto extraescolares, que fogem à lógica habitual
escolar podem ser construídos, de modo a que sejam redefinidos os espaços de
socialização e retomadas as identificações mútuas entre adultos e adolescentes.
Pechberty faz referência a diversos projetos, não usuais no ambiente da escola, que
permitem reinventar o pedagógico, atravessar a angústia e estabelecer trocas e laços
mais consistentes entre alunos e professores. Dentre os projetos possíveis, ele cita
atividades periescolares, saídas da escola, encontro com artistas, filmes produzidos por
alunos, introdução do lúdico no aprendizado. No que diz respeito aos professores,
enfatiza a importância dos estágios de análise clínica das práticas profissionais,
destinada aos debutantes na profissão, visando à construção da identidade profissional.
Nessa perspectiva, podemos afirmar que a desconsideração da existência do
outro e de suas ressonâncias psíquicas, o isolamento na sala de aula e o não-
reconhecimento no exercício da prática pedagógica levam a um rompimento das
relações interpessoais e a uma quebra dos laços sociais, no cotidiano do ofício de
ensinar. O fato de não ser reconhecido em sua função de autoridade e representante do
mundo adulto pode ser entendido por muitos docentes como uma violência, de fato,
uma desqualificação pessoal e profissional. No jogo das relações e práticas educativas,
no interior da escola, tanto professores quanto estudantes, ao se sentirem ignorados em
suas demandas psíquicas, reeditam vivências de abandono e desamparo. Quando a
angústia e o mal-estar são muito fortes e sem possibilidade de elaboração simbólica,
corre-se o risco da não-integração de pulsões (seus representantes ideativos e seus
afetos), e o agir e a passagem aos atos violentos podem, então, dominar o ambiente
escolar.
Debarbieux (2010) defende que uma das grandes soluções para os problemas da
escola, na modernidade, é o trabalho em equipe, atividade primordial no contexto
escolar. Segundo o autor, o trabalho em grupo estabiliza o conjunto de docentes e
melhora o funcionamento interno da escola, necessário à transmissão dos saberes, que
não subsiste se a escola não tiver uma estrutura e um funcionamento capazes de garantir
um suporte suficientemente adequado ao exercício do ofício docente.
Com uma visão de cunho mais pedagógico e uma certa idealização do ato
educativo, Clerc (2009) aponta alternativas para que o docente torne seu ofício mais
eficaz e menos penoso, em todos os aspectos. Para o autor, o professor não deve abrir
mão de ter domínio de sua classe, ao mesmo tempo em que deve conquistar a confiança
de seu aluno. Também propõe aos jovens professores, que atuam no ensino de
8
estudantes “difíceis”, alguns dispositivos que ele denomina “Técnicas Pedagógicas”,
cada uma com objetivos precisos, tais como construir e manter o respeito e o rigor com
o objetivo de sustentar a autoridade; trabalhar com atividades teatrais e com dinâmicas
mobilizadoras, para prender a atenção dos estudantes; manejar uma pressão positiva
quanto à disciplina na classe, para que os alunos não percam a noção dos limites, em
sala de aula; proporcionar situações de aproximação entre os alunos, por meio de
trabalhos em equipe; criar condições motivadoras em sala, para que os alunos possam se
manter interessados; fazer a gestão de sua própria energia, para que não sucumba ao
estresse; interessar-se de fato pelos alunos, chamar os pais à escola; manifestar
otimismo no diálogo com os alunos, para que os embates e os confrontos sejam
evitados, respondendo do lugar de adulto e de autoridade e não como uma criança igual
ao seu aluno.
Essas iniciativas, na concepção de Clerc (2009), podem ajudar o professor a
lidar com o cotidiano na escola com menor grau de dificuldade e um pouco mais de
prazer. Visam, também, acolher o jovem professor no início de sua profissão, quando se
confronta com o real da profissão docente.
Com relação à formação docente, sobretudo a formação continuada ou em
serviço, embora não haja solução milagrosa, acreditamos que o suporte dos professores
mais experientes é muito relevante para os jovens professores. Pode-se, inclusive,
planejar e experimentar, na prática, a idéia de tutoria dos mais experientes em relação
aos menos experientes.
Na mesma direção, o dispositivo de análise das práticas, ao facilitar aos
professores o acesso à palavra, escutá-los e acompanhá-los nas situações e experiências
difíceis, de modo a que sua angústia possa ser reconhecida e elaborada, é fundamental.
Esse dispositivo permite troca de experiências, ligadas à história de vida dos sujeitos,
que afetam e são afetadas pelas vivências e dinâmica da profissão, e lhes permite
compreender melhor as ressonâncias subjetivas e profissionais em jogo, na relação
pedagógica, vislumbrando soluções mais criativas e menos repetitivas para os
problemas enfrentados na escola. Almeida (2011) defende essa idéia e assinala a
importância de um adequado manejo dos dispositivos clínicos de orientação
psicanalítica, na formação de professores, atravessados pelo “ethos do cuidado e do
acolhimento” (p. 28). Em sua análise, ressalta que não é possível separar a vida pessoal
da vida profissional do professor, pois ambas são entrelaçadas de modo a determinar o
ser e o fazer na profissão, e chama a atenção para o fato de que “a formação de
9
professores não pode ser centrada apenas nos aspectos técnicos, didáticos, instrumentais
e racionais ligados ao exercício de um saber-fazer profissional” (p.27).
Isto não quer dizer, entretanto, que não se reconheça a importância da inclusão
de temas e problemas atuais que tocam e afetam a sociedade, a família e a escola, no
currículo da formação de professores, tais como o fenômeno das violências, o ensino e o
aprendizado de alunos “difíceis”, as novas configurações familiares, a educação para a
sexualidade, a inclusão escolar de alunos com transtornos de desenvolvimento e/ou com
deficiências, o fenômeno da drogadição, a indisciplina, o sofrimento psíquico de
professores, dentre outros problemas que revelam os impasses da educação, na
atualidade. Contudo, não se pode deixar em segundo plano, no processo de formação, a
premissa essencial da articulação entre o pessoal e o profissional, na função docente,
pois a subjetividade do professor atravessa a sua prática pedagógica e constitui o esteio
que sustenta a relação educativa.
Assim, acreditamos que a (re)construção dos laços de autoridade, no ambiente
escolar, se dará, legítima e eticamente, por meio do reconhecimento e do efetivo
exercício do papel e das funções do adulto na educação das novas gerações, desde o
âmbito privado, no seio familiar, quanto o público, no interior das escolas.
No que toca aos professores, especialmente os que se dedicam ao ensino de
alunos adolescentes, parece-nos essencial que consigam dar testemunho de sua relação
singular com o saber e exercer, por acréscimo, uma função de suplência da autoridade
paterna e de identificação narcísica, essenciais a uma travessia menos traumática e
violenta da adolescência, conforme propõem Almeida et al. (2011), a partir de tese
defendida por Marty (2006). Uma formação continuada, de inspiração psicanalítica,
voltada para a análise clínica das práticas profissionais, trabalha nessa direção: no
avesso da formação teórico-instrumental.
Referências:
10
(Org.). Psicanalistas e educadores: tecendo laços (pp. 53-69). Rio de Janeiro: Wak
Editora.
Feyfant, A. (2010). Des violences à l'école. Dossier d'actualité n° 54 – mai 2010. Veille
scientifique et technologique. Recuperado em 04 jul. 2010, em http://www.inrp.fr/vst
11
Guyoyat, F & Quilleret, C. (2010). Ces jeunes profs sans expérience pratique qui
plongent cette année dans le grand bain. Recuperado em 20 mar. 2011, em
<http://www.france-info.com/france-education-2010-09-01-l-angoisse-des-jeunes-
professeurs-sans-formation-481911-9-43/>.
Sarkosy, N. (2010). Discours sur les violences scolaires. Recuperado em 30 mar. 2011,
em http://www.elysee.fr/president/les-actualites/discours/2010/discours-sur-les-
violences-scolaires.8748.html.
12
PSICANÁLISE E EDUCAÇÃO: um olhar sobre o fenômeno do bullying
RESUMO
154
PSYCHOANALYSIS AND EDUCATION: a look at the phenomenon of bullying
ABSTRACT
The article discusses the phenomenon of the bullying, leaving from the analysis of texts of
spread found easily in the Internet. It carries out the discussion looking in the Freudian
Psychoanalysis and in the Psychoanalysis of Direction lacaniana, the necessary theoretical
bases to demystify the phenomenon while practice of unilateral violence survived in the
schools and in the society in general. The phenomenon is presented like a contemporary
social symptom, which origin is in the process of constitution of the subjects that practice the
bullying, be like an aggressor or like receiver of the aggressiveness of other. It considers that
both persons in charge for the relation whom they build, for the road of his symptoms.
O presente trabalho tem como objetivo esclarecer aos leitores quanto ao fenômeno
do bullying, no que tange à sua gênese, tanto do ponto de vista do agressor quanto do ponto de
vista do agredido ou da “vítima”. A Psicanálise Freudiana e lacaniana se põe como ponto de
partida para a análise de discursos a respeito do fenômeno em questão e que se encontram
disponíveis na mídia em geral. O funcionamento psíquico do sujeito precisa ser apreendido,
segundo a teoria freudiana sobre a compulsão à repetição e como modalidade de gozo do
sujeito, na perspectiva da psicanálise lacaniana, para que se possa dar conta dessa discussão
que não pode ser definida unicamente por aspectos internos aos sujeitos, mas sim deste em
suas relações com o contexto sócio-histórico e cultural, no qual os sujeitos se constituem.
Com essa proposta, destaquei, em uma pesquisa realizada pelo Google, dois textos
que estão disponíveis na internet, para qualquer leigo- principalmente os pais, que por
qualquer motivo se queixam às escolas, afirmando que seus filhos estão sendo vítimas de
bullying - que queira saber algo sobre o bullying. Tais textos trazem discursos que são no
mínimo precipitados, em função da superficialidade dos conhecimentos apresentados, tendo
em vista a profundidade do tema.
Para as análises que empreenderemos aqui, foram selecionados dois textos, sendo um 155
24
texto de definição enciclopédica, representado pelo Wikipédia , dicionário encontrado pelo
sistema simples de busca do Google e pelo texto de Orson Camargo, Colaborador da revista
digital Brasil Escola, Graduado em Sociologia e Política pela Escola de Sociologia e Política
de São Paulo – FESPSP e Mestre em Sociologia pela Universidade Estadual de Campinas –
UNICAMP, intitulado Bullying: não é brincadeira de criança, publicado em um blog
informativo25. O texto também foi publicado pela revista Brasil Escola.
Destes textos de divulgação, depreendemos algumas concepções que não podem ser
confirmadas pelos estudiosos da psicanálise de Freud a Lacan, dois referenciais
importantíssimos para qualquer estudo que se pretenda a propósito dos novos sintomas
contemporâneos. Sendo assim, trataremos destes dois textos de divulgação, à luz dos
principais textos psicanalíticos de Freud e de Lacan, utilizando o crivo dos pressupostos mais
básicos da Psicanálise: a singularidade das manifestações do sujeito e a gênese de todos os
24
WIKIPEDIA. Bullying. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Bullying#Terminologia. Acessado em
30/07/2014.
25
http://bullyingnaoebrincadeiradcrianca.blogspot.com.br/2011/04/bullying.html.
FREUD
Freud (2006a) em Além do princípio de prazer, inicia seu texto dizendo:
...não se pode hesitar em supor que o curso tomado pelos eventos mentais está
automaticamente regulado pelo princípio de prazer, ou seja, acreditamos que o curso
desses eventos é invariavelmente colocado em movimento por uma tensão
desagradável e que toma uma direção tal, que seu resultado final coincide com uma
redução dessa tensão, isto é, com uma evitação de desprazer ou uma produção de
prazer. (FREUD, 2006ª: p. 17).
LACAN
162
No terceiro ensino de Lacan, há um “osso duro” no gozo, que não se consegue
atingir. Assim como Freud se referiu ao “umbigo do sonho”, como um desejo inacessível,
Lacan faz referência a algo que é da ordem do real e, portanto do objeto a, que é impossível
de apreender.
Miller (2009) afirma que para Lacan, o sujeito fala para si mesmo e que essa fala
empreendida pelo sujeito é uma fala gozosa, considerada como pulsão. O circuito da fala-
satisfação, da fala-pulsão. Diz que no terceiro ensino de Lacan, o inconsciente, ao contrário
do inconsciente freudiano, que representa o discurso do Outro, se apresenta como o discurso
do Um. Esse discurso faz com que a fala perca sua função de comunicação e passa a ser só o
gozo do Um.
Ressalta que em seu terceiro ensino, Lacan passa a designar o sujeito como falasser
ou ser na fala e segundo Miller, essa designação compreende o sujeito e o inconsciente.
Recorre ao texto de Lacan, para dizer que a fala é inconsciente, porque se fala sozinho, para si
mesmo e se diz sempre a mesma coisa. Contempla o falasser lacaniano como em uma relação
autística consigo mesmo, que se manifesta na alíngua.
Camargo (2011) diz que o bullying é um termo da língua inglesa (bully = “valentão”)
que se refere a todas as formas de atitudes agressivas, verbais ou físicas, intencionais e
repetitivas, que ocorrem sem motivação evidente e são exercidas por um ou mais indivíduos,
causando dor e angústia, com o objetivo de intimidar ou agredir outra pessoa sem ter a
possibilidade ou capacidade de se defender, sendo realizadas dentro de uma relação desigual
de forças ou poder.
Ressalto aqui alguns pontos que precisam ser analisados: a falta de motivação
evidente para a agressão; a relação desigual de forças ou poder dentro da relação existente 163
entre o agressor e a pessoa agredida e a falta de possibilidade ou capacidade de se defender da
pessoa agredida. Estes são alguns pontos do texto que precisam ser mais aprofundados para
que se possa ter uma melhor compreensão da intrincada teia de significações contidas no
fenômeno do bullying, o que faremos ao final deste tópico.
O mesmo autor afirma que o fenômeno bullying se divide em duas categorias:
a) bullying direto, que é a forma mais comum entre os agressores masculinos e
b) bullying indireto, sendo essa a forma mais comum entre mulheres e crianças, tendo como
característica o isolamento social da vítima. Em geral, a vítima teme o(a) agressor(a) em razão
das ameaças ou mesmo a concretização da violência, física ou sexual, ou a perda dos meios de
subsistência.
Aqui neste ponto do texto de Camargo (2011), quero ressaltar as várias formas de
violências implicadas no fenômeno, o que mostra que o bullying pode muito facilmente ser
empreendido em qualquer contexto em que uma criança ou adolescente esteja inserido.
Especial e principalmente, porque mais facilmente, por adultos, quais sejam pessoas
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tendo em vista o que foi dito a respeito do gozo do sujeito contemporâneo, a partir
da Psicanálise freudiana e lacaniana, o que podemos ensejar à escola é que vincule a criança
ao desejo, desde sempre atrelado ao conhecimento (desejo de aprender); aos professores, que
REFERÊNCIAS
ARTIGO ARTICLE
a partir de um estudo sobre a agressividade humana
Abstract The aim of the present article is to offer a Resumo O objetivo deste artigo é oferecer uma fer-
tool to enlighten the comprehension of aggressive ramenta que ilumine a compreensão acerca dos com-
behavior and violent situations often found in edu- portamentos agressivos e das situações violentas co-
cational institutions. The words “violence” and “ag- mumente encontrados na instituição escolar. As pa-
gressiveness” are not used in an unequivocal way, lavras “violência” e “agressividade” não são utiliza-
and the establishment of a map showing this fact das de forma inequívoca e estabelecer uma cartogra-
allows designating places and ways of treatment spe- fia que demonstre tal fato permite a designação de
cific for the phenomena. Following the theoretical lugares e formas de tratamento específicos aos fenô-
model of the psychoanalyst Donald Winnicott, we menos. Seguindo o modelo teórico proposto pelo psi-
will discuss the differences between aggressiveness canalista Donald Winnicott, faremos uma discussão
and violence, illustrating them through the presen- das diferenças entre agressividade e violência, ilus-
tation of a case experienced by our health team in a trando-a com a apresentação de um caso trabalhado
public school in the state of Rio de Janeiro. In face of por nossa equipe de saúde em uma escola pública do
the difficulties found and the questions raised, we estado do Rio de Janeiro. Diante dos questionamen-
sought to show that the denaturalization of violence tos levantados e das dificuldades encontradas, procu-
and the depathologization of aggressiveness offer us ramos mostrar que a desnaturalização da violência e
the possibility to propose actions which are not re- a despatologização da agressividade nos oferecem a
stricted to the control and correction of such mani- possibilidade de propor ações que não se restrinjam
festations, but can be more efficient in preventing ao controle e à correção de tais manifestações, mas
1
Escola de Defesa Civil,
Superintendência
the irruption and reproduction of violent situations que possam ser mais eficientes em prevenir a irrup-
Operacional do Corpo de for con siderin g th e socia l context in wh ich th ey ção e a reprodução de situações violentas, por leva-
Bombeiros Militar do emerge and the subjective experiences involved. rem em conta o contexto social em que emergem e as
Estado do Rio de Janeiro.
Key words Aggressiveness, Violence, Antisocial ten- experiências subjetivas nelas envolvidas.
Rua Oswaldo Aranha 156,
Praça da Bandeira. dency, School, Social context, Psychoanalysis Palavras-chave Agressividade, Violência, Tendên-
20271-330. Rio de Janeiro cia anti-social, Escola, Contexto social, Psicanálise
RJ. helandrade@hotmail.com
2
Instituto de Medicina
Social, Universidade do
Estado do Rio de Janeiro.
446
Andrade EV, Bezerra Jr B
Introdução: o desafio da “violência na escola” que a educação deve ser realizada através de medi-
das dominadoras e autoritárias (o que fazia com
Este artigo é um ensaio baseado em parte do ma- que essas medidas estivessem fortemente presen-
terial produzido pela dissertação de mestrado da tes na rede social em questão). Em nossa prática, a
autora, sob orientação do co-autor1. O tema sur- avaliação sempre levava em conta o sofrimento da
giu de inquietações éticas, teóricas e clínicas pro- criança ou do adolescente em relação à situação.
vindas da prática com expressões de agressividade Diante de tantas reclamações semelhantes e da
e situações de violência, durante quatro anos de impotência muitas vezes sentida ao recebermos es-
trabalho em um Centro Integrado de Educação ses casos, foi percebida uma grande dificuldade de
Pública (CIEP) da Baixada Fluminense. Nesta épo- lidarmos com algo que nos era familiar e estranho
ca, a autora atuava no Programa Saúde na Escola ao mesmo tempo. O levantamento realizado teve
(PSE) do Corpo de Bombeiros Militar do Estado como resultado o estabelecimento de um estudo
do Rio de Janeiro (CBMERJ) com uma equipe mais sistemático de casos exemplares, no qual se
multidisciplinar – composta também por assis- buscou, através de um diálogo entre essa experiên-
tente social, clínico geral, dentista, fonoaudiólogo, cia e os instrumentos teóricos, aprofundar nosso
nutricionista e pediatra – que recebia encaminha- conhecimento sobre as manifestações que envol-
mentos de profissionais de educação e saúde de vem violência na escola, em especial no que diz
outras escolas da redondeza. respeito aos significados da agressividade infanto-
O primeiro atendimento a essa demanda era juvenil.
feito através de um Grupo de Recepção Integrada Dentre os sujeitos que foram atendidos pela
(GRI), dispositivo através do qual eram realizados psicologia durante o período mencionado acima,
a recepção, o acolhimento, a avaliação e, quando três foram escolhidos para ilustrar os questiona-
necessário, o re-encaminhamento (interno ou ex- mentos presentes, tanto em relação aos significa-
terno) dos casos que chegavam por motivos diver- dos dos comportamentos apresentados, quanto
sos. A riqueza desse grupo – com seus encaminha- aos dispositivos recorrentemente utilizados sem
mentos, relatos e prontuários – tornou-o fonte de grande sucesso. O atendimento de todos os casos
estudo e análise, possibilitando constantes reflexões já tinha sido interrompido quando esse estudo foi
sobre formas de escutar e atuar nesses casos tão realizado e as identidades foram devidamente pro-
recorrentes. Com as discussões daí derivadas, pu- tegidas por troca de características-chave. Neste
demos nos questionar sobre as demandas apre- artigo, escolhemos apresentar apenas certos as-
sentadas, sobre os lugares que as crianças e adoles- pectos relevantes de um dos casos – cujas dificul-
centes atendidos ocupavam em suas famílias e es- dades no manejo serviram de incitação e norte à
colas, e sobre formas possíveis de intervenção. pesquisa teórica subseqüente.
Entre julho de 2002 e novembro de 2005, foi
feito um levantamento dos casos que passaram
pelo GRI e pôde-se verificar que a queixa inicial Visões simplistas de um fenômeno complexo
mais recorrente neste período era a de alunos com
comportamento “agressivo” ou “anti-social” (65 Na sociedade contemporânea, a violência tornou-
dos 273 casos atendidos, o que corresponde a 23,8% se tão previsível e constante no cotidiano que deixa-
do total). Alunos que batiam em outros, desafia- mos de vê-la como um evento extraordinário. In-
vam qualquer pessoa que tentasse ocupar o lugar fluenciados por sua presença difusa, progressiva-
de autoridade ou tinham atitudes com o fim de mente temos sido levados a incorporar a violência
chocar quem as presenciasse eram alguns dos que como um elemento inerente à atualidade. A adoção
acabavam sendo desse modo classificados. Apesar dessa perspectiva produz como efeito a redução de
de somente 5,1% dos casos terem chegado ao Gru- nossas expectativas em relação à possibilidade de
po com queixas de violência sofrida pelo aluno, compreender e enfrentar as causas de sua expansão
quase a metade de todos eles estava, de alguma na vida social, restringindo a abordagem do pro-
forma, relacionada com algum tipo de violência blema ao horizonte estreito das políticas de repres-
pelo qual este havia passado ou estava passando. são e controle – política cujos limites e equívocos
Cabe destacar que, mesmo com todas as classifi- vêm sendo repetidamente demonstrados em todo
cações disponíveis na literatura especializada, a o mundo. Dito de outra forma, a percepção da vi-
equipe enfrentava obstáculos ao tentar avaliar se olência como uma vocação natural do ser humano
em determinado caso havia violência ou não, prin- (ampliada nas condições sociais atuais) somente
cipalmente ao discutirmos o caráter intencional dos contribui para a sua banalização e perpetuação, na
atos ocorridos e as crenças e normas culturais de medida em que a toma como um fenômeno incon-
447
mo e pelo discurso sobre igualdade de direitos – do qual o aluno dificilmente conseguia se desvin-
potencializa as problemáticas familiares e a falta cular. Com uma visão mais curiosa e embasada de
de suporte oferecido. Fatores como a má distri- alguns casos, pudemos ampliar nosso modo de
buição de renda, o desemprego e a instabilidade olhar para certos comportamentos difíceis e pro-
profissional, o aumento do narcotráfico, a des- vocativos. Atentos à possibilidade da existência de
crença na justiça, a mitificação de bandidos facili- uma descontinuidade representativa na infância,
tada por parte dos meios de comunicação, entre foi possível identificar alguns dos significados que
outros, são fortes condicionantes para a dificulda- essas atuações podiam ter: mais esperança do que
de de erradicação da violência, pois estruturam e desespero, mais carência do que maldade, mais
alimentam seu círculo vicioso. apelo do que destrutividade.
Neste trabalho, procuramos destacar a impor- Para ilustrar esse ponto, faremos o recorte de
tância de alguns aspectos subjetivos contidos em um caso que, apesar de singular, se apresenta como
boa parte dos aparecimentos da violência na cena um exemplo paradigmático dos impasses encon-
social e que dizem respeito à busca por visibilida- trados. Não é um caso de sucesso, ao contrário. É
de, reconhecimento e pertencimento, condições que um caso em que aprendemos como boas inten-
são cruciais para o sentimento de responsabilida- ções, postas a serviço de entendimentos equivoca-
de – portanto, para a não degradação da agressi- dos, podem nos levar ao fracasso.
vidade em violência – e que vêm sendo negadas à Rafael, 13 anos, aluno da 7a série, chegou ao
maioria da população brasileira. A desvalorização Núcleo de Saúde encaminhado pela diretora da
da vida, bastante observada e temida nos dias de escola, com a queixa principal de se meter em en-
hoje, torna-se mais compreensível quando pensa- crencas pelas mentiras que contava. O adolescente
mos, com Winnicott, que o medo de uma vida expôs que estava morando com o pai e com a
sem sentido é maior que o medo da morte. Mais madrasta há oito meses e que, desde então, não
importante do que permanecer vivo é ter sua exis- havia visto mais sua mãe. De acordo com ele, esta
tência desejada por um outro significativo, sendo havia lhe perguntado se queria morar com seu pai
reconhecido e valorizado enquanto sujeito e cida- e ele havia respondido que sim. Como ela sabia
dão pela família e pela sociedade24. A resposta de que o pai poderia não aceitar a proposta, quando
uma criança envolvida no tráfico quando pergun- este foi pegá-lo para passar um fim-de-semana, a
tada, em um documentário recente de grande di- mãe havia colocado as roupas de Rafael para fora,
fusão, se não tinha medo de morrer exemplifica fingindo não querê-lo mais lá com ela. O proble-
bem nossa reflexão: “Se eu morrer nasce outro que ma é que o pai e a madrasta acreditaram na histó-
nem eu. Ou melhor, ou pior”25. ria e passaram a impedir que Rafael visse a mãe ou
mesmo ligasse para ela.
A história que Rafael contou foi completamen-
Quando o fracasso ensina: te diferente daquela que o pai e a madrasta conta-
análise de uma experiência de intervenção ram quando os chamamos para uma entrevista.
Esta disse que Rafael mentia muito, que estava fur-
Observamos que o entendimento de atos geral- tando alguns objetos e que era agressivo com ela. O
mente descritos como “agressivos”, “rebeldes”, “de- pai, mais compreensivo e interessado no filho, rela-
sonestos” ou “mentirosos” como carregados so- tou dois fatos extremamente importantes. Um é
mente de destrutividade tem levado a medidas de que Rafael é adotado e não sabe. Seus pais adotivos
instrução e repressão. Isso porque, vistas dessa estavam em outro estado quando conheceram um
forma, essas expressões indicam má educação ou casal que não tinha condições de sustentar o filho
doença e sua eliminação deve ocorrer por correção (na época, com dois anos) e resolveram trazê-lo
ou ajuste. É com esse fim que se dão algumas me- para cá. Poucos meses depois, o casal adotante se
didas disciplinares, como ameaças, expulsões de separou. O outro fato é que a cena na porta da casa
sala de aula acompanhadas de broncas públicas da mãe de Rafael havia sido uma expulsão brutal e
ou mesmo a solicitação de que o responsável leve o chocante e que ele não a via nem falava com a mãe
aluno para tratamento médico. Essas intervenções, porque esta não queria (não atendia seus insisten-
porém, não vinham se mostrando eficientes, nem tes telefonemas de jeito nenhum). Isso foi confir-
para a eliminação dos sintomas, nem para a dimi- mado quando tentamos falar com esta mãe que,
nuição do sofrimento. Ao contrário, as experiênci- ao ouvir o nome de Rafael, disse que nada em rela-
as subjetivas eram rapidamente reduzidas aos ró- ção ao adolescente dizia respeito a ela, que ele estava
tulos de “criança doente” e de “adolescente proble- com seu pai e que era para este que devíamos fazer
ma”, que, de tão repetidos, levavam a um estigma qualquer pedido ou reclamação.
451
contribuição e participação permite que a criança como podiam, suas indagações e solicitações a
usufrua de forma saudável de sua agressividade e quem pudesse ouvi-los. Nesses casos, a agressivi-
desenvolva sua capacidade de concernimento, exer- dade emitia sinais a serem decodificados, que con-
cendo um movimento importante de prevenção tinham esperança e apelo. De outro, existiam situ-
da violência. A importância de profissionais de ações em que já não parecia haver propriamente
educação procurarem saber com o quê e com quem nem questionamento, nem pedido. Esse apelo já
estão lidando também caminha nesse sentido, uma não fora escutado, e a violência destrutiva surgia
vez que, ao acolher e sobreviver a comportamen- como expressão de desistência em relação a si e
tos agressivos, eles podem evitar que a escola re- indiferença em relação ao outro. Essas duas condi-
produza violências ocorridas em outros âmbitos e ções se mostraram distintas e entender suas dife-
que haja uma explosão mais séria, porque mais renças e semelhanças tornou-se indispensável para
desesperada, por parte do aluno. Por outro lado, se estabelecer um modo minimamente eficaz de
uma educação que vise apenas à adaptação do su- lidar com essas questões.
jeito à sociedade através da transmissão de conhe- Diante da perspectiva mais empírica e menos
cimento técnico, não priorizando o discurso e a especulativa de Winnicott, constatamos que pro-
ação, perpetua e reitera a violência. blemas com os quais nos deparamos cotidiana-
A escolha por permitir e conter – em vez de mente são bem mais complexos e multidimensio-
esconder, proibir e ignorar – expressões emocio- nais do que certas leituras “psi” podem fazer pare-
nais de difícil manejo, como as relacionadas à agres- cer e do que querem fazer parecer certos discursos
sividade, acarreta uma dificuldade ainda maior em apressados ou oportunistas que abundam sempre
tempos como os nossos, nos quais a espontaneida- que esses problemas se tornam objeto de atenção
de causa mal-estar. A falta de limites impede a criança especial na mídia. Na acepção proposta, a violên-
e, principalmente, o adolescente de exercitar sua cia pode situar-se no plano físico, psicológico ou
capacidade de se organizar, de ser criativo e de expe- ético, uma vez que está estreitamente relacionada à
rienciar suas atividades instintivas com segurança. intenção de destruir e/ou negar a existência do ou-
Contudo, vale ressaltar que o limite não está relaci- tro. Já a agressividade pode ter um valor positivo,
onado apenas à interdição, mas à consistência, à de movimento, criatividade ou esperança. Porém,
segurança e ao acolhimento. Nesse sentido, medi- a provisão do afeto e de condições ambientais aco-
das disciplinares como expulsões e suspensões nem lhedoras é determinante para o sujeito ser capaz de
sempre se justificam com base na necessidade de exercer sua agressividade de forma não-destrutiva
ordem, podendo freqüentemente ser consideradas e de se responsabilizar por seus atos. Considera-
uma punição autoritária e uma repressão inibido- mos, então, que devemos relacionar a violência
ra, e não uma colocação firme e madura de limites. atual não só ao declínio da função paterna ou a
A humilhação afronta ainda mais o sentimento de uma ausência de medidas de contenção, mas tam-
dignidade pessoal que muitos alunos estão bus- bém à falta de um ambiente suficientemente bom,
cando resgatar com suas atitudes transgressoras. que sobreviva às expressões da agressividade sem
se sentir ameaçado.
Apontar a dimensão e a relevância das experi-
Considerações finais ências subjetivas e do contexto social no qual estas
estão inseridas contribui para que associações sim-
A análise da narrativa de alguns casos que haviam plistas, que acabam por banalizar fenômenos tão
sido acompanhados na escola e a discussão das assustadores e tão presentes na sociedade que es-
intervenções realizadas nestes mostrou claramen- tamos construindo, sejam substituídas por uma
te como o modo de descrevermos a realidade tem análise mais ampla, que possibilite um horizonte
conseqüência para nossas ações. Ao observarmos de ação mais fértil. Pretendemos que este artigo
com mais atenção as diversas manifestações que seja um instrumento a mais para incitar profissio-
envolviam agressividade e violência no espaço es- nais de saúde e educação a trilhar caminhos teóri-
colar, foi possível perceber que, por trás da apa- co-práticos para a construção de estratégias que
rente homogeneidade do problema “da violência”, não se restrinjam ao controle e à correção, mas
existia uma importante discriminação a ser feita. que propiciem o que consideramos, estas sim, for-
De um lado, havia crianças e adolescentes queren- tes armas contra a irrupção e a reprodução de si-
do falar de alguma coisa de sua subjetividade e de tuações violentas – o uso da criatividade do sujeito
suas histórias de vida, endereçando, da maneira e o exercício de poder do cidadão.
453
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https://doi.org/10.1590/ES.235730 FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO
INDISCIPLINA NA ESCOLA:
UMA APROXIMAÇÃO À LUZ DE WILFRED BION
Ana Archangelo1
INDISCIPLINE AT SCHOOL:
AN APPROACH IN THE LIGHT OF WILFRED BION
INDISCIPLINA EN LA ESCUELA:
UNA APROXIMACIÓN A LA LUZ DE WILFRED BION
*O texto é resultado de projeto de pesquisa fomentado pela Fapesp, linha “Melhoria do Ensino” (processo n. 2010/08739-7).
1.Universidade Estadual de Campinas – Faculdade de Educação – Departamento de Psicologia Educacional – Campinas (SP),
Brasil. E-mail: ana.archangelo@gmail.com
Introdução
A
reflexão aqui apresentada é síntese de um processo de estudo e análise de uma experiência vivida
em uma escola pública brasileira, de Ensino Fundamental, na qual as ocorrências de indisciplina
passaram a ser pensadas à luz dos conceitos de elementos-beta, função-alfa e elementos-alfa, bem
como dos conceitos de relação continente–contido, de Bion (2004a). Inicialmente pautada pela correção, a
escola tinha alguns padrões de resposta para as ocorrências de indisciplina. Esses consistiam, basicamente,
em: 1) orientação para que o aluno aceitasse as exigências dos professores; 2) convocação dos pais e exigência
do compromisso, da parte deles, para com o bom comportamento de seus filhos na escola; e 3) suspensão.
Essa última, diferentemente do que se possa imaginar, era medida utilizada com frequência, não como
recurso extremo ou exceção. Por essa razão, vários alunos eram sistematicamente obrigados a se ausentar
da escola durante vários dias. Ao contrário do que se esperava, porém, tal punição não coibia novos “atos
indisciplinados” e parecia fazer com que os mesmos alunos voltassem cada vez mais frequentemente à sala
do diretor, tendo cometido novas “infrações”, o que exigia que a direção lançasse mão de suspensões por
períodos cada vez mais longos.
Durante dois anos, alguns professores e um vice-diretor da escola estiveram envolvidos em um
projeto que previa encontros semanais, nos quais eram abordados, entre outros assuntos, episódios escolares
rotineiros, além de serem estudados alguns textos de autores da psicanálise ou de inspiração psicanalítica.
Em virtude das inúmeras queixas de indisciplina na escola, esse passou a ser um tema de preocupação do
grupo e o vice-diretor, mais diretamente implicado com a intervenção sobre as ocorrências de indisciplina,
foi convidado a organizar o registro sistemático de tais ocorrências, para análise longitudinal.
A partir das alarmantes constatações iniciais e do estudo empreendido pelo grupo, a intervenção
da direção da escola nos episódios de indisciplina, gradualmente, deixou de ser balizada apenas pela ideia de
controle e correção do aluno e passou a ser pautada pela escuta e pelo acolhimento do sofrimento presente
nessas situações. A análise de alguns casos exemplares, a diminuição progressiva e sensível das “ocorrências” de
indisciplina e o movimento interno à instituição na busca por meios para atender a algumas das necessidades
de alunos e professores foram apresentados em Archangelo (2014). O presente texto tem o desafio de formular
alguns pressupostos acerca da produção, da circulação e do manejo do fenômeno chamado indisciplina,
à luz das ideias de um autor alheio ao discurso educacional, mas que contribuiu com uma intervenção
propriamente pedagógica na escola aqui citada.
Para Entender por que Bion Pode Ser Útil ao Tema da Indisciplina Escolar
Bion jamais tratou da indisciplina escolar. No entanto, suas ideias sobre a constituição e o
desenvolvimento do psiquismo humano ecoam sobre todas as situações em que pessoas experimentam
o viver com o outro. Para Bion (2004a), qualquer experiência entre o sujeito e o mundo (outro objeto, outra
pessoa ou situação) evoca impressões sensoriais que vêm sempre acompanhadas de uma qualidade emocional.
Portanto, todas as nossas experiências carregam um vetor afetivo a ser processado, elaborado ou “digerido”.
Toda experiência que temos com um objeto ou uma pessoa implica impressões sensoriais (p. ex., frio e
quente), que são carregadas de uma resposta emocional, não sensorial (agradável, violenta etc.).
Ao tocar uma xícara de chá quente, percebo não apenas a temperatura, mas registro a agradável
experiência de aquecer a mão fria em um dia de inverno. A mesma xícara de chá quente, porém, pode, pelo
contrário, constituir experiência de violência, caso a alta temperatura chegue a queimar minha mão. Posso,
ainda, ansiar pela experiência agradável que um chocolate quente me traria, sem que ele esteja disponível.
Algo em meu corpo dará sinais de minha capacidade ou incapacidade momentânea de imaginar e verbalizar
meu desejo e/ou minha frustração.
A esse conjunto indissociável entre a impressão sensorial e o vetor emocional da experiência, Bion
(2004a) dá o nome experiência emocional – ou seja, a experiência emocional não é apenas relacionada aos
órgãos sensoriais, mas também à qualidade afetiva que o psiquismo confere a esse contato eu–mundo e ao
que se pode imaginar e criar a partir dele. Em igual medida, podemos dizer que aspectos afetivos de nosso
psiquismo são indissociáveis dessa experiência no nível de nosso corpo.
Ainda segundo o autor, os elementos resultantes da experiência emocional não podem ser
armazenados como memória tampouco se prestam ao pensamento onírico, a menos que sejam processados
mentalmente. Para fazer-se entender, o autor explora a metáfora da digestão, afirmando que nossas
experiências, para serem convertidas em memória ou em algo pensável, antes precisariam de uma “digestão
mental”; ou seja, do processamento ou da “digestão” desses elementos aos quais Bion chamou elementos-beta.
Bion (2004a) afirma que o elemento-beta, tal e qual é produzido na experiência, seria uma “coisa em
si”, que necessita de uma função mental capaz de processá-la. Apenas após esse processamento o elemento-
beta ficaria à disposição do pensamento e do armazenamento. A metáfora da digestão coloca em relevo
justamente esta qualidade: o alimento só serve à nutrição depois que sofre a ação de uma função que o
transforma em algo absorvível pelo organismo. Antes disso, serve somente para ocupar espaço no estômago
ou ser expelido. O mesmo ocorreria com os produtos de nossas experiências: ou são processados por uma
função mental, ou apenas servem à evacuação ou à fragmentação.
Também como no fenômeno da digestão, enquanto houver uma “coisa” indigesta ou indigerível no
estômago, o sujeito é incapaz de usufruir de outro alimento. Todos sabemos que, se algo não nos cai bem, só
conseguimos comer novamente depois de normalizada a digestão, seja mediante reações que permitam que
seja expelida a coisa indigerível, seja mediante medidas externas (p. ex., medicação) que recomponham a
dinâmica digestória. Às vezes, passamos dias ingerindo apenas o mínimo necessário à manutenção de outras
funções corporais, até que a função digestória se estabilize. Enquanto isso, não apenas recusamos grande
parte do alimento que nos é oferecido, como também perdemos parcela do entusiasmo e da vitalidade que
nos caracteriza.
Bion (2004a) diz que, no plano mental, o mesmo ocorre com as impressões sensoriais e as emoções.
A essa função mental que processa/digere os elementos-beta, o autor dá o nome função-alfa, a qual seria,
portanto, responsável por tornar alimento “a coisa” não digerida da experiência, transformando-a em algo
pronto a ser utilizado pela mente, seja em forma de pensamento, seja em forma de memória, sonho etc. Aos
produtos desse processamento, o autor dá o nome elementos-alfa: aqueles que podem vir a ser armazenados
como memória e utilizados nas atividades de pensar e sonhar.
Quando não há função-alfa disponível, os elementos-beta são como o alimento/coisa que intoxica:
são transformados em fragmentos e expulsos, tal como no vômito. Exigem que o corpo não apenas se livre
deles, mas recuse outros alimentos, provocando certa impressão de desinteresse pelo que se passa ao redor.
Nessa situação, a expulsão da “coisa” indigesta e fragmentada agride o aparelho digestório tanto quanto
a experiência emocional não processada agride o psiquismo do sujeito ou, em outras palavras, provoca
sofrimento psíquico. Ao mesmo tempo, o vômito faz da “coisa” indigesta algo que se espalha sem controle
nem finalidade pelo entorno. Os elementos-beta não processados pela função-alfa fazem o mesmo, ao que
Bion (2004a) chamou identificação projetiva: a expulsão desordenada dos fragmentos não processados ou
não digeridos da experiência emocional do sujeito, os quais se espalham pelo ambiente e atingem a todos,
provocando neles algum impacto.
Segundo Bion (2004a), ao nascer, não temos ainda a função-alfa desenvolvida. Vivemos nossos
estados emocionais na sua forma bruta, o que produz muita ansiedade – em especial ansiedade persecutória
(KLEIN, 1991), cuja característica fundamental é o temor pelo aniquilamento do ego. No entanto, não estamos
sozinhos nessa experiência, mas sim acompanhados sempre de um outro – usualmente, mas não apenas,
a mãe, nos estágios iniciais da vida. Esse outro, em tese, disporia da função-alfa e seria capaz de ajudar no
processamento dos estados emocionais do bebê. Portanto, ao chorar desesperadamente de fome ou dor, o bebê
estaria expulsando de si sua ansiedade (elemento-beta). Ao fazer isso, evocaria no outro que lhe dá suporte
uma resposta. Tendo sorte, a resposta seria justamente o oferecimento daquilo que ao sujeito é necessário
naquele momento: o alimento, um banho morno, o colo, um remédio ou outra providência e, somado a isso,
o conforto de ter sido compreendido em sua necessidade.
Em outras palavras, aquilo que o bebê não sabe o que é, mas que nele provoca sofrimento e
ansiedade, vai sendo expulso pelo choro, pelo movimento de contorcer-se etc., até o ponto de comunicar ao
outro a necessidade que o bebê apresenta naquele momento. Ao mecanismo envolvido nessa ação do bebê,
Bion (2004a) dá o nome identificação projetiva realista. O termo realista significa que essa é uma atividade
necessária à sobrevivência do bebê, uma vez que seria, nessa etapa da vida, um dos únicos recursos psíquicos
disponíveis para ele estabelecer alguma comunicação com o outro, com o mundo. Portanto, essa identificação
projetiva teria um caráter comunicativo, cabendo à mãe estar sensível àquilo que lhe é comunicado, embora
nem sempre isso ocorra.
O que o autor quer dizer é que, ao nascer, o bebê não tem recurso interno suficiente para processar
por conta própria sua ansiedade e seu medo de morrer; para entender de onde eles vêm e a que se referem; e
para compreender como podem ser atenuados. Em outras palavras, quando nascemos, não temos função-alfa
disponível para o processamento de nossas experiências. Voltando à metáfora digestória, podemos dizer que
não dispomos inicialmente de aparelho mental de digestão ou processamento das ansiedades que sentimos
desde o nascimento. Essa função deverá ser desempenhada pelo adulto.
É a mãe (ou outro cuidador) que traduz e discrimina o choro de sono, de fome ou de dor e oferece
a resposta adequada; que faz com que o choro cesse e a ansiedade seja atenuada. Quando isso ocorre, o bebê
pode retomar o contato consigo mesmo e com as experiências que teve, bem como entrar em contato com a
capacidade de compreensão ofertada pela mãe. Ao intuir e identificar a razão do choro, a mãe está processando
os elementos da experiência do bebê até esses se tornarem a informação necessária para que ela saiba o que
fazer para ajudá-lo. Repetidas experiências como essas fazem com que, progressivamente, o bebê passe a
aceitar a fome e a dor como algo que se pode tolerar e, ainda, sobre o que se pode pensar.
O que Bion (1994) está dizendo é que, inicialmente, a digestão da experiência emocional é feita pela
mãe (ou quem a substitua), no lugar do bebê, tornando a ansiedade tolerável para ele. Ao viver essa mudança,
o bebê não apenas tomaria para si sua própria experiência, agora tolerável, mas também a capacidade desse
outro de processar o sofrimento. Em suma, a função-alfa, que permite ao sujeito processar suas experiências
emocionais tornando-as toleráveis e “pensáveis”, nasceria do contato do bebê com o outro, com a capacidade
da qual o outro fez uso no processamento da ansiedade do bebê.
Segundo Bion (1994), tornamo-nos tanto mais capazes de processar e digerir nossas experiências
quanto mais oportunidade tenhamos tido de estar em companhia de pessoas que nos tenham ofertado a
sua própria capacidade no momento em que precisávamos. Se tudo correr bem, aos poucos abriremos mão
da identificação projetiva, já que nos tornaremos capazes de tolerar nossas experiências e as frustrações
decorrentes delas. Sendo capazes de tolerar a frustração que advém da experiência, suportamos ser
atravessados pela ansiedade e acolhemos mentalmente os elementos que precisam ser processados, digeridos
e pensados. É dessa capacidade de processar que nasce a capacidade de pensar. Os pensamentos sobre nossas
experiências são, na origem, esses elementos-beta acolhidos pela função-alfa; tornam-se pensamentos quando
já processados. Como afirma Bion (1994), somente os elementos-alfa (elementos da experiência que foram
tolerados pela mente e processados pela função-alfa) são passíveis de serem pensados. Portanto, ao longo
do desenvolvimento, substituímos, progressivamente, a identificação projetiva realista pela função-alfa.
Em vez de expulsarmos os elementos frustrantes da experiência, acolhemos a necessidade de pensá-los.1
Contudo, todos sabemos que isso não ocorre sempre: nem no mesmo nível nas diferentes esferas de nossa
existência, nem igualmente com todos os sujeitos. Alguns são privados do suporte que o adulto deve dar nesse
processo inicial da vida; outros vivem repetidas experiências de profundo sofrimento (p. ex., em situações de
desamparo, injustiça, discriminação e preconceito, exclusão social etc.), sem tempo nem suporte ambiental
suficientes para o processamento delas; outros ainda vivem experiências traumáticas, que tornam tanto o
montante de sofrimento por demais intenso quanto a área da mente tomada pela ansiedade por demais extensa
– contaminando e danificando os recursos mentais que até então estavam disponíveis para o acolhimento
e o processamento dessas experiências. Nessas circunstâncias, o que fazer com esses estados emocionais,
quando a função-alfa não se desenvolveu suficientemente ou foi prejudicada por algum acontecimento
da vida?
Segundo Bion (2004a), permaneceríamos fazendo uso da identificação projetiva. Nesse caso, ela já
não seria predominantemente realista ou uma forma de comunicar o estado de sofrimento ao outro, mas sim
de fugir “da verdade da experiência”; ou seja, um modo de o sujeito evadir-se do sofrimento, na esperança de
controlá-lo. A expulsão dos estados emocionais brutos teria o caráter preponderante de fuga da frustração e
da ansiedade decorrentes da experiência, pelo que tenderia a ser uma expulsão violenta e desordenada dos
elementos-beta. Esses seriam, mediante um pensamento onipotente (BION, 1994), depositados no interior do
psiquismo do outro, de modo que não fossem reconhecidos como sofrimento próprio. Ou seja, se a função-
alfa é aquela que nos permite digerir o próprio sofrimento e torná-lo algo tolerável e “pensável” como parte
de nós mesmos, a ausência ou a insuficiência momentânea dessa função nos obrigaria à atitude de “fazer
picadinho” dessa experiência e “evacuá-la”, até o ponto de torná-la irreconhecível, como se não fosse nossa.
Os efeitos da ausência de função-alfa são vários, sendo talvez o mais evidente a violência com que o
sujeito expele partes de suas experiências e repele aquilo que lhe é oferecido, assim como o estômago tomado
pela comida estragada expele-a e repele outras tentativas de alimentação. Outro efeito seria certa perda de
interesse por algumas novas experiências – ou um interesse inicial que se mostra repulsivo logo adiante. Por
fim, o efeito de longo prazo, caso perdure a ausência de função-alfa, é o distanciamento do sujeito em relação
à sua própria experiência de ser, já que, em vez de se permitir ser atravessado por ela e de se constituir a
partir dela, o sujeito se empenharia em livrar-se dela, contaminando todo o ambiente com esse sofrimento,
cuja origem o sujeito não reconhece. Todos são acometidos pelo que é expulso, mas ninguém sabe de onde
aquilo vem, pois, como a experiência foi fragmentada, ficaria “irreconhecível”.
Quando, numa organização, o espaço para o pensamento sobre sentimentos dolorosos e ansiedades
não existe ou é recusado, esses se tornam provavelmente tóxicos e disruptivos em seus efeitos, materializados
em doença e conflito entre as pessoas. Portanto, para pensarmos a indisciplina à luz dos conceitos de Bion,
é necessário problematizarmos a natureza dos chamados atos indisciplinados, sua origem e seu sentido, em
termos institucionais, para, somente então, pensarmos nas possibilidades de manejo desse problema.
Primeiro pressuposto
Segundo pressuposto
diferentes meios e estratégias para que o aluno aprenda, mas acolher o ódio, o ressentimento e o sentimento
de impotência ou inadequação que perpassam a relação desse aluno com o professor, com a disciplina e com
o conteúdo específico. Acolher tais sentimentos significa legitimá-los como elementos intrínsecos à aventura
de aprendizagem. Nada mais reconfortante do que perceber que fazemos tão mais parte da comunidade
humana quanto mais somos capazes de experimentar sentimentos intensos, e nem sempre prazerosos.
Também a capacidade de rever-se em sua atividade pedagógica – seja didática, seja metodológica,
seja de escolha de conteúdo ou de instrumentos de avaliação – compõe essa capacidade de processamento
do professor. Tomar a dificuldade do aluno como algo pensável em vários níveis e direções divide a
responsabilidade pela frustração e, sobretudo, dá mostras de como fazer uso da função-alfa – investigando,
levantando as mais diversas hipóteses e colocando-se aberto ao que o aproxima da verdade da experiência
(BION, 2004b).
Quando os elementos-beta são resquícios de experiências externas à escola, a situação torna-se um
tanto mais complexa, pois ao professor é mais difícil reconhecer o sofrimento que atravessa a experiência
de aprendizagem. O aluno, por sua vez, sem função-alfa suficiente para reconhecer e processar sua própria
experiência, faz tentativas desordenadas de comunicar seu sofrimento, muitas vezes depositando-o no
ambiente escolar de maneira considerada “injusta” pela instituição.
Se, nas situações descritas, o professor não tiver função-alfa suficiente à sua disposição, considerará
o aluno malcomportado ou indisciplinado e tenderá a colocá-lo para fora de sala, para que medidas
administrativas sejam tomadas. Em nível administrativo, o mesmo pode se repetir. Caso o diretor tenha
função-alfa disponível, pode fazer uso dela para processar tanto os elementos-beta do aluno quanto do
professor, produzidos nessa relação tensa com o “aluno indisciplinado”. No entanto, na escola, a tendência,
por parte do professor e do gestor, tem sido abordar a situação pela via do controle – de maneira prescritiva
(“você deve fazer isso ou aquilo”) ou corretiva –, aplicando medidas punitivas, com “o rigor da lei”. Essa era
normalmente a situação com a qual se deparavam os alunos indisciplinados da escola estudada.
Terceiro pressuposto
Como dito anteriormente, a ansiedade não tolerada é expelida pela mente que não dispõe de função-
alfa suficiente em um determinado momento. Nesse sentido, basta que mudemos o vértice de observação
para perceber que os elementos-beta a que se refere a indisciplina podem ser provenientes do aluno,
mas não apenas dele. Podem provir do professor, do grupo-classe ou mesmo dos profissionais responsáveis
pela gestão da instituição. Ou seja, ao se falar de indisciplina, não apenas o aluno está implicado, mas a
totalidade da instituição. Um professor pressionado por excessivas exigências profissionais ou ainda pelo
descaso institucional pode não suportar a intensidade da frustração presente nessas experiências, gerando,
dessa maneira, uma tensão em sala de aula que resulte, fundamentalmente, de sua ansiedade não processada
e expelida sob a forma de identificação projetiva.
Já há algum tempo tem sido grande a preocupação com a saúde dos profissionais da educação
(CODO, 1999). Depoimentos de professores que se ausentam do trabalho com ou sem justificativa revelam
que, muitas vezes, fazem-no por não tolerar o contato com a escola e não se sentir amparados pela instituição
na tarefa que lhes cabe com os alunos todos os dias da semana. Faltam um dia, esperando recuperar forças
para o dia seguinte. Ao fazerem isso, têm um alívio momentâneo. Contudo, como os elementos-beta não
são processados ou pensados, produzem outro nível de desgaste: a ausência voluntária expulsa o sofrimento
sob a forma de resposta hostil ou de indiferença dos professores em relação à instituição. A hostilidade e a
indiferença, porém, recaem também sobre os alunos, os quais, por sua vez, veem no professor uma figura
que os agride com sua ausência–indiferença ou uma figura frágil, incapaz de estar frente a frente com os seres
(alunos) de quem deveria cuidar.
Os alunos são tomados pela violência dessa identificação projetiva vinda dos adultos, de modo
difuso. Sem saber de onde vem e a que serve, reagem, num crescendo, com sarcasmo, indiferença ou
outra forma de violência que o professor, mais uma vez, não suporta. Ao final, é a essa reação dos alunos
que o professor e a escola dão o nome indisciplina, embora não tenha sido gerada no segmento dos
alunos, apenas tenha encontrado neles um ponto de reverberação dos elementos-beta produzidos por
uma instituição que não dá suficiente apoio aos professores. Essa mesma dinâmica pode ser verificada na
relação entre a administração central e os gestores das unidades escolares, fazendo com que elementos
não processados desencadeiem respostas igualmente não processadas entre os professores e os alunos,
num efeito dominó.
Quarto pressuposto
Quinto pressuposto
Tomando a situação do professor descrito no terceiro pressuposto, podemos pensar em uma classe
que, em vez de reagir violentamente à identificação projetiva do professor, fique sensível ao estado dele e se
comporte de maneira a oferecer maior atenção ao que ele fala. A empatia da turma para com o sofrimento
do professor, muitas vezes, é suficiente para que ele recobre o entusiasmo, a esperança na educação e, por
conseguinte, a capacidade de enfrentar as dificuldades inerentes ao processo; ou seja, recupere sua função-
alfa. Esse comportamento não é incomum entre os alunos, em especial quando o estado de tensão criado
pelo professor é algo esporádico. Quando, contudo, a dificuldade do professor é algo sistemático, os alunos
tendem a identificar não o sofrimento pelo qual ele passa, mas apenas a agressão a que estão submetidos em
virtude dele.
Às vezes, a classe percebe o estado do professor, mas não está em condições de acolher, ser continente
ou ter empatia. Nesses casos, é comum que a turma se sinta responsável pelo mal-estar do professor. Em nível
administrativo, o gestor também pode ser aquele que faz uso de sua função-alfa para ajudar o professor a
processar alguns elementos de sua experiência, em particular aquelas relacionadas à própria profissão. Muitas
das reações hostis de professores são motivadas por sofrimento intenso e não acolhido, relativo a dificuldades
no cotidiano da escola e no trato tanto com alunos que não aprendem ou se mostram refratários a toda e
qualquer estratégia do professor quanto com a burocracia escolar. Encontrar no gestor da escola uma figura
disposta a acolher, legitimar e processar a angústia mobilizada nessas experiências pode ajudar o professor
a recuperar sua própria função-alfa.
Sexto pressuposto
Como afirma Bion (2004b), nem sempre é o analista que está de posse da função-alfa, mas sim
o paciente. Quando isso ocorre, o analista deve ser capaz de aceitar que a contribuição do paciente, não a
sua própria, é a que permite à dupla (analista–paciente) se aproximar da verdade da experiência. O “outro”,
que, em tese, pode acolher e processar os elementos-beta de um sujeito, também pode ter sua função-
alfa variando para mais ou para menos, dependendo das condições em que se encontra (p. ex., maior ou
menor tensão).
Portanto, quando a função-alfa desse “outro” está disponível ao uso, pode ajudar a processar os
elementos-beta que circulam na instituição. Por outro lado, quando sua função-alfa está diminuída, maior é a
chance de que os elementos-beta do primeiro sujeito sejam potencializados com os desse “outro”. A instituição
escolar é sempre um ambiente de intensas trocas emocionais. Nem sempre o profissional de quem se espera
maior lucidez está de posse de sua função-alfa. Nesses casos, o importante é avaliar de onde parte a maior
capacidade de processamento das experiências emocionais ali presentes, além de confiar que as soluções
para alguns problemas nem sempre partem das pessoas formalmente incumbidas dessa função. Em outras
palavras, é importante que a instituição reconheça que funciona de maneira mais apropriada ou saudável
se acolher o melhor uso da função-alfa, venha de onde vier - pais, secretários, vigias, merendeiras, alunos,
professores ou equipe gestora.
Quando Bion (2004a) introduz o conceito de função-alfa, a ideia de compreensão – voltada para o
âmbito da racionalidade –, cede lugar às ideias de continência e acolhimento que invadem o âmbito afetivo. A
verdade da experiência, portanto, deixa de ser apreensível exclusivamente pela consciência e pela razão e passa
a ser apreensível por uma função que exige o processamento mental das emoções contidas nessa experiência.
A capacidade de ser continente (de acolher mentalmente um conteúdo), portanto, não está
mecanicamente associada a níveis de ensino, idade ou nível socioeconômico. Consequentemente, a relação
entre um conteúdo e uma mente continente não é unidirecional. Embora se espere maior capacidade de
resolver problemas e enfrentar dificuldades daqueles que possuam maior qualificação profissional, dos mais
velhos e daqueles que ocupem funções de maior responsabilidade institucional, nem sempre isso ocorre.
Assim se espera porque se imagina que a idade e a qualificação profissional desenvolvam a capacidade
de compreensão de um maior espectro da realidade, bem como que a progressão na carreira derive dessa
maior capacidade. Muitas vezes, todavia, esperamos um professor continente às necessidades da sala e
encontramos uma sala continente para as dificuldades do professor; filhos continentes para dificuldades dos
pais; merendeiras continentes para dificuldades de professores e alunos.
Ainda que a posição do profissional não implique necessariamente a disponibilidade de sua
função-alfa, deve ser objetivo dele pensar-se como um agente de recuperação ou desenvolvimento da própria
função-alfa e da função-alfa dos demais da instituição. Ou seja, aos gestores e aos professores caberia
incansavelmente pensar em como não devolver ou potencializar os elementos-beta (não processados) que
circulam na instituição e em como “conter” ou ser continente para os aspectos intoleráveis produzidos
nas experiências institucionais.
Notas
1. “Pensar os pensamentos”, em termos bionianos, difere de “pensar sobre eles”, pois exige deixar-se atravessar por
aquilo que deriva da experiência, e não apenas uma tarefa sobre a qual podemos nos debruçar intelectualmente.
Referências
ARCHANGELO, A. (org.). Professores que não jogaram a toalha. São Paulo: Loyola, 2014.
BION, W. R. Estudos psicanalíticos revisados (Second Thoughts). Rio de Janeiro: Imago, 1994.
BION, W. R. Transformações: Do aprendizado ao crescimento. 2. ed. Trad. Paulo Cesar Sandler. Rio de
Janeiro: Imago, 2004b.
KLEIN, M. Inveja e gratidão e outros trabalhos. 4. ed. Trad. Elias Mallet da Rocha. Rio de Janeiro: Imago,
1991.
VILLELA, F. C. B.; ARCHANGELO, A. Fundamentos da escola significativa. São Paulo: Loyola, 2013.
Sobre a Autora
Ana Archangelo é Graduada em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em 1988.
Mestre (1995) e Doutora (1999) em Educação pela Universidade Estadual de Campinas. Realizou estudos pós-
doutorais na Univesity of the West of England; na University of Colchester; e no Dipartimento di Psicologia,
da Università degli Studi di Torino (2011). Livre-docente (2019) pela Unicamp. Líder do grupo de pesquisa
DiS (Diferenças e Subjetividades em Educação), junto ao CNPq.
Resumo
O bullying é considerado uma problemática social que emerge no contexto escolar e que está atingindo
elevadas proporções. O panorama do bullying não inclui somente uma vítima e um agressor. Este é mais
abrangente e os papéis distribuem-se entre uma ou mais vítimas, agressores, testemunhas (passivas ou ativas)
e apoiantes do agressor. Objetivou-se estudar a identificação destes participantes, por meio da construção e
validação de um questionário para este efeito. A amostra é composta por 561 alunos, de duas escolas do 2º e
3º ciclos da Região Autónoma da Madeira, com idades entre os 11 e os 19 anos. A validação do instrumento
demonstrou um valor de fiabilidade de .85 e a análise fatorial exploratória revelou a existência de três
fatores, nomeados de agressor, vítima e testemunha. Através da correlação de Spearman verificamos uma
relação significativa entre todos os fatores do instrumento.
Abstract
Bullying is considered a social problem that emerges in the school context and that is reaching high
proportions. The panorama of bullying includes not only a victim and aggressor. This is more comprehensive
and roles are distributed between one or more victims, offenders, witnesses (passive or active) and offender’s
supporters. The objective was to study the identification of these participants, through the construction and
validation of a questionnaire for this purpose. The sample consists of 561 students from two schools in the
2nd and 3rd cycles of the Autonomous Region of Madeira, with ages between 11 and 19 years. The
instrument validation demonstrated a .85 reliability value and the exploratory factor analysis revealed three
factors, named aggressor, victim and witness. Through Spearman correlation we found a significant
relationship between all instrument factors.
1
Mestre pela Universidade da Madeira, Portugal. E-mail: n.vn@hotmail.com
2
Professora com Agregação da Universidade da Madeira, Portugal. Tel.: 291705280. E-mail: mpocinho@uma.pt
3
Investigadora do Centro de Investigação em Estudos Regionais e Locais pela Universidade da Madeira, Portugal. E-
mail: soraiagarces@gmail.com
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Escala de Identificação dos Participantes do Bullying 149
No que concerne às testemunhas, são aquelas (OMS), que estão envolvidas na educação e saúde
crianças e jovens que não se envolvem dos jovens. Em contexto escolar há cada vez mais
diretamente em episódios de bullying, mas ocorrências de episódios de bullying, sendo este
participam como espetadores, em que maioria considerado um problema de saúde pública a nível
sente simpatia pelas vítimas e fica triste ao mundial que causa grande impacto na saúde das
presenciar situações de bullying em que os pessoas, famílias e comunidades (Molcho et al.,
colegas são vitimizados (Bandeira & Hutz, 2012). 2009).
As testemunhas caraterizam-se por ativas, Através de diversas investigações realizadas,
passivas ou neutras. As que sentem empatia, constatou-se que este fenómeno expande-se a uma
condenam os comportamentos dos agressores e larga escala, atingindo as diversas faixas etárias,
avisam ou tentam avisar os professores/auxiliares contextos e culturas. Em Itália, Baldry e
da situação ocorrente, são caraterizadas como Farrington (2004), estudaram os comportamentos
ativas. Contudo na maioria das situações as de bullying e vitimização a nível escolar. Através
testemunhas não conseguem ajudar as vítimas por de uma amostra de 661 alunos com idades
receio de represálias ou de tornarem-se a próxima compreendidas entre os 11 e os 15 anos de idade,
vítima dos bullies (Berger, 2007; Neto, 2005). constataram que as raparigas têm maior risco para
Outra razão para não ajudarem a vítima é porque queixas internas (queixas a nível somático,
as mesmas não sabem o que fazer, ou porque ansiedade e depressão).
fizeram algo de errado causando mais problemas. No Canada, Duck (2005), estudou as atitudes
Nesta situação as testemunhas são passivas porque associadas a comportamentos de bullying e de
sofrem em silêncio, apesar de não serem alvos vitimização entre pares em contexto escolar.
diretos de bullying (Salmivalli, 2010). As Através de uma amostra de 1.066 adolescentes do
testemunhas não envolvidas, ou seja, as neutras, 7º ao 10º ano de escolaridade, constatou que as
englobam todos aqueles alunos que estão atitudes de vingança estavam associadas aos
presentes, por vezes em número significativo, mas comportamentos de agressão e não aos
não querem se envolver com medo de se tornarem comportamentos de vitimização.
o próximo alvo (Swearer, Espelage, Vaillancourt Em Portugal, Espinheira e Jólluskian (2009)
& Hymel, 2010). realizaram um estudo com crianças do 5º ano de
Os assistentes dos agressores, caraterizam-se escolaridade com idades compreendidas entre os
pelos alunos que pertencem ao grupo dos bullies, 10 e os 12 anos e concluíram que 44.7% eram
aquele grupo que é popular e que domina. Estes vítimas de agressões prevalecendo o sexo
alunos desempenham o papel de apoiante ao masculino. Já Pereira, Silva e Nunes (2009),
incentivar e assistir aos comportamentos realizaram um estudo em Lisboa com alunos de 2º
agressivos dos colegas (Neto, 2005). Estes ciclo e concluíram que 20% dos alunos já tinham
discentes por vezes acreditam que o método de sido vítimas de bullying e que 16% eram
alcançar a popularidade e o poder é através da agressores verificando-se um aumento nos últimos
prática de comportamentos agressivos contra os tempos.
colegas, tornando-se também em agressores de Na Grécia, Stamos, Pavlopoulos e Motti-
bullying. Quando estes alunos não estão em Stefanidi (2005), estudaram a relação entre
contacto com o bullie o seu envolvimento comportamentos de bullying e a predisposição
diminui, no entanto as suas caraterísticas para a depressão, através de uma amostra com 485
agressivas são muito parecidas às do agressor alunos do 5º e 6º ano de escolaridade. Os autores
(Neto, 2005). constataram que o nível de incidência de
O bullying não é uma problemática recente, agressores e vítimas era de 15%, os alunos
devido à sua elevada prevalência existe uma vítimas-agressivas de 30% e os alunos sem
crescente preocupação de diversas organizações, envolvimento de 40%. Averiguaram que as
como a United Nations International Children's vítimas-agressivas apresentavam índices mais
Emergency Fund (UNICEF), a United Nations elevados de afetos negativos.
Educational, Scientific and Cultural Organization Os investigadores Linares, Acién, Díaz e
(UNESCO) ou a Organização Mundial Saúde Fuentes (2009), realizaram um estudo em três
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designado como “Questionário Identificação dos verificou-se que o valor do teste de Kaiser-Meyer-
Participantes do Bullying” (QIPB), o mesmo foi Olkin, foi de .87, valor considerado bom e
enviado por e-mail a alguns profissionais da área adequado para prosseguimento desta análise de
para verificar a validade de construto do mesmo. acordo com os autores Pestana e Gageiro (2008).
Este instrumento foi sujeito a um processo de Nesta análise a variância explicada por estes
validação cujos procedimentos estatísticos se quatro fatores foi de 52.79. Ao analisar o scree
apresentam nos resultados. Para uma avaliação de plot (Figura 1) verificou-se que a composição
pré-teste aplicou-se este instrumento a duas fatorial deveria, provavelmente incidir sobre três
turmas de alunos, no sentido de verificar como o fatores.
mesmo era compreendido pela população-alvo. Relativamente à análise da consistência
Após esta primeira aplicação, verificou-se que era interna verificou-se que o Alfa de Cronbach para
necessário fazer algumas alterações devido a os 20 itens era de .62, sendo este valor
complexidade das questões. Realizou-se a sua considerado fraco pela literatura (Pestana &
simplificação substituindo as frases complexas Gageiro, 2008). Ao analisarmos
por mais simples de modo a não se tornar tão pormenorizadamente o Alfa de Cronbach apurou-
exaustivo e complexo na sua leitura e se que se eliminássemos o item sete o valor de
compreensão. Este questionário confere o Alfa aumentaria para .85 (Quadro 1). Assim deste
anonimato e a confidencialidade de identidade dos modo procedemos à sua eliminação.
seus participantes. Posteriormente voltou-se a realizar uma nova
análise AFE com o método de componentes
Procedimentos principais, rotação varimax, forçada a 3 fatores e
Inicialmente foram pedidas as respetivas com carga fatorial superior a .4. Forçamos a três
autorizações a duas escolas de 2º e 3º ciclos do fatores, visto que o scree plot (Figura 1) justificou
Ensino Básico da Região Autónoma da Madeira. esta decisão.
Após a aprovação do estudo pelos Presidentes dos
Conselhos Executivos de ambas as escolas,
solicitamos aos diretores de turma (DT) que estes
entregassem os consentimentos informados aos
seus alunos para que estes dessem os mesmos aos
seus encarregados de educação. Depois foi
agendado o dia e a hora da aplicação das provas.
Com a aprovação dos encarregados de educação e
dos alunos participantes do estudo, através dos
consentimentos informados, realizou-se
primeiramente um pré-teste que serviu para
observar a validade de construto do instrumento
(QIPB) e verificar se o mesmo era compreensível
para os alunos e para os diretores de turma numa
das escolas escolhidas. De seguida, procedeu-se à Figura 1. Scree Plot
recolha final dos dados.
Nesta nova análise apurou-se que o valor do
Resultados teste Kaiser-Meyer-Olkin foi de .88, valor
considerado adequado para prosseguimento desta
Análise Fatorial Exploratória (AFE) e análise de acordo com os autores Pestana e
Consistência Interna Gageiro (2008). Nesta análise a variância
Numa primeira análise fizemos uma Análise explicada por estes três fatores foi de 50.02%. No
fatorial exploratória (AFE) com o método de que respeita à matriz rodada, os itens 4 e 6 não
componentes principais, rotação varimax e carregaram em nenhum dos fatores pelo qual
forçada a quatro fatores. Nesta análise inicial decidiu-se excluir os mesmos da versão final do
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instrumento (Quadro 2). Posteriormente analisou- com a testemunha (fator 3 do QIPB). Por outras
se a consistência interna aos três fatores (Quadro palavras, quanto mais os alunos se percecionam
3), sendo que o Alfa da escala total manteve-se como agressores, mais estes se percecionam como
em .85. No quadro 4 apresenta-se a composição vítimas. E quanto mais se percecionam como
de cada um dos fatores, tendo os mesmo sido vítimas, mais se percecionam como testemunhas
designados da seguinte forma: fator 1 do QIPB que presenciam a agressão (Quadro 5).
corresponde ao nome de agressor; o fator 2 do
QIPB designou-se como vítima, e o fator 3 do Discussão
QIPB intitulou-se como testemunha.
O bullying é um fenómeno desafiante, que
Análise Correlacional causa um grande impacto na sociedade, cultura e
Os fatores do bullying correlacionam-se entre principalmente na vida de cada pessoa. Este
si. O agressor (fator 1 do QIPB) correlaciona-se estudo pretende trazer à comunidade científica,
positivamente com a vítima (fator 2 do QIPB) e um instrumento de avaliação psicológica que
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Nota: Método de Extração: Análise de Componente Principal. Método de Rotação: Varimax com Normalização de Kaiser
a
Rotação Convergida em 6 Interações
agressores, testemunhas e apoiantes de
Quadro 3. Consistência Interna QIPB - Valores de agressores). Para apurar a validação e fiabilidade
consistência interna dos fatores do QIPB do instrumento, realizou-se uma análise fatorial
Alfa de exploratória, forçada a 4 fatores, mas ao
N de itens
Cronbach
analisarmos minuciosamente o scree plot (Figura
Fator 1 .84 8
1) levou-nos a concluir que estariam em evidência
Fator 2 .79 5
sobretudo três fatores. Realizamos uma nova
Fator 3 .71 4 análise fatorial exploratória, com as mesmas
características da análise anterior mas forçada a 3
permita identificar os participantes do bulliyng. fatores. Apurou-se que o valor do teste de Kaiser-
Este instrumento ajudará a traçar um perfil Meyer-Olkin nesta nova análise era de .88, valor
relativamente aos alunos que são participantes do considerado bom e apropriado para seguimento
bullying em contexto escolar, podendo ser desta análise (Pestana & Gajeiro, 2008).
utilizado pelos diversos agentes educativos na Relativamente à análise da variância explicada
prevenção de episódios de bullying. pelos três fatores foi de 50.02%, um valor
De modo a identificar a tipologia de considerado bem no campo das ciências sociais e
participantes construiu-se um questionário humanas, uma vez que está a explicar 50% dos
composto por 20 itens e com opções de resposta participantes do fenómeno bullying. Por fim
numa escala de Likert. Estes itens contemplam verificou-se que ao nível da consistência interna a
quatro categorias de participantes (vítimas, versão final com 17 itens foi de .85 um valor
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Quadro 5. Análise Correlacional - Relação entre verificou-se que o instrumento construído é uma
as variáveis (Correlações de Spearman) ferramenta adequada com caraterísticas
Agressor Vítima Testemunha psicométricas apropriadas e satisfatórias. Este
Coeficiente de instrumento permitiu identificar três grandes
1.00 .23** .35**
Agressor Correlação categorias de intervenientes dentro do fenómeno
Sig. . .00 .00 bullying, nomeadamente o agressor, a vítima e a
Coeficiente de testemunha, contribuindo para o aumento dos
1.00 .53**
Vítima Correlação
instrumentos de avaliação psicológica em
Sig. . .00
Portugal.
Coeficiente de
FatorFT 1.00 Os fatores do QIPB (agressor, vítima e
Correlação
Testemunha testemunha) estes estão correlacionados entre si, o
Sig. .
* A correlação é significativa no nível .01 (2 que significa que há uma relação entre os vários
extremidades) intervenientes no bullying, ou seja, quanto maior a
** A correlação é significativa no nível .05 (2 perceção que os alunos têm como agressores,
extremidades)
*** p<.05
maior a sua perceção como vítimas e também
maior a sua perceção enquanto testemunhas. Por
considerado bom pela literatura (Pestana & outro lado quanto maior a sua perceção como
Gageiro, 2008). Relativamente à consistência vítima, maior a sua perceção como testemunha.
interna individual de cada fator (Quadros 3 e 4), Este resultado demonstra que existe uma relação
verificou-se que o fator 1 do QIBP obteve um entre os diferentes papéis assumidos pelos
Alfa de Cronbach de.84 e designou-se o mesmo participantes numa situação de bullying. Numa
por agressor. Relativamente ao fator 2 do QIPB, dada situação podemos ter um agressor e esse
este apresentou um Alfa de Cronbach de.79, mesmo agressor noutro local ou em outras
denominou-se o mesmo por vítima. Finalmente, o circunstâncias, pode ser vítima ou até mesmo uma
fator 3 do QIPB revelou um Alfa de Cronbach de testemunha. Segundo Matos e Goncalves, (2009),
.71 e nomeou-se o mesmo de testemunha. Através o bullying, não é assim um fenómeno isolado, ele
dos resultados dos alfas acima expostos e da AFE provém de uma panóplia de situações abrangendo
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Role Models, Contagions, and Copycats:
An Exploration of the Influence of Prior Killers
on Subsequent Attacks Peter Langman, Ph.D.
INTRODUCTION TERMINOLOGY
There is a great deal of interest in the idea that mass shootings The terms contagion, copycat, and role models may not refer to
have a contagion effect or can result in copycat attacks, i.e., clearly distinguishable dynamics. Some preliminary definitions,
that one attack leads to more attacks. Certainly, many school however, are provided here.
shooters have not only been aware of previous shooters, but A “general contagion” effect may occur for some perpetra-
have studied their attacks and their writings, and on occasion tors, meaning that someone perceives that mass attacks are
apparently sought to follow in their footsteps. becoming more common and this perception (whether accurate
In my book School Shooters: Understanding High School, Col- or not) makes it easier for him to proceed with his own attack.
lege, and Adult Perpetrators, I discussed three types of external This is discussed below in “Breaking the Taboo” and “Normal-
influence: peer influence, media violence, and role models / izing, or Finding a Peer Group.”
ideology. Though role models can be found among real people In contrast to this general contagion effect, there may be
as well as fictional characters (whether in books, movies, vid- more “specific contagion” effects related to the influence of
eogames, etc.), the focus in this document is on influence by one or more particular perpetrators. This is what is referred
actual people. to as role-modeling. The term copycat could possibly refer to
This document includes an exploration of role models for copying a specific perpetrator or perhaps also include copying
violence, but also considers other factors that might contribute attackers in general.
to the contagion or copycat effect. The second section provides
speculation and documentation regarding instances in which
one perpetrator may have found inspiration from previous per- BREAKING THE TABOO
petrators.
Finally, it must be kept in mind that influence is not causa- One way of understanding the concept of contagion is the pos-
tion. Knowing about a school shooter doesn’t cause someone sibility that the more the taboo against mass murder is broken,
to become a school shooter. For people already at risk or on a the easier it becomes for the next perpetrator. Each time that
path toward violence, however, external influences in the form of threshold is crossed may lower the threshold for people already
other mass attacks may be a factor in spurring them on toward on the path toward violence. Thus, the phenomenon may be
committing their own attack. feeding on itself, growing with each new incident.
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NORMALIZING, OR FINDING A PEER GROUP by Chris Harper-Mercer, the Umpqua Community College
shooter, who wrote a blog about Vester Flanagan’s murder of
Another aspect of the concept of contagion may be that it serves the television newscaster:
to normalize mass violence and those who commit it. If the po- On an interesting note, I have noticed that so many people
tential perpetrator feels alone, outcast, perhaps even despised, like him are all alone and unknown, yet when they spill a
studying shooters or joining an online forum or chat-group little blood, the whole world knows who they are. A man
about mass murderers gives them a virtual peer group. It is who was known by no one, is now known by everyone.
their way of joining a subculture in which they are not only His face splashed across every screen, his name across
normal, but perhaps feel themselves to be special, apart from the lips of every person on the planet, all in the course of
and above mainstream society. Multiple shooters have criticized one day. Seems the more people you kill, the more you’re
mainstream culture or society, as if they had greater insight in the limelight.²
than the masses of people. This includes Eric Harris, Sebastian
Bosse, Pekka-Eric Auvinen, and Adam Lanza. For those who feel like they are nobody, the path to becoming
Adam Lanza, for example, appears to have found two ways somebody is very simple — get a gun and shoot a lot of people.
of creating virtual peer groups. He compiled a remarkably de- Thus, in addition to breaking the taboo against killing, mass
tailed spreadsheet of information on five hundred mass mur- shootings also generate incredible media attention. Perhaps
derers. Being immersed in this research may have made his some perpetrators are not as preoccupied with killing as with
own interest in homicide seem less aberrant. Similarly, Lanza, fame, with murder serving as the vehicle of their own elevation
who did not have a group of friends to hang out with, found to what seems to them like celebrity status.
an online forum that originally was focused on the videogame
Super Columbine Massacre but broadened into a discussion of LIST OF PERPETRATORS
mass murderers and movies about them. This was a place where
Lanza could communicate with people who shared his interests.
In one post, he wrote, “Serial killers are lame. Everyone knows The following list includes documented evidence as well as
that mass murderers are the cool kids.”¹ This comment did not speculation regarding the impact of prior killers on subsequent
elicit any alarm or condemnation on the forum. Apparently, in killers. Though the primary focus is on school shooters, non-
that context, such a comment was not strange or out of place. school shooters who may have influenced (or been influenced
Thus, both Lanza’s research and the online forum may have by) school shooters are also cited. There have also been many
served to make mass murder not only normal, but “cool.” potential or foiled attacks in which people cited Columbine or
other attacks as influences; these are not included here. Only
incidents in which people were shot are listed.
ROLE MODELS THAT LEGITIMATE VIOLENCE Though the idea of contagion is concerned with contem-
porary figures who may have inspired subsequent attackers,
Many shooters have found role models in the months or years historical figures are also noted as possible influences. Though
leading up to their atacks. Many school shooters were interested these may not have contributed to a current contagion, it is
in Hitler and the Nazis, while in the years since Columbine, interesting that perpetrators find role models from previous
many subsequent shooters have taken Eric Harris as a role decades, centuries, and even millennia.
model. Having a role model or an ideology that supports their The perpetrators are listed alphabetically, but their “follow-
violent intentions may serve the purpose of transforming what ers” (i.e., those subsequent shooters who referred back to them)
is otherwise aberrant and abhorrent into something admirable. are listed chronologically.
It validates, or legitimates, the urge toward violence. Finally, rather than using phrases such as “clearly was a role
There may not be a meaningful difference between finding model,” “appears to have been a role model,” or “might have
a peer group that normalizes one’s violent intentions and find- been a role model,” for the sake of simplicity people are simply
ing a role model to admire that inspires imitation. The possible listed as role models, with the reason for including them as
difference is that one involves more of a friendship among such presented and referenced. This should not be taken as a
equals, whereas the other consists of someone of lesser stature definitive determination of a contagion effect.
looking up to a more exalted figure. The end result, however, Following the list of perpetrators and their role models, a
appears to be the same. diagram illustrates the apparent lines of influence from Col-
umbine through subsequent attacks.
◆ ◆ ◆
SEEKING FAME
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DARION AGUILAR 25 January 2014 Nazis and Unabomber
He also was interested in the Nazis: “He became absorbed in
aguilar’s role models: totalitarian regimes, including North Korea and the German
Third Reich.”¹² Finally, Auvinen’s manifesto “was influenced
Eric Harris / Dylan Klebold
by Theodore Kaczynski’s Industrial Society and Its Future (the
Aguilar was not a school shooter, but he conducted thou- ‘Unabomber manifesto,’ 1995).”¹³
sands of online searches related to mass murder and showed
a “particular fascination with the Columbine shooting.”¹ He auvinen as role model: see Matti Saari.
reportedly imitated some of the clothing Harris wore on the
day of the attack and timed his attack to begin at about the
same time as Columbine.²
AMY BISHOP 12 February 2010
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MICHAEL CARNEAL 1 December 1997 cre. They went for two days to Colorado. Alvaro was
excited to visit Columbine. He bought a trench coat
carneal as role model: see Eric Harris / Dylan Klebold. in Colorado because Eric Harris had worn a trench
coat during the Columbine massacre . . . On July 10, he
wrote that on the day of the massacre, “I will contact
ALVARO CASTILLO 30 August 2006 the principal of Columbine High School and tell him
about my plans” . . . He began to make pipe bombs
castillo’s role models: because Harris and Klebold used pipe bombs at Col-
Eric Harris / Dylan Klebold umbine; he learned how to make them from a movie
The first page of Castillo’s journal has a photograph of Har- about the Columbine massacre. On July 24 (his last
ris as well as the dates of Harris’s birth and death.¹³ Cas- day of therapy), he wrote, “I know that I am doing the
tillo attempted to kill himself on the seventh anniversary of right thing. We must remember Columbine. Sacrifices
the attack at Columbine, but his father intervened. Harris must be made.”²³
named one of his guns Arlene, and as Castillo noted in his He said he would buy black cargo pants and boots for
journal, he did the same. He noted his desire to buy clothes his shooting. He wrote, “I must do this! I have to show
to match those that Harris wore when he attacked Colum- the world Columbine.” . . . On August 29, he wrote,
bine High School: “I will buy black cargo pants and black “Well, tomorrow is the day that Hillsborough, NC will
boots online to complete the uniform that Eric was wearing remember Columbine once and for all” . . . Alvaro also
on April 20, 1999.”¹⁸ His journal refers to an autobiography talked about the significance he found in similarities
he had written that was saved on his computer with the title between the signs for Columbine and Orange High
“Columbine.” His journal also refers to the day of his attack Schools: “I’ve been looking for signs of Columbine in
as “Operation Columbine.” Orange High School. And look. Look at this. That sign,
The court case in the North Carolina Court of Appeals my friends, looks exactly like the one in Columbine . . .
(State of North Carolina v. Alvaro Rafael Castillo, No. coa10- It looks exactly like it. This is why it must happen.”²⁴
814¹⁹) contains a wealth of information regarding Castillo’s
fascination with Eric Harris and the attack at Columbine. [Castillo wrote:] “Today is the big day for Operation
The following passages are direct quotations from the court Columbine. It is time that the world be reminded of
report: Columbine. I will die today!” . . . He had written “Shoot
me” and “Columbine” in marker on the headband. He
On March 10, Alvaro wrote that he was obsessed with had written “Natural Selection” on the front of the T-
the Columbine massacre. He mentioned videos he had shirt [note: Harris had done this, too] and “Remember
seen about school shootings. He wrote that he felt Columbine, April 20, 1999, Littleton, Colorado” on the
sorry for the Columbine shooters — Eric Harris and back . . . According to [Officer] Ivey, Alvaro said “non-
Dylan Klebold — as well as for their victims. He ex- sensical things, talking about Columbine.” Alvaro said
pressed a physical attachment to Eric Harris, and he twice, “Kill me. Just kill me. Remember Columbine.”
worried about his sexuality.²⁰ Sheriff’s deputies arrived at the school. As Ivey put him
He also put in his journal photographs of the guns used into a patrol car, Alvaro said, “Remember Columbine.”²⁵
by Harris and Klebold and a photograph of their bodies Further light is shed on the reference to Castillo express-
after they had killed themselves . . . On March 29, Alvaro ing a physical attachment to Eric Harris by a passage in
wrote that he would kill himself with a shotgun because his journal: “Eric is just so good-looking. I can’t believe he
Eric Harris killed himself with a shotgun . . . On April 5, couldn’t get a date from the prom. If I was a girl, I would
Alvaro wrote that he had chosen April 20 (the seventh have gone to the prom with him. Does that sound gay,
anniversary of the Columbine shootings) for his suicide straight or bi[sexual]?”²⁶
and that he would kill himself at the exact time of day
that Eric Harris had killed himself.²¹ Kip Kinkel
Castillo deliberately committed his attack on Kip Kinkel’s
[Castillo wrote:] “Anyway, I now realize what I must birthday. The evidence for this is found in the court case:
do. I must commit a Columbine-like massacre at . . .
Orange High School.”²² On August 10, Alvaro wrote that he had chosen August
30 as the date for his planned Orange High School
In June, Alvaro told his mother that he wanted to visit massacre. He noted that it was the anniversary of the
Columbine High School in Colorado, and she agreed flooding of New Orleans from Hurricane Katrina and
to go with him. She somehow thought that visiting the birthday of Kip Kinkel, who killed his parents and
Columbine might end his obsession with that massa- then killed two students in a school shooting in 1998.²⁷
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Charles Whitman LAURIE DANN 20 May 1988
In 2006, Alvaro Castillo mentioned in his journal having
watched a documentary about Whitman, noting that the dann as role model: see James Wilson.
40th anniversary of Whitman’s attack was approaching.²⁸
John Hinckley WELLINGTON DE OLIVEIRA 7 April 2011
He was also interested in John Hinckley, who shot President
Reagan in 1981. He compared his obsession with a girl de oliveira’s role models:
(A.R.) he knew to Hinckley’s obsession with Jodie Foster:
“He observed that he was obsessed with A.R., just as John Seung Hui Cho
Hinckley, Jr. was obsessed with actress Jodie Foster when Wellington de Oliveira referred to Cho as “a brother”: “Like
he shot President Reagan.²⁹ Castillo also listed Hinckley as Cho, he says he was once weak and now is strong and will
someone he would he would like to meet.³⁰ seek revenge for himself and others who like him were
persecuted.”³⁵ Also, “Among the seven photos of Oliveira
Other role models recovered from his computer and released, two show him
Castillo “compiled an 18-page notebook with detailed de- in poses similar to those seen in photos of Cho;”³⁶ whether
scriptions and photographs of school shootings, other mass this was imitation or coincidence is unknown.
murders, and shooters, which he named, ‘Mass Murderers
and School Shootings of the 20th and 21st Centuries.’”³¹ The Edmar Freitas and Muslim terrorists
court report also quotes Castillo referring to Jeffrey Weise. De Oliveira identified with a previous Brazilian school shoot-
er, Edmar Freitas. In addition he was fascinated by Muslim
terrorists and told people he was Osama bin Laden.³⁷ In fact,
SEUNG HUI CHO 16 April 2007 his obsession with terrorists appears to have been the major
influence on his pursuing a path of violence.
cho’s role models:
Eric Harris / Dylan Klebold BRUCO EASTWOOD 23 February 2010
Cho’s interest in Columbine long pre-dated his attack. The
official report on the Virginia Tech shooting states, “During eastwood’s role models:
the 8th grade, suicidal and homicidal ideations are identi-
fied by Cho’s middle school teachers in his writing. It is Eric Harris / Dylan Klebold
connected to the Columbine shootings this year. (He refer- Eastwood reportedly wrote in a journal:
ences Columbine in school writings.)”³² The report also Where I come from they, or I should say, respect life
notes that shortly after the attack at Columbine: “Cho wrote 100%, but what do I do when I’m the only one who
a disturbing paper in English class that drew quick reaction understands that way. Are they going to listen, prob-
from his teacher. Cho’s written words expressed generalized ably not. Like Columbine H. S. Do they ever think that
thoughts of suicide and homicide, indicating that ‘he wanted some of us just ain’t playing?³⁸
to repeat Columbine,’ according to someone familiar with
the situation.”³³ In Cho’s manifesto, he identified with the
Columbine killers in the phrase, “we martyrs, like Eric and CHAD ESCOBEDO 10 April 2007
Dylan.”³⁴
escobedo’s role models:
Hitler and Manson
Cho also used the number “88” in his manifesto, citing Eric Harris / Dylan Klebold
it as the number of the Anti-Terrorist. The number 88 is Escobedo reported to law enforcement officials that he had
sometimes used to mean “Heil Hitler” because “h” is the watched a documentary on Columbine and shortly after this
8th letter of the alphabet. Whether this was Cho’s reason had the idea to commit his own attack.³⁹
for using it is unknown.
Cho also used the name Ax Manson in his fiction;
whether or not this was a reference to Charles Manson is VESTER FLANAGAN 26 August 2015
also unknown.
flanagan’s role models:
cho as role model: see Matthew Murray, Steven Kazmierczak,
Pekka-Eric Auvinen, Matti Saari, Wellington de Oliveira, Adam Eric Harris / Dylan Klebold and Seung Hui Cho
Lanza, Aaron Ybarra, Vester Flanagan, and Chris Harper- According to one source, Flanagan “expressed admiration
Mercer. for the gunmen who carried out mass shootings at Virginia
Tech in 2007 and Columbine High School in 1999.”⁴⁰ An-
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other source quoted Flanagan’s manifesto: “I was influ-
enced by Seung Hui Cho. That’s my boy right there. He got
NEARLY double the amount that Eric Harris and Dylann ANDREW GOLDEN
[sic] Klebold got.”⁴¹ Based on this, it isn’t clear that he ad- MITCHELL JOHNSON 24 March 1998
mired Harris and Klebold or if he were just using them for
comparison; the manifesto has not been released. golden and johnson’s role model:
Joseph Todd
EDMAR FREITAS 27 January 2003 On 24 March 1998, Golden and Johnson committed their
attack in Jonesboro, Arkansas. They did not enter the school,
freitas as role model: see Wellington de Oliveira. but carried out a sniper attack from the woods overlooking
the school. In my book, Why Kids Kill: Inside the Minds of
School Shooters, I speculate that Golden got the idea for the
KIMVEER GILL 13 September 2006 attack from Joseph Todd, who committed a sniper attack
from the woods by his school in Stamps, Arkansas on 15
gill’s role models: December 1997.
Eric Harris / Dylan Klebold and Nazis During his deposition (after his release), Johnson said
Gill’s online postings reveal his interest in Harris and Kle- that Golden first approached him with the idea of the attack
bold. In a list of “Likes” he includes “Reb and V (Modern around Christmas, 1997.⁵⁴ This would have been shortly
Day Saints).”⁴² Reb was Harris’s nickname and V was short after Todd’s attack. As I noted in Why Kids Kill:
for Vodka, which was Klebold’s nickname. Gill also appears Although there is no proof that Drew [Golden] knew
to imitate Eric Harris. For example, Harris wrote “Ich bin of the shooting, there are several reasons to think this
gott” (German for “I am God”) and Gill also wrote “Ich bin event may have influenced the boy’s plan. It occurred
gott.”⁴³ (See “Themes in the Writings of Eric Harris” at www. in the same state and would have been covered in tele-
schoolshooters.inf regarding his writing of this phrase.) vision news and in newspapers. Drew first mentioned
There are other possible connections to Columbine but they his idea for the attack to Mitchell shortly after Todd’s
may be coincidental. For example, Gill wrote that “Black shooting. And all three boys carried out their shoot-
leather Trenchcoats rule.”⁴⁴ Whether this was related to his ings from hidden, protected areas. Joseph Todd did not
interest in Harris and Klebold is unknown. Another possible enter the school and shoot people; he hid in a wooded
connection is that Harris wrote about his desire to “KILL area near the school and gunned people down from a
MANKIND” and “Destroy as much as possible,”⁴⁵ and Gill distance. This is precisely what Drew and Mitchell did.⁵⁵
wrote, “Destroy all mankind.”⁴⁶ Similarly, Harris wrote about
himself as god-like (see “Themes in the Writings of Eric golden and johnson as role models: see Andrew Wurst,
Harris) and Gill wrote, “I am God.”⁴⁷ Harris wrote about Kip Kinkel, and Eric Harris / Dylan Klebold.
the government “lying to everyone all the time”⁴⁸ and Gill
wrote that the “governments of the world keep lieing [sic]
ERIC HAINSTOCK 29 September 2006
to the people of the world.”⁴⁹
Gill may have also imitated Harris in his fascination
hainstock’s role models:
with the Nazis, or perhaps this was something Gill came
to on his own. His online posts include praise of Aryans,⁵⁰ Eric Harris / Dylan Klebold
the phrase “Germany rulz” (i.e., “rules”),⁵¹ and multiple Hainstock reportedly “invoked Columbine” in the days lead-
repetitions of “Heil Heil Heil.”⁵² ing up to his attack.⁵⁶
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another source, he also uploaded “an interview with Charles this paper, but his choice of topic shows his awareness of
Manson and documentaries about the 1999 Columbine other shooters and an interest in the phenomenon.
massacre and the 2007 Virginia Tech shooting.”⁵⁸ He may
Andrew Golden / Mitchell Johnson
also have had an interest in the Nazis. One source stated,
Harris also apparently referred to Golden and Johnson but
“His username on the dating site Spiritual Passions was
thought they were in Kentucky: “Do not think we’re trying
ironcross45, an apparent reference to the Nazi military hon-
to copy anyone. We had the idea before the first one ever
our.”⁵⁹ Another source noted that he had the movie ufo
happened. Our plan is better, not like those fucks in Ken-
Secrets of the Third Reich.⁶⁰ Finally, as noted in the introduc-
tucky with camouflage and .22s.”⁶⁷ Though he denied being
tion, Harper-Mercer apparently imitated Vester Flanagan in
influenced by them, this needs to be taken with a grain of
an attempt to achieve notoriety.
salt. Harris wrote repeatedly about the issue of influence
and how much he wanted to never be influenced by anyone,
MARK RICHARD HARRIS 4 August 1966 but recognized that this was impossible (see “Themes in
the Writings of Eric Harris” at www.schoolshooters.info).
harris’s role models:
harris and klebold as role models: see Todd Cameron
Charles Whitman and Richard Speck Smith, T.J. Solomon, Seth Trickey, Andy Williams, Jason Hoff-
Harris committed a random murder, not a school shooting, man, Robert Steinhäuser, Robert Bonelli, James Newman,
three days after Charles Whitman’s attack in Austin and just Jeffrey Weise, Alvaro Castillo, Kimveer Gill, Eric Hainstock,
a few weeks after Richard Speck’s mass murder in Chicago. Sebastian Bosse, Chad Escobedo, Seung Hui Cho, Pekka-Eric
After his capture, he said, “I wanted to have fun like the Auvinen, Matthew Murray, Steven Kazmierczak, Matti Saa-
guys in Chicago and Austin who had fun killing people.”⁶¹ ri, Tim Kretschmer, Bruco Eastwood, Robert Gladden, Adam
Lanza, Jose Reyes, Karl Pierson, Darion Aguilar, Alex Hribal,
Geddy Kramer, Aaron Ybarra, Vester Flanagan, Chris Harper-
ERIC HARRIS / DYLAN KLEBOLD 20 April 1999 Mercer, and Randy Stair.
In Why Kids Kill: Inside the Minds of School Shooters, I wrote Eric Harris / Dylan Klebold
about the apparent influence of these figures on Harris and Though Hribal committed a mass stabbing at his school
Klebold. See also my article, “Influences on the Ideology rather than a shooting, he was clearly influenced by the
of Eric Harris” at www.schoolshooters.info. For additional attack at Columbine. Hribal’s final letter stated, “I would
information regarding Harris’s interest in Hitler and the Na- be nothing and this whole event would never occur if it
zis, see “jcso Columbine Documents Organized by Theme” weren’t for Eric Harris and Dylan Klebold of Columbine
at www.schoolshooters.info. High School.”⁶⁹ A few sentences later he wrote, “I became a
prophet because I spread the word of a God, Eric Harris.”⁷⁰
Michael Carneal
Regarding possible influences from previous school shoot- Caesar and Lenin
ers, Eric Harris wrote a paper called “Guns in School” (dated Hribal also wrote that Julius Caesar and Vladimir Lenin
10 December 1997).⁶⁶ He referenced the recent shooting by became gods.⁷¹
Michael Carneal (1 December 1997), though he erroneously
said it occurred in Texas. There is no indication that Harris
was thinking of committing an attack at the time he wrote
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STEVEN KAZMIERCZAK 14 February 2008 school and both said, ‘Hey, that’s pretty cool.’”⁷⁹ Two months
after Jonesboro, Kinkel carried out his attack.
kazmierczak’s role models:
Ted Kaczynski (Unabomber)
School shooters, mass murderers, serial killers, terrorists Kinkel “had made comments to other students about his
According to the official report on his attack: ability to build bombs . . . and had expressed admiration for
the Unabomber.”⁸⁰
Throughout his lifetime, Steven Kazmierczak was never
able to shake his obsessional interest in violence, de- kinkel as role model: see Alvaro Castillo, Sebastian Bosse,
struction, murder, and the macabre. Wherever he hap- Adam Lanza, and Jose Reyes.
pened to find it, whether in video games, films, books
about serial killers, Hitler, reports of new horrors on the
nightly news, Columbine, Jeffery Dahmer or Virginia
GEDDY KRAMER 29 April 2014
Tech, it all fascinated him and he could never seem to
get enough.⁷² kramer’s role models:
The report also noted, “The niu assailant spoke persistently Eric Harris / Dylan Klebold
and admiringly of Adolph [sic] Hitler, Jeffrey Dahmer, Ted Kramer was not a school shooter, but he viewed them as role
Bundy, and other mass murderers. He examined the meth- models. He wrote, “I’ve found that Eric Harris and Dylan
ods of the Columbine and Virginia Tech killers.”⁷³ Klebold are some of my heroes . . . So I’m going to go out
Kazmierczak’s interest in violence showed up in his guns blazing.”⁸¹
academic writings, which included “Hamas: The History
and Ideology of the Islamic Resistance Movement” and “No TIM KRETSCHMER 11 March 2009
Crazies with Guns!: A Brief Summary of the Aftermath of
Virginia Tech and the Ensuing Debate Over Mental Health
kretschmer’s role models:
and Gun Control Legislation.”⁷⁴
Kazmierczak openly discussed his fascination with Eric Harris/Dylan Klebold
school shootings with his friends: “Steve admired how Cho Kretschmer reportedly researched Columbine.⁸²
thought to chain the doors, how Dylan and Eric planned to
Robert Steinhäuser
create confusion with the propane-tank bombs.”⁷⁵ He talked
Kretschmer, like Steinhäuser, was a German school shooter.
about “the methodology of Columbine, going through weap-
Kretschmer wrote an essay for school about Steinhäuser’s
ons choices, the plan, each step, what they could have done
shooting; whether he was given this topic to write on or
differently.”⁷⁶ When Cho committed his attack,
chose it himself is unknown.⁸³
“Steve’s excited. He’s firing off emails. ‘Crazy,’ he tells Kretschmer also participated in an online forum devoted
Jessica [his on and off girlfriend], and sends her Cho’s to school shootings where he reportedly commented, “the
writings. He’s all over this with Kevin [a friend], studying funny thing is that even when that person announces it,
everything. The writings, where Cho bought his guns, nobody believes him.”⁸⁴
his mental-health history, the photos, the planning, the
kretschmer as role model: see Ali Sonboly.
timing, even his favorite songs.”⁷⁷
kinkel’s role models: Eric Harris / Dylan Klebold, a multitude of mass murderers
Lanza studied mass murderers perhaps more than any other
Andrew Golden / Mitchell Johnson school shooter. He compiled a massive spreadsheet that
Kinkel was reported to have been interested in the Jonesboro contained data on five hundred mass murderers.⁸⁵ He also
attack. According to Frontline, Kip and a friend “watched mentioned various school shooters and other killers in his
some of the school shootings coverage on tv monitors at online posts.⁸⁶ According to the official report, he had “an
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obsession with mass murders, in particular the April 1999 MATTHEW MURRAY 9 December 2007
shootings at Columbine High School.”⁸⁷ Lanza’s computer
contained “hundreds of documents, images, [and] videos murray’s role models:
pertaining to the Columbine H.S. massacre including what
Eric Harris / Dylan Klebold, other shooters
appears to be a complete copy of the investigation.”⁸⁸
Though Murray did not commit a school shooting, he re-
The official reported also noted that Lanza had “a New
York Times article from February 18, 2008, regarding the portedly was influenced by school shooters as well as other
killers. Evidence from his computer indicated he had re-
school shooting at Northern Illinois University”⁸⁹ by Steven
searched school shooters including Harris and Klebold,
Kazmierczak. According to Matthew Lysiak’s book on the
Seung Hui Cho, and Duane Morrison. He also studied other
Sandy Hook attack, Lanza seemed particularly interested
perpetrators of violence, including Ricky Rodriguez, Sulej-
in Kazmierczak.⁹⁰ Other killers Lanza reportedly showed
man Talovic, and Robert Hawkins.⁹⁸ Murray also posted
more interest in than most (based on Lysiak’s investigation)
a message online that was copied from Eric Harris’s writ-
included James Holmes, Jared Loughner, Charles Roberts
iv, John Allen Muhammad and Lee Boyd Salvo, and An- ings.⁹⁹
ders Behring Breivik. Also, Lanza’s computer contained Kip
Kinkel’s confession⁹¹ as well as documents about George JAMES NEWMAN 14 March 2006
Sodini,⁹² Robert Hawkins,⁹³ and James Huberty.⁹⁴ In addi-
tion, Lanza referred to “the enthusiasm I had back when newman’s role models:
Virginia Tech happened.”⁹⁵
Eric Harris / Dylan Klebold, other school shootings
lanza as role model: see Chris Harper-Mercer, Karl Pierson, Newman reportedly “researched Columbine and other
and Randy Stair. school shootings online, and read copies of diaries and
journals left behind by Eric Harris and Dyland Klebold.”
He also told the police that Columbine “kind of inspired
MARC LÉPINE 6 December 1989
me. If they could do it, I thought I could do it.”¹⁰⁰
lépine’s role models:
BRYAN OLIVER 10 January 2013
Denis Lortie
In his suicide note, Lépine referred to Denis Lortie.⁹⁶ In
1984, Lortie had stormed the Canadian Parliament in a oliver’s role models:
murderous rampage attack against the government. The Unspecified school shooters
reference to Lortie was perhaps Lépine’s way of framing Oliver reportedly talked with his peers about “school shoot-
murder as a political act. ings.”¹⁰¹ I have not found any other details.
Julius Caesar Hitler
In addition, Lépine’s suicide note contained a quote that is Oliver also appears to have had a fascination with Hitler
attributed to Julius Caesar (“Alea Iacta Est,” which is Latin and sent a text message stating “I’m right as Hitler was.”¹⁰²
for “the die is cast”). Whether or not this is evidence that
Caesar was a role model is unknown.
KARL PIERSON 13 December 2013
Hitler
According to his mother, Lépine had “once admitted to being
pierson’s role models:
a fervent admirer of Adolf Hitler.”⁹⁷
Eric Harris / Dylan Klebold
Pierson not only studied the attack at Columbine, but made
JOHN McLAUGHLIN 24 September 2003 a PowerPoint presentation based on the book, Columbine: A
True Crime Story, by Jeff Kass.¹⁰³ A search of his computer
m c laughlin as role model: see Jeffrey Weise. revealed that Pierson had done online research on Colum-
bine and had downloaded photographs of the school.¹⁰⁴ In
addition, he had a copy of my book Why Kids Kill: Inside
DUANE MORRISON 27 September 2006
the Minds of School Shooters,¹⁰⁵ which includes profiles of
ten school shooters. Though he may have studied multiple
morrison as role model: see Matthew Murray.
shooters in the book, his primary influence appears to have
been Eric Harris. As I wrote in my article on Pierson:
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Pierson’s journal echoed the words of Eric Harris. For ROBERT POULIN 27 October 1975
example, Harris wrote, “I’m full of hate and I love it.”
Pierson wrote, “I am filled with hate, I love it.” Similarly, poulin’s role model:
Harris said, “It’s a weird feeling knowing you’re going to
Michael Slobodian
be dead in two and a half weeks.” Pierson wrote, “It’s
weird going through life knowing that in 19 days, I’m
Robert Poulin committed his attack on 27 October 1975 at
going to be dead.” Also, Harris and Klebold referred to
St. Pius X in Ottawa, Ontario. At that time, school shoot-
their attack as “nbk,” which was the abbreviation for
ings were much less frequent than they have since become.
Where did Poulin get the idea to commit such an attack?
one of their favorite films, Natural Born Killers. Like
One possibility is that he had read about Michael Slobodian’s
Harris and Klebold, Pierson used the abbreviation “nbk”
attack, also in Ontario, that occurred five months earlier (28
and he listed the film as one that he liked. In another
possible imitation, Pierson wrote “kmfdm” on a test
May 1975). The authors of the book about Poulin compared
at school when he got a disappointing grade (this may
the two attacks and believed that Slobodian’s attack was a fac-
have been meant as an indirect threat to the teacher;
tor in Poulin’s decision to commit a shooting at his school:
the abbreviation is generally translated as “no mercy/ The reason the two incidents can be related with such
pity for the majority”); kmfdm was one of Harris’s fa- certainty is that in the April 7 diary entry, in which the
vorite music groups. Ottawa youth [i.e., Poulin] mapped out his master plan,
Prior to going on his rampage, Pierson went bowl- there is no mention whatsoever of his school, or any
ing. This may have been done in imitation of Eric Harris hatred he may have had towards fellow students and
and Dylan Klebold, who allegedly went bowling the teachers. It seems likely that if St. Pius had been part
morning of their attack. Though this turned out to be of Robert’s plan in April, he would have written about
false, the idea became widespread, and inspired the it. Therefore, he may have picked up the idea sometime
title of the film Bowling for Columbine.¹⁰⁶ between April 7 and October.¹¹⁴
Adam Lanza The authors concluded that Poulin got the idea of commit-
Pierson was interested in the Sandy Hook shootings and ting a school shooting after reading about Slobodian’s attack.
not only had photographs of the incident but showed them Though this may have likely been the case, there is no solid
to his peers. He even thought they were “funny in a crude evidence to confirm it.
way.”¹⁰⁷ It was also reported that he “had photoshopped a
Korean pop star in the Newtown photos” and thought they
were “hilarious.”¹⁰⁸ JOSE REYES 21 October 2013
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Sodini, who committed an attack against women at an LA school. He ordered a handgun from the Web site of
Fitness center in 2009.¹¹⁷ the same shop where Auvinen bought his weapon.
They shared the same social network in YouTube.¹²²
JON ROMANO 9 February 2004 The official report on Saari noted that he used the internet
to view “material on the Columbine and Jokela school shoot-
romano’s role models: ings.”¹²³ Another source noted that in 2007, Saari’s friends
“observed his interest in the Columbine, Virginia Tech, and
Eric Harris / Dylan Klebold Jokela shootings.”¹²⁴
This is an ambiguous case. On the one hand, Romano left a
note about having watched the film Bowling for Columbine.
On the other hand, after the attack he reportedly wrote, “It MICHAEL SLOBODIAN 28 May 1975
was said that I ‘studied’ Columbine and was trying to repeat
it. That’s just ridiculous.”¹¹⁸ slobodian as role model: see Robert Poulin.
Researchers noted numerous similarities between Saari’s Eric Harris / Dylan Klebold
and Auvinen’s attacks: T.J. Solomon committed his attack just a month after Col-
umbine. Following the shooting at Columbine, he made
There are many indications that Saari was influenced
“a statement to others in reference to Columbine about
by Auvinen. He followed the same procedure of leav-
doing it differently and saying how cool it was.”¹²⁹ He report-
ing a media package in Rapidshare, entitled “Massacre
edly “began to talk about Columbine in odd ways to other
in Kauhajoki.” He took similar photos of himself with
people.”¹³⁰ During a scout meeting in which Columbine
a gun, visited Jokela, and photographed Jokela high
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was discussed, Solomon said, “I should do something like Breivik, the white supremacist who murdered 77 people
that,” adding that “‘it should have happened to our school in Norway in 2011. The massacre in Munich took place
a long time ago,’ that he ‘could understand’ the Columbine on the fifth anniversary of the Norway attacks and
killers ‘wanting to shoot the jocks and preps.’”¹³¹ Sonboly had recently changed a profile picture on an
Prior to his attack, he had written a statement about why online messaging service to one of Breivik.¹³⁹
he was doing this, commenting:
For the sake of my brothers and sisters related to the RANDY STAIR 8 June 2017
trench coat mafia [a group that in the immediate after-
math of the attack at Columbine it was believed Harris stair’s role models:
and Klebold belonged to], that will have to remain a
mystery to the public eye. I have been planning this for Eric Harris / Dylan Klebold
years, but finally got pissed off enough to really do it.¹³² Though Stair was not a school shooter (he committed his
attack at Weis Market), he was obsessed with Columbine and
After his attack, he explained, “I had just gotten the idea in particular with Eric Harris. His journal quotes Harris and
from the shooting at Columbine High School on April 20. refers to him as a “hero.” He wrote, “I cannot get Columbine
So the Monday of the May 20 shooting, I decided to open off my mind” and expressed a wish to meet Harris in the
fire May 20, one month after the Colorado shooting.¹³³ In afterlife. Shortly before his attack, he wrote, “As of right now
another statement, Solomon “emphasized how much he . . . Weis Markets is officially Columbine High School.” He
envied the attention that the Columbine killers got as a imitated Harris by making three shirts that said “Natural
result of their deeds. He said that he was thinking of that Selection,” just like the shirt Harris wore on the day of the
when he acted.”¹³⁴ attack. He acknowledged Harris’s birthday and the anniver-
The assistant prosecuting attorney on the case stated, sary of the attack, writing “18 YEARS OF COLUMBINE.”
“Columbine was the trigger that gave T.J. the permission to He wrote several times that he loved Harris.¹⁴⁰
do it. It showed a way that T.J. could gain power; he could
be in control. He envisioned he could be someone; that he Other role models
could be infamous.”¹³⁵ Stair also expressed interest in meeting “dead celebs” such as
Lee Harvey Oswald, Adam Lanza, and Timothy McVeigh.¹⁴¹
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of their [Harris and Klebold’s] April 20, 1999, rampage . . . ANDY WILLIAMS 5 March 2001
He started wondering what he would do if he were placed in
the role of the perpetrators that were previously depicted on williams’s role models:
the tv and media.”¹⁴³ Elsewhere it was reported that Trickey
Eric Harris / Dylan Klebold
had “a yearning to know what it was like to be in the shoes
Andy Williams “had told as many as a dozen people he was
of Columbine perpetrators Harris and Klebold.”¹⁴⁴
going to ‘pull a Columbine.’”¹⁴⁹
General Patton
In addition to the Columbine influence, “Several psycholo-
gists who interviewed Trickey said that what pushed him to JAMES WILSON 26 September 1988
act was his obsession with military tactics and his identifica-
tion with World War ii Gen. George Patton.”¹⁴⁵ wilson’s role models:
Laurie Dann
JEFFREY WEISE 21 March 2005 On 20 May 1988, Laurie Dann committed a bizarre, multi-
faceted rampage attack. On 6 June 1988, People magazine
weise’s role models: published an article about Dann and her rampage.¹⁵⁰ This
article was so fascinating to James Wilson that he tore it out
Eric Harris / Dylan Klebold of the magazine and reportedly read it daily until he com-
Weise mentioned Columbine in a short story, but there is mitted his own attack on 26 September 1988.¹⁵¹
no direct indication that his attack was influenced by Harris
and Klebold. John Wayne Gacy
In addition, Wilson was fascinated by true crime stories and
John McLaughlin read a biography of John Wayne Gacy,¹⁵² who had killed over
The same story mentioned the school shooting at Cold thirty men and boys and buried at least some of the bodies
Spring, which was an attack by John McLaughlin.¹⁴⁶ Though on his own property. The morning of Wilson’s shooting,
McLaughlin’s attack has not received the attention of many he asked his grandmother, “Would you live in a house with
school shootings, it is not surprising that Weise was aware of thirty bodies buried under it?”¹⁵³
it because it occurred in Minnesota, which is where he lived.
Hitler ANDREW WURST 24 April 1998
He also joined a neo-Nazi forum and expressed his admi-
ration for Hitler. His name on the form was “Todesengel,” wurst’s role models:
which is German for “Angel of Death.”¹⁴⁷
Andrew Golden / Mitchell Johnson
weise as role model: see Alvaro Castillo and Sebastian Bosse. The Jonesboro attack occurred on 24 March 1998. Shortly
after this, Wurst “said he was going to do something like
that someday.” He also remarked, “That Jonesboro thing,
CHARLES WHITMAN 1 August 1966
that would be like me bringing a gun to the dinner dance.”¹⁵⁴
Wurst did exactly that — he brought a gun to the school din-
whitman’s role models:
ner dance and opened fire. He did this on 24 April 1998
In Cold Blood and Richard Speck — one month to the day after the Jonesboro attack.
As noted by Whitman’s biographer, Gary Lavergne, Whit-
Napoleon and Hitler
man’s decision to commit mass murder may have been
In addition, Wurst reportedly talked about thinking that
influenced by the fact that the book In Cold Blood (about a
Hitler was “cool.”¹⁵⁵ It was also reported that both Hitler
mass murder) was a best-seller in 1966, and less than three
and Napoleon were his heroes because of their ability to
weeks before his own attack, Richard Speck committed a
lead people.¹⁵⁶
mass murder that was called “the crime of the century.”
Lavergne stated, “The power of mass murder to capture
the attention of, to shock, and to break the heart of a nation AARON YBARRA 5 June 2014
could not have escaped Charlie.”¹⁴⁸
ybarra’s role models:
whitman as role model: see Mark Richard Harris, Robert
Benjamin Smith, and Alvaro Castillo. Eric Harris / Dylan Klebold, Seung Hui Cho
Ybarra reported being influenced by Eric Harris and Seung
Hui Cho. In his journal he wrote, “Since Virginia Tech and
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Columbine, I’ve been thinking about these a lot. I used to the voices of Harris and Cho talking to him.¹⁵⁸ Also after
feel bad for the ones who were killed, but now Eric Harris the attack, Ybarra told police “that he had been inspired
and Seung Hui Cho became my idols. And they guided me by the killers in the Columbine shooting and the Virginia
til[l] today.”¹⁵⁷ After the attack, Ybarra claimed to have heard Tech shooting.”¹⁵⁹
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APPENDIX: THE INFLUENCE OF COLUMBINE
This diagram portrays the apparent lines of influence from Columbine through subsequent attacks. Attacks are arranged chronologically within each column.
T.J. Solomon
Seth Trickey
Andy Williams
Jason Hoffman
Robert Steinhäuser
Robert Gladden
Jose Reyes
Darion Aguilar
Alex Hribal
Geddy Kramer
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NOTES 33 “Mass Shootings at Virginia Tech,” p. 35.
34 “Seung Hui Cho’s ‘Manifesto,’” p. 3. Available at www.school
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1 “Adam Lanza’s ‘Shocked Beyond Belief’ Posts,” p. 25. Available 35 Juliana Barbassa. “Video, Texts of Brazil School Shooter Show
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2 “Chris Harper-Mercer’s Blog,” p. 1. Available at www.school 36 Barbassa, “Video, Texts.”
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37 Peter Langman. School Shooters: Understanding High School,
3 “Columbia Mall Shooter Obsessed with Columbine, Mass Mur- College, and Adult Perpetrators. Lanham, MD: Rowman and Little-
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4 Alice Popovici. “Maryland Mall Shooter May Have Copied Col- 38 Pierre Thomas, Mike Levine, and Jack Cloherty. “Columbine
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7 “Auvinen Online,” p. 5. Named as Suspect in Live tv Shooting in Virginia,” nbc News,
8 “Harris’s Journal,” p. 4. 26 August 2015.
9 Atte Oksanen, Johanna Nurmi, Miika Vuori, and Pekka Räsänen. 41 Pierre Thomas, Jack Cloherty, Jack Date, and Mike Levine. “Af-
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12 Oksanen, et al., “Jokela,” p. 198. 46 “Kimveer Gill Online,” (electronic version), p. 10.
13 Oksanen, et al., “Jokela,” p. 201. 47 “Kimveer Gill Online,” (electronic version), p. 27.
14 Amy Wallace. “What Made This University Scientist Snap?” The 48 “Eric Harris’s Journal,” p. 4.
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49 “Kimveer Gill Online,” (electronic version), p. 40.
15 Associated Press. “Columbine Influence in Mall Shootings?”
nbc News, 14 February 2005. 50 “Kimveer Gill Online,” (electronic version), p. 12.
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22 “North Carolina v. Castillo,” p. 11. 56 Bill Lueders. “Eric Hainstock: Free at Last,” Isthmus, 31 July 2008.
23 “North Carolina v. Castillo,” pp. 12–13. 57 Ben Jacobs and Nicky Wolf. “Chris Harper Mercer: Details
24 “North Carolina v. Castillo,” pp. 14–15. Emerge of Oregon College Killer,” The Guardian, 2 October 2015.
25 “North Carolina v. Castillo,” pp. 16, 17, 18. 58 Chuck Ross. “Oregon Shooter Uploaded Documentaries of Mass
26 “Accused Shooter’s Journal: ‘Planning Your Suicide is so Fun,’” Shootings, Conspiracy Theories, Porn Videos,” Daily Caller,
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27 “North Carolina v. Castillo,” p. 14. 59 Tim Walker, “Oregon shooting: Shooter Chris Harper Mercer
was reclusive 26-year-old with an interest in ira and Nazism,”
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60 Jack Healy and Ian Lovett. “Oregon Killer Described as Man of
29 “North Carolina v. Castillo,” p. 8.
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64 “Eric Harris’s Journal Transcribed and Annotated,” p. 7. Available 97 Monique Lépine and Harold Gagné. Aftermath, translated by
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68 Ben Fox, “School Shooter Referred to Columbine, Says Class- Legacy.”
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69 “Alex Hribal’s Letter,” p. 1. Available at www.schoolshooters.info. Leading Up to School Shooting,” Bakersfield Californian, 19 No-
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70 “Hribal’s Letter,” p. 2.
102 Kotowski, “Oliver on the Stand.”
71 “Hribal’s Letter,” p. 2.
103 Arapahoe County Sheriff’s Office (acso), “Arapahoe High School
72 “Report of the February 14, 2008 Shootings at Northern Illinois Investigation,” p. 1,494. Available at www.schoolshooters.info.
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74 “Report of the February 14, 2008 Shootings,” p. 28. 105 acso, “Arapahoe High School Investigation,” p. 1,607.
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76 Vann, “Portrait of the School Shooter.” 107 acso, “Arapahoe High School Investigation,” p. 5.
77 Vann, “Portrait of the School Shooter.” 108 acso, “Arapahoe High School Investigation,” p. 1,674.
78 Vann, “Portrait of the School Shooter.” 109 acso, “Arapahoe High School Investigation,” p. 1,492.
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89 Sedensky, “Report of the State’s Attorney,” p. 26. 123 Ministry of Justice, “Kauhajoki School Shooting,” p. 58.
90 Lysiak, Newtown, pp. 165–167. 124 Kiilakoski and Oksanen, “Cultural and Peer Influences,”
91 Sedensky, “Appendix to Report,” p. a217. pp. 37–38.
92 Sedensky, “Appendix to Report,” p. a218. 125 Steve Bassett. “Ex-Texas Countian Accused As 5 Are Slain in
93 Sedensky, “Appendix to Report,” p. a217. Arizona,” Springfield Leader and Press (Springfield, Missouri),
13 November 1966, p. 1.
94 Sedensky, “Appendix to Report,” p. a215.
126 Bovsun, “Beauty Salon Massacre.”
95 Office of the Child Advocate, “Shooting at Sandy Hook Elemen-
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96 “Marc Lépine’s Suicide Note.” Available at www.schoolshooters
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129 Mercer L. Sullivan and Rob T. Guerette. “The Copycat Factor: 144 Leann Long. “Honor Students Can Kill Too,” Forensic Examiner,
Mental Illness, Guns, and the Shooting Incident at Heritage Winter, 2005, pp. 10–11.
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p. 40. 147 “Jeffrey Weise Online” (scans). Available at www.schoolshooters
130 Sullivan and Guerette, “The Copycat Factor,” p. 51. .info.
131 Sullivan and Guerette, “The Copycat Factor,” p. 51. 148 Gary M. Lavergne. A Sniper in the Tower: The Charles Whitman
Murders. Denton, TX: University of North Texas Press, 1997,
132 Sullivan and Guerette, “The Copycat Factor,” p. 50. p. 81.
133 Sullivan and Guerette, “The Copycat Factor,” p. 51. 149 Jeff Williams (interviewed by Christopher Goodwin and Simon
134 Sullivan and Guerette, “The Copycat Factor,” p. 56. Hattenstone), “My Child, the Murderer,” The Guardian, 28 Oc-
135 Sullivan and Guerette, “The Copycat Factor,” p. 57. tober 2011.
136 Harriet Alexander, Barney Henderson, Chiara Palazzo, Luke 150 Montgomery Brower, Bonnie Bell, Dennis Breo, Jody Brott, Judy
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spired by far-right terrorist Anders Breivik’ and ‘used Facebook 151 Richard Greer. “Shooting Suspect Kept Thinking of Own Un-
offer of free McDonald’s food to lure victims.’” Telegraph (UK), happy School Days,” Houston Chronicle, 30 September 1988, a7.
24 July 2016. 152 Greer, “Shooting Suspect.”
137 Kate Lyons and Janek Schmidt. “Afghan, 16, Arrested in Con- 153 Greer, “Shooting Suspect.”
nection with Munich Shootings,” The Guardian (UK), 24 July
2016. 154 William DeJong, Joel C. Epstein, and Thomas E. Hart. “Bad
Things Happen in Good Communities: The Rampage Shoot-
138 Kate Connolly. “Munich Gunman Saw Sharing Hitler’s Birthday ing in Edinboro, Pennsylvania, and Its Aftermath.” In Deadly
as ‘Special Honor,’” The Guardian, 27 July 2016. Lessons: Understanding Lethal School Violence, edited by National
139 Alexander et al. “Munich Shooting.” Research Council, Washington, DC: National Academies Press,
140 All information is from “Randy Stair Journal,” available at www. 2001, p. 82.
schoolshooters.info. Harris is referred to as a hero on p. 12. The 155 DeJong, Epstein, and Hart, “Bad Things Happen,” p. 87.
quotations are from pages 78, 228, 192. References to loving 156 Ed Palattella. “A Portrait of Conflict,” Erie Times-News, 7 March
Harris appear on pages 83, 149, and 156. There are multiple 1999.
references to the “Natural Selection” shirts, including on pages
49, 149, and 186. 157 “Aaron Ybarra’s Journal,” p. 6. Available at www.schoolshooters
.info.
141 “Randy Stair Journal,” p. 229.
158 Lewis Kamb, “In Newly Released Video, spu Shooter Details
142 Heinz Gasser, Malte Creutzfeldt, Markus Naher, Rudolf Rainer, How and Why He Targeted Campus,” Seattle Times, 9 December
and Peter Wickler. “Bericht der Kommission Gutenberg-Gym- 2014.
nasium.” Freistaat Thuringen, 2004, p. 12.
159 “2014: Washington v. Ybarra,” p. 5. Available at www.school
143 “Columbine Cited in Oklahoma Shooting,” Telegraph-Herald, 12 shooters.info.
June 2000.
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FATORES PSICOLÓGICOS E SOCIAIS ASSOCIADOS AO BULLYING
Resumo
O objetivo deste ensaio é analisar a relação entre alguns fatores
sociais, mais propriamente educacionais, alguns fatores
psicológicos e o bullying. Tais fatores se expressam nas
hierarquias estabelecidas entre os alunos na escola; no
autoritarismo e na ausência de autonomia individual. Para isso,
apresentamos alguns conceitos e dados de pesquisas sobre o
bullying e depois discutimos a relação daqueles fatores com
essa forma de violência à luz da Teoria Crítica da Sociedade e
da Psicanálise.
★ Doutor em Psicologia Escolar
PSICOLOGIA POLÍTICA. VOL. 12. Nº 24. PP. 211-229. MAIO – AGO. 2012 211
JOSÉ LEON CROCHÍK
Keywords
Bullying, Authoritarianism, Prejudice, Critical Theory of Society, Psychoanalysis.
Resumen
El objetivo de este ensayo es analizar la relación entre algunos factores sociales, más
específicamente los factores educativos, algunos psicológicos y la intimidación. Tales
factores se expresan en las jerarquías establecidas entre los estudiantes en la escuela; en el
autoritarismo y en la falta de autonomía individual. Para ello, introducimos algunos
conceptos y datos de investigación sobre la intimidación y, a continuación, discutimos la
relación de estos factores con esta forma de violencia a la luz de la Teoría Crítica de la
Sociedad y el Psicoanálisis.
Palabras clave
Intimidación, Autoritarismo, Perjuicio, Teoría crítica de la sociedad, Psicoanálisis.
Introdução
Este ensaio tem como objetivo refletir sobre fatores determinantes da violência escolar,
sobretudo a que tem sido denominada bullying1. Tais fatores envolvem as esferas psicológica
e política, que medeiam a formação da consciência, que pode resistir à violência que visa a
destruição irracional ou, em sua ausência, promover essa mesma violência. A divisão dos
alunos em hierarquias escolares, o tipo de personalidade propiciado por uma sociedade
hierárquica e a questão da presença ou ausência da autoridade expressam aqueles fatores.
Cabe enfatizar que tanto a psicologia quanto a política, em nosso entendimento, são mediadas
pela sociedade, razão pela qual inicialmente a violência será pensada, neste ensaio, em termos
gerais e associada a esta sociedade, ainda que já sejam destacados aspectos psicológicos. Na
sequência apresentaremos:
1. uma contradição social recente, presente na escola: o convívio da violência escolar com
a educação inclusiva;
2. algumas considerações sobre o bullying;
3. alguns fatores determinantes do bullying – hierarquias escolares; personalidade
autoritária e relação entre responsabilidade e autoridade.
Ao final do ensaio serão expostas duas tendências de entendimento da violência e da
consequente responsabilização ou não de seu autor: o determinismo e o livre-arbítrio.
Violência Social
1
O termo bullying não tem tradução precisa e única para a língua portuguesa (ver Fante, 2005), assim,
neste ensaio, utilizaremos os termos ‘intimidação’ e ‘provocação’, como algumas de suas traduções e
mais frequentemente o próprio termo bullying, que nos meios acadêmicos já é bastante difundido e utili-
zado.
PSICOLOGIA POLÍTICA. VOL. 12. Nº 24. PP. 211-229. MAIO – AGO. 2012 213
JOSÉ LEON CROCHÍK
Se a violência tem sido constante, a escola é uma das instituições que tem como objetivo
desenvolver a civilidade em seus alunos, isto é, a possibilidade de os homens conviverem
pacificamente e discutir suas divergências de forma pacífica, por meio de normas aceitas
coletivamente. Sem dúvida, precisamos dessas normas, assim como as relações entre os países
também devem ter as suas para conseguirem a ‘paz perpétua’, segundo Kant (1992).
As leis, regras e normas, conforme se enunciou antes, são estabelecidas em situações
sociais contraditórias e conflitantes e os indivíduos também detêm certa quota de violência
para enfrentar seu sofrimento, oriundo de renúncias a seus desejos, necessárias para viver em
coletividade. Dessa forma, a tensão entre a tendência ao progresso das relações humanas e os
conflitos sociais e psíquicos prossegue. Com a escola, assim como com qualquer outra
instituição social, não poderia ser diferente: a violência também se apresenta nela.
Alguns autores distinguem a ‘violência na escola’ da ‘violência da escola’(por exemplo,
Paula e D’Aura-Tardeli, 2009); a primeira se refere à presença da violência que tem origem
fora dos muros escolares, mas nela se apresenta; a outra se refere à violência que a escola gera
ou fortalece a partir de suas regras. A nosso ver, essa distinção pode atribuir à ‘violência da
escola’ uma ausência de relação com a sociedade que não é real, pois o que a escola valoriza
ou não, seus objetivos e métodos não são plenamente determinados por ela. Neste sentido,
Adorno (1995a) defende que os professores são malvistos porque fazem o ‘trabalho sujo’ que
as demais instituições se recusam a fazer: impor a domesticação às crianças e aos
adolescentes. Esse mesmo autor indica a existência de duas hierarquias na escola: a que
classifica os piores e os melhores alunos, segundo o rendimento escolar, e uma outra, não
214 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSICOLOGIA POLÍTICA
FATORES PSICOLÓGICOS E SOCIAIS ASSOCIADOS AO BULLYING
oficial, que os classifica segundo habilidades prático-corporais, tendo a virilidade como uma
de seus critérios; segundo ele, o fascismo se aliou a essa última contra a primeira das
hierarquias citadas. Ora, a existência de hierarquias na escola é coerente com a sociedade que
gera constantemente a ordenação entre os homens: mais rico – mais pobre; mais forte – mais
fraco; mais belo-mais feio etc. O favorecimento da ‘hierarquia corporal’ sobre a ‘hierarquia
intelectual’ não é algo específico da escola, mas da sociedade. Claro que interesses ligados ao
tráfico de drogas, aos conflitos policiais, roubos etc. não são próprios da escola e lá ocorrem,
mas todas as demais formas de violência também não podem ser atribuídas na origem à
escola: são expressões de violências sociais, que adquiriram características específicas na
escola.
Se a violência escolar tem sido uma preocupação constante, de outro lado, a legislação e
as estatísticas mostram que as escolas se voltam cada vez mais para a inclusão de contingentes
maiores de pessoas: é dizer, tem se voltado para os trabalhadores, para as mulheres, para os
pobres e, atualmente, com o movimento da educação inclusiva ou educação para todos, tenta
que todos não só tenham acesso à escola, como estudem conjuntamente. Claro, há problemas
de evasão escolar, de repetência, de analfabetismo funcional, mas a tendência de a educação
ser cada vez mais inclusiva numa sociedade excludente é apreciável. Para constatar isso, basta
assinalar que, no Brasil, em 2003, o número de matrículas de alunos com necessidades
educacionais especiais no ensino regular era de 29%, e, em 2009, passou para 61% (ver
INEP/MEC, 2009): cada vez mais, alunos que frequentavam instituições especiais ou classes
especiais, ou que não estavam na escola, se matriculam no ensino regular.
O fortalecimento da chamada educação inclusiva ocorreu a partir da década de 1990, com
marcos como a conferência de Jontiem, em 1990 e a de Salamanca, em 1994. Muitos países,
nesse último evento, foram signatários dessa luta: permitir que as minorias sociais, que, por
vezes, variam entre os países, possam estudar nas escolas regulares, sem nenhum tipo de
segregação. O Brasil foi um desses países, e os dados explicitados acima mostram que vem
obtendo êxito na implementação dessa proposta. Claro, há obstáculos. Um deles se refere a
que a educação inclusiva tem se voltado, sobretudo, para os alunos com deficiência, quando
deveria se dirigir a todas as minorias que, por diversos motivos, não estão podendo frequentar
a escola ou têm dificuldades de nela permanecer. Outro deles é que as escolas não têm se
modificado para incluir todas as minorias que deveriam nela adentrar; os alunos considerados
em situação de inclusão são, quando muito, integrados, mas não incluídos. A distinção entre
educação integrada e educação inclusiva, conforme Ainscow (1997) e Vivarta (2003), é que a
primeira adapta o currículo, os métodos de ensino e a avaliação para os alunos em situação de
inclusão, ao passo que a educação inclusiva altera a estrutura e funcionamento da escola tendo
em vista uma politíca-pedagógica que contemple a todos.
Além desses obstáculos, a literatura científica tem mostrado que se, de um lado, há
aceitação dos alunos em situação de inclusão – basicamente, alunos com deficiências-, de
outro, é difícil que seus colegas os aceitem em seus grupos. O estudo de revisão elaborado por
Vieira e Denari (2007) indica que os alunos com deficiência são pouco valorizados pelos seus
colegas. Conforme as autoras, essa desvalorização pode ser devida a concepções sociais
atuais: um preconceito que se reproduz. No estudo de Batista e Enumo (2004), testes
sociométricos foram aplicados a três classes de escolas municipais, contendo cada uma, um
aluno considerado com deficiência intelectual; os três alunos foram filmados durante o recreio
para verificar suas interações com as outras pessoas. Os testes sociométricos evidenciaram
PSICOLOGIA POLÍTICA. VOL. 12. Nº 24. PP. 211-229. MAIO – AGO. 2012 215
JOSÉ LEON CROCHÍK
três resultados distintos: um dos alunos não foi escolhido por nenhum de seus colegas e foi
rejeitado por dois deles; outro foi considerado como popular por ter sido escolhido por vários
de seus colegas para as tarefas escolares (seis colegas) e para brincar (sete colegas); um
terceiro teve nove rejeições, que foram justificadas pelo seu comportamento motor
inadequado, inadequação social e falta de repertório acadêmico. Quanto às filmagens,
observaram que, apesar das diferenças enunciadas entre os alunos em foco, a maior parte do
tempo, esses ficaram sozinhos; quando interagiram, em geral, o fizeram com apenas uma
pessoa por vez e por um breve tempo.
Além da distinção entre educação integrada e educação inclusiva, acima indicada, há
diversos modelos de educação inclusiva. Um deles é desenvolvido na Escola da Ponte, em
Portugal (ver Pacheco, Eggertsdóttir e Marinósson, 2007), que centra a atenção nos currículos
individuais e no trabalho em grupo; outro deles desenvolveu-se na Espanha, por meio de
Melero (2006), que defende a proposição de um mediador junto à família e à escola para
alunos com deficiência intelectual, principalmente pessoas que têm Síndrome de Down.
Outro, desenvolvido, sobretudo, na Inglaterra, mas também proposto e difundido pela
UNESCO, trabalha a comunidade escolar: não deixa de atentar às diferenças individuais, mas
não descuida da coletividade (ver Ainscow, 1997). Como este ensaio tem como objeto a
violência escolar, é importante destacar que as mudanças propostas nesses diversos modelos
são antídotos contra ela, por lutar contra o preconceito e a discriminação presentes na
segregação e na marginalização, por insistirem tanto no aprendizado individual como na
relação com o grupo. Apesar disso, como vimos, ainda há problemas na implementação desse
tipo de educação.
Ora em uma sociedade totalitária, definida como aquela na qual o todo é mais importante
do que seus membros (Adorno, 1991), totalitarismo que pode se manifestar quer nas
sociedades comunistas quer nas capitalistas, todos são excluídos: uns têm mais condições que
outros para sobreviver, mas mais cedo ou mais tarde, as tragédias sociais recaem sobre todos,
e a impotência individual se faz notar. Não obstante, não é menos verdadeiro que ao lado de
sua tendência totalitária, a sociedade também se movimenta para a liberdade, para a inclusão
de todos; o progresso é contraditório: fortalece os que têm mais poder, mas contribui para
melhorar a vida de todos. Na escola isso também ocorre. Ao lado do movimento da educação
inclusiva, assistimos a violência presente no bullying, fenômeno que tem tido muito destaque,
em nosso meio, nos últimos anos.
A perseguição aos que parecem frágeis é marca frequente em diversas formas de
preconceito, fenômeno esse que compõe boa parte da violência existente em diversas épocas e
em distintos lugares (ver Horkheimer e Adorno, 1985). Seria de se esperar que os novos
alunos incluídos – sobretudo os que têm deficiência – sejam as vítimas preferenciais do
bullying, tal como afirmam Freire e col. (2006) e Fante (2005); segundo Fante (2005:64): “As
crianças portadoras de deficiências físicas e de necessidades educacionais especiais correm
maiores riscos de se tornarem vítimas de bullying, riscos estes duas a três vezes maiores do
que as crianças consideradas normais.”
Monteiro e Castro (1997), contudo, mostraram que os alunos com deficiência têm sido
bem recebidos pelos colegas, que aprendem com eles; apesar disso, há de se perguntar se não
desenvolvem outras formas de violência em relação a esses alunos em situação de inclusão: a
de marginalização e/ou a de segregação.
Antunes e Zuin (2008), a partir da literatura da área, indicam que as vítimas do bullying
têm sido: pessoas que têm características físicas, socioeconômicas, étnicas e preferências
sexuais específicas, entre eles, ciganos, artistas de circo, estrangeiros, alunos obesos, de baixa
estatura, homossexuais. Se os alunos com deficiência física, sensorial e intelectual têm uma
distinção perceptível em relação a outras pessoas, se essas diferenças são frutos da natureza
ou de acidentes, os demais alvos podem apresentar características de fragilidade que são
culturalmente desvalorizadas.
Uma pesquisa que fizemos (Crochík, 2004), comparando o preconceito contra indivíduos
com deficiência física com o preconceito contra indivíduos com deficiência intelectual,
evidenciou que os que têm deficiência física são mais discriminados do que os que têm
deficiência intelectual: o que é mais próximo à ‘normalidade’ parece atrair mais a ira dos
‘normais’ do que o que é mais distante. Está presente o fenômeno descrito por Freud (1986)
como ‘narcisismo das pequenas diferenças’: o que está mais próximo, mas detém alguma
diferença, deve ter essa diferença ampliada para que os mais ‘semelhantes’ sejam alvos
possíveis de identificação. Assim, os alunos não considerados em situação de inclusão, mas
que tenham características desvalorizadas: usar óculos, ser muito magro, muito gordo, alto,
baixo, podem ser mais destinados a ser alvos do bullying do que os em situação de inclusão,
ou talvez tipos diversos de bullying sejam destinados a esses dois grupos; não encontramos
pesquisas na área que elucidem essa questão.
É recente a discussão sobre o bullying escolar, mas a sua existência, segundo Fante (2005)
não é nova, e cabe destacar que Grossi e Santos (2009), assim como Voors (2006), não
deixam de associar esse fenômeno com a violência social. Pinheiros e Willians (2009) e
Antunes e Zuin (2008) indicam que, não só no Brasil, a partir da década de 1980, a violência
tende a se tornar mais grave: antes, danos ao patrimônio; agora, violência interpessoal,
incluindo agressão a professores e funcionários e a intimidação acarretada pela presença de
gangues na escola.
Alguns adultos, segundo Freire e col. (2006) e Voors (2006), julgam o bullying como
brincadeiras infantis, que deverão ser superadas, ou que as crianças devem resolver por si
mesmas, e que como ‘brincadeiras’ não acarretam nenhum dano; às vezes, consideram-no
natural, necessário sobretudo para os meninos. Parte dos alunos entrevistados na pesquisa
realizada pela Plan (2010) 2, sobretudo do sexo masculino, também considera o bullying uma
brincadeira, ao contrário das meninas que tendem a ficar magoadas, e que o bullying parece se
iniciar como uma brincadeira que se transforma em agressão. Na atitude de se considerar o
bullying como brincadeira, os valores da força e da virilidade podem ser destacados em
detrimento dos direitos humanos e do desenvolvimento da sensibilidade.
Se é clara, para alguns, a distinção entre ‘brincadeiras’ e violência, deve-se lembrar que
piadas contra pessoas com deficiência, imigrantes, negros, podem ser expressões do
preconceito sutil, que é uma das formas da violência se manifestar (ver Meertens e Pettigrew,
2
A PLAN é uma Organização Não Governamental voltada à defesa dos direitos da criança; foi responsável
por esse estudo sobre o bullying em território brasileiro.
PSICOLOGIA POLÍTICA. VOL. 12. Nº 24. PP. 211-229. MAIO – AGO. 2012 217
JOSÉ LEON CROCHÍK
1999). A esse respeito, é interessante a relação estabelecida entre bullying e preconceito, por
Antunes e Zuin (2008) e por Grossi e Santos (2009), os primeiros indicando que esse último
fenômeno é a base do primeiro, os últimos evidenciando a presença do preconceito na
violência escolar.
O bullying escolar tem sido definido como a hostilidade de um aluno mais velho ou mais
forte, ou grupo de alunos, intencionalmente e com frequência, dirigida a um mesmo aluno,
podendo gerar diversas consequências psíquicas no que o sofre, desde uma angústia acentuada
até o assassinato e o suicídio (Pinheiro e Willliams, 2009; Fante, 2005; Freire e col., 2006;
Voors, 2006); como se percebe, as consequências desse fenômeno não devem ser associadas a
meras brincadeiras ou a situações que são facilmente superáveis.
Antunes e Zuin (2008) expõem que o bullying pode ser de três tipos: direto e físico
(agressões físicas, roubo, destruição de objetos de colegas, exploração sexual); direto e verbal
(insultos, apelidos, ‘sarros’, comentários discriminatórios ofensivos); e indireto (fofocas,
boatos, ameaças).
Há diversas pesquisas que revelaram variáveis ligadas quer à prática da intimidação, quer
aos alvos. Pinheiro e Willians (2009) citam Berdondini e Smith (1996), que avaliaram
aspectos da coesão familiar em alunos vítimas de bullying, alunos autores da intimidação e
alunos sem envolvimento em situações de bullying. Os autores concluíram que a ausência do
pai tornava mais provável o aluno ser intimidador e que o carinho familiar, expressado pela
superproteção, estaria relacionado com a vítima da hostilidade. Freire e col. (2006)
apresentam considerações distintas: parece haver relação entre o estatuto de aluno-vítima e
famílias com um só ou nenhum dos pais presentes; quanto aos alunos com estatuto de
agressores, tendencialmente vivem com ambos os pais.
Os provocadores tendem a vir de famílias que os agridem (Fante, 2005; Voors, 2006;
Antunes & Zuin, 2008). Fante (2005), a partir de quatro estudos realizados, indica que a
violência familiar pode ser uma das causas do bullying, o que é respaldado pela opinião de
alunos e funcionários coletada nesses estudos e pela opinião de especialistas; esse fator –
violência doméstica – também é considerado pela pesquisa realizada pela Plan (2010), na
opinião dos professores entrevistados, como importante para se entender o comportamento
dos que provocam. Fante (2005) acrescenta a necessidade de o agressor ser notado, buscando
reconhecimento. Em sua pesquisa, Pinheiro e William (2009) verificaram a relação entre a
violência doméstica quer no que se refere à exposição à violência entre os pais, quer a
violência diretamente voltada aos filhos e o papel a ser assumido no bullying: agressor,
alvo/agressor, alvo, e concluíram que a mera exposição à violência entre os pais não se
relacionou com a prática da intimidação, já a violência direta a eles os tornou alvos e
agressores no caso dos meninos e agressoras, no caso das meninas.
No estudo de Pinheiro e Williams (2009), assim como nos relatados por Fante (2005),
quase metade dos participantes declarou participação no bullying. Segundo o estudo da Plan
(2010), aproximadamente 10% dos alunos praticam o bullying e outros 10% o sofrem; a maior
parte é da quinta ou sexta série do ensino fundamental e os meninos têm uma frequência
maior como vítima; os autores desse estudo nacional indicam que os diversos sujeitos
entrevistados – alunos, professores, pais – têm dificuldades de distinguir entre mau trato e
bullying, além do que algumas vítimas podem ter vergonha de dizer que apanharam, por isso
os autores desse estudo supõem que a frequência do fenômeno deva ser maior do que a
constatada.
Veiga Simão e col. (2004) indicam que a maior parte dos alunos – quase 70% – é
observadora do bullying e ‘passiva’ frente à violência que assiste; é provável que alguns
satisfaçam seus próprios desejos agressivos dessa maneira e que outros se identifiquem com
os agredidos; segundo a pesquisa desenvolvida pela Plan (2010), essa identificação é
expressada por parte dos alunos que observam o bullying. Já o desejo de humilhar o outro
ocorre com o que agride e com aquele que é partidário do ataque, mas não agride diretamente.
A satisfação com a agressão é destacada por Fante (2005):
O bode expiatório constitui-se, para um aluno agressor, num alvo ideal. Sua ansiedade,
ausência de defesa e seu choro produzem um forte sentimento de superioridade e de
supremacia no agressor, que pode então satisfazer alguns impulsos de vingança... Ao que
parece, o agressor sente a mesma satisfação quando ataca ou quando são outros que
atacam a vítima. (p. 48)
Sem reduzir o fenômeno a questões individuais, mas também sem negar o que há de
próprio aos indivíduos que praticam o bullying, cabe mencionar três fatores que parecem se
relacionar com esse fenômeno: a dupla hierarquia social, presente na escola, e sobre a qual já
se escreveu algo aqui, a que tem como critério o desempenho intelectual, cultural e a que tem
como crivo a força física, a virilidade; a formação da personalidade autoritária ou não; e a
autonomia, ou a ausência dela, em relação à autoridade.
Conforme dito antes, nossa sociedade é estruturada com base em hierarquias: os mais e
menos aptos, os mais e menos fortes, os mais e menos inteligentes e assim por diante. A
existência de duas hierarquias básicas que se confrontam e se complementam – a do
desempenho intelectual/cultural e a do desempenho corporal – tende a contribuir, sob forma
de ideologia, com a reprodução da estrutura de classes descrita por Marx (1984). Na história
de nossa civilização, a inteligência e os instrumentos que criou foram substituindo a força
necessária para modificar a natureza para a reprodução da espécie, mas como a necessidade
PSICOLOGIA POLÍTICA. VOL. 12. Nº 24. PP. 211-229. MAIO – AGO. 2012 219
JOSÉ LEON CROCHÍK
de dominar a natureza não foi, segundo Horkheimer e Adorno (1985), superada, mesmo a
inteligência ainda representa a força na sobrevivência do mais apto. Assim, na base de
qualquer hierarquia, a ideia da dominação estaria presente, mas a hierarquia
intelectual/cultural contém o germe para superar a própria ideia de hierarquia, que pode pelo
pensamento desestruturá-la. A percepção sobre o intelectual é ambígua, segundo Adorno
(1995a), pois esse mostra ser ao mesmo tempo digno de respeito, por aquilo que possibilita na
adaptação e na superação dessa, e desprezado, por ser considerado frágil frente à força da
mesma natureza que se pretende dominar para que o homem possa sobreviver. Essa
ambiguidade frente ao intelectual, que no fascismo, segundo Adorno (1995a), é eliminada, por
puro desprezo a tudo o que não represente a força, na escola pode colocar os que têm bons
desempenhos escolares a ser invejados e desprezados pelos que não os têm; esse desempenho
pode representar a valorização do que é ‘frágil’, que ao mesmo tempo é almejado e, por não
ser obtido, é desprezado pelos que não o conseguem. Assim, o aluno que obtém bom
desempenho escolar parece ser um alvo de hostilidade adequado para aqueles que não o
conseguem, e o aluno que se destaca por sua destreza e/ou beleza corporais pode ser tanto
aquele que exerce a violência de formas diversas sobre os mais fracos ou um modelo que
serve de contraponto ao desenvolvimento intelectual.
Claro, o modelo incentivado atualmente pela sociedade é o do desenvolvimento intelectual
e corporal, mas nesse caso, um e outro dizem respeito, conforme Adorno (1995a:168), ao
‘menino saudável’ e a ‘menina espontânea’ que se contrapõem à diferenciação, ao
desenvolvimento intelectual, pois têm como objetivo principal a adaptação; certamente, a
adaptação é necessária, mas para a formação de um indivíduo autônomo não é suficiente.
Numa sociedade que incita a competição para que os mais aptos se destaquem, a adaptação,
quer como intectualidade, quer como habilidade corporal, representa força para a superação
dos adversários; já o corpo e o espírito que se formam para a emancipação devem poder
expressar a violência e o sofrimento existentes, sob a forma de arte e de ciência.
O combate à fragilidade é fruto de uma identificação negativa: os indivíduos que não
podem aceitar alguns medos, desejos ou ideais como próprios atribuem a outrem a culpa por
expressá-los e, por isso, os perseguem (ver Horkheimer e Adorno, 1985). A necessidade de
ser forte é própria de uma sociedade que cultiva a sobrevivência, ou ao menos o privilégio dos
mais fortes. A fragilidade remonta a estágios superados que o homem civilizado deseja
esquecer, lembra a natureza que o homem presume ter superado (ver Horkheimer e Adorno,
1985). Porque a força deve ser substituída pela inteligência, a inteligência é vista como força
e valoriza ela mesma o que pretensamente superou; reciprocamente, os que se valem da força
física se ressentem da inteligência: isso resulta na inteligência a serviço do irracional; daí o
surgimento de duas hierarquias sociais que conforme assinalamos antes, segundo Adorno
(1995a), apresentam-se na escola: a hierarquia formada pelos mais e menos desenvolvidos
cognitivamente (intelectual e culturalmente) e a hierarquia formada pelos desempenhos
corporais, entre os quais encontra-se a força física e as habilidades para imobilizar e/ou
machucar os outros. Os que estão no topo dessas hierarquias podem utilizar a inteligência e a
força para intimidar os que estão na base, reproduzindo assim o poder existente e a
necessidade social de que haja a hierarquia; Horkheimer e Adorno (1985) não se furtam de
mencionar que somente a renúncia ao desejo da dominação possibilitaria a paz entre os
b) Personalidade Autoritária
[...] uma organização mais ou menos permanente das forças internas do indivíduo. Estas
forças persistentes da personalidade contribuem a determinar a resposta do sujeito frente a
distintas situações, e, portanto, é a elas que se deve atribuir em boa parte a constância do
comportamento, seja verbal, seja físico. (p. 30; tradução do autor deste ensaio)
psíquicas, por seu turno, são o produto de fenômenos contemporâneos tais como a
desintegração da propriedade média, a crescente impossibilidade de uma existência
econômica auto-suficiente, certas transformações na estrutura da família e certos erros na
direção da economia. (Horkheimer & Adorno, 1973:173)
c) Autoridade e responsabilidade
Fante (2005:61) diz que os especialistas consideram como causa do bullying quer a
ausência de autoridade, quer a sua presença violenta: “As causas desse tipo de
comportamento, segundo especialistas, devem-se à carência afetiva, à ausência de limites e ao
modo de afirmação do poder dos pais sobre os filhos, por meio de ‘práticas educativas’ que
incluem maus-tratos físicos e explosões emocionais violentos.”
Nesse mesmo sentido, na pesquisa realizada pela Plan (2010), parte dos professores alega
que não foi preparada para conter a indisciplina a não ser pela coerção; já as famílias dizem
que a escola tem falta de hierarquia e autoridade.
Dessas atribuições de causas, podemos supor duas tendências de pensamento no que se
refere à autoridade educativa – familiar ou escolar: uma defende a imposição de limites de
forma rígida; outra, ao contrário, negligencia a necessidade da indicação de limites pelas
autoridades. Ambas, paradoxalmente, são semelhantes em seus efeitos: não possibilitam
adequadamente a formação da consciência moral3, nomeada pela psicanálise de superego; a
primeira, porque ao mesmo tempo em que indica claramente o que a autoridade deva incutir
às crianças e aos jovens, o faz calcada no princípio e não em sua racionalidade: é pelo
medo, segundo essa tendência, que as pessoas seguem os indicadores morais, e não por
convicção, assim, essa consciência se forma fragilmente e se torna ambígua; a segunda,
porque a autoridade não oferece nenhum modelo para que seus filhos se identifiquem, e
assim o que se pode ou não fazer é dirigido externamente; segundo Freud (1986), esse tipo
de pessoa que não desenvolve o superego já era bastante frequente na época que viveu: não
sente culpa.
Outro resultado possível da formação da consciência moral é também destacado por Freud
(1986); argumenta que pais indulgentes podem formar filhos com consciência rígida, pois não
fornecem um objeto para que possam depositar seu ódio pela repressão acarretada aos desejos,
assim, o indivíduo volta a agressão sob a forma de culpa a si mesmo; essa explicação pode ser
adequada para as vítimas do bullying, que tendem a se deprimir e a ter baixa autoestima.
3
Para este texto, os conceitos de consciência moral, superego e ideal de ego serão considerados como
similares, ainda que um não se reduza ao outro; não explicitaremos a distinção existente entre eles para
não tornar ainda mais longo este ensaio.
222 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSICOLOGIA POLÍTICA
FATORES PSICOLÓGICOS E SOCIAIS ASSOCIADOS AO BULLYING
A fragilidade da formação do ideal do eu é indicada por esse autor, em outro livro (Freud,
1993), como elemento fundamental para que os indivíduos ajam irracionalmente nas massas e
pode explicar o porquê do bullying ser praticado, parte das vezes (ver Plan Brasil, 2010), em
grupo, e porque os observadores podem tirar prazer do sofrimento das vítimas da humilhação.
Numa perspectiva teórica distinta, Voors (2006) propõe que as crianças, mesmo de pouca
idade, assumam a responsabilidade por suas condutas violentas e saibam que essas condutas
não são desejadas.
Assim, a consciência moral, expressa quer por sua ausência ou por sua rigidez – estaria na
base da prática do bullying. Como essa discussão diz respeito à formação, refere-se também à
autoridade e sua distinção do autoritarismo, uma autoridade esclarecida, que deveria , segundo
Adorno (1995a), ser substituída pela consciência individual, à medida que o indivíduo vai se
tornando autônomo.
Bleichmar (2008) descreve dois tipos de autoridade: a que tenta se impor externamente
e a que se constitui por meio de identificações. Defende essa última forma e argumenta que
o vínculo de confiança estabelecido com o adulto é o que permite a constituição de normas.
Não só a psicanálise, mas também a vertente construtivista distingue duas formas de
relações educacionais com resultados distintos para a autonomia. Segundo Carvalho (1999),
Piaget denomina a primeira como tradicional, centrada no conteúdo e responsável pela
heteronomia do aluno; já o método ativo, centrado no aluno, que reduziria o professor a um
‘amigo mais velho’ em jogos, pela cooperação entre os indivíduos geraria a autonomia.
Essas tendências – Psicanálise e Construtivismo –, no entanto, quase não se pronunciam
quanto à reflexão sobre a racionalidade das normas, que só pode ser pensada conforme as
necessidades da época e do lugar, sem perder o movimento do todo; o ideário nazista, por
exemplo, tem normas, mas dificilmente elas podem ser consideradas racionais (ver
Horkheimer & Adorno, 1973).
Essa crítica contra a autoridade educacional que gera a heteronomia também é feita por
Adorno (2004), mas dialético que é, argumenta que o declínio da autoridade não trouxe algo
melhor, pois enfraqueceu junto com o autoritarismo, as referências que a autoridade traz.
Aliás, esse autor insiste que o desprezo pela autoridade intelectual é também desprezo pela
cultura, a qual, por sua vez, quanto mais desenvolvida for, mais poderá diferenciar os
indivíduos que se formam por meio de sua incorporação. Em sentido similar, argumenta
Arendt (1978): emancipar-se da autoridade dos adultos pode significar conformismo ou
delinquência das crianças – frequentemente uma combinação de ambas- pois a criança
pretensamente livre queda sob a tirania da maioria.
A autoridade é importante para a formação do indivíduo, pois oferece referências,
princípios, valores; serve como modelo que deve ser incorporado para depois ser superado.
Se não há esse modelo, a individualidade não se constitui, pois a pessoa mal consegue saber
o que quer, o que deseja; se não supera o modelo introjetado, só o reproduz rigidamente
(ver Adorno, 1995a). Nos dois casos a autonomia é impedida. A autonomia deve se
constituir na possibilidade de analisar e decidir sobre as próprias ações e escolhas com base
na expressão adequada do próprio desejo e das condições adequadas para realizá-lo sem por
em risco a si próprio e aos outros. Somente seguir regras ou não segui-las indica
heteronomia. Como hipótese, podemos supor que os provocadores do bullying devem ser
heterônomos: nem conhecem bem seus desejos, nem conseguem encontrar formas de
realizá-los adequadamente.
PSICOLOGIA POLÍTICA. VOL. 12. Nº 24. PP. 211-229. MAIO – AGO. 2012 223
JOSÉ LEON CROCHÍK
justa – ainda não existente – pode dificultar pensar o que já é possível haver de sujeito nesta
sociedade, com as atuais condições concretas de existência. Se uma sociedade injusta e
violenta como a nossa não é favorável ao surgimento de um indivíduo que possa se
responsabilizar inteiramente pelos seus atos, não impede de pensar que esta mesma sociedade
também luta pela justiça e pela paz e, assim, os indivíduos deveriam lutar para manter e
fomentar o que há de mais racional nesta sociedade. Assim, é possível exigir ações racionais
dos sujeitos, sem descuidar das determinações objetivas. O progresso, conforme Adorno
(1995b) o defende contra os niilistas, não é somente excludente, também gera condições para
a liberdade. Justiça, liberdade, autonomia, não podem ser pensadas em abstrato, mas segundo
a história da sociedade; são mediadas pelas contradições sociais. Assim, considerar com base
no materialismo a responsabilidade individual é afirmar e negá-la simultaneamente: os
indivíduos ainda não podem assumir plenamente os seus atos quer por condições sociais, quer
por condições psíquicas, mas isso não significa que não tenham opções pelas quais possam se
responsabilizar e ser responsabilizados, entre elas evitar o crime.
Foucault (1987) mostra o momento de passagem entre a compreensão do crime devido a
condições circunstanciais e o seu entendimento como fruto de fatores inerentes ao indivíduo –
psíquicos e/ou educacionais. Não são mais as condições concretas as responsáveis pelo crime:
o indivíduo é responsável pelo crime antes de cometê-lo. Segundo Freud (1975), o crime
permite aliviar a culpa; a intenção do crime gera a culpa, a sua realização alivia. Esse
entendimento, no entanto, em vez de atribuir a responsabilidade ao indivíduo pode ser
utilizado como uma forma de compreensão que retira a intenção (consciente) e permite
atenuar o delito: ‘ele não sabia o que fazia’.
Os legalistas, por sua vez, defendem a exigência do cumprimento das leis sem se
perguntarem se os indivíduos têm condições de cumpri-las. Foi Freud (1986) também que fez
a crítica contundente a essa posição e à cultura de uma forma geral, ao mostrar que os
indivíduos passam a ser hostis à cultura, uma vez que os sacrifícios exigidos não são
compensados. Em ‘Futuro de uma ilusão’, Freud (1978) defende que se os homens
aprendessem desde crianças a perceber o valor que a cultura tem para a sua vida, não a
agrediriam. Se essa discussão se aplica quando não há muitas dúvidas de se houve ou não
crime, ela se acirra mais quando, como dito antes, os agentes são crianças ou adolescentes e se
a infração for considerada, por alguns, como algo ‘natural’, como brincadeira infantil, como
ocorre, por vezes, com o bullying.
Voltando às duas hipóteses enunciadas por Fante (2005) em relação às causas do bullying
– família violenta e insegurança do aluno –, em relação à primeira cabe mencionar a discussão
de Horkheimer e Adorno (1973) sobre a forma contemporânea de autoridade, que
diferentemente da de outrora não é mais, prioritária e predominantemente, calcada na força,
mas na ameaça – sutil ou não de abandono – o que fortalece a sua segunda hipótese: se a
ameaça de sermos excluídos a todo o momento aumentou, a necessidade de fazer parte, ser
aceito no grupo – ainda que por meio de imposição – é cada vez maior; isso não retira a
importância de se estar atento à violência física da família sobre seus filhos na tentativa de
explicação da ocorrência do bullying, mas fortalece a outra hipótese.
Não foi, segundo esses autores, o poder paterno que deu base ao fascismo, mas o declínio
da autoridade. O enfraquecimento da autoridade retirou as referências necessárias para que os
indivíduos buscassem seus caminhos na vida, e aqueles que trazem essas referências ocupam
o lugar do pai. Em relação ao declínio da autoridade paterna, dizem os autores:
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JOSÉ LEON CROCHÍK
A efetiva debilidade do pai na sociedade, que tem sua origem na redução da esfera da
concorrência e da livre iniciativa, penetra assim até as células mais profundas do
equilíbrio psíquico-moral; a criança já não pode identificar-se totalmente com o pai, não
pode fazer a interiorização das exigências impostas pela família que, apesar de seus
aspectos repressivos, contribuía de uma forma decisiva para a formação do indivíduo
autônomo. (p. 144)
Se a consciência moral é cada vez mais obstada em sua formação, a autonomia não pode
surgir e, dessa maneira, a possibilidade de se agir racionalmente e controlar as ações
individuais destrutivas, presentes do bullying e na discriminação aos alunos em situação de
inclusão, se torna cada vez mais difícil.
Tendo em vista o que foi discutido neste ensaio, cabe propor estudos empíricos que
confirmem ou não a determinação dos fatores aqui explicitados sobre o bullying – a
hierarquia escolar, o autoritarismo e a ausência de autonomia (ou de consciência).
Obviamente, esses fatores não devem ser limitados aos indivíduos e suas famílias, mas
refletidos em relação aos conflitos existentes nesta sociedade e as consequentes implicações
individuais. Caberia também verificar empiricamente se as propostas de educação inclusiva,
nas escolas que a adotam, não contêm o combate ao bullying e se o novo alunado,
possibilitado por ela, pode ser ou não um novo alvo desse tipo de violência, apesar de este
tipo de educação lhe ser contrário.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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• Recebido em 05/02/2011.
• Revisado em 27/04/2011.
• Aceito em 14/05/2011.
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Boletim de Psicologia, 2015, Vol. lXV, Nº 142: 015-028
RESUMO
O artigo pretende analisar a manifestação da violência na juventude, especialmente, em relação aos casos de
conflito entre grupo de jovens. Para tal, propõe uma reflexão sobre a complexidade do fenômeno da violência
em seu aspecto semântico conceitual e sobre os impactos da reestruturação da figura do jovem na sociedade
contemporânea, sustentando a hipótese de que a violência se tornou uma referência fundamental nas formas
atuais de subjetivação. Por fim, o artigo discute as várias perspectivas da violência escolar, da abrangência do
tema às tentativas de definir seu campo e faz uma análise crítica das medidas protetivas propostas para o seu
enfrentamento.
ABSTRACT
YOUTH AND VIOLENCE: SUBJECTIVITY PROCESS ON SCHOOL AMBIANCE
The article intends to analyze the exhibition of violence by youth, particularly that related to conflicts betwe-
en youth groups. In order to attain this we propose a reflection about the complexity of the phenomenon of
violence through its semantical concepts and also about the impacts caused by youth figure restructuring into
the contemporary society, sustaining the hypothesis that violence has turned to be a fundamental reference on
the current forms of subjectivity. Finally, the article discusses several perspectives of school violence, such as the
amplitude of the subject, the attempts to define the field making a critical analysis of the protective measures
proposed to solve it.
Endereço para correspondência: Rua Paissandu 93/701, Flamengo. Rio de Janeiro – RJ. CEP: 22210-080.
E-mail: cb.andrade@terra.com.br
CLÁUDIA BRAGA DE ANDRADE
INTRODUÇÃO
A racionalidade da violência
A violência faz parte da história humana e está presente nas diversas sociedades e tradições
culturais. Conforme assinala Birman (2009a), a violência é sempre um traço da experiência social que,
nos seus múltiplos registros, político, religioso e simbólico, regula e desregula a relação entre as sub-
jetividades. A constatação da presença da violência ao longo da história da humanidade não significa,
contudo, uma naturalização da mesma.
16
Violências e JuVentudes: Processos de subJetiVação no contexto escolar
Para saber que o povo lutará por sua pátria não precisamos descobrir instintos de
‘territorialismo grupal’ em formigas, peixes e macacos ... Basta passar um dia nos cor-
tiços de qualquer grande cidade. Fico surpresa e encantada de ver que alguns animais
se comportam como homens, mas não consigo ver de que forma isto pode justificar
ou condenar o comportamento humano. Não consigo compreender, por que devemos
reconhecer que o homem se comporta como um espécime de grupo territorial e não
o contrário – que certas espécies animais se comportam muito como homens (Arendt,
1999, p. 133-134).
O argumento biológico sobre a natureza da violência é frágil, pois se apoia na premissa de que
a violência é produto da conduta humana movida pelo instinto e não pela razão. A oposição entre ra-
zão e violência não se sustenta, uma vez que a razão não impede um ato violento. Freud (1915/1976)
discute como os instrumentos da razão não serviram, por exemplo, para impedir a violência da guer-
ra. Outro problema do argumento biológico da violência é a ligação que se estabelece entre irracional
e emocional. Para a psicanálise, a violência não está isenta de razão e a emoção não se opõe à razão.
O que a hipótese da irracionalidade da conduta violenta pode revelar é que a razão desconhece as
verdadeiras intenções e finalidades (Costa, 1986).
O fato de a violência apresentar uma disposição autônoma e originária não corresponde a uma
biologização da mesma. Freud (1920/1976) não postula a pulsão de violência, mas a pulsão de morte
que, na sua vertente destrutiva, também coexiste com a pulsão de vida. A violência, considerada um
dos elementos primordiais do destino da vida psíquica e social do homem, coloca uma situação para-
doxal. Embora se admita que a agressividade esteja presente no ser humano, há uma forte resistência
em admiti-la como algo inerente ao campo da subjetividade.
17
CLÁUDIA BRAGA DE ANDRADE
As modalidades da violência
o seu próximo não é para eles, não apenas um ajudante potencial ou um objeto sexual,
mas também alguém que tenta satisfazer sobre ele a sua agressividade, a explorar sua
capacidade de trabalho sem compensação, utilizá-lo sexualmente sem o seu consenti-
mento, apoderar-se de suas posses, humilhá-lo, causar sofrimento, torturá-lo e matá-lo.
18
Violências e JuVentudes: Processos de subJetiVação no contexto escolar
ressalta que poucas são as ocasiões que o indivíduo pode prescindir do vínculo com os outros e que
este outro está sempre presente em sua vida psíquica “como modelo, como objeto, como auxiliar e como
inimigo” (p. 67.) Na construção do mito de “Totem e Tabu”, Freud (1913/1976) trabalha com a ideia de
que a violência simbólica introduz um limite à força bruta. A morte do pai da horda primitiva seria
fundador da sociedade propriamente dita. Os irmãos, mais frágeis, permitem impor um limite à vio-
lência absoluta da figura do pai primordial. Esta violência, que pode impor um limite à violência real,
constitui um código de ética. A tese freudiana é que o uso do poder pode ser feito através das leis. A
união dos grupos pode garantir a manutenção de uma comunidade, mas a violência sempre é o pano
de fundo dessa manutenção (Freud, 1933/1976).
A questão da violência entre jovens é abordada diretamente e indiretamente por vários estu-
dos. Deter-nos-emos nas análises desenvolvida sobre o tema violência escolar. Um ponto importante
a ser realçado é que a violência escolar não é considerada um fenômeno recente. O que surge como
um fato novo na atualidade são, além de seu alto índice de incidência, suas inéditas formas de mani-
festações. A pesquisa da UNESCO sobre violências nas escolas, coordenada por Abramonovay & Rua
(2002), levanta a complexidade do tema definindo-o como um grave problema social. Uma das causas,
que são apontadas como responsáveis pela gravidade assumida atualmente, se deve a transforma-
ções tais como: surgimento de armas nas escolas, disseminação do uso de drogas e a expansão do fe-
nômeno de gangues, influenciando na rotina das escolas, eventualmente associadas ao narcotráfico.
Estes dados evidenciam a interseção da violência escolar e da violência social.
Até a década de 80, o estudo desenvolvido sobre a violência escolar a associava às questões
de disciplina. Na década de 90 começa a ser considerada como uma manifestação de delinqüência
juvenil e expressão de um comportamento anti-social. Na literatura contemporânea se nota uma mu-
dança no enfoque pelo qual o tema é abordado. Isto, na medida em que aparece uma preocupação
em demarcar uma variabilidade de sentidos da violência no contexto escolar e sua correlação com as
representações de juventude e da educação (Abramovay & Rua, 2002).
Charlot, professor em Ciências da Educação, chama a atenção para a dificuldade em definir
violência escolar por sua referência a fenômenos heterogêneos, difíceis de delimitar e de ordenar
(Charlot & Émin, 1997) e também porque o fato desestrutura “as representações sociais que têm valor
fundador: aquela infância (inocência), a da escolar (refúgio de paz) e da própria sociedade (pacificadora no
regime democrático)” (Charlot & Émin, 1997, p. 1). Procurando estabelecer instrumentos para analisar
a complexa questão da violência escolar, Charlot (2002) propõe uma distinção conceitual entre a vio-
lência na escola, à escola e da escola. A violência na escola é aquela que se produz dentro do espaço
escolar, sem estar ligada à natureza e às atividades da instituição escolar. A violência à escola está
ligada à natureza e às atividades da instituição escolar, trata-se de uma violência contra a escola. Por
fim, a violência da escola como a violência institucional, simbólica, que os próprios jovens suportam
através da maneira como a instituição e seus agentes a tratam.
19
CLÁUDIA BRAGA DE ANDRADE
Nas últimas duas décadas, os estudos sobre a violência no contexto escolar destacaram, es-
pecialmente, que a instituição escolar não funciona apenas como reprodutora das experiências de
opressão e violência advindas do plano macroestrutural, mas que as escolas também produzem sua
própria violência e sua própria indisciplina. Um outro recorte da violência no âmbito escolar passa a
ser destacado, sem desconsiderar a influência e afetação da violência presente na sociedade. No âm-
bito escolar, começa a surgir uma preocupação com a violência gerada no interior da própria escola
(Sposito, 2001; Njaine & Minayo, 2003).
O campo da educação aparece como elemento fundamental na distinção entre a violência es-
colar propriamente dita e a violência escolar que é ocasionada em consequência da violência social.
Sposito (2001) expõe claramente sua preocupação em destacar uma violência escolar stricto-sensu,
que nasce no interior da escola ou como modalidade de relação direta com o estabelecimento de
ensino, da violência social, determinada por condições históricas e sociais que explicariam o apare-
cimento de condutas violentas na escola. A autora ainda esclarece que o fato de reconhecer certa
moldura social propiciadora das condições para a eclosão da conduta violenta, não é o suficiente para
estabelecer uma linearidade entre o quadro social, que favorece o seu aparecimento, e as práticas de
violência na instituição escolar.
O tema da violência escolar também encontra uma dificuldade de análise, uma vez que o
significado de violência não é conceitual. Na tentativa de delimitar a fronteira e delimitar diferentes
formas de tratamento dos fenômenos, pesquisadores franceses desenvolveram, nos últimos anos,
uma distinção entre a violência, a transgressão e a incivilidade. O termo violência se reserva ao que
ataca a lei com uso da força ou ameaça usá-la, tais como lesões, extorsão, tráfico de drogas, roubos.
20
Violências e JuVentudes: Processos de subJetiVação no contexto escolar
O FENÔMENO BULLYING
Para a análise sobre a violência entre jovens consideramos relevante o debate sobre o fenô-
meno bullying, termo utilizado para descrever atos de violência física ou psicológica, intencionais e
repetidos, praticados com o objetivo de intimidar ou agredir.1 O tema tem despertado um extenso
debate no âmbito da violência escolar. No ano de 2003, a ABRAPIA - Associação Brasileira de Proteção
à Infância e à Adolescência, em uma pesquisa com 5.875 alunos, entre 10 e 19 anos, da 5ª a 8ª séries
de 11 escolas do município do Rio de Janeiro, entre elas nove municipais e duas particulares, da zona
sul e norte, teve o resultado de que 40,5% dos alunos entrevistados admitiram estar envolvidos em
casos de bullying, no qual 16,9% eram alvos deste tipo de agressão, 10,9% se caracterizavam como ví-
timas e autores, 12,7% como autores. Em 2009, uma pesquisa do IBGE revelou que cerca de um terço
(30,8%) dos estudantes em todo o país informou já ter sofrido bullying. De acordo com a pesquisa, a
maior proporção de estudantes atingidos ocorreu em escolas privadas (35,9%) em relação às escolas
públicas (29,5%).
O bullying se tornou um emblema na discussão sobre a violência entre jovens. O tema gera
controvérsias se realmente não se trata de uma ‘nova’ nomeação para um velho e conhecido proble-
ma. O estudo sobre o bullying indica que não se trata de uma violência qualquer, mesmo que apon-
1
Recentemente, apareceu um novo modo de intimidação chamada cyberbullying que representa o uso da tecnologia da infor-
mação para a prática de atos hostis, deliberados e repetidos, por um indivíduo ou grupo de indivíduos, em direção a outro
indivíduo ou grupo de indivíduos. São cada vez mais comuns os casos de cyberbullying em redes sociais da chamada Web, tais
como Orkut, Facebook, MySpace, Twitter e assemelhados.
21
CLÁUDIA BRAGA DE ANDRADE
tado como um fenômeno que ocorre sem causa evidente, há evidências de que ele não corresponde
a uma simples manifestação da violência sem fator determinante. Alguns autores observam que as
causas do bullying incluem, além de fatores econômicos, sociais e culturais, os fatores relacionados
ao temperamento do indivíduo, às influências familiares, de colegas, da escola e da comunidade (Smi-
th, 2002; Lopes Neto, 2005). Embora tais estudos tenham o mérito de desenvolver classificações e
tipologias que tornam visíveis determinadas manifestações de violência, nota-se a importância de
que tais definições sejam analisadas considerando a constituição subjetiva e social do jovem. Nesta
perspectiva, Antunes e Zuin (2008), propõem uma interessante relação entre bullying e o conceito de
preconceito, a partir do exame dos fatores sociais que determinam os grupos-alvo e dos indicativos
da função psíquica para aqueles considerados como agressores. Portanto, as causas do fenômeno de-
nominado bullying fornecem um importante dado para sua análise, uma vez que sejam devidamente
problematizadas.
A identificação do fenômeno bullying tem sido o motivador de um conjunto de leis de combate
e prevenção. No Brasil não existe nenhuma legislação específica sobre bullying. O Estatuto da Criança
e do Adolescente (1990) prevê medidas protetivas e socioeducativas a jovens que cometam atos in-
fracionais. Mas, na última década, uma série de medidas jurídicas vêm sendo implementada no Brasil,
como por exemplo, algumas iniciativas políticas que deram partida a um programa de enfrentamento
do bullying. Os projetos de Lei de uma política anti-bullying trazem como justificativa o fato do bullying
favorecer o surgimento de várias doenças, dificuldade de aprendizagem, exclusão social, transtornos
emocionais, dentre outros sintomas psicossomáticos, podendo levar a vítima a assumir um compor-
tamento agressivo e nocivo à sociedade. Destacamos, a seguir, algumas destas iniciativas. No Rio de
Janeiro, o Projeto de Lei no 94/2009 (Projeto Lei, 2009) prevê que as escolas públicas da Educação Bá-
sica do Município do Rio de Janeiro devem incluir em seu projeto pedagógico medidas de conscienti-
zação, prevenção e combate ao bullying escolar. Em setembro de 2010, também no Rio de Janeiro, foi
sancionada a Lei no 5824 (Lei no 5824, 2010) que torna obrigatória a notificação de casos de bullying.
De acordo com esta lei, os casos de bullying e de violência contra crianças e adolescentes em escolas
públicas e particulares do Rio terão que ser notificados à polícia. A lei prevê uma multa de três a 20
salários mínimos (até R$ 10.200) para instituições de ensino que descumprirem a norma. Pelas novas
regras, professores e funcionários de escolas terão que denunciar os casos a delegacias e conselhos
tutelares. No Rio Grande do Sul, a Assembleia Legislativa (2010) aprovou a Lei no 13.474, que prevê
políticas de combate ao bullying em escolas. A defesa para a aplicação da Lei faz menção a combater
um problema social que tem provocado distúrbios psicossomáticos nas vítimas. Seu principal obje-
tivo é reduzir a violência física e psicológica nas instituições. No Distrito Federal, em 24/05/2012, foi
decretada a Lei No 4.837 (Câmara Legislativa do Distrito Federal (2012), que pretende conscientizar,
prevenir e combater o bullying nas escolas públicas e privadas.
O fenômeno bullying expressa uma face da criminalização e da judicialização da violência entre
jovens, tornando-se alvo de uma série de processos judiciais.2 Tem se traduzido como uma expres-
2
Muitos casos de bullying foram julgados e condenados à pena de indenização. Em outubro de 2008, dois adolescentes de
classe média entre 15 e 16 anos foram acusados de terem apelidado de bode e, ainda, divulgado os xingamentos na internet de
22
Violências e JuVentudes: Processos de subJetiVação no contexto escolar
são da violência e também de uma quebra na regulação social. Compreendemos que este fenômeno
indica que os laços sociais não têm funcionado como um fator de regulação da violência. Torna-se
evidente a precariedade da regulação social e uma nova estruturação do laço social que reorganiza
por completo nossa vida coletiva.
uma colega de classe de uma escola tradicional de Ribeirão Preto (SP). O juiz puniu os jovens a prestar serviços comunitários
por seis meses. (Folha online, 2008). Em 2009, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal condenou uma escola particular de
Ceilândia a pagar uma indenização de R$ 3 mil à família de um garoto que sofreu bullying no ano letivo de 2005, quando tinha
7 anos e cursava a 2ª série. O aluno apanhava constantemente dos colegas. (Correio Braziliense, 2009). Em maio de 2010, o juiz
Luiz Artur Rocha Hilário, da 27ª Vara Cível de Belo Horizonte, condenou um estudante de 7ª série do Colégio Santa Doroteia a
indenizar a sua colega de classe em R$ 8 mil pela prática de bullying. A estudante disse que, em pouco tempo de convivência
escolar, o menino começou a lhe colocar apelidos e fazer insinuações sobre a sua sexualidade. (Folha online, 2010). Em julho de
2010, a justiça do Rio Grande do Sul condenou uma mãe a pagar indenização no valor de R$ 5.000 por danos morais em nome
do filho, menor de idade, que criou um site para ofender um colega de classe. De acordo com o entendimento da 6ª Câmara
Cível, que manteve a decisão de primeira instância, a prática de bullying é ato ilícito e enseja reparação. (Última Instância,
2010). Em abril de 2011, o Tribunal de Justiça condenou o Colégio Nossa Senhora da Piedade, na zona norte do Rio, pagar R$
35 mil de indenização à família de uma aluna que sofreu agressões físicas e psicológicas na escola. Os desembargadores da 13a
Câmara Cível negaram por unanimidade o recurso da instituição que é dirigida por freiras. A menina, hoje com 15 anos, vai
receber R$ 15 mil e seus pais, R$ 20 mil. (Estadão, 2011).
23
CLÁUDIA BRAGA DE ANDRADE
dade inscrita no registro econômico, político, social e simbólico caracterizam a precária condição da
juventude (Birman, 2006, 2009a, 2009b).
Podem ser demarcadas profundas mudanças na experiência da temporalidade no contexto das
transformações ocorridas no capitalismo na segunda metade do século XX (Sennett, 1999). A perda
de noção linear do tempo e a ruptura da noção de tempo e espaço aparecem como reflexo não só da
dinâmica imposta pelo novo modelo de trabalho. O mercado de trabalho se tornou instável e variável,
colocando em questão a existência social do sujeito. Sennett denomina como ‘corrosão de caráter’
estas mudanças nas formas de subjetivação, decorrentes da sensação de fracasso, da constante incer-
teza e das mudanças rápidas, que corroem, não só o trabalhador, mas o seu caráter, a família e mesmo
as suas perspectivas de vida.
Nesta nova configuração social, a instabilidade e a precariedade se tornam marcas das relações
pessoais e das relações de trabalho. O espaço social da família e do trabalho não mais se constitui
como uma fonte de segurança e estabilidade perdendo, desta forma, sua eficácia normativa.
Além das novas condições existentes no mundo do trabalho, a juventude também se depara
com as transformações ocorridas no registro social da família. A crise das instituições coloca em
questão a autoridade e o reconhecimento do outro, conferindo uma nova estruturação do laço so-
cial, reorganizando por completo a nossa vida coletiva. A autoridade sempre esteve relacionada às
instituições com poder político, econômico e social. Atualmente nos deparamos com o poder sem
autoridade, sem reconhecimento moral (Costa, 2004). A experiência dos jovens é marcada por uma
precariedade da alteridade, uma vez que o mundo adulto não oferece uma referência subjetiva se-
gura e uma perspectiva de futuro. Segundo Kehl (2004, p. 97), “a experiência do adulto, assim como a
memória, produz consistência subjetiva. Descartado o passado, em nome de uma eterna juventude, produz-se
um vazio difícil de suportar”.
A falta de referentes simbólicos culturais produzidos na sociedade contemporânea promove
o sentimento de não-pertencimento, de não-filiação. Junto a este cenário, se apresenta uma forma
individualista da sociabilidade voltada para o consumo, que afeta, sobretudo, o seguimento juvenil.
A vertente principal desta precariedade da construção subjetiva dos jovens aparece na identificação
subjetiva com a violência.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Refletir sobre a violência entre os jovens na atualidade é uma questão urgente. O debate
sobre a violência na juventude, mais precisamente a forma como o tema tem sido veiculado serve,
sobretudo, à função adaptativa ao classificar a violência e, pretensamente, justificá-la e controlá-la,
como são os exemplares e extensos casos de processos judiciais para casos de violência entre jovens
no espaço escolar.
Nos últimos anos, é clara a inserção do campo jurídico na esfera escolar e a busca de discus-
sões sobre o papel do educador e da figura representativa da Lei. Promotores de justiça são convida-
dos para fazer palestras em escolas, o policiamento passou a fazer parte da rotina no interior da esco-
24
Violências e JuVentudes: Processos de subJetiVação no contexto escolar
la, casos de danos morais entre alunos são julgados em tribunais de justiça. Podemos aludir que nos
deparamos com o retorno ao reconhecimento da palavra da Lei, que somente ganha sua legitimidade
através de um discurso de verdade encarnado, neste caso, em uma teoria do direito (Foucault, 2002).
A elaboração de medidas protetivas ao enfrentamento da violência não deve se restringir a um
determinado modelo de comportamento e conduta moral, mas englobar uma compreensão sobre os
reflexos da nova cartografia social da juventude. Neste sentido, os casos de violência de jovens no
ambiente escolar não apenas devem ser explicados pela deterioração do contexto social e da imagem
da escola (e do saber) como lugar de promoção social, mas também decorrentes da alteração dos
processos de formação da subjetividade, próprios à nova condição da juventude e ao seu desamparo,
que leva os jovens a procederem a um processo de socialização e constituição de sua identidade so-
cial no “enfrentamento” com outros jovens. Desta forma, poderemos fornecer subsídios para avançar
a discussão sobre a violência e a produção subjetiva de laços violentos na juventude.
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Recebido em 10/04/2014
Revisto em 07/07/2015
Aceito em 9/07/2015
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* Doutorando em Psicologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Psicólogo da Escola
Judicial do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG).
Email: fabio.siloe@gmail.com
** Doutora em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Professora Adjunta do
Departamento de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG).
Email: nadia.laguardia@gmail.com
Educação em Revista|Belo Horizonte|v.30|n.02|p.161-180|Abril-Junho 2014
162
relacionada com a que foi aqui discutida. Ele destaca que o corpo
biológico do cidadão ocupa posição central nos cálculos e estratégias
do poder estatal. Isso significa que a política moderna transformou-
se numa biopolítica, em que a vida politicamente qualificada (bios)
perde todo seu espaço para a vida nua (zoé) — a vida natural,
que coincide com o corpo biológico dos cidadãos, despojado de
toda relevância política. Uma possível contribuição psicanalítica
preconiza justamente a abertura de espaço para a emergência do
sujeito, para além de seu corpo biológico. Ou seja, quando o cálculo
utilitário e a biopolítica excluem totalmente da cena as dimensões
incalculáveis, contingentes e sutis que concernem ao sujeito, temos
o império de um discurso de domínio que apenas retroalimenta
sistematicamente o ciclo de violência. Para que haja um rompimento
desse ciclo, é preciso entrar em cena uma preocupação que vá além
da simples preservação dos corpos das crianças na escola. É preciso
preservar-lhes a possibilidade de ação e transformação, de resposta
aos impasses ocasionados pelas recusas cada vez mais insistentes dos
modelos tradicionais de escolarização.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
decidido de Célio Garcia “de que um dia o jovem pudesse largar suas
armas e tomar a palavra” (BARROS-BRISSET, 2013, p.6). De fato, ele
aponta que, quando alguém fala, o faz a partir de uma posição própria.
“Criar condições para o reconhecimento dessa posição subjetiva
[...] significa deixar vir sua voz nua e crua, sem garantia de realidade”
(GARCIA, 2011b, p.24). Essa perspectiva traz uma inspiração ética
profunda, na medida em que a tomada da palavra permite uma
enunciação que pode abrir alternativas aos atos de violência. “Eis a
forma analítica de dispensar o aprisionamento ao discurso do mestre
contemporâneo para dar lugar ao saber fazer de cada um”, apresenta
Barros-Brisset: “convidando cada um a tomar a palavra para falar
mais sobre isso” (BARROS-BRISSET, 2013, p.6).
Como também sugere Lacadée (2000), ao invés de medidas
puramente proibitivas, é preciso autorizar os sujeitos a respeitarem-
se a si mesmos, para que eles possam se reconhecer na sociedade. A
escola se ocupa de jovens em formação, que precisam ser amparados
nesse momento de suas vidas. Educar é ajudar a construir um sentido
para a vida, é despertar, nos jovens, o desejo de viver. Para além da
transmissão de conhecimentos universais, a escola deve acolher o
novo que cada jovem porta em seu corpo e em sua palavra.
Cabe à escola abrir espaços para a palavra, para a construção
de um sentido individual dentro desse espaço coletivo. A criação
surge da transgressão, do conflito, presente em todo grupo social.
Como adverte Arendt (2000), a violência resulta da severa frustração
da faculdade de agir no mundo. É necessário que o sujeito dê o seu
consentimento “para participar da teia de relações inter-humanas
que constituem toda sociedade” (ARENDT, 2000, p.91). Ao invés
de buscar propostas somente de natureza coercitiva, a escola precisa
investir em projetos educacionais que garantam a participação ativa
de cada um na vida social.
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NOTA
1
A ideia de anomalias sociais remete à discussão empreendida por Canguilhem (2009)
sobre a confusão semântica entre anomalia, que teria um sentido mais descritivo, e anormal,
que guardaria uma referência a um valor. “Nem toda anomalia é patológica”, diz ele, “mas
só a existência de anomalias patológicas é que criou uma ciência especial das anomalias
que tende normalmente — pelo fato de ser ciência — a banir, da definição da anomalia,
qualquer implicação normativa” (CANGUILHEM, 2009, p.52-53). Foucault (1999) mostra
precisamente como o biopoder retoma a noção de anomalia para implicar os desvios em
relação a uma normatividade social.
Recebido: 18/08/2013
Aprovado: 14/03/2014
Contato:
Universidade Federal de Minas Gerais.
Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas.
Av. Antônio Carlos, 6.627 - Campus Pampulha,
Belo Horizonte | MG | Brasil
CEP 31.270-901