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CAPÍTULO 3 - ARQUITETURA DAS REDES DE

TELECOMUNICAÇÕES

Há diversas abordagens para se descrever a arquitetura de uma rede de


telecomunicações. Esse capítulo tem por objetivo apresentar as diversas formas de se
definir arquitetura e descrever, a título de exemplo, a arquitetura de algumas redes de
telecomunicações.

3.1. Definindo Arquitetura


A arquitetura de uma rede de telecomunicações define a forma como a rede está
organizada. Na literatura não há uma forma única e consensual para se definir
arquitetura de rede, mas sim várias formas alternativas. As formas mais comuns
utilizadas são [1],[2],[3],[4],[5],[6] e [7]:

• Definir arquitetura como a forma de organizar a implementação das funções


necessárias para a operação da rede.

• Definir arquitetura como a forma de organizar os equipamentos necessários para


a operação da rede.

• Definir arquitetura em termos funcionais, ou seja, como a forma de organizar os


blocos funcionais da rede.

• Definir arquitetura como a forma de organizar redes para que um determinado


serviço possa ser oferecido.

• Definir arquitetura como a forma de organizar os segmentos que compõem a


rede.

Algumas redes têm sua arquitetura definida de mais de uma forma, como é o caso
das redes telefônicas e das redes NGN (Next Generation Networks). A arquitetura das
redes NGN pode ser definida como a forma de organizar os equipamentos necessários
para a operação da rede ou como uma arquitetura em camadas que define a forma de
organizar os segmentos que compõem a rede.

Qualquer que seja a definição de arquitetura adotada, o que se busca é obter uma
visão particionada da rede, facilitando o entendimento da operação da mesma.
De todas as formas de definição citadas acima, a única que possui um modelo geral
padronizado e independente da tecnologia da rede é a definição de arquitetura como a
forma de organizar as funções necessárias para a operação da rede. Este modelo é
denominado de Modelo de Referência OSI (Open Systems Interconnection) e divide as
redes em sete camadas. No nosso entender, a compreensão deste modelo ajuda
sobremaneira no entendimento das complexas redes de telecomunicações atuais e, por
esta razão, esse será o foco principal desse capítulo. As outras formas de definição são
particulares de cada rede e, em função disto, nossa estratégia de abordagem desses
modelos de definição será por meio da apresentação de alguns exemplos específicos.

3.2. O Modelo de Referência OSI


No Capítulo 2 estudamos as diversas funções que compõem uma rede de
telecomunicações. A implementação destas funções é realizada utilizando uma
arquitetura em camadas (ou níveis), com cada camada sendo responsável pela
implementação de um subconjunto de funções.

O modelo de referência OSI, padronizado pela ISO, é um modelo de referência para


interconexão de sistemas abertos, isto é, sistemas implementados a partir de
padronizações e que, portanto, são abertos para comunicação com outros sistemas
implementados a partir das mesmas padronizações. [3][8]

O modelo OSI define 7 camadas denominadas: camada física (nível 1), camada de
enlace (nível 2), camada de rede (nível 3), camada de transporte (nível 4), camada de
sessão (nível 5), camada de apresentação (nível 6) e camada de aplicação (nível 7).

A camada N recebe um serviço da camada N-1 e presta um serviço para a camada


N+1. As camadas de mesmo nível trocam informações entre si por meio de protocolos
associados à camada em questão. Por exemplo, a camada de transporte do terminal de
origem troca informações com a camada de transporte do terminal de destino por meio
de um protocolo de transporte. Estas informações são trocadas através de cabeçalhos (e
eventualmente trailers) que são acrescentados em cada camada.

A unidade de dados que a camada N passa para a camada N-1 é denominada de


PDU (Protocolo Data Unit) da camada N. A PDU da camada N é composta pelos dados
da camada N+1 e pelo cabeçalho da camada N. O campo de dados da camada N
transporta a PDU da camada N+1.
A comunicação entre as camadas se dá por meio do ponto de acesso ao serviço
(SAP – Service Access Point). A primeira camada fim a fim do modelo, ou seja, que
está presente apenas nos terminais (transmissor e receptor), é a camada de transporte.

As Figuras 3.1 e 3.2 ilustram o modelo de referência e alguns termos definidos


acima. Na Figura 3.1, as linhas tracejadas conectando as camadas pares (por exemplo,
camadas de transporte nos terminais A e B) representam o protocolo daquela camada.
Como pode-se observar na Figura 3.1, os dispositivos da rede de comunicação só
implementam as três primeiras camadas do modelo, estando as demais camadas
presentes apenas nos terminais de origem e destino.

Terminal A Terminal B

Aplicação Aplicação
Apresentação Apresentação
Sessão Sessão
Transporte Transporte
Rede Rede Rede Rede
Enlace Enlace Enlace Enlace
Física Física Física Física

Rede de comunicação

Figura 3.1. - Modelo de referência OSI.

Camada N + 1 HN+1 PDU da camada N+2

Camada N HN PDU da camada N+1

Camada N - 1
HN-1 PDU da camada N

Ponto de acesso ao serviço HN = cabeçalho da camada N

Figura 3.2. - Ilustração do SAP e da PDU.

Em geral, a PDU recebe um nome particular em função da camada em que ela está
associada. Assim, na camada de enlace é comum denominar a PDU de quadro (por
exemplo, quadro Ethernet), na camada de rede as denominações mais comuns são
pacote e datagrama e, finalmente, na camada de transporte a denominação comum é
segmento.

As funções associadas a cada uma das camadas são:


• Camada Física: é responsável pela transmissão e recepção dos bits. Define
características elétricas e mecânicas, como por exemplo: quantos volts
representa o bit 0 e quantos volts representa o bit 1, qual é a taxa de transmissão,
qual o tipo de conector utilizado para interconectar o terminal à rede, etc. Da
mesma forma, define o meio de transmissão, a topologia da rede, o código de
linha, a modulação digital.

• Camada de Enlace: as principais funções da camada de enlace são: controle dos


erros de transmissão (codificação de canal), controle de fluxo e múltiplo acesso.
A função de endereçamento pode estar associada à camada de enlace, como os
endereços MAC (Medium Access Control) das redes locais. Além disso, a
camada de enlace tem por função definir os limites dos quadros de dados, ou
seja, ela deve dividir o fluxo de bits de entrada em quadros, e controlar se os
quadros estão sendo recebidos na sequência correta.

• Camada de Rede: controla a operação da rede de comunicação. As principais


funções são roteamento e controle de congestionamento. O endereço de rede do
terminal é definido na camada de rede (por exemplo, o endereço IP de um
computador). Além disso, a camada de rede executa algumas funções associadas
à interconexão de redes.

• Camada de Transporte: é a primeira camada fim a fim da rede. Ou seja, é a


primeira camada na qual o protocolo do terminal de origem troca informações
diretamente com o protocolo do terminal de destino, sem a interveniência dos
nós intermediários da rede. A camada de transporte é responsável por
implementar as funções de controle de erro e controle de fluxo fim a fim.

• Camada de Sessão: é responsável por estabelecer, gerenciar e finalizar sessões


entre aplicações. Esta camada talvez seja a mais abstrata de todas as camadas do
modelo OSI.

• Camada de Apresentação: provê independência para os processos de aplicação


das diferenças na representação dos dados (sintaxe).

• Câmara de Aplicação: provê acesso ao ambiente OSI para os usuários. A


camada de aplicação contém vários protocolos que são necessários para os
usuários executarem suas aplicações ou atividades. Por exemplo, o protocolo
HTTP (HyperText Transfer Protocol), que é a base para consultas à Internet
(WWW), é um protocolo da camada de aplicação.

Devemos ressaltar que o modelo OSI é um modelo de referência, muito útil na


análise de soluções de rede, mas que não é implementado por nenhuma rede
comercialmente importante. Dois exemplos de arquiteturas de redes que utilizam o
modelo de camadas funcionais são a Arquitetura TCP/IP e a Arquitetura ATM,
brevemente descritas a seguir.

3.3. Arquitetura TCP/IP


A arquitetura TCP/IP é largamente utilizada, atualmente, em redes de
telecomunicações. Esta arquitetura define um modelo de 5 camadas, ilustrado na Figura
3.3. As camadas física, de enlace, de rede e de transporte têm funcionalidades iguais às
definidas para as camadas de mesmo nome do modelo OSI. A camada de aplicação na
arquitetura TCP/IP engloba funções das camadas de sessão, apresentação e aplicação do
modelo OSI.

Estação origem Estação destino

Aplicação Aplicação
Transporte Transporte
Rede Rede
Enlace Rede Enlace
Física Física

Figura 3.3. - Arquitetura em camadas das redes TCP/IP.

3.4. Arquitetura ATM


A arquitetura da rede ATM adiciona à arquitetura em camadas o modelo de planos,
definindo: um plano de controle, um plano do usuário, um plano de gerenciamento das
camadas e um plano de gerenciamento dos planos. O modelo possui quatro camadas,
como ilustrado na Figura 3.4, denominadas de camada física, camada ATM, camada de
adaptação e camadas superiores.

As funcionalidades de cada camada não podem ser facilmente mapeadas para as


camadas do modelo OSI. Por exemplo, a camada física ATM é responsável pela
transmissão dos bits (função da camada física do modelo OSI) e também pelo controle
de erro no cabeçalho e delineamento de células (funções que seriam de camada de
enlace no modelo OSI). A camada ATM tem funcionalidade semelhante à camada de
rede do modelo OSI e a camada de adaptação, que é a primeira camada fim a fim do
ATM, se assemelha à camada de transporte do modelo OSI. A camada de adaptação
tem, dentre outras, a responsabilidade de adaptar as informações do usuário ao padrão
de transmissão da rede ATM, no qual os pacotes possuem tamanho fixo, denominados
de células, igual a 53 bytes.

As redes ATM serão descritas no Capítulo 6.

Plano de Plano do
Controle Usuário

Camadas Camadas
Superiores Superiores

Camada de Camada de
Adaptação Adaptação

Camada ATM

Plano de
Camada Física Gerenciamento
dos Planos

Plano de
Gerenciamento
das Camadas

Figura 3.4. - Arquitetura em camadas e planos das redes ATM.

3.5. Arquitetura das Redes MPLS


Uma rede MPLS (Multiprotocol Label Switching) se baseia nas redes IP e, portanto,
sua organização em camadas é igual à arquitetura TCP/IP. No entanto, o MPLS
acrescenta um novo elemento arquitetural às redes IP, a divisão da rede em um plano de
roteamento e outro de encaminhamento, como ilustra a Figura 3.5. O plano de
roteamento opera como a função de roteamento normal das redes IP, enquanto no plano
de encaminhamento os datagramas são encaminhados pela rede com base em um label,
como nas redes do tipo circuito virtual.
Plano de roteamento

L1
L3
L2
Plano de encaminhamento
LSP

Figura 3.5. - Arquitetura da rede MPLS.

3.6. Arquitetura da rede SDH


A arquitetura das redes SDH (Synchronous Digital Hierarchy) é composta de
quatro camadas denominadas: camada fotônica, camada de sessão, camada de linha e
camada de caminho, como ilustra a Figura 3.6.

Camada de Caminho
Camada de Linha
Camada de Sessão
Camada Fotônica

Figura 3.6. - Arquitetura em camadas das redes SDH.

As redes SDH também utilizam o conceito de arquitetura baseada na organização


dos segmentos da rede, com a definição de três segmentos: caminho, linha e seção. A
Figura 3.7 ilustra estes segmentos, bem como sua interação com a arquitetura em
camadas.
Sinal elétrico Sinal elétrico

Caminho Caminho
Linha Linha
Seção Seção
Fotônica Fotônica

Sinal óptico Sinal óptico Sinal óptico Sinal óptico

Regenerador

MUX ADM

Seção Seção Seção Seção

Linha Linha

Caminho

Figura 3.7. - Arquitetura como organização de segmentos da rede e sua interação com a
arquitetura em camadas.

3.7. Arquitetura das Redes Telefônicas


A arquitetura das redes telefônicas pode ser definida segundo vários dos critérios
definidos na Seção 3.1.

A Figura 3.8 ilustra uma possível definição de arquitetura para a rede telefônica, na
qual a arquitetura é baseada na organização dos segmentos da rede: rede de acesso, rede
de sinalização, rede de transporte.

Rede de
acesso

Rede de telefonia
Rede de Transporte
Central Central
Local Central Local
Central
Trânsito
Trânsito
assinantes Central
Trânsito

Rede de Sinalização

Rede de Dados
Central
Local Roteador Roteador

Voz Roteador

Sinalização
Dados

Figura 3.8. - Arquitetura da rede telefônica, como organização dos segmentos de rede.
A Figura 3.9 ilustra outra definição, na qual a arquitetura é apresentada como a
forma de organizar a conexão entre os equipamentos necessários para a implantação da
rede. Esta arquitetura é baseada em uma topologia hierárquica, com várias classes de
centrais telefônicas.

Trânsito Internacional

Trânsito Interurbana

Trânsito Local

Tandem

Locais

Figura 3.9. - Arquitetura da rede telefônica, como organização da conexão entre as centrais.

As redes telefônicas serão descritas no Capítulo 6.

3.8. Arquitetura para IPTV


A arquitetura de IPTV é definida como a forma de organizar os blocos funcionais
da rede. A Figura 3.10 ilustra esta arquitetura, na qual podem ser identificados os blocos
funcionais e a comunicação existente entre eles, representadas pelas linhas tracejadas.

Funções da Aplicação

Funções
Funções Funções
de
dos Funções de controle do de
serviço Funções de entrega de gerência provedor
usuários conteúdo de
conteúdo

Funções de rede

Figura 3.10. - Arquitetura de IPTV, como forma de organizar os blocos funcionais.


Referências

[1] - GOLENIEWSKI, Lillian. Telecommunications Essentials: The Complete Global


Source for Communications Fundamentals, Data Networking and the Internet, and
Next-Generation Networks. Montreal, Canadá: Addison Wesley, 2003. 608 p.

[2] - FOROUZAN, Behrouz A.. Comunicação de dados e redes de computadores. 4.


ed. São Paulo, Sp: Bookman, 2006. 840 p.

[3] - TANENBAUN, Andrew S.. Computer Networks. 4. ed. Upper Saddle River, Nj:
Prentice Hall, 2003. 912 p.

[4] - KUROSE, James F.; ROSS, Keith W.. Computer Networking: A Top-Down
Approach Featuring the Internet. 3. ed. Montreal, Canadá: Addison Wesley, 2004.

[5] - DODD, Annabel Z.. The Essential Guide to Telecommunications. 3. ed. Upper
Saddle River, Nj: Prentice Hall, 2002.

[6] – Ver no original da Anatel

[7] – Ver no original da Anatel

[8] - BRISA. Arquiteturas de Redes de Computadores OSI e TCP/IP. São Paulo,


Sp: Makron Books, 1994.

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